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NÁ<br />

O C í N C A C m O -<br />

GENTIL-HOMEM<br />

TRILHA DO CINEMA<br />

A l E X V I A N Y<br />

Cineclubista, distribuidor<br />

de filmes, participante da<br />

fundação do Cinema Novo,<br />

William (Juca) Cobbett há<br />

muito sonhava em farer um<br />

filme sobre Jesuíno Brilhan<br />

te, o cangaceiro gentil-homem,<br />

que lutou pela idéia<br />

republicana e contra a escra<br />

vidão, um século atrás, nos<br />

sertões do Rio Grande do<br />

Norte. Com recursos modes<br />

tos, Cobbett voltou à sua ter<br />

ra natal e realizou a saga de<br />

Jesuíno em tom de cordel. O<br />

filme entra hoje em cartaz no<br />

>N >' ^ <<br />

No elenco, entre vários nomes veteranos, estão<br />

atores do Rio Grande do Norte, onde foi filmado essa<br />

história de cangaceiro com ritmo de western<br />

Rio.<br />

N é r i V í t o r é<br />

Jesuíno Brilho/nte,<br />

um Robin Hood da caatinga


Quase üm século depois<br />

de sua morte em combate,<br />

em 1879, Jesuíno Brilhante<br />

continua vivo na literatura<br />

de cordel, nas histórias repe<br />

tidas pelos cantadores das<br />

feiras do Nordeste — e, mui<br />

to especialmente, de sua ter<br />

ra do Rio Grande do Norte.<br />

Agora, Jesuíno vira he<br />

rói de cinema num filme fei<br />

to no sertão do Rio Grande<br />

do Norte por William Cobbett,<br />

que deve tão estranho<br />

nome a ancestrais de nacio<br />

nalidade desconhecida, mas<br />

provavelmente ciganos.<br />

O R O B I N H O O D<br />

DA<br />

SECA<br />

Jesuíno Brilhante foi, se<br />

gundo Luís da Gamara Cas<br />

cudo, "o cangaceiro gentilhomem,<br />

espécie matuta de<br />

Cavaleiro Andante, adorado<br />

pela população pobre, de<br />

fensor dos fracos, dos an<br />

ciãos oprimidos, das moças<br />

ultra,jadas, das crianças<br />

agredidas."<br />

Durante seis anos consecutivps,<br />

entre 1873 e 1879,<br />

foi um legítimo líder serta<br />

nejo, chegando a reunir cer<br />

ca de mil homens sob seu co<br />

mando, para a distribuição<br />

de justiça e alimentos. Na<br />

grande seca de 1877, não se<br />

sabe quantos flagelados sal<br />

v o u c o m s e u s i s t e m a d e t i r a r<br />

dos ricos para matar a fo<br />

m e d o s n e c e s s i t a d o s .<br />

— Natmalmente, a his<br />

tória de Jesuíno estava a exi<br />

gir uma superprodução —<br />

c o m e n t a W i l l i a m C o b b e t t . —<br />

• Mas. se eu fosse esperar as<br />

condições ideais, talvez nun<br />

ca fizesse o filme, com o<br />

qual venho sonhando desde<br />

garoto.<br />

O garoto William, batiza<br />

do com esse nome por uma<br />

bisavó que falava mal o por<br />

tuguês, nasceu na vila de<br />

Ipanguaçu em 1930 e cedo<br />

começou a sonhar com o ci<br />

nema, enquanto tentava ser<br />

mecânico, contador e outras<br />

coisas. Com um grupo de cinemeiros,<br />

ajudou a sustentar<br />

um cineclube de Recife, en<br />

tre 1949 6 1953. Depois, já<br />

no Rio de Janeiro, fundou<br />

uma distribuidora cinemato<br />

gráfica, a Tabajara, com seu<br />

amigo Túlio Cardoso.<br />

— A t r a v é s d a d i s t r i b u i<br />

dora, queríamos ganhar di<br />

nheiro para investir na pro<br />

dução.- Mas não tínhamos<br />

base, nem vivência, nem ta<br />

rimba.<br />

Mas. um dia, alguns dos<br />

f u n d a d o r e s d o C i n e m a N o v o<br />

— Joaquim Pedro de Andra<br />

de, Miguel Borges, Eduardo<br />

Coutinho, Carlos Diégues,<br />

Marcos Farias, Leon Hirszm<br />

a n — p r o p u s e r a m q u e a<br />

Tabajara entrasse na produ<br />

ção de Cinco Vezes Favela,<br />

um filme em episódios, que<br />

aproveitaria o já terminado<br />

Couro de Gato, de Joaquim<br />

Pedro, e, tendo Coutinho co<br />

mo drreto'f de produção, in<br />

cluiria quatro outras his<br />

tórias (de Borges, Diégues,<br />

Farias e Hirszman).<br />

O L O N G O C A M I N H O<br />

D E<br />

V O L T A<br />

A primeira produção in<br />

dividual em que a Tabajara<br />

participou foi Canalha em<br />

Crise, de Miguel Borges, que<br />

chegou a bom termo após<br />

u n s t r ê s a n o s d e d i f i c u l d a<br />

des. Em seguida, houve o<br />

projeto frustrado de Marcos<br />

Farias, Chico Palavrão.<br />

— Ai fiquei de molho uns<br />

tempos, até que, em 1968,<br />

Paulo Tiago apareceu com a<br />

idéia de Senhores da Terra. O<br />

dinheiro era pouco, mas, a es<br />

sa altura, eu já havia adqui<br />

rido uma grande experiência<br />

na produção de filmes bara<br />

tos e difíceis. Por isso, saí por<br />

aí e coordenei a produção,<br />

que se realizou sem muitos<br />

problemas.<br />

Bem diferente foj o traba<br />

lho seguinte de Cobbett, que<br />

se associou a José Règattieri,<br />

um ex-seminarista, para<br />

f i l m a r u m a P a i x ã o h á m a i s<br />

d e 1 0 a n o s e n c e n a d a n a c i -<br />

dadezinha de São Roque, Es<br />

pírito Santo. Foi o sucesso<br />

dessa Vida de Jesiis Cristo,<br />

principalmente na Semana<br />

Santa e nos cinemas popula<br />

res, que finalmente deu a Ju<br />

cá as condições mínimas pa<br />

r a t i r a r s e u v e l h o s o n h o d a<br />

gaveta.<br />

— Como não consegui um<br />

co-produtor que aceitasse o<br />

desafio, peguei o pouco di<br />

nheiro que tinha e sai para<br />

f a z e r J e s u í n o B r i l h a n t e . E u<br />

já sabia há muito tempo que<br />

n ã o s e f a z c i n e m a s ó c o m<br />

uma idéia na cabeça: este<br />

meu cinema, a gente faz<br />

muito mais com as mãos. E,<br />

depois de tudo o que eu pas<br />

sei, continuo com vontade<br />

d e f a z e r c i n e m a n a s m e s m a s<br />

condições.<br />

W i l l i a m ( J u c a ) C o b b e t t<br />

certamente estranhaifia se<br />

algum dia lhe dessem um<br />

linanciamento camarada e<br />

uma produção confortável.<br />

No caso de Jesuíno Brilhan<br />

te, nunca lhe passou pela ca<br />

b e i a fi l m a r e m o u t r o l u g a r<br />

que não fosse a caatinga de<br />

Jesuíno e Juca.<br />

— E u f i z u m t r a b a l h o d e<br />

pesquisa, li tudo sobre Je<br />

suíno, e, com os recursos de<br />

que dispunha, optei por uma<br />

saga popular, em tom de cor<br />

del. Sei que não fiz ainda,<br />

plenamente, o filme de Je<br />

suíno Brilhante: e, se hou<br />

ver oportunidade, gostaria<br />

ue .r-ódi- aiguiu dia lun outro<br />

filme a respeito dele.<br />

O M E D O D O<br />

F I L M E F E C H A D O<br />

E m N a t a l , n u m c i n e m a<br />

cuja entrada custa Cr$ 3,00,<br />

Jesuíno Brilhante foi visto<br />

por mais de 50 mil especta<br />

dores, arrecadando um total<br />

de CrS 42 mil,<br />

— O público de minha ter<br />

ra entendeu a linguagem do<br />

filme, que é a linguagem do<br />

cordel. Era muitos momen<br />

tos, durante a filmagem, eu<br />

tive de repelir certas tenta<br />

ções quase irresistíveis para<br />

u m v e t e r a n o c i n e c l u b i s t a .<br />

T i n h a m e d o d e f a z e r u m fi l<br />

me fechado, parado; por isso,<br />

acabei apelando para uma<br />

e s t r u t u r a , u m r i t m o d e w e s<br />

tern.<br />

O criador do papel de Je<br />

suíno é um jovem ator que<br />

Juca levou do Rio de Janeiro,<br />

Néri Vítor.<br />

— A primeira coisa que<br />

ele fez, lá no sertão, foi pas<br />

sar uma semana vivendo,<br />

conversando, montando e co<br />

mendo cora os vaqueiros.<br />

Quando Néri partiu para a<br />

primeira cena, parecia na<br />

realidade ura vaqueiro.<br />

Ao lado do próprio William<br />

— que agora também escre<br />

veu e dirigiu o filme — quem<br />

cuidou da produção foi sua<br />

esposa, Eliana, foimada a<br />

seu lado na escola da Taba<br />

jara. Ainda que em todo o<br />

fi l m e p r e d o m i n e m o s e l e<br />

mentos jovens, há no elenco<br />

a presença de veteranos co<br />

mo Rodolfo Arena, Vanja<br />

Orico, Valdir Onofre e Mil<br />

ton Vilar. A fotografia colo<br />

rida é de Carlos Tourinho,<br />

que antes só havia feito fil<br />

mes de curta metragem e um<br />

episódio de O Amor em Qua<br />

tro Tempos.<br />

— É um excelente cinegrafista.<br />

que jamais perdeu um<br />

plano, por mais movimenta<br />

do que fosse. Aliás jovens e<br />

v e t e r a n o s c o n s t i t u í r a m u m<br />

e q u i p e c o m a l m a , c o<br />

aquelas do velho cinema b<br />

sileiro.

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