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Como Eu Era Antes de Voce - Jojo Moyes

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— Ah, não foi ele que me <strong>de</strong>ixou assim — exclamei. — Foram todos esses<br />

anos <strong>de</strong> trabalho no café. Lá, a gente ouve e vê todos os tipos <strong>de</strong> comportamento<br />

humano. Você não imagina o que existe.<br />

— Por isso você nunca se casou?<br />

Pisquei.<br />

— Acho que sim.<br />

Não quis dizer que na verda<strong>de</strong> nunca fui pedida em casamento.<br />

* * *<br />

Po<strong>de</strong> parecer que não fazíamos muita coisa. Mas, na verda<strong>de</strong>, os dias com Will<br />

eram sutilmente diferentes, variando conforme o humor <strong>de</strong>le e, mais importante,<br />

a intensida<strong>de</strong> das dores. Alguns dias, quando eu chegava, percebia pela rigi<strong>de</strong>z do<br />

maxilar <strong>de</strong>le que não queria falar comigo, nem com ninguém. Assim, eu me<br />

ocupava do anexo, tentando prever o que ele ia precisar para não ter que<br />

perguntar.<br />

As dores <strong>de</strong>le tinham causas variadas. Havia a dor pela perda muscular —<br />

apesar <strong>de</strong> toda a sioterapia feita por Nathan, Will tinha muito menos músculos<br />

para sustentar o corpo. Havia a dor <strong>de</strong> estômago causada por problemas<br />

digestivos; a dor no ombro; a dor por infecção urinária — inevitável, apesar dos<br />

esforços <strong>de</strong> todos. Ele também tinha uma úlcera estomacal <strong>de</strong>vido ao excesso <strong>de</strong><br />

analgésicos que tomara como se fossem balinhas no início da recuperação.<br />

De vez em quando, tinha escaras na pele por car sentado na mesma posição<br />

durante muito tempo. Por duas vezes, precisou car na cama para que as feridas<br />

cicatrizassem, mas ele <strong>de</strong>testava car na cama. Ficava <strong>de</strong>itado ouvindo o rádio,<br />

os olhos brilhando <strong>de</strong> raiva <strong>de</strong> tal forma que nem conseguia controlar. Will<br />

também tinha dores <strong>de</strong> cabeça. Para mim isso era efeito colateral da raiva e<br />

frustração que sentia. Ele tinha muita energia mental mas não podia usá-la para<br />

nada. Tinha <strong>de</strong> <strong>de</strong>saguar em alguma coisa.<br />

Mas o que mais incomodava era a incessante queimação nas mãos e nos pés<br />

que não o <strong>de</strong>ixava pensar em outra coisa. <strong>Eu</strong> trazia uma tigela <strong>de</strong> água gelada e<br />

mergulhava as mãos <strong>de</strong>le, ou enrolava os pés em uma anela fria na esperança<br />

<strong>de</strong> amenizar seu <strong>de</strong>sconforto. Um músculo da sua mandíbula se retesava e cava<br />

pulsando e <strong>de</strong> vez em quando Will parecia sair do ar, como se a única forma <strong>de</strong><br />

não sentir dor fosse <strong>de</strong>ixar o próprio corpo. Surpreen<strong>de</strong>ntemente, eu havia me<br />

acostumado às suas necessida<strong>de</strong>s físicas. Parecia injusto que, além <strong>de</strong> não po<strong>de</strong>r<br />

usar ou sentir as mãos e os pés, eles ainda causassem tanto <strong>de</strong>sconforto.<br />

Apesar <strong>de</strong> tudo, ele não reclamava. Por isso levei semanas para perceber que<br />

estava sofrendo. Agora eu conseguia <strong>de</strong>cifrar o cansaço em seu olhar, os silêncios,<br />

o jeito como ele parecia se refugiar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si mesmo. Ele apenas pedia:<br />

— Po<strong>de</strong> trazer água gelada, Louisa? — ou: — Acho que preciso <strong>de</strong> alguns

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