You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
PORTUGAL ENTRE REI CATÓLICO E CRENÇAS<br />
MEDIEVAIS<br />
Contam lendas <strong>de</strong> além-mar que viveu em Portugal uma po<strong>de</strong>rosa <strong>bruxa</strong>.<br />
Essa <strong>bruxa</strong> foi famosa. Centenária. Po<strong>de</strong>rosa. Era a <strong>bruxa</strong> da cida<strong>de</strong>, que<br />
andava com um mocho às costas e que tocava harpa nas noites frias <strong>de</strong><br />
inverno. Aliada do Tinhoso, era ao mesmo tempo temida e adorada.<br />
Numa casa, um simples casebre, vivia a esperança <strong>de</strong> muitos, o pavor <strong>de</strong><br />
outros: a Bruxa <strong>de</strong> Évora, a Moura Torta, a guardadora dos segredos dos<br />
feitiços do Oriente, a que voava em camelos alados nas noites <strong>de</strong> lua cheia,<br />
a boca-suja, a praguejadora, a maga negra, a que fazia as mulheres<br />
engravidarem (pois dizem que até as mulheres nobres a procuravam para<br />
terem filhos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> tentarem promessas, rezarem missas e chorarem aos<br />
pés dos santos Sebastião, Jorge e Pu<strong>de</strong>nciana, a virgem)... Vivia como<br />
eremita, sempre só em sua casa, com suas galinhas e coelhos, com<br />
chapelão, saia e avental, com sapatos golpeados, murmurando rezas<br />
estranhas...<br />
Vamos contar suas histórias, seus feitiços e suas lendas. Ponham atenção...<br />
sintam seu cheiro <strong>de</strong> cânhamo e beladona... É tempo <strong>de</strong> almas penadas e <strong>de</strong><br />
santos vivos... É tempo <strong>de</strong> magia negra!<br />
Nossa história se passa em Évora, lá pelos idos <strong>de</strong> 1230, setenta anos<br />
<strong>de</strong>pois da tomada <strong>de</strong> Lisboa aos mouros que lá viviam e mandavam,<br />
adorando a Mafoma e a Allah; gran<strong>de</strong> feito dos guerreiros portugueses,<br />
alcançado graças ao sacrifício <strong>de</strong> Dom Martim Moniz, senhor do domínio<br />
<strong>de</strong> Ravasco, que <strong>de</strong>u a vida para que os portugueses se apo<strong>de</strong>rassem do<br />
castelo <strong>de</strong> Achbuna.<br />
A vida mantinha então as cores <strong>de</strong> um conto <strong>de</strong> fadas. Pois as i<strong>de</strong>ias<br />
dominantes eram as do Velho Testamento, do romance <strong>de</strong> cavalaria, da<br />
balada. Narrativas <strong>de</strong> aventuras eram comuns; e talvez esta seja apenas<br />
mais uma <strong>de</strong>las.<br />
A cavalaria na Ida<strong>de</strong> Média criou um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> homem forte, vigoroso e<br />
amante; mas a <strong>bruxa</strong>ria <strong>de</strong>u o lado encantado <strong>de</strong>ssa era. Cavaleiros<br />
andantes, <strong>bruxa</strong>s, padres andarilhos, magos, alquimistas, reis, freiras, papas<br />
e imperadores reinaram por todo esse período. Or<strong>de</strong>ns como a <strong>de</strong> São João,<br />
a dos Templários e a dos Teutônicos levavam os homens aos reinos da<br />
fantasia. O cavaleiro andante, fantástico e misterioso, era sem apegos como<br />
os primeiros templários o foram, e tão mágicos quanto as <strong>bruxa</strong>s e seus