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2<br />
SIMONE ELKELES<br />
How to Ruin a<br />
S<strong>um</strong>mer Vacation
3<br />
<strong>Como</strong> é que <strong>um</strong>a adolescente moderna termina em <strong>um</strong>a fazenda no<br />
meio de Israel, com seu pai quase desconhecido? Bem, nem vem ao caso<br />
descrevê-lo.<br />
Moshav? O que é <strong>um</strong> Moshav? Será que é shopping em hebreu?<br />
Quero dizer, pelo que Jéssica me disse, as lojas de Israel têm as melhores<br />
roupas da Europa. Esse vestido preto que tem é realmente lindo. Sei que<br />
seria terrível sair para comprar com o doador de esperma, mas continuo<br />
pensando em todas as roupas incríveis que podia trazer quando voltasse.<br />
Infelizmente para Amy Nelson de 16 anos, Moshav está longe de<br />
ser <strong>um</strong> shopping. Pense em cabras, não em Gucci. Ir a Israel com seu pai<br />
quase desconhecido é a última coisa que Amy quer fazer neste verão. Amy<br />
tem <strong>um</strong> grande rancor de seu pai a quem chama de “Doador de Esperma”<br />
por quase não estar presente na sua vida. E que agora a está arrastando a<br />
<strong>um</strong>a zona de guerra para que conheça <strong>um</strong>a família que nem sabia que tinha,<br />
onde provavelmente será alistada no exército. Finalmente será presa em<br />
<strong>um</strong>a casa sem ar condicionado e com apenas <strong>um</strong> banheiro para sete pessoas,<br />
sem melhor amiga, sem namorado, sem shopping, sem telefone celular...<br />
Adeus orgulho, olá Israel.
4<br />
Capítulo 1<br />
Em questões de segundos os pais podem mudar o curso da<br />
sua vida.<br />
<strong>Como</strong> <strong>um</strong>a garota de 16 anos relativamente inteligente é presa em<br />
<strong>um</strong>a situação da qual não pode sair? Bem, penso nisso enquanto estou<br />
sentada no aeroporto internacional O’Hare em Chicago na tarde de <strong>um</strong>a<br />
segunda-feira, durante <strong>um</strong>a hora e quarenta e cinco minutos de atraso,<br />
pensando nas últimas 24 horas da minha nova “ferrada” vida. Estava sentada<br />
no meu quarto ontem, quando meu pai biológico, Ron, ligou.<br />
Não, você não entende... Ron nunca liga. Bem, a não ser que seja meu<br />
aniversário, e isso foi há oito meses. Veja, depois de sua aventura na<br />
universidade, minha mãe descobriu que estava grávida. Ela vinha de <strong>um</strong>a<br />
família com dinheiro, e Ron.. Bom, ele não. Com seus pais pressionando-a,<br />
minha mãe disse a Ron que seria melhor se não tivesse <strong>um</strong> papel importante<br />
nas nossas vidas. Pessoal, estavam errados. Mas o pior é que ele desistiu,<br />
sem sequer tentar.<br />
Eu sei que ele coloca dinheiro n<strong>um</strong>a conta para mim. Ele também<br />
vem pra me levar para jantar no meu aniversário. Mas e daí? Eu quero <strong>um</strong><br />
pai que está sempre lá pra mim.<br />
Ele cost<strong>um</strong>ava vir <strong>um</strong> pouco mais, mas finalmente lhe disse pra me<br />
deixar em paz, assim minha mãe poderia encontrar <strong>um</strong> verdadeiro pai. Não,<br />
sério, suponho que só estava apenas tentando testá-lo. Ele falhou<br />
miseravelmente.<br />
Bem, o cara ligou desta vez para dizer a minha mãe que quer me<br />
levar a Israel. Israel! Você sabe aquele pequeno país do Oriente Médio que
causa tanta controvérsia. Você não tem que assistir às notícias no TiVo 1 para<br />
saber que Israel é <strong>um</strong> foco de hostilidade internacional.<br />
Sei que estou me distraindo, assim, vamos voltar ao que sucedeu.<br />
Minha mãe me deu o telefone sem ao menos dizer “é seu pai” ou “é o tipo<br />
com quem tive <strong>um</strong>a aventura de <strong>um</strong>a noite, mas não me casei”, para me<br />
advertir que era ele.<br />
— Olá , Amy. É Ron.<br />
— Quem? — pergunto.<br />
Não tento ser <strong>um</strong>a sabe-tudo, simplesmente não registro que o cara<br />
que me deu 50% dos meus genes está ligando.<br />
— Ron... Ron Barak — diz <strong>um</strong> pouco mais forte e mais lento, como se<br />
eu fosse <strong>um</strong>a completa imbecil.<br />
Congelo e acabo dizendo nada. Acredite ou não, às vezes dizer nada<br />
realmente funciona a meu favor. Aprendi com o decorrer dos anos. Isso<br />
normalmente deixa as pessoas nervosas, mas antes elas do que eu. Bufo com<br />
força para que saiba que ainda estou na linha.<br />
— Amy?<br />
— Sim?<br />
— H<strong>um</strong>, só queria que soubesse que sua avó está doente — diz com<br />
seu sotaque israelense.<br />
Uma imagem anônima de <strong>um</strong>a pequena mulher de cabelos brancos<br />
que cheira a talco de bebê e mofo, e qual objetivo na vida é assar biscoitos<br />
com lascas de chocolate, passa brevemente pela minha mente.<br />
5<br />
1<br />
Aparelho de vídeo que permite aos usuários capturar a programação televisiva para<br />
armazenamento em disco rígido.
