?! CURIOSA MENTE Violência Por Natália Gallo Psicóloga do Hospital <strong>São</strong> <strong>Francisco</strong> @inclinarepsicologia psicológica: o abuso invisível A violência contra a mulher foi algo considerado normal durante séculos, e ainda é assim em alguns países. Tal agressão não ocorre apenas pelo uso da força física, mas também costuma estar escondida em uma forma de abuso muitas vezes sutil e difícil de ser identificada: a violência psicológica. “Regue bem seu sentimento Porque rega no momento Não pode faltar Gente também é semente Tem que estar contente Tem que respirar” (Vinicius de Moraes) 10 |
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define violência como “o uso de força física ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação”. O conceito de violência é ampliado pela palavra “poder” e, assim, a definição passa a incluir os maus-tratos psicológicos, como ameaças, difamação, intimidação, discriminação, desrespeito, insultos, injúrias, rejeição, humilhação, cobranças exageradas e ciúme excessivo. Esses comportamentos controladores fazem com que a vítima passe a se menosprezar e ferem profundamente sua autoestima. Quando alguém é exposto repetidas vezes a tais situações, os sentimentos decorrentes dos abusos sofridos geram feridas que permanecem em sua vida psíquica, inscritas na memória e constantemente revividas com emoções intensas, deixando marcas traumáticas. RESIGNAÇÃO E SUBMISSÃO Embora as pessoas afetadas comumente apresentem sentimentos crônicos de tristeza, frustração, infelicidade, descontentamento e mal-estar, é raro que elas tenham a consciência de que sofrem este tipo furtivo de violência e podem até mesmo demonstrar uma aceitação resignada, acostumando-se à situação e achando que aquilo não importa. Desta forma, tudo o que tem valor para a vítima é banalizado. Às vezes, isso é mascarado por piadas e outras atitudes socialmente aceitas, podendo ser sutis e difíceis de serem reco- nhecidas e, assim, contribuindo para que os abusos continuem. Ao contrário da agressão física, tal abuso não deixa marcas concretas e, devido a isso, produz consequências psicológicas e sem evidências imediatas. Esse tipo de violência é uma das mais difíceis de serem identificadas e notificadas, apesar de ser a mais comum. Na verdade, qualquer outro tipo de abuso (físico, sexual ou por abandono/ omissão) envolve também a presença de violência psicológica e, muitas vezes, essa agressão acaba evoluindo para a força física. As consequências mais drásticas para as vítimas destes casos são o abuso de álcool, drogas e até o suicídio. Estar apaixonada pelo agressor pode ser outro agravante, visto que o sentimento de amor pode superar o medo ou desgosto pelo abuso sofrido. E mesmo que reconheça estar sendo submetida à violência psicológica, as convenções sociais e sentimentos de vergonha e culpa forçam a pessoa a manter-se em silêncio. Assim, raramente a vítima busca ajuda externa, com tendência a aceitar e mesmo buscar justificativas para as atitudes do agressor. Muitas vezes, as vítimas são acusadas, inclusive culturalmente, e temem ser responsáveis pela situação que vivem, sentindo-se sem condições ou desesperançosas para ousarem rebelar-se e fazer algo a respeito. PESSOAS E AMBIENTES MAIS PROPENSOS Cabe salientar que não apenas a mulher, mas, qualquer pessoa mais propensa à vulnerabilidade (como crianças, adolescentes, idosos e incapazes) está sujeita a sofrer violência psicológica. Além disto, apesar de mais frequente no âmbito das relações íntimas e familiares, ela não se restringe ao ambiente doméstico, podendo ocorrer também em escolas, locais de trabalho e mesmo em instituições sociais e médicas destinadas ao cuidado do público. Considerando-se que a violência não é apenas um problema individual, mas também relacional, comunitário e social, muitos são os esforços para preveni-la e ela é considerada uma questão de saúde pública, exigindo ações que envolvem diversos setores, como saúde, educação, serviço social, justiça e política. COMO AJUDAR Quando se trata de auxiliar quem diretamente sofre este tipo de violência, o primeiro passo é mostrar que ela precisa de ajuda. Para tanto, será necessário ajudá-la a reconhecer que vive uma situação que extrapola os limites do normal ou natural, quebrando a reação mais comum do ser humano diante de ameaças: o isolamento. O silêncio e a introspecção diante do sofrimento tornam a pessoa prisioneira de si mesma, à medida que a impedem de buscar novas perspectivas e soluções. O auxílio de um psicólogo é o princípio deste cuidado e, portanto, fundamental para que tais dores possam ser trabalhadas. O encontro terapêutico irá propiciar desenvolvimento da capacidade de sentir, pensar e agir - o que pode significar o início da adoção de atitudes para o enfrentamento da violência psicológica e promoção de transformações. | 11