Revista LiteraLivre 9ª edição
9ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 9nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar
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<strong>LiteraLivre</strong> nº 9 – Maio/Jun de 2018<br />
eram uma pasta grosseira. Queria com esse gesto acalmar a si mesmo e afirmar<br />
que ainda mantinha o controle total da situação. Não! Não iria chegar ao ponto<br />
de dizer que tudo estava para sempre perdido e que agora ele estava nos<br />
domínios dedáleos do destino. Num instante viu uma rocha.<br />
Parou.<br />
A contemplação de uma fenda da rocha. Deveria se refugiar ali? O som da<br />
chuva dava interferências nos seus pensamentos. Ainda conservava traços de<br />
orgulho, como se estivesse a imaginar uma futura biografia: numa terrível<br />
tempestade, o poderoso Anselmo recusa-se a se refugiar numa fenda da rocha e<br />
constrói por contra própria o seu refúgio. Queria o papel heroico e não a imagem<br />
acossada de uma besta encurralada e ofegosa. Num gesto um corisco reverberou<br />
em sua mente: uma imagem velha e feminina. De onde vinha essa imagem? De<br />
que canto escuro vinha para se assenhorear de suas volições? Parecia uma<br />
matriarca soberana. Por alguma associação obscura o valente sentiu-se<br />
compelido imediatamente a aceitar o refúgio rochoso.<br />
Confiante de sua agilidade, de corredor que compete com cavaleiros,<br />
supunha que já não estava mais nos limites de Serra Velha, assim não temeria se<br />
alguém o visse naquela posição. Ele tinha chegado aos limites do mundo.<br />
Entretanto, o que era Anselmo agora? Um qualquer encharcado pressionado por<br />
duas colunas imemoriais de rocha. Talvez chegasse a um ponto em que perdera<br />
para sempre sua identidade. Seria apenas uma criatura pré-humana que<br />
respirava. Uma massa informe.<br />
Olhou para suas roupas. Era como um sacerdote primitivo que tivesse<br />
realizado uma hecatombe, como um Elias que tivesse matado os profetas de<br />
Baal. Sangue e água unidos no seu corpo testificavam que ele ainda estava ali.<br />
As vozes desses elementos queriam dizer algo a ele? Os paredões de rocha<br />
abraçavam-no ou sufocavam-no? Eram mãos amigas ou inimigas? De que lado<br />
eles estavam? Havia o rabisco de um homem na rocha. Era sua imagem. A<br />
imagem do horror traçada com violência. Teria retrocedido ao tempo zero?<br />
Num delírio ele via o rabisco se deslocando da parede dando seu<br />
filamentinho de mão para a imagem da matriarca soberana e para o homem<br />
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