— Não sabia que tinha <strong>um</strong>a avó — digo, acentuando o “ó” porque<br />
Ron, como todos os outros israelenses que conheci, não podem dizer “ó”<br />
porque esse som agudo não está na sua língua.<br />
A minha avó materna morreu pouco depois que eu nasci, assim que<br />
fui <strong>um</strong>a dessas garotas sem avó. Uma pontada de dor e pena de nunca saber<br />
que tinha <strong>um</strong>a avó e agora saber que está “doente” fez-me sentir doente.<br />
Porém empurro esses sentimentos na parte de trás da minha mente, onde<br />
estão seguros.<br />
Ron pigarreia.<br />
— Ela vive em Israel. Estou indo para lá pra passar o verão. Gostaria<br />
que fosse comigo.<br />
Israel?<br />
— Não sou judia — deixo escapar.<br />
6<br />
diga.<br />
Um pequeno som, como <strong>um</strong> de dor, escapa da sua boca antes que<br />
— Não tem que ser judia para ir à Israel, Amy.<br />
Não é preciso ser <strong>um</strong> gênio pra saber que Israel está no meio de <strong>um</strong>a<br />
zona de guerra. Uma zona de guerra!<br />
— Agradeço a oferta, mas vou para o acampamento de tênis este<br />
verão. Diga à avó que espero que melhore de sua doença. Adeus — digo e<br />
desligo.<br />
Quando faço isso, menos de quatro segundos se passam e o telefone<br />
toca de novo. Sei que é Ron. Um pouco irônico, quando ele liga duas vezes<br />
por ano e aqui está ligando duas vezes em questão de segundos.<br />
Minha mãe atende ao telefone na sala de estar. Trato de escutar<br />
através da porta do meu quarto. Não posso escutar muito. Só sussurros,<br />
sussurros, sussurros. Depois de cerca de quarenta minutos, ela bate na<br />
minha porta e me diz para fazer as malas para ir à Israel.
7<br />
— Está brincando, não é?<br />
— Amy, não pode evitá-lo pra sempre. Não é justo.<br />
Não é justo? Cruzo os braços na frente do meu peito.<br />
— Desculpe, o que não é justo é vocês dois nem tentarem viver como<br />
pais. Não fale sobre justiça.<br />
Eu sei que tenho dezesseis anos e deveria ter superado isso, mas não.<br />
Nunca disse que era perfeita.<br />
— A vida não é simples, saberá quando for mais velha — disse —<br />
Todos cometemos erros no passado, mas é tempo de repará-los. Você irá.<br />
Está resolvido.<br />
O pânico começa a me dominar e decido tomar o caminho pelo<br />
sentimento da culpa.<br />
— Vão me matar. A não ser que isso não seja a última coisa que<br />
queira.<br />
— Amy, pare o drama. Ele me prometeu que te manterá segura. Será<br />
<strong>um</strong>a grande experiência.<br />
Trato de falar por mais duas horas pra sair disso, realmente tento.<br />
Deveria saber que tentar arg<strong>um</strong>entar com minha mãe não ganharia nada,<br />
tirando <strong>um</strong>a dor de garganta.<br />
Decido ligar pra minha melhor amiga, Jessica. Procurando apoio e<br />
compreensão de Jessica.<br />
— Hey Amy, o que aconteceu? — responde <strong>um</strong>a voz alegre do outro<br />
lado da linha. Você tem que amar o identificar de chamadas.<br />
— Meus pais decidiram <strong>arruinar</strong> minha vida — digo.<br />
— O que quer dizer com seus pais? Ron ligou?
— Oh, sim, ele ligou. E de alg<strong>um</strong>a maneira convenceu minha mãe a<br />
cancelar meus planos de verão para poder me levar pra Israel. Posso<br />
morrer?<br />
8<br />
mim.<br />
— Hm, realmente não quer escutar minha opinião, Amy. Confia em<br />
Franzo minhas sobrancelhas enquanto lentamente começo a<br />
entender Jessica, minha mais querida amiga no mundo, não vai me apoiar<br />
110%.<br />
— É <strong>um</strong>a zona de guerra! — digo lentamente para que ela receba o<br />
impacto.<br />
É <strong>um</strong>a risada que escuto do outro lado da linha?<br />
— Está brincando? — Jessica diz — Inferno, minha mãe vai à Tel<br />
Aviv 2 todo ano para fazer compras. Disse que eles têm os diamantes mais<br />
caros que alg<strong>um</strong>a vez já cortaram. Sabe aquele vestido preto que amo? Ela<br />
comprou pra mim lá. Eles têm os melhores estilos europeus e...<br />
— Necessito ajuda aqui, Jess, não dou a mínima para os diamantes e<br />
as roupas — digo, cortando seu discurso de “Israel é tudo”. Deus!<br />
— Sinto muito. Têm razão — diz.<br />
— Nunca vê as notícias?<br />
— Claro que Israel tem seus problemas. Mas meus pais dizem que<br />
muito do que vemos na TV é propaganda. Simplesmente não vá a <strong>um</strong> ponto<br />
