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___Baggini-Fosl-as-Ferramentas-Dos-Filosofos-Um-Compendio-Sobre-Conceitos-e-Metodos

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Ferrament<strong>as</strong> básic<strong>as</strong> da argumentação 1 3 5<br />

No primeiro c<strong>as</strong>o, a inconsistência poderia ser apen<strong>as</strong> aparente. O que<br />

se poderia estar efetivamente dizendo não é que está chovendo e não está<br />

chovendo, m<strong>as</strong>, antes, que não está propriamente chovendo nem é o c<strong>as</strong>o<br />

que não esteja chovendo, já que há uma terceira possibilidade - talvez<br />

esteja chuviscando ou garoando, ou chovendo de modo intermitente -, e<br />

que esta outra possibilidade descreve mais acuradamente a situação.<br />

O que produz a inconsistência apen<strong>as</strong> aparente neste exemplo é<br />

que a pessoa que faz a afirmação altera o sentido dos termos que está<br />

empregando. Outra maneira de formular a primeira sentença, portanto,<br />

é: "em certo sentido está chovendo, m<strong>as</strong> cm outro sentido não está''.<br />

Para que a inconsistência seja real, os termos relevantes empregados têm<br />

de ter o mesmo sentido do início ao fim.<br />

Este equívoco nos significados d<strong>as</strong> palavr<strong>as</strong> mostra que é preciso<br />

ter cuidado para não confundir a forma lógica de uma inconsistência<br />

- afirmar X e não-X - com <strong>as</strong> form<strong>as</strong> da linguagem comum que parecem<br />

se encaixar na definição de inconsistência m<strong>as</strong> que de fato não são<br />

inconsistentes. Muit<strong>as</strong> afirmações que afirmam ao mesmo tempo "X" e<br />

"não-X" na linguagem comum, quando cuidadosamente analisad<strong>as</strong> não<br />

se revelam de modo algum como inconsistênci<strong>as</strong>. Portanto, tenha cuidado<br />

antes de acusar alguém de inconsistência.<br />

M<strong>as</strong> quando você reconhece uma inconsistência lógica genuína, fez<br />

uma grande coisa, pois é impossível defender uma inconsistência sem<br />

rejeitar abertamente a racionalidade! Talvez existam contextos poéticos,<br />

religiosos e filosóficos nos quais é precisamente isto o que <strong>as</strong> pesso<strong>as</strong><br />

julgam apropriado fazer.<br />

Inconsistência poética, religiosa ou filosófica?<br />

E quanto ao segundo exemplo que apresentamos acima - "Minha<br />

c<strong>as</strong>a não é minha c<strong>as</strong>a?''. Suponhamos que o contexto no qual a sentença<br />

é enunciada é o diário de alguém que vive sob um regime terrivelmente<br />

violento e ditatorial - talvez o diário de Winston Smith, o personagem<br />

de George Orwell em 1984. Literalmente, a sentença é autocontraditória,<br />

internamente inconsistente. Ela parece afirmar simultaneamente que "esta<br />

é minha c<strong>as</strong>a" e "esta não é minha c<strong>as</strong>a". M<strong>as</strong> a sentença também parece<br />

transmitir certo sentimento poético, parece transmitir quão absurdo o

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