RELATOS DE UM JOGADOR Conheci o bingo em 1999, com o pai da minha filha. Lembro que naquela noite ficamos por volta de uma hora jogando nas máquinas e ganhamos. Era tanto dinheiro que achei que era o local exato para eu ganhar mais e melhorar de vida. No início ia a cada 20 dias e, às vezes, uma vez por mês. Até que no mesmo ano saí de férias, e como não tinha nada para fazer resolvi ir até a casa de jogos e joguei até perder todo o dinheiro das férias. Achei um absurdo, pois trabalhei o ano todo e em questão de meia hora já havia perdido tudo. Na ânsia de recuperar meu dinheiro, passei a frequentar mais vezes, até o momento em que já não buscava mais o prazer do jogo e sim recuperar o valor perdido. Não tinha o controle do dinheiro, do tempo, da auto-estima, nem dignidade e amor próprio. Já não me alimentava, faltava ao trabalho, recebi duas cartas de advertência da empresa, mas nada me fez parar de jogar. Lembro que deixei minha filha, na época menor de idade, do lado de fora do bingo para jogar. Peguei dinheiro com agiotas, empréstimos nos bancos e com pessoas conhecidas, simulei assaltos, menti, manipulei, virei um trapo humano. Eu achava que meu problema era financeiro e não o jogo. Aliás, aquelas máquinas me fascinavam pelas luzes, era como se eu estivesse dopada e não percebia o tempo passar. Depois de virar uma pessoa derrotada procurei ajuda. Desde 20<strong>02</strong> frequento o grupo de Jogadores Anônimos e vivo um dia de cada vez. al entre dois homens que tinham problemas com jogos. Eles começaram a se reunir regularmente e à medida que os meses se passavam nenhum deles voltou a jogar. No Brasil, a primeira reunião de Jogadores Anônimos ocorreu no Rio de Janeiro em 1993. Hoje o JA tem cerca de 30 grupos de apoio espalhados por todo o país, cada um recebe de 8 a 10 pessoas por reunião que acontece uma vez por semana. Eles acreditam que a pessoa pode tratar o vício por meio de uma progressiva mudança de caráter, seguindo os conceitos básicos do Programa de Recuperação de Jogadores Anônimos que é composto por 12 passos. Nestes passos o viciado admite a impotência perante o jogo, passa a acreditar em uma nova forma de pensar e analisar a vida. É necessário tentar reparar os danos causados e buscar, ainda, apoio nas orações e na meditação. Depois de completado os 12 passos é hora de auxiliar outros jogadores. Além disso, no JA a família também recebe ajuda. VIDA REAL A ficção sempre se faz presente na vida real. É importante novelas e filmes, por exemplo, divulgarem problemas da sociedade que muitas vezes são escondidos. Com anos de trabalho na televisão, Lilia Cabral visitou jogadores anônimos para entender o que acontece na prática. Em um depoimento para o site da Globo, a atriz contou o que a surpreendeu. “O semblante deles é muito tranquilo, porque eles têm a consciência do vício diferente de um alcoólatra que tem a parte física alterada. Eles mentem tanto que poderiam ganhar o Oscar segundo disseram pessoas que convivem com esses jogadores”, diz Lilia. Nestes casos a ajuda da família é essencial. “Num primeiro momento a família pode tentar conversar, mas sem julgamentos porque isso só atrapalha. É importante conter a emoção, ser tolerante e paciente”, orienta Areco que indica o acompanhamento de um psicólogo “Muitas vezes é preciso fazer uma avaliação, e dependendo do caso, o viciado pode ser encaminhado ao médico psiquiatra”, finaliza. 32 |
Responsável técnico: Dr. José Carlos Lucheti Barcelos CRM nº 81.223 ANS - Nº 3<strong>02</strong>09-1 são francisco | 33