de ônibus e lojas de café. Ron te manterá salva.<br />
— Ah! — digo.<br />
— Está brava comigo? — pergunta Jess. — Podia mentir e dizer que<br />
sua vida está arruinada definitivamente. Isso faria se sentir melhor?<br />
Jessica é a única pessoa que pode tirar sarro de mim e sair intacta.<br />
2 Cidade de Israel.
— Você apenas riu por <strong>um</strong> instante, Jess. Sabe que nunca poderia<br />
ficar brava com você, é minha melhor amiga.<br />
O que dizer da nossa relação de amizade, quando minha melhor<br />
amiga não tem problema em me enviar para <strong>um</strong>a zona de guerra?<br />
E, menos de vinte e quatro horas depois, estou sentada no aeroporto<br />
esperando nosso vôo da El Al Israel Airlines iniciar o embarque.<br />
Olho meu pai biológico, o homem quase inexistente na minha vida,<br />
que está lendo o jornal. Ele tentou falar comigo no caminho até o aeroporto.<br />
Eu o cortei, colocando meus fones e escutando meu iPod.<br />
<strong>Como</strong> se sentisse que estou olhando-o, ele abaixa o jornal e olha para<br />
mim. Seu cabelo é curto. É espesso e escuro, como o meu. Sei que se fosse<br />
maior seria encaracolado, também. Tão difícil como é, desembaraçar meus<br />
cabelos todas as manhãs. Não gosto do meu cabelo.<br />
Os olhos da minha mãe são verdes, os meus são azuis. As pessoas<br />
dizem que meus olhos são de <strong>um</strong> resplendor azul brilhante. Considero que<br />
meus olhos são o meu melhor recurso. Infelizmente, o mais importante que<br />
herdei da minha mãe foram peitos grandes. Além de mudar meu cabelo,<br />
gostaria de ter peitos menores. Quando jogo tênis, eles ficam no caminho.<br />
Alg<strong>um</strong>a vez já tentou <strong>um</strong> revés a dois 3 com peitos grandes? Eles seriamente<br />
deveriam ter vantagens no tênis para pessoas com peitos grandes.<br />
Quando for mais velha talvez consiga <strong>um</strong>a redução. Jessica me disse<br />
<strong>um</strong>a vez que durante <strong>um</strong>a redução de mama, o médico corta e retira toda a<br />
auréola.. Você sabe, essa parte rosada no meio do seio, e então, depois de<br />
tirarem todo o excesso, eles a colocam de volta no lugar. Não creio que goste<br />
de minhas partes rosadas separadas do restante.<br />
Enquanto penso em auréolas separadas, me dou conta que Ron ainda<br />
me olha. Olhando para a expressão do seu rosto provavelmente pensa que<br />
estou chateada com ele. Provavelmente não posso explicar que estou<br />
pensando em partes rosadas separadas.<br />
9<br />
3 Passe de jogo de tênis. É quando, por exemplo, <strong>um</strong> jogador segurando a raquete com a mão direita tem<br />
que rebater <strong>um</strong>a bola ao seu lado esquerdo, tendo que posicionar a raquete em frente ao peito.
De toda forma, ainda estou brava com ele por me trazer para esta<br />
viagem estúpida em primeiro lugar. Graças a ele, tive que abandonar o<br />
acampamento de tênis neste verão. O que significa que possivelmente não<br />
estarei na equipe do colégio quando as audições começarem em outubro.<br />
Totalmente quero participar da equipe do colégio.<br />
Para piorar a situação, Mitch, meu namorado, nem sequer sabe que<br />
fui embora. Ele foi acampar com seu pai por alg<strong>um</strong>as semanas em <strong>um</strong>as<br />
férias “livres de celulares”. Todavia, ainda é <strong>um</strong> relacionamento novo. Se não<br />
estivermos juntos o resto do verão, ele poderá encontrar alguém que esteja<br />
lá para ele.<br />
Não sei por qual razão Ron quer que eu vá com ele. Eu nem gosto<br />
dele. Provavelmente minha mãe me queria fora de casa para que ela pudesse<br />
ter privacidade com seu último homem. Seu atual namorado, Marc com “c”,<br />
acredita que é o único. <strong>Como</strong> se fosse. Não se dá conta de que <strong>um</strong>a vez que<br />
ela encontrar alguém maior, ou melhor, ele estará fora do jogo?<br />
— Vou ao banheiro — digo a Ron.<br />
Realmente não tenho que ir, mas pego minha bolsa e caminho pelo<br />
corredor. Quando saio da visão de Ron, pego meu telefone celular e continuo<br />
andando. Mamãe me deu <strong>um</strong> telefone “só para emergências.”<br />
Definitivamente sinto <strong>um</strong>a emergência chegando.<br />
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11<br />
Capítulo 2<br />
Ficar dentro de <strong>um</strong> avião durante doze horas deveria ser<br />
proibido.<br />
Caminho pelo corredor e ligo para Jessica.<br />
— Por favor, você tem que estar em casa. — Rezo enquanto vejo<br />
através das janelas aviões parados no estacionamento. Normalmente não<br />
rezo, não está na minha natureza. Porém tempos desesperados pedem<br />
medidas desesperadas e eu sou flexível. Bem, às vezes.<br />
— Amy?<br />
Sinto-me melhor ao escutar sua voz.<br />
— Sim, sou eu. Meu vôo está atrasado.<br />
— Diga-me, você ainda está louca?<br />
— Sim. Diga-me outra vez, porque eu não deveria estar preocupada?<br />
— Amy, não vai ser tão ruim. Se houver algo que eu possa fazer...<br />
É a hora de dizer a Jess meu plano. Acabo de pensar nisso.<br />
— Tem <strong>um</strong>a coisa...<br />
— O que é?<br />
— Venha até o aeroporto. No Terminal Internacional. Eu estarei<br />
escondida ali, hm, vem ao Air Ibéria. Espere-me ali.<br />
— Então, o quê?
