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Revista LiteraLivre 9ª edição

9ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 9nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar

9ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 9nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar

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<strong>LiteraLivre</strong> nº 9 – Maio/Jun de 2018<br />

A Muralha<br />

Alberto Arecchi<br />

Pavia - Itália<br />

Cheguei nesta cidade sendo um garoto de seis anos. Os bulevares da periferia<br />

estavam alinhados com longas e maçantes paredes cobertas de frascos de vidro.<br />

Eram os limites das fábricas, erguidos nos anos anteriores à Primeira Guerra<br />

Mundial. Todas as manhãs, com qualquer tempo meteorológico, milhares de<br />

trabalhadores, caminhando ou de bicicleta, iam-se fechar atrás dessas paredes.<br />

Cada noite, outras mulheres e outros homens davam-lhes a mudança, para os<br />

turnos noturnos. Nos anos sessenta e setenta, a cerca desses muros tornou-se a<br />

fronteira entre o movimento estudantil e os trabalhadores, uma frente de<br />

distribuição de folhetos, de contatos, discussão e agitação. No lado de fora, ao<br />

longo dos passeios, tem longas calçadas de tílias. Lembro-me das grandes gotas<br />

que se condensavam caindo de seus ramos nus, nas noites de neblina densa.<br />

Agora que as tílias cresceram, as grandes fábricas fecharam as portas e se<br />

transformaram em "áreas abandonadas". O Muro de Berlim caiu, outros muros<br />

foram criados, mas estes em nossos subúrbios permanecem, como memórias<br />

cinzentas e precárias de um mundo isolado onde milhares de homens<br />

voluntariamente se fechavam, todas as manhãs, mudando sua personalidade,<br />

vestindo-se, transformando-se em autômatos, para dedicar longas horas à<br />

repetição monótona de gestos sempre iguais. Era o preço da sobrevivência. Esses<br />

mesmos gestos continuam a ser repetidos hoje, em partes distantes do mundo,<br />

por outros homens, mas aqui são apenas uma lembrança do passado.<br />

O muro de que quero falar corre por um quilômetro ao longo da rua principal<br />

do bairro, sempre na sombra, porque o sol nunca atinge a face externa. As<br />

calçadas, sob as tílias, passam ao norte da cerca, ao lado do tráfego rápido e<br />

barulhento. Um longo percurso, empoeirado no verão, úmido e lamacento no<br />

inverno, quando a neve nunca derrete. Essa fábrica tem sido por mais de<br />

sessenta anos um dos motores vivos da economia local. Suas exalações<br />

envenenavam o ar e os pulmões. À noite, a chaminé drenava fumos ácidos no ar.<br />

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