44 K A R L W E I S S M A N N — O H I P N O T I S M O As duas últimas componentes desta fórmula valem, na realidade, por uma só. Quanto à atenção desviada, que é fundamental, corresponde à atenção concentrada ou à super-concentração das escolas antigas. A HIPNOSE, UM ESTADO DE INTENSA CONCENTRAÇÃO A hipnose resulta, antes de mais nada, de um estado de intensa concentração. Isso explica as façanhas de que é capaz o indivíduo hipnotizado, quer na dramatização das situações sugeridas, quer nas modificações psico-somáticas que se produzem passageiramente na estrutura de sua personalidade. Neste estado de super-concentração diluem-se, ao menos em parte, as fronteiras da personalidade consciente. As divisas do Ego se apagam. Daí os pensamentos e os sentimentos sugeridos pelo hipnotizador afigurarem-se ao “sujet” como se fossem seus próprios pensamentos e sentimentos, a ponto de não poder discriminar o material auto-psíquico do hetero-psíquico. Há autores que se recusam a ver semelhante fenômeno ùnicamente o poder da sugestão, alegando que esse é apenas um componente da indução hipnótica, nada tendo a ver com o estado de hipnose pròpriamente dito. Tudo parece indicar, entretanto, que não existe essa diferença substancial entre essas duas fases, ou seja, entre a indução e o estado hipnótico consumado. É mais uma vez uma diferença de grau e não de natureza. Sendo a atenção desviada ou super-concentrada, um fenômeno psicológico corrente ocorre com todas suas concomitantes psicosomáticas correspondentes, também fora das sessões de hipnotismo, notadamente na paixão amorosa e no susto. Vejamos : O indivíduo apaixonado encontra-se “en rapport” em relação ao objeto de sua paixão. Torna-se insensível às excelências alheias ao seu próprio romance. Superconcentrado, o que equivale a dizer, com a atenção desviada da realidade ambiente, só ouve, só vê, só obedece àquela determinada pessoa. E tal como o “sujet” em transe, perde a auto-crítica. Confunde a vontade alheia com a sua própria vontade, as virtudes alheias com as suas próprias virtudes. Enquanto ama, vive em regime alucinatório. E se o amor não resiste a certos abusos e choques, também o encanto da hipnose se quebra, conforme as objeções que o paciente formula ao hipnotista. Por sua vez, a pessoa operada sob hipnose, que, em virtude de sua atenção desviada pelo hipnotizador ou do estado de super-concentração em que se encontra, se “esquece” de sentir a dor, assemelha-se ao indivíduo que sòmente descobre que perdeu a perna, num desastre de automóvel, momentos depois da amputação. Enquadra-se na mesma categoria de reações psicológicas o caso do herói da anedota a quem se gritou : “Manuel, a sua mulher acaba de ser atropelada em Niterói!” Só depois de chegar extenuado no local mencionado, e sòmente depois de ter obedecido à ordem irrefletida e impulsivamente, o herói se capacitou de que, ele não se chamava Manuel, que não tinha mulher e que não residia na indicada localidade. Sob o efeito da distração, ou da atenção desviada, esquecera temporariamente das características fundamentais de sua própria identidade. Encontramos a todo passo paralelos curiosos e convincentes na vida cotidiana a reproduzir inadvertidamente os mais engenhosos expedientes psicológicos da hipnotização, mostrando destarte que a hipnose é efetivamente um estado psicológico, senão rigorosamente normal, ao menos bastante comum e que os mecanismos desse fenômeno
K A R L W E I S S M A N N — O H I P N O T I S M O 45 cabem, salvo graves heresias de resumo, dentro da fórmula que acabamos de expor.