12<br />
— Depois de alg<strong>um</strong> jeito conseguirei ir ao acampamento de tênis e..<br />
Oh, não sei se Ron quer que eu seja <strong>um</strong>a filha perfeita, mas ele é o pai mais<br />
horrível que alg<strong>um</strong>a vez...<br />
O celular é arrancando da minha mão, cortando o discurso de “pai de<br />
merda”. O ladrão, é claro, não é outro a não ser o próprio pai de merda.<br />
— Hey, me devolva ele! – digo.<br />
— Olá. Quem é? – Ron grita no telefone como <strong>um</strong> comandante do<br />
exército com <strong>um</strong> impedimento de fala.<br />
Não posso ouvir Jessica. Espero que ela não fale para ele.<br />
— Jessica, ela te ligará quando puder — diz, e em seguida desliga o<br />
telefone.<br />
Nem sequer me deu a oportunidade de ligar pra Mitch para que<br />
saiba aonde fui no verão.<br />
— Por quê? Por que quer estragar meu verão me levando pra Israel?<br />
Ele guarda o telefone no bolso de trás da sua calça.<br />
— Porque quero que conheça sua avó antes que seja tarde demais.<br />
Por isso.<br />
Assim, isso não tem nada a ver com Ron querer me conhecer e<br />
passar alg<strong>um</strong> tempo comigo. Não, de agora em diante, quero que seja o pai<br />
que sempre deveria ter sido.<br />
Não deveria estar desapontada, mas estou.<br />
— Dirijam-se para o vôo 0<strong>01</strong> de El Al à Tel Aviv com escala em<br />
Newark. — Uma voz com sotaque israelense continua falando através do alto<br />
falante.
— Os passageiros das fileiras trinta e cinco e quarenta e cinco<br />
tenham seus cartões de embarque e passaportes para mostrar aos<br />
funcionários, por favor.<br />
— Te direi algo – diz Ron. — Devolverei o telefone se cooperar e<br />
entrar no avião. Pode tentar? — <strong>Como</strong> se tivesse outra opção.<br />
— Ok — digo e estendo minha mão. Pelo menos tenho minha<br />
pequena conexão com a sabedoria e a independência.<br />
Ele me entrega o telefone, e relutantemente, eu o sigo até o avião.<br />
Ron e eu somos resignados para a fila sessenta, a última fila. Tenho <strong>um</strong><br />
minuto de felicidade, porque ninguém sentará atrás de mim, assim posso<br />
descansar confortavelmente durante dozes horas até chegar a Tel Aviv. A<br />
menos, é claro, que <strong>um</strong>a bomba seja plantada no avião ou terroristas nos<br />
assaltem e nos matem antes que cheguemos à zona de guerra. Quando penso<br />
em terroristas no avião, olho pra Ron.<br />
— Ouvi falar que chefes da polícia aérea estão em todos os vôos da El<br />
Al — digo e empurro minha mala embaixo do banco a minha frente. — É<br />
verdade?<br />
Não lembro de alg<strong>um</strong>a vez ter começado <strong>um</strong>a conversa com Ron<br />
antes, e ele parece aturdido. Olha ao redor para ver se estou falando com<br />
outra pessoa antes de responder.<br />
— El Al sempre tem chefes de polícia aéreos.<br />
— Quantos? — Porque se houver apenas <strong>um</strong> chefe de polícia aéreo<br />
contra cinco terroristas, a polícia aérea estará perdida.<br />
— Muitos. Não se preocupe, a segurança da El Al é insuperável.<br />
— Uh huh — digo não muito convencida. Quando olho à minha<br />
esquerda, vejo <strong>um</strong> cara com <strong>um</strong>a sobrancelha levantada que parece muito<br />
suspeito. O Sr. Apenas-<strong>um</strong>a-sobrancelha sorri para mim.<br />
Seu sorriso desaparece quando percebe que Ron o está olhando.<br />
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Depois de tantos anos com Ron agindo como <strong>um</strong>a figura de “apenas<br />
aniversários”, sinto que não tem nenh<strong>um</strong> direito de dizer que é meu pai.<br />
Quando era pequena e vinha para me levar para a minha saída de<br />
aniversário anual, adorava o chão que ele pisava. Era como <strong>um</strong> super-herói<br />
que concedia cada <strong>um</strong> dos meus desejos e me tratava como <strong>um</strong>a “princesa<br />
por <strong>um</strong> dia”.<br />
Porém quando me dei conta que <strong>um</strong> pai na realidade deveria estar<br />
ali para você todos os dias, comecei a ressentir-me dele. No ano passado eu<br />
realmente explodi com ele. Fugi de casa, deixando <strong>um</strong> bilhete pra minha mãe<br />
avisando que tinha saído com amigos, e que voltaria à noite.<br />
Minha mãe não é fácil. Ela descarta homens por esporte. Mas o que<br />
eu sei de Ron, é que ele já foi <strong>um</strong>a vez comandante das Forças de Defesa<br />
Israelense. Um comandante que foi covarde demais para lutar pelo<br />
casamento com <strong>um</strong>a mulher que engravidou não vale muito no meu livro.<br />
Eu não vou ser como minha mãe quando for mais velha. Não serei<br />
como Ron tampouco.<br />
Pouco depois aterrissamos em Newark para pegar mais passageiros.<br />
Eu nunca havia comido sardinha, mas quando as pessoas começaram a<br />
ocupar cada espaço vazio do avião, os pequenos peixes asquerosos vieram à<br />
minha memória. Minha mente estava perturbada por ver quantas pessoas<br />
entravam no avião para voar pra <strong>um</strong> lugar que está na lista de alerta aos<br />
cidadãos americanos.<br />
Enquanto decolamos, empurro aquele pequeno botão para reclinar<br />
meu banco porque começo a ficar cansada. Percebo rapidamente que desde<br />
que estamos na última fileira, os bancos não se reclinam. Bem, agora isto não<br />
é engraçado. Este não é <strong>um</strong> vôo curto para Orlando. Este é <strong>um</strong> vôo de doze<br />
horas para <strong>um</strong> lugar que não quero ir, em primeiro lugar, para encontrar<br />
<strong>um</strong>a avó doente que eu nem sequer sabia de sua existência, em primeiro<br />
lugar. (Estes são dois pontos, eu sei, mas neste momento da minha vida, tudo<br />
o que me incomodava e estava em segundo lugar... especialmente agora,<br />
tomou o primeiro lugar.)<br />
Continuo tentando e forço o banco para reclinar-se pela quinta vez e<br />
a pessoa na minha frente se reclina totalmente, agora praticamente só tenho<br />
espaço para as minhas pernas, esse sentimento na boca do meu estômago<br />
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me fez querer chorar. Eu não posso fazer nada. Odeio este avião, odeio<br />
minha mãe por me obrigar a ter essa viagem estúpida, e odeio Ron por quase<br />
todo o resto.<br />
Depois de alg<strong>um</strong>as horas consigo me levantar para ir ao banheiro,<br />
esta vez de verdade. Infelizmente, pelo menos <strong>um</strong>a centena de pessoas já<br />
havia utilizado e o chão estava coberto de pedaços de papel higiênico. Além<br />
do mais o chão está cheio de pequenas gotas. Será urina ou água? Meus<br />
sapatos Dansko 4 não estão acost<strong>um</strong>ados a serem submetidos a tais abusos.<br />
Volto ao meu lugar e, para minha surpresa, sou capaz de pegar no<br />
sono mesmo que em posição vertical. O sonho é o momento de felicidade<br />
pura. O capitão apaga as luzes e logo fecho meus olhos.<br />
Alguém grita, e de repente sou acordada do país dos sonhos. Justo na<br />
minha frente, praticamente na minha cara, está <strong>um</strong> judeu hassídico 5 . Você<br />
sabe, <strong>um</strong> daqueles caras que vestem <strong>um</strong> chapéu preto e <strong>um</strong> casaco, cabelos<br />
longos, bigode e costeletas no rosto quase chegando ao pescoço. Jessica (ela<br />
é judia) me disse <strong>um</strong>a vez que são ultra, ultra religiosos e que tratam de<br />
seguir as seiscentas, ou algo assim, regras de Deus. Custa-me muito seguir as<br />
regras da minha mãe, pra não falar das seiscentas de Deus.<br />
Demoro <strong>um</strong> minuto para perceber que seus olhos estão fechados e<br />
que está orando. Porém ele não está orando no seu assento, está orando<br />
praticamente à direita do meu assento. Se balança, com os olhos fechados, e<br />
seu rosto está totalmente concentrado. Na verdade, quando meus olhos se<br />
ajustam à escuridão, me dou conta de que todos os judeus hassídicos<br />
reuniram-se na parte de trás do avião para orar.<br />
Percebo, porém, que as orações de todos soam mais como <strong>um</strong>a<br />
música mesclada com sussurros. Eles podem até não estar orando. Mas,<br />
então, <strong>um</strong> dos homens, que acredito ser o líder, diz alg<strong>um</strong>as palavras em voz<br />
alta e todos respondem e seguem fazendo sua canção entre dentes. Sim,<br />
estão orando.<br />
Será que todos têm que fazer ao mesmo tempo?<br />
15<br />
4 Marca de sapato.<br />
5 Membro do hassidismo, <strong>um</strong> movimento religioso ortodoxo e místico dentro do judaísmo.
E o que são essas listras ao redor de suas mãos e braços ou aquele<br />
quadro na frente?<br />
Agora que olho com mais atenção, admiro esses homens por serem<br />
tão dedicados a sua religião, orando ao invés de dormir. Não me entendam<br />
mal, os admiro, mas não faria isso.<br />
Olho Ron, dormindo profundamente. É <strong>um</strong> homem bonito, se você<br />
gosta do tipo escuro, <strong>um</strong> tipo mediano. Embora para mim não seja. Minha<br />
mãe é de pele clara com cabelos loiros e olhos verdes. Possivelmente estava<br />
na sua fase “oposta” quando ela e meu pai se conheceram naquela fatídica<br />
noite.<br />
Pergunto-me se Ron desejava que eu não nascesse. Se ele tivesse<br />
optado por ficar no dormitório do seu primo na Universidade de Illinois, ao<br />
invés de seguir minha mãe para sua casa de irmandade há dezessete anos<br />
atrás, então, não teria sido preso com <strong>um</strong>a garota que o incomodava.<br />
Seus olhos se abrem de repente e me recosto no meu banco, fingindo<br />
que estou tentando ver algo na televisão que está na minha frente sem os<br />
fones de ouvido nas orelhas. Tenho algo de bom pra dizer do avião de El Al<br />
Israel, eles têm telas de televisão integradas na parte de trás de cada<br />
assento. Um milagre mesmo.<br />
— Penso que gostará – diz Ron. — Mesmo que eu tenha vivido nos<br />
Estados Unidos durante dezessete anos, Israel sempre será parte de mim.<br />
— E... — digo.<br />
— E sua avó vai querer ser parte de você também. Não a desaponte.<br />
Viro-me e lhe dou minha famosa encarada, a qual meu lábio superior<br />
se torce na quantidade certa.<br />
— Deve estar brincando. Não desapontá-la. Eu não sabia que ela<br />
existia até antes de ontem. E se eu me decepcionar? Se você não se esqueceu,<br />
ela não foi <strong>um</strong>a avó amorosa.<br />
Acredite, conheço pessoas que tem avós carinhosas. A avó de Jessica,<br />
Pearl, gastou quatro anos tecendo <strong>um</strong>a manta. Quatro anos! E logo depois<br />
começou a sofrer de artrite.<br />
16
Eu me pergunto o que a avó Pearl pensaria se soubesse que Jessica<br />
perdeu sua virgindade com Michael Greenberg sob a manta que ela gastou<br />
trabalhando quatro anos com os dedos tortos.<br />
Ron suspira e volta à atenção a pequena tela de televisão pessoal.<br />
Noto que não está usando os fones, também. Encosto-me. Há <strong>um</strong> largo<br />
silêncio, acho que se eu olhar o encontrarei dormindo novamente.<br />
17<br />
frente.<br />
— <strong>Como</strong> a chamo? — pergunto, sem deixar de olhar a tela na minha<br />
— Ela gostará que a chame de Safta. Significa avó em hebraico.<br />
— Safta — digo a mim mesma em voz baixa, vendo com o som da<br />
palavra sai da minha boca. Olhando para o doador de esperma, me dou conta<br />
que está assentindo com a cabeça. Levanta seu queixo e me dá <strong>um</strong> pequeno<br />
sorriso, como se estivesse orgulhoso. Ugh!<br />
Olhando para frente, coloco minha televisão pessoal no canal que<br />
mostra quanto tempo falta para chegar a Israel. Quatro horas e cinqüenta e<br />
cinco minutos.<br />
Neste momento os judeus hassídicos já voltaram aos seus lugares.<br />
Fecho novamente meus olhos, agradecendo que foram dormir. Antes que eu<br />
perceba, a aeromoça diz algo em hebraico. Espero que a informação se<br />
repita em inglês.<br />
— Daqui a pouco estaremos aterrissando em Tel Aviv, por favor,<br />
coloquem seus bancos em posição vertical.<br />
Notícia de última hora, meu assento já tem estado em posição<br />
vertical todo o vôo de doze horas!
18<br />
Capítulo 3<br />
Não sou grosseira, apenas sou <strong>um</strong>a<br />
adolescente com atitude.<br />
A oficial de Imigração do aeroporto Bem Gurion em Tel Aviv<br />
pergunta a Ron (que tem dupla nacionalidade: israelense e americana) quem<br />
sou.<br />
— Minha filha — diz.<br />
— Está registrada como cidadã israelense? — pergunta.<br />
A mulher está brincando? Eu? Uma cidadã israelense? Embora<br />
quando olhe para o rosto sério da oficial de Imigração, entre em pânico. Já<br />
ouvi falar de casos de garotos americanos que são pegos nos países do<br />
Oriente Médio e que não são permitidos voltarem. Não quero ser israelense.<br />
Quero ir para casa, agora mesmo!<br />
Dou a volta, andando em direção ao avião. Esperando que o capitão<br />
me permita voltar... Irei dentro do avião, dentro de <strong>um</strong>a mala, dentro de <strong>um</strong>a<br />
maldita mala que carrega animais. Só me tire daqui!<br />
Quase estou na porta. A liberdade está na minha frente quando sinto<br />
<strong>um</strong>a mão em meu ombro.<br />
mim.<br />
— Amy — diz o familiar tom melancólico da voz de Ron atrás de<br />
Viro e o enfrento.<br />
— Não vão me deixar voltar pra casa, certo? Você me sequestrou pra<br />
este país que quer que eu seja <strong>um</strong>a cidadã. Oh, Deus. Eles fazem com que
todos, inclusive garotas, sejam mandadas para o exército com dezoito anos,<br />
certo? Escutei isso, não tente me enganar.<br />
Sei que estou soando como <strong>um</strong>a louca de dezesseis anos agora<br />
mesmo, minha voz está <strong>um</strong> oitava mais alta que o normal. Não posso evitar e<br />
continuo falando.<br />
— Vai me fazer ficar aqui e serei recrutada no exército, não?<br />
Eu posso vê-los trocando as minhas Abercrombie & Fitch 6 por<br />
uniformes. Meu coração está batendo rápido e pequenas gotas de suor<br />
começam a escorrer pelo meu rosto. Juro que não são lágrimas e sim gotas<br />
de suor.<br />
— Ron, para ser honesta, nem tenho certeza que seja sua filha.<br />
Alg<strong>um</strong>a vez fez <strong>um</strong> teste de paternidade? Porque vi <strong>um</strong>a foto de <strong>um</strong> cara com<br />
quem minha mãe saiu na Universidade, que era quase igual a mim.<br />
Ron mira o teto e solta <strong>um</strong> suspiro. Quando volta a me olhar, seus<br />
olhos marrons estão mais escuros que o normal. Sua mandíbula se aperta<br />
com firmeza.<br />
— Não se preocupe Amy. Está fazendo <strong>um</strong>a cena.<br />
— Amigo — digo duro, tentando controlar minha voz. Agora sou<br />
como Angelina Jolie, na parte do filme onde ela chuta a bunda de todo<br />
mundo que cruza com ela. — Nem sequer comecei a fazer <strong>um</strong>a cena.<br />
Um soldado com <strong>um</strong>a metralhadora muito, muito grande caminha<br />
entre as pessoas. Tem a cabeça quase raspada e posso dizer somente o<br />
olhando que tem <strong>um</strong> dedo no gatilho. Fantástico, minha vida está acabada,<br />
vou ser presa n<strong>um</strong> país de terceiro mundo pelo resto dos meus dias... que<br />
provavelmente estão contando desde agora.<br />
— Mah carrah? — fala o soldado a Ron em hebraico. Soa mais como,<br />
“Macarena” ou “Mata a Amy?” para mim.<br />
— há’kok b’ seder — responde Ron.<br />
19<br />
6 Marca de roupas.
20<br />
Nunca pensei que lamentaria não saber hebraico. No colégio, peguei<br />
espanhol.<br />
Meu coração, no entanto está batendo acelerado quando pergunto:<br />
— O que está dizendo? O que está acontecendo? — Tenho medo da<br />
resposta, mas trato de ser valente para poder dizer aos Agentes do Serviço<br />
Secreto toda a informação que obtiver antes de escapar. O Governo<br />
Americano vai querer saber o que está acontecendo aqui, estou segura disso.<br />
— Não é <strong>um</strong>a cidadã israelense — diz Ron. — E não será recrutada<br />
em nenh<strong>um</strong> exército.<br />
— Então, o que disse o soldado?<br />
— Perguntou-me o que está errado e lhe disse que tudo estava bem.<br />
Isso é tudo.<br />
História provável, acredito. Porém volto ao encontro da senhora da<br />
Imigração, sobretudo porque ele agarrou meu braço com força. Ele fala com<br />
a mulher em hebraico desta vez, provavelmente para assegurar que eu não<br />
entenda. Pelo que sabemos, está negociando <strong>um</strong> acordo para me vender<br />
para ser escrava infantil. Às vezes me considero bastante atualizada sobre os<br />
acontecimentos mundiais, na verdade nunca ouvi falar da escravidão infantil<br />
israelense.<br />
Pouco depois, a mulher pega meu passaporte (minha mãe havia<br />
conseguido com propósitos de emergência havia <strong>um</strong> ano e a tonta aqui,<br />
aceitou, pensando que ela estava secretamente planejando me levar à<br />
Jamaica ou às Bahamas) e nos dirigimos à área de bagagens. Só temos que<br />
caminhar doze passos antes de chegarmos lá.<br />
— Venha, irei conseguir <strong>um</strong> carro — ordena Ron.<br />
— Esperarei aqui — digo, por que quero que ele saiba que me recuso<br />
a seguir as ordens dele.<br />
Ele cruza seus braços sobre o peito.
— Amy, com o drama que acaba de fazer ali atrás não vou interpretar<br />
<strong>um</strong> pai que confia em você neste momento.<br />
Estou sem saída, mas não posso resistir.<br />
21<br />
— Não tem sido bom interpretando <strong>um</strong> amoroso pai, tampouco. —<br />
digo, as palavras passando pela minha língua como se alguém estivesse me<br />
fazendo dizê-las. Que tipo de pai pode interpretar Ron? Você sabe, para que<br />
eu possa reconhecer quando o vir.<br />
Ron não se mostra muitas vezes irritado, mas mesmo com a pequena<br />
quantidade de tempo que passei com ele, sei os sons que faz ou as mudanças<br />
respiratórias quando algo está entalado na sua garganta.<br />
— Não acredite que é velha demais para ser castigada, mocinha.<br />
Tenho meu famoso ar depreciativo preparado.<br />
— Uma pista, Papai Querido. Estar aqui com você já é castigo<br />
suficiente.<br />
Na maioria das vezes não sou tão grosseira, de verdade, não sou.<br />
Porém meu ressentimento em relação à Ron e a insegurança a respeito do<br />
seu amor paternal me fazem atuar como <strong>um</strong>a cadela. Eu nem sequer sou<br />
consciente disso metade do tempo. Suponho que se sou grosseira com ele,<br />
estou dando <strong>um</strong>a razão para não me amar.<br />
Mudança no padrão respiratório.<br />
— Espere. Aqui. Ou. Do. Contrário... — diz.<br />
Ele vai embora, mas eu não posso ficar aqui. Olho o aeroporto e meus<br />
olhos se concentram em <strong>um</strong>a das coisas que a maioria dos adolescentes não<br />
consegue resistir: Uma máquina de Coca-Cola. (Insira música de Harpa aqui,<br />
porque é isso que está tocando na minha cabeça).<br />
Caminho no meio das pessoas como se estivesse em transe. Coca-<br />
Colas geladas estão me chamando. — Amy, Amy, Amy. Sei que você está<br />
irritada e quente. Amy, Amy, Amy. Sei que está suando como <strong>um</strong> porco<br />
nojento. Amy, Amy, Amy. Resolverei seus problemas.
22<br />
Toco a máquina de Coca-Cola e imediatamente me tranquilizo. Estou<br />
pronta pra colocar meu dinheiro na abertura e pela primeira vez em vinte e<br />
quatro horas sinto <strong>um</strong> sorriso vindo. É reconfortante que até mesmo a Coca-<br />
Cola está disponível no Oriente Médio. Logo, olho o preço. Meu vício de<br />
Coca-Cola está a ponto de custar-me <strong>um</strong>a quantidade considerável de<br />
dinheiro.<br />
Minha boca se abre e dou <strong>um</strong> pequeno grito.<br />
— Sete dólares e oito centavos?! Isso é <strong>um</strong> roubo!<br />
— Esse preço é em shekels 7 — diz <strong>um</strong>a mãe com acento israelense e<br />
dois filhos pendurados nela. — Sete shekels e oito ah-goo-roat.<br />
— Shekels? Ah goo-roat? — Não tenho shekels. E estou segura como<br />
o inferno que não tenho ah-goo-roats. Ou cabras 8 se foi isso que ela disse.<br />
Tenho apenas dólares americanos, mas encontro <strong>um</strong> cartaz que<br />
indica que <strong>um</strong> banco se encontra no aeroporto. Sigo o cartaz, andando<br />
diretamente a ele. Ele é do outro extremo do terminal. Se me apressar, Ron<br />
nem sequer notará que saí.<br />
No entanto quando chego ao banco, há <strong>um</strong>a fila. Para piorar a<br />
situação, o maior grupo de preguiçosos está na minha frente. Deveria<br />
retornar para a área de bagagem, mas não quero perder meu lugar na fila. Se<br />
somente essas pessoas fossem <strong>um</strong> pouco mais rápidas, teria meus shekels e<br />
ah-goo-roats para minha Coca-Cola rapidamente.<br />
Quando olho no relógio, me pergunto quantos minutos estou<br />
esperando. Dez? Vinte? É tão fácil perder a noção do tempo. Finalmente, sou<br />
a próxima. Pego minha nota de vinte dólares e entrego ao amigo banqueiro.<br />
— Passaporte? — diz.<br />
— Só quero trocar esse dinheiro — digo.<br />
7 Dinheiro israelense.<br />
8 Cabra em hebraico é “goats”. Por isso a confusão com o “ah-goo-roats”.
— Sim, entendo. Preciso do seu número de passaporte para trocá-lo.<br />
— Meu... Pai o tem. — digo. Ron pegou depois que não era mais<br />
necessário para que não perdesse. — Não pode simplesmente dar-me<br />
shekels sem ele?<br />
— Não. Próximo — diz, enquanto devolve minha nota de vinte<br />
dólares e olha atrás de mim para o próximo cliente.<br />
Minha boca fica aberta. Perdi todo esse tempo por <strong>um</strong>a Coca-Cola e<br />
mesmo assim não terei <strong>um</strong>a. Incrível.<br />
Caminho de volta à área de bagagens e encontro Ron. Está falando<br />
com dois soldados e quando me vê, minha primeira reação é correr na<br />
direção contrária. Não fiz nada de errado. Sim, ele disse que esperasse, mas<br />
juro que pensei que seria apenas <strong>um</strong> minuto.<br />
Chame de intuição adolescente, mas de alg<strong>um</strong>a maneira não penso<br />
que Ron escutará minha explicação com <strong>um</strong>a mente aberta. Diz algo aos<br />
soldados e logo caminha na minha direção, deliberadamente lento. Penso<br />
que está demorando tanto porque é muito provável que esteja pensando nas<br />
maneiras que pode me desmembrar e matar. Ensinam Desmembramento<br />
1<strong>01</strong> na escola de comando?<br />
Ron finalmente me alcança e preparo a mim mesma. Soa como “arrr”<br />
e “yuh” saindo da sua boca, mas depois se volta dando alguns passos para a<br />
esteira de bagagens pegando as nossas malas. Percebo que nossas malas são<br />
as últimas que sobraram. Ele as pega e coloca n<strong>um</strong> carrinho como se<br />
pesassem dois quilos.<br />
Minha mala estava acima do peso permitido. Sei disto porque ele<br />
teve que pagar mais de cem dólares pelas malas extras para que subisse no<br />
avião. Nota para mim mesma: Ron é muito forte.<br />
Continuo olhando-o, esperando sua ira chegar. Acredite, sei que está<br />
chegando. O que dá medo é que está demorando pra chegar. Um pai<br />
previsível é bom. Por outro lado, <strong>um</strong> pai imprevisível é o pior pesadelo de<br />
<strong>um</strong> adolescente.<br />
23
Agora Ron vai em direção à área marcada com “saída” empurrando o<br />
carrinho com nossas malas. E eu, no entanto estou parada aqui, meus pés<br />
plantados no chão deste aeroporto estranho. Justo agora percebo que meu<br />
querido pai simplesmente me deixou pra trás.<br />
Maldição.<br />
Normalmente esperaria tanto quanto pudesse e o faria suar.<br />
Deixaria-o pensar que nunca iria segui-lo. Porém quando olho os soldados<br />
que agora estão andando na minha direção, viro as costas e ando em direção<br />
à saída.<br />
Adeus orgulho, olá Israel.<br />
24
25<br />
Capítulo 4<br />
Mudanças me dão coceiras.<br />
Vejo Ron através dos carros parados. Ele nem ao menos está<br />
preocupado comigo ou vendo se o estou seguindo. Paro na frente dele, mas<br />
ele não reconhece minha presença.<br />
Bufo com força.<br />
Ele continua sem notar-me.<br />
A mulher do departamento lhe entrega <strong>um</strong>a chave e fala algo em<br />
hebraico. Ele lhe sorri, dizendo.<br />
— Todah. 9 — E começa a puxar o carrinho com nossas malas dentro.<br />
— Desculpe-me ