You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
pernas compridas e parecer com alguém que a maior parte <strong>de</strong> nós só vê em<br />
comerciais. Imaginei se o cabelo e a maquilagem <strong>de</strong>la tinham sido feitos por<br />
uma equipe <strong>de</strong> prossionais. E se ela estaria usando uma calcinha mo<strong>de</strong>ladora.<br />
Claro que não. Devia usar coisinhas rendadas em tons suaves — lingeries<br />
femininas para quem não precisa levantar nenhuma parte do corpo e que custam<br />
mais que o meu salário semanal.<br />
Enquanto o padre falava e as daminhas <strong>de</strong> sapatilhas <strong>de</strong> balé se agitavam nos<br />
bancos da igreja, olhei em volta, notando os outros convidados. Quase todas as<br />
mulheres podiam estampar as páginas <strong>de</strong> uma revista <strong>de</strong> luxo. Os sapatos,<br />
exatamente no mesmo tom das roupas, pareciam nunca ter sido usados. As mais<br />
jovens se equilibravam com elegância em saltos <strong>de</strong> <strong>de</strong>z centímetros, com as<br />
unhas dos pés muito bem pintadas. As mais velhas, com saltos mais baixos,<br />
usavam vestidos bem-cortados, ombreiras <strong>de</strong> seda com costuras em cores<br />
contrastantes e chapéus que pareciam <strong>de</strong>safiar a lei da gravida<strong>de</strong>.<br />
<strong>Era</strong> menos interessante observar os homens, mas todos tinham aquele ar que<br />
eu às vezes <strong>de</strong>tectava em Will, graças à riqueza e aos títulos, dando a impressão<br />
<strong>de</strong> que a vida corria sem percalços. Imaginei com que pessoas andavam, em que<br />
mundo viviam. Me perguntei se reparavam em pessoas como eu, que cuidavam<br />
dos lhos <strong>de</strong>les, os atendiam nos restaurantes. Ou faziam pole dance para os seus<br />
colegas <strong>de</strong> trabalho, pensei, lembrando das minhas entrevistas no Centro <strong>de</strong><br />
Trabalho.<br />
Em geral, nos casamentos a que eu costumava ir, as famílias dos noivos<br />
cavam separadas, pois temiam que alguém <strong>de</strong>srespeitasse a liberda<strong>de</strong><br />
condicional <strong>de</strong>les.<br />
Will e eu nos sentamos no fundo da igreja, eu na beirada do banco e a ca<strong>de</strong>ira<br />
<strong>de</strong>le à minha direita. Ele olhou <strong>de</strong> relance Alicia passar e virou-se para a frente,<br />
com uma expressão inescrutável. Um coro <strong>de</strong> quarenta e oito vozes (eu contei)<br />
cantava em latim. Rupert suava <strong>de</strong>ntro do smoking e levantou uma sobrancelha<br />
como se estivesse se sentindo, ao mesmo tempo, satisfeito e meio bobo. Ninguém<br />
aplaudiu nem comemorou quando o padre <strong>de</strong>clarou-os marido e mulher. Rupert<br />
pareceu um pouco estranho, inclinou-se sobre a noiva como se fosse mor<strong>de</strong>r uma<br />
maçã pendurada num barbante e errou o alvo. Perguntei-me se a classe alta<br />
consi<strong>de</strong>rava “<strong>de</strong>selegante” se agarrar no altar.<br />
Então, a cerimônia chegou ao m. Will já estava se dirigindo para a saída da<br />
igreja. Vi a parte <strong>de</strong> trás da cabeça <strong>de</strong>le, altiva e curiosamente digna e tive<br />
vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> perguntar se ele se arrepen<strong>de</strong>u <strong>de</strong> ter ido. Queria perguntar se ainda<br />
sentia alguma coisa por ela. Queria dizer que ele era bom <strong>de</strong>mais para aquela<br />
mulherzinha dourada sem graça, por mais que as aparências pu<strong>de</strong>ssem dar a<br />
enten<strong>de</strong>r o contrário e que... não sei o que mais eu queria dizer.<br />
Só queria <strong>de</strong>ixar as coisas melhores.<br />
— Você está bem? — perguntei, ao me aproximar <strong>de</strong>le.