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Revista Curinga Edição 21

Revista Laboratorial do Curso de Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto.

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Sheila, professora universitária da Ufop<br />

“conteúdos escolares como ciências, história e geografia<br />

são, em sua maioria, transmitidos via leitura<br />

e escrita. Se o aluno não lê e interpreta bem, ele<br />

também acaba por ter dificuldades em outras áreas<br />

do conhecimento.”<br />

Os índices de analfabetismo são baseados em<br />

pessoas que não sabem ler e escrever. No entanto,<br />

mensurá-lo é uma tarefa mais complicada, pois a<br />

capacidade de interpretar textos é fundamental<br />

para a autonomia das pessoas no exercício diário<br />

de cidadania. O Indicador de Alfabetismo Funcional<br />

(Inaf) foi desenvolvido em 2001 pelo Instituto<br />

Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa. O último<br />

relatório do Instituto, publicado em 2016, revela<br />

que da totalidade de alfabetizados no país, apenas<br />

8% são proficientes, ou seja, encontram-se no<br />

nível de excelência de alfabetização. E outros 27%<br />

são considerados analfabetos funcionais. O estudo<br />

atual classifica cinco tipos de alfabetismo no Brasil,<br />

buscando compreender as habilidades e práticas de<br />

leitura e escrita da população. Análises como essa<br />

sinalizam a necessidade de se proporcionar o desenvolvimento<br />

da alfabetização plena, que incluiria<br />

a possibilidade de refletir e questionar o mundo.<br />

“Sem o estudo não se chega a lugar nenhum”,<br />

é a conclusão da Faxineira, Georgia Pais, hoje em<br />

dia. Desmotivada, com dificuldades em algumas<br />

disciplinas, ela apostou no trabalho e abandonou a<br />

escola na sétima série, com 14 anos. Mais tarde percebeu<br />

que necessitava voltar aos estudos, compreende<br />

a importância e tenta passar para seus filhos.<br />

“A gente vai falando, mas parar de estudar, como eu<br />

parei, nenhum deles vai”. Em 2014, ela terminou<br />

os estudos pelo EJA, sonha em escrever e lançar um<br />

livro, mas perde as palavras só de lembrar da sensação<br />

do diploma na mão. “Depois de mais de 20<br />

anos, foi muito bom, é ótimo”.<br />

Míriam Castro, vinte e três anos após abandonar<br />

os estudos, procurou pelo EJA para concluir<br />

o Ensino Médio. Desde criança teve dificuldades<br />

em estudar. Primeiro na infância, no município de<br />

Barra Longa, onde a escola era basicamente uma<br />

professora, que dava conta de todas as séries primárias.<br />

Depois, na adolescência, já em Mariana,<br />

por ter que conciliar os estudos com o trabalho de<br />

doméstica, o qual precisava manter para ajudar sua<br />

mãe. Concluiu o Ensino Fundamental e deixou a<br />

escola para cuidar dos filhos, pensando: “Deus me<br />

livre de estudar”. Os pensamentos mudaram quando<br />

sua filha começou a estudar e precisou de sua<br />

ajuda para realizar os deveres de casa. Hoje, com<br />

49 anos, Míriam aguarda ansiosa pela colação de<br />

grau no curso de psicologia, que acontecerá em julho.<br />

“No dia do vestibular, quando cheguei na sala,<br />

só tinha jovens e eu, que fiz o EJA. Pensei: ‘o que eu<br />

tô fazendo aqui?’. Comecei a rir sozinha.” O sorriso<br />

permanece no rosto, indicando o quanto valeu a<br />

pena enfrentar essa batalha.<br />

Na contramão dos avanços<br />

O Presidente da República, Michel Temer, sancionou<br />

a medida provisória que reformula o Ensino<br />

Médio no dia 16 de fevereiro de 2017. A medida<br />

prevê uma flexibilização dos currículos. Definindo<br />

as disciplinas obrigatórias pela Base Nacional<br />

Curricular Comum (BNCC) e aumentando a carga<br />

horária com matérias de aprofundamento em uma<br />

área de interesse. A proposta gerou polêmicas em<br />

todo o país porque desfavorece áreas do conhecimento<br />

que se relacionam com o desenvolvimento<br />

da consciência histórica e dos direitos. Ter acesso a<br />

conteúdos diversificados é positivo, pois completa<br />

a formação. Flexibilizar o contato com determinadas<br />

disciplinas é um caminho que aponta para um<br />

ensino mais técnico e menos crítico. Como aponta<br />

a professora Sheila Dias, “o estudante de baixa<br />

renda vai optar por disciplinas que dêem condições<br />

para ele se inserir no mercado de trabalho. Como<br />

se a gente vivesse numa fartura de empregos”. Ela<br />

ainda ressalta que no ensino privado essa flexibilização<br />

não acontecerá, o que torna desigual o tipo<br />

de acesso à educação. “Essa elite burguesa sabe que<br />

o conhecimento é libertador e que a gente passa a<br />

reivindicar a partir do momento que temos conhecimento<br />

sobre as coisas”, conclui.

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