29.05.2018 Views

Revista LiteraLivre 9ª edição

9ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 9nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar

9ª Edição da Revista LiteraLivre, uma revista virtual e ecológica, criada para unir autores que escrevem em Língua Portuguesa em todo o mundo. 9nd Edition of LiteraLivre Magazine, a virtual and ecological magazine, created to bring together authors who write in Portuguese throughout the world. Http://cultissimo.wixsite.com/revistaliteralivre/comoparticipar

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>LiteraLivre</strong> nº 9 – Maio/Jun de 2018<br />

sucumbiu pela manhã e à noite foi servido no jantar. Minha avó, Dinha Aurora, o<br />

preparou no fogão a lenha. Ela e minha tia Preta foram morar conosco após o<br />

nascimento do Cleiton, meu próximo irmão na escala. Depois dele vieram a Kate<br />

e o Clemir. Eu não quis comer nenhum pedaço do “Galinho”, tinha afeição a ele,<br />

apesar da sua ingratidão. Fui dormir com os olhos vermelhos, no colchão de<br />

palha seca.<br />

O quintal dos fundos inundava durante o período das águas, quando o<br />

pequeno córrego Tijuca, que carregava normalmente um fio fedorento de água<br />

leitosa da fábrica Itambé, transformava-se em um gigante de turbilhões<br />

barrentos e varria além de seus limites. Nessas ocasiões para mim também era<br />

bom. O que me importava eram os barquinhos de papéis coloridos, flutuando no<br />

mar alaranjado que se formava na borda da janela da cozinha. Quanta dor de<br />

cabeça para os moradores adultos! Tormento que fez o papai construir o prédio<br />

de frente para a Avenida Amazonas e nos afastar dessa ameaça.<br />

Embaixo do prédio, ficava o porão. Lugar escuro, abafado, que servia para<br />

guardar sucata. Não gostávamos de ficar no porão, pois no lugar tinha pulgas e<br />

outros insetos, pois os cachorros dormiam lá. Recordo que meus irmãos mais<br />

velhos, uma vez, foram colocados de castigo naquele lugar, pelo meu pai. Porém,<br />

eu frequentava, de vez em quando, o porão, para brincar, numa espécie de<br />

exp<strong>edição</strong>. Certa vez, numa tarde de Sexta-feira da Paixão, encontrei um<br />

minúsculo camundongo entre a porta e um monte de brita que seria usada em<br />

alguma reforma. Peguei um toquinho e prendi a cauda dele. O bichinho grunhia,<br />

sofreu até eu me cansar e soltá-lo. Corri e fui rindo contar à minha mãe. Maria,<br />

na sua meiguice de olhos azuis, muito calma, disse-me que era Sexta-feira da<br />

Paixão, que Nosso senhor Jesus Cristo padecia na cruz e que eu jamais poderia<br />

ter feito isso. Então, justifiquei que o rato é um bicho que ninguém gosta. Ela<br />

disse-me que na vida eu encontraria, talvez, pessoas que não gostariam de mim<br />

e nem por isto, teriam o direito de maltratar-me. Senti-me menor do que era,<br />

pelo que fiz.<br />

Na minha cabeça existiam duas realidades, dois mundos dentro daqueles<br />

limites. O quintal dos fundos era o mundo dos pobres, do galinho, das enchentes,<br />

7

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!