Sheila, professora universitária da Ufop “conteúdos escolares como ciências, história e geografia são, em sua maioria, transmitidos via leitura e escrita. Se o aluno não lê e interpreta bem, ele também acaba por ter dificuldades em outras áreas do conhecimento.” Os índices de analfabetismo são baseados em pessoas que não sabem ler e escrever. No entanto, mensurá-lo é uma tarefa mais complicada, pois a capacidade de interpretar textos é fundamental para a autonomia das pessoas no exercício diário de cidadania. O Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) foi desenvolvido em 2001 pelo Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa. O último relatório do Instituto, publicado em 2016, revela que da totalidade de alfabetizados no país, apenas 8% são proficientes, ou seja, encontram-se no nível de excelência de alfabetização. E outros 27% são considerados analfabetos funcionais. O estudo atual classifica cinco tipos de alfabetismo no Brasil, buscando compreender as habilidades e práticas de leitura e escrita da população. Análises como essa sinalizam a necessidade de se proporcionar o desenvolvimento da alfabetização plena, que incluiria a possibilidade de refletir e questionar o mundo. “Sem o estudo não se chega a lugar nenhum”, é a conclusão da Faxineira, Georgia Pais, hoje em dia. Desmotivada, com dificuldades em algumas disciplinas, ela apostou no trabalho e abandonou a escola na sétima série, com 14 anos. Mais tarde percebeu que necessitava voltar aos estudos, compreende a importância e tenta passar para seus filhos. “A gente vai falando, mas parar de estudar, como eu parei, nenhum deles vai”. Em 2014, ela terminou os estudos pelo EJA, sonha em escrever e lançar um livro, mas perde as palavras só de lembrar da sensação do diploma na mão. “Depois de mais de 20 anos, foi muito bom, é ótimo”. Míriam Castro, vinte e três anos após abandonar os estudos, procurou pelo EJA para concluir o Ensino Médio. Desde criança teve dificuldades em estudar. Primeiro na infância, no município de Barra Longa, onde a escola era basicamente uma professora, que dava conta de todas as séries primárias. Depois, na adolescência, já em Mariana, por ter que conciliar os estudos com o trabalho de doméstica, o qual precisava manter para ajudar sua mãe. Concluiu o Ensino Fundamental e deixou a escola para cuidar dos filhos, pensando: “Deus me livre de estudar”. Os pensamentos mudaram quando sua filha começou a estudar e precisou de sua ajuda para realizar os deveres de casa. Hoje, com 49 anos, Míriam aguarda ansiosa pela colação de grau no curso de psicologia, que acontecerá em julho. “No dia do vestibular, quando cheguei na sala, só tinha jovens e eu, que fiz o EJA. Pensei: ‘o que eu tô fazendo aqui?’. Comecei a rir sozinha.” O sorriso permanece no rosto, indicando o quanto valeu a pena enfrentar essa batalha. Na contramão dos avanços O Presidente da República, Michel Temer, sancionou a medida provisória que reformula o Ensino Médio no dia 16 de fevereiro de 2017. A medida prevê uma flexibilização dos currículos. Definindo as disciplinas obrigatórias pela Base Nacional Curricular Comum (BNCC) e aumentando a carga horária com matérias de aprofundamento em uma área de interesse. A proposta gerou polêmicas em todo o país porque desfavorece áreas do conhecimento que se relacionam com o desenvolvimento da consciência histórica e dos direitos. Ter acesso a conteúdos diversificados é positivo, pois completa a formação. Flexibilizar o contato com determinadas disciplinas é um caminho que aponta para um ensino mais técnico e menos crítico. Como aponta a professora Sheila Dias, “o estudante de baixa renda vai optar por disciplinas que dêem condições para ele se inserir no mercado de trabalho. Como se a gente vivesse numa fartura de empregos”. Ela ainda ressalta que no ensino privado essa flexibilização não acontecerá, o que torna desigual o tipo de acesso à educação. “Essa elite burguesa sabe que o conhecimento é libertador e que a gente passa a reivindicar a partir do momento que temos conhecimento sobre as coisas”, conclui.
Acessibilidade... Texto: Carolina Carli e Paula Locher Foto: Pedro Nigro Arte: Amanda dos Santos Francisco CURINGA CURINGA | EDIÇÃO | EDIÇÃO <strong>21</strong> <strong>21</strong> 25