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edição de 22 de maio de 2017

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52 anos com 52 novelas<br />

Histórias provocam revoluções<br />

<strong>de</strong> costumes e comportamento<br />

Inspirada pela própria socieda<strong>de</strong> e, em contrapartida, também capaz<br />

<strong>de</strong> influenciar, a dramaturgia forma o caldo cultural e sociológico do país<br />

Claudia Penteado<br />

São 66 anos <strong>de</strong> novelas <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

a primogênita, Sua vida me<br />

pertence, exibida na TV Tupi <strong>de</strong><br />

São Paulo. De lá para cá, os folhetins<br />

fazem parte do dia a dia<br />

dos brasileiros, numa história<br />

única que se construiu somente<br />

no Brasil, com a magnitu<strong>de</strong><br />

e a potência a que chegou como<br />

produto <strong>de</strong> dramaturgia diária.<br />

Inspiradas pela própria socieda<strong>de</strong><br />

brasileira e, em contrapartida,<br />

também capazes <strong>de</strong> inspirar<br />

e influenciar comportamentos,<br />

as novelas formam o caldo cultural<br />

e sociológico que permeia<br />

o cotidiano da gran<strong>de</strong> <strong>maio</strong>ria.<br />

Um interminável jogo <strong>de</strong> espelhos.<br />

“As novelas provocaram e<br />

retrataram a <strong>maio</strong>r parte das revoluções<br />

<strong>de</strong> costumes que aconteceram<br />

no Brasil nos últimos 66<br />

anos. São gran<strong>de</strong>s fenômenos<br />

culturais e continuam importantes<br />

como sempre”, diz Washington<br />

Olivetto, CEO da WMc-<br />

Cann, que se inspirou no tímido<br />

professor Josué, interpretado<br />

por Marco Nanini em Gabriela,<br />

em 1975, para compor o Garoto<br />

Bombril, em 1978.<br />

A via <strong>de</strong> mão dupla entre realida<strong>de</strong><br />

e ficção é <strong>de</strong> fato potente,<br />

transforma a realida<strong>de</strong> e há inúmeros<br />

exemplos disso ao longo<br />

do tempo. Mulheres Apaixonadas,<br />

que abordou <strong>de</strong> maneira impactante<br />

o tema <strong>de</strong> maus-tratos<br />

a idosos, contribuiu para a aprovação<br />

do Estatuto do Idoso aqui<br />

fora, na vida. Indo mais longe no<br />

tempo, vale lembrar a contribuição<br />

<strong>de</strong> Escalada para a discussão<br />

sobre o divórcio (na época<br />

ainda não legalizado). Novelas<br />

são longevas – continuam sendo<br />

revistas interminavelmente em<br />

programas como Vale a pena ver<br />

<strong>de</strong> novo e canais como o Viva, da<br />

Globosat. No atual horário nobre,<br />

se entrelaçam as histórias <strong>de</strong><br />

uma personagem travesti e outra<br />

que planeja fazer a transição <strong>de</strong><br />

gênero, em A Força do Querer.<br />

“A telenovela, com sua gran-<br />

Cena <strong>de</strong> a Força do Querer, atual novela no horário nobre da Globo, que entrelaça histórias da diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gênero<br />

<strong>de</strong> propagação em diversos<br />

setores da socieda<strong>de</strong> e por distintas<br />

mídias, tem como uma <strong>de</strong><br />

suas características a apropriação<br />

da realida<strong>de</strong> como matéria-<br />

-prima. Nela, realida<strong>de</strong> e ficção<br />

tomam formas cada vez mais<br />

parecidas, uma acaba inspirando<br />

a outra”, analisa Mauro<br />

Alencar, estudioso <strong>de</strong> novelas,<br />

doutor em teledramaturgia<br />

brasileira e latino-americana<br />

pela USP e autor <strong>de</strong> diversos livros<br />

sobre as novelas, como A<br />

Hollywood Brasileira – Panorama<br />

da Telenovela no Brasil.<br />

Alencar <strong>de</strong>screve a telenovela<br />

como um gênero catalisador <strong>de</strong><br />

outras linguagens – literatura, teatro,<br />

cinema. Técnicas são criadas<br />

e renovadas constantemente,<br />

temáticas do cotidiano são<br />

inseridas na ficção, utilizando<br />

como argamassa <strong>de</strong> construção a<br />

história do Brasil, além <strong>de</strong> ciências<br />

como a psicologia, a sociologia<br />

e a antropologia. Telenovelas<br />

impulsionaram a economia – por<br />

exemplo, com as vendas da televisão<br />

em cores a partir <strong>de</strong> 1973 –<br />

e amplificaram a “economia do<br />

entretenimento”. Mas seu <strong>maio</strong>r<br />

valor, na opinião do especialista,<br />

é e foi a formação <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

nacional para o Brasil.<br />

“A novela contribui para diminuir<br />

as diferenças entre os<br />

diversos aspectos do complexo<br />

comportamento humano, pois<br />

com a riqueza <strong>de</strong> nossa telenovela,<br />

a <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> nossa individualida<strong>de</strong>,<br />

po<strong>de</strong>mos compreen<strong>de</strong>r<br />

que somos parte <strong>de</strong> um todo”,<br />

comenta.<br />

Marcelo Silva, vice-presi<strong>de</strong>nte<br />

artístico da Record TV – que<br />

emplacou um novo gênero <strong>de</strong><br />

novelas <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> sucesso, contando<br />

histórias bíblicas, afirma<br />

que o público apren<strong>de</strong>u a se reconhecer<br />

na tela da TV – o que<br />

não ocorre, por exemplo, ao<br />

assistir filmes estrangeiros. “As<br />

novelas conseguiram explorar<br />

diferentes aspectos da vida do<br />

povo e acabam tão presentes<br />

João Miguel Júnior/Divulgação<br />

que pautam as conversas, e até o<br />

noticiário do dia”.<br />

Silvana Gontijo, presi<strong>de</strong>nte da<br />

PlanetapontoCom, especializada<br />

em inovação em educação, critica<br />

a visão carregada <strong>de</strong> preconceitos<br />

que rotulava as novelas<br />

como alienadoras e “o ópio do<br />

povo”, em especial as campeãs<br />

<strong>de</strong> audiência. “Como qualquer<br />

obra autoral, uma novela, uma<br />

peça <strong>de</strong> teatro, uma exposição<br />

<strong>de</strong> arte ou um livro po<strong>de</strong> ser boa<br />

ou ruim, aplaudida ou rejeitada,<br />

inovadora ou conservadora.<br />

Acho que as novelas, se prestam<br />

ou prestaram um <strong>de</strong>sserviço, foi<br />

talvez o <strong>de</strong> nos mostrar o que não<br />

queremos ver e muito menos<br />

reconhecer como feio, em nós<br />

mesmos. Tem mais, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

que fomos alienados por elas me<br />

parece uma visão extremamente<br />

<strong>de</strong>squalificante <strong>de</strong> nós mesmos.<br />

Como se seus críticos duvidassem<br />

da nossa inteligência e capacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> avaliar criticamente o<br />

que recebemos”, afirma.<br />

1<strong>22</strong> <strong>22</strong> <strong>de</strong> <strong>maio</strong> <strong>de</strong> <strong>2017</strong> - jornal propmark

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