O Hipnotismo - Psicologia, Técnica e Aplicação

rodrigo.vieirati
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94 K A R L W E I S S M A N N — O H I P N O T I S M O atributos como autoridade, inteligência e simpatia, ainda que em moderada medida. Não se despreza por outro lado, a aparência física, a qual, fugindo do nível médio, pode militar a favor ou contra o candidato. Não façamos côro com aquêles que proclamam : “Nós somos os tais”. Não podemos, no entanto, deixar de incluir na qualificação do hipnotista, a exemplo do que se faz na qualificação de qualquer outra categoria profissional, uns tantos fatôres que, em dadas proporções, tornam umas tantas pessoas mais aptas do que outras, considerando-se ainda que o hipnotismo, além de ciência é também uma arte. Um dos paralelos que se adequam no caso seria o do canto. Excetuando os poucos mudos, todos podem educar a voz à sua maneira. Contudo sempre haverá Carusos, ainda que os carusos não sejam tão raros quanto os bons ou mesmo os ótimos hipnotizadores. Na mesma base serveria o paralelo entre os grandes hipnotistas e os grandes intérpretes musicais. O bom hipnotista é ainda corretamente comparado ao bom vendedor, ao corretor de imóveis e ao agente de seguros, vitoriosos em sua carreira. A habilidade de tais profissionais consiste notoriamente em chamar a atenção para os seus produtos e torná-los particularmente atraentes aos olhos dos candidatos à sua aquisição. Para tanto êles têm de ter aprimorado o dom da persuasão. Têm de convencer. A persuasão direta ou indireta, franca ou oculta, representa o c o n d i t i o n s i n e q u a n o n , não apenas do hipnotista, mas de tôda pessoa que deseja triunfar em qualquer atividade material ou espiritual. Conquanto o processo hipnótico se inicie pelo desvio da atenção e pelo subsequente estado de expectativa, o paralelo mais cabível seria o do indivíduo, que, numa reunião, sem nenhum motivo especial, consegue polarizar a atenção de tôdas ou de quase tôdas as pessoas presentes. A crença popular segundo a qual o hipnotizador domina pelos olhos, faz com que até hoje a quase totalidade das pessoas o imaginem dotado de olhos vivos, penetrantes, empregados calculadamente para inspirar terror. Sabemos que na realidade não é preciso que o hipnotista tenha olhos especiais, o que não obsta que êle se beneficie com tais característicos oculares, embora apenas imaginados pelos pacientes. O fato de usar óculos (não excessivamente graduados ou escuros) não neutraliza necessàriamente êsse atributo real ou imaginário. Por outro lado, são perfeitamente dispensáveis os clássicos exercícios para aumentar ou desenvolver a fôrça ou a fixidez do olhar. Um fator mais decisivo e que comporta algum treino, é a voz. Esta constitui notòriamente o tal estímulo sensorial, monótono e suave que induz à hipnose pela inibição cortical. É a água mole em pedra dura… A voz deve ser preferentemente grave, não necessàriamente cava, observando sempre uma cadência rítmica, ou seja, repetitiva. Um traço de caráter indispensável ao exercício proficiente da hipnose é um certo grau de autoridade. Com tudo isso, o hipnotizador não precisa de ser uma personalidade tirânica, provocativa ou desafiante. Êle pode ser suave, mas convincente. O hipnotista não pode demonstrar timidez ou falta de auto-confiança. Tive ensejo de corrigir mais de um aluno, que, convidado para fazer uma demonstração prática deante dos colegas, iniciou assim : “A convite do professor vou arriscar, mas com a condição de vocês não rirem de mim…” Excusado será dizer que, nesses casos, a experiência sempre resultou em fracasso. Os gestos e as palavras do hipnotizador, conquanto não necessitem de gelar o paciente de terror, devem refletir um alto grau de autoridade e confiança. Devem merecer a devida atenção, suscitar obediência, expectativa e a firme convicção do “sujet” quanto à autenticidade, para não dizermos de uma vez, à infalibilidade da experiência que se lhe propõe.

K A R L W E I S S M A N N — O H I P N O T I S M O 95 O hipnotista não pode dar a impressão de aprendiz. Deve dar, isso, sim, a impressão de um Mestre consumado, ainda que não o seja. É notório que as pessoas que nos conheceram antes de nossa habilitação hipnótica são sempre mais difíceis de hipnotizar do que as outras. Os meus alunos lutam com maior dificuldade na indução de pacientes durante a aula, na minha presença, do que em seu próprio âmbito social e profissional. Nêste ponto relembro o conditio sine qua non do hipnotista : o prestígio. Se é preciso ter prestígio em pràticamente tôdas as atividades sociais, no exercício hipnótico êsse fator é duplamente necessário. Se as pessoas de grande prestígio e vitoriosas em outras carreiras se dedicassem ao hipnotismo, muitíssimos seriam os grandes hipnotizadores. Daí levarem vantagem certas categorias profissionais, já tradicionalmente prestigiadas, tais como tribunos, magistrados, médicos, professôres publicistas, etc. Elementos ao mesmo tempo admirados e temidos. Indivíduos capazes de fazerem o bem (premiar) e também o mal (castigar). De um modo geral o hipnotista tem de ser um doublee de Mestre e Amigo, incluindo ainda as virtudes do médico, sobretudo as do psicoterapêutica. Isso quando não se lhe exigem as qualidades “sobrenaturais” do taumaturgo 110 . Há uma tendência de atribuir ao hipnotizador o poder de realizar curas milagrosas. Essa tendência supersticiosa em ralação à hipnose tem valido a fanáticos ignorantes, charlatães deshonestos e a oportunistas. Não podemos deixar de incluir nas categorias profissionais, particularmente favorecidas no exercício hipnótico, a classe sacerdotal. A notória participação do clero na prática e na difusão do hipnotismo, dêsde os primórdios desta ciência, explica-se psicològicamente à base da afinidade existente entre o poder hipnótico e o poder sacerdotal, poder êsse, baseado na fé, no respeito e na reverência de uma entidade superior, de prestígio eminentemente espiritual. Com efeito, o bom hipnotizador, discretamente solene e ritualístico, sereno e confidente, de certo modo, tem de reunir as virtudes do padre, aos do médico, do mestre e do amigo. Pelos requisitos que acabamos de enumerar o hipnotizador maduro terá maiores chances do que o seu colega jovem. É notória a ação sugestiva dos cabelos brancos ou pelo menos grisalhos. A todos nós, indistintamente inspiram respeito e uma certa submissão, além de sugerirem experiência e sabedoria superiores. Isso, porém, não exclui os moços de possibilidade de exito, desde que não lhes falte a habilidade necessária, nem o fator crédito, confiança e prestígio. Uma menina de oito anos, que assistiu a algumas das minhas demonstrações pela televisão, conseguiu induzir ao transe quase tôda a sua família, inclusive os avós. A menina desfrutava no seio da sua família de um prestígio descomunal. O fenômeno da hipnose se explica, de um modo geral, como “o milagre da presença” na forma de um ente prestigiado. Na qualificação do hipnotista temos de incluir a disposição do indivíduo em face de auto-crítica : um auto-exame dos desejos e possíveis motivações inconscientes que o levam à prática do hipnotismo, incluindo uma apreciação crítica e analítica das suas ambições e frustrações. Dentre as pessoas que se sentem particularmente fascinadas pela aquisição do poder hipnótico, encontramos frequentemente elementos anormais, sendo comuns os paranóicos delirantes. A prática do hipnotismo envolve, psicològicamente falando, em grau mais ou menos comprometedor, a maioria dos seus estudiosos e praticantes. Muitos ainda insistirão em que o hipnotizador, culto ou ignorante, artista ou cientista, deva possuir um dom especial, ou aquilo que popularmente se costuma designar 110 Que ou aquele que faz milagres.

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Não façamos côro com aquêles que proclamam : “Nós somos os tais”. Não<br />

podemos, no entanto, deixar de incluir na qualificação do hipnotista, a exemplo do que se<br />

faz na qualificação de qualquer outra categoria profissional, uns tantos fatôres que, em<br />

dadas proporções, tornam umas tantas pessoas mais aptas do que outras, considerando-se<br />

ainda que o hipnotismo, além de ciência é também uma arte. Um dos paralelos que se<br />

adequam no caso seria o do canto. Excetuando os poucos mudos, todos podem educar a voz<br />

à sua maneira. Contudo sempre haverá Carusos, ainda que os carusos não sejam tão raros<br />

quanto os bons ou mesmo os ótimos hipnotizadores. Na mesma base serveria o paralelo<br />

entre os grandes hipnotistas e os grandes intérpretes musicais. O bom hipnotista é ainda<br />

corretamente comparado ao bom vendedor, ao corretor de imóveis e ao agente de seguros,<br />

vitoriosos em sua carreira. A habilidade de tais profissionais consiste notoriamente em<br />

chamar a atenção para os seus produtos e torná-los particularmente atraentes aos olhos dos<br />

candidatos à sua aquisição. Para tanto êles têm de ter aprimorado o dom da persuasão. Têm<br />

de convencer. A persuasão direta ou indireta, franca ou oculta, representa o<br />

c o n d i t i o n s i n e q u a n o n , não apenas do hipnotista, mas de tôda pessoa<br />

que deseja triunfar em qualquer atividade material ou espiritual.<br />

Conquanto o processo hipnótico se inicie pelo desvio da atenção e pelo subsequente<br />

estado de expectativa, o paralelo mais cabível seria o do indivíduo, que, numa reunião, sem<br />

nenhum motivo especial, consegue polarizar a atenção de tôdas ou de quase tôdas as<br />

pessoas presentes.<br />

A crença popular segundo a qual o hipnotizador domina pelos olhos, faz com que<br />

até hoje a quase totalidade das pessoas o imaginem dotado de olhos vivos, penetrantes,<br />

empregados calculadamente para inspirar terror. Sabemos que na realidade não é preciso<br />

que o hipnotista tenha olhos especiais, o que não obsta que êle se beneficie com tais<br />

característicos oculares, embora apenas imaginados pelos pacientes. O fato de usar óculos<br />

(não excessivamente graduados ou escuros) não neutraliza necessàriamente êsse atributo<br />

real ou imaginário. Por outro lado, são perfeitamente dispensáveis os clássicos exercícios<br />

para aumentar ou desenvolver a fôrça ou a fixidez do olhar.<br />

Um fator mais decisivo e que comporta algum treino, é a voz. Esta constitui<br />

notòriamente o tal estímulo sensorial, monótono e suave que induz à hipnose pela inibição<br />

cortical. É a água mole em pedra dura… A voz deve ser preferentemente grave, não<br />

necessàriamente cava, observando sempre uma cadência rítmica, ou seja, repetitiva.<br />

Um traço de caráter indispensável ao exercício proficiente da hipnose é um certo<br />

grau de autoridade. Com tudo isso, o hipnotizador não precisa de ser uma personalidade<br />

tirânica, provocativa ou desafiante. Êle pode ser suave, mas convincente. O hipnotista não<br />

pode demonstrar timidez ou falta de auto-confiança. Tive ensejo de corrigir mais de um<br />

aluno, que, convidado para fazer uma demonstração prática deante dos colegas, iniciou<br />

assim : “A convite do professor vou arriscar, mas com a condição de vocês não rirem de<br />

mim…” Excusado será dizer que, nesses casos, a experiência sempre resultou em fracasso.<br />

Os gestos e as palavras do hipnotizador, conquanto não necessitem de gelar o<br />

paciente de terror, devem refletir um alto grau de autoridade e confiança. Devem merecer a<br />

devida atenção, suscitar obediência, expectativa e a firme convicção do “sujet” quanto à<br />

autenticidade, para não dizermos de uma vez, à infalibilidade da experiência que se lhe<br />

propõe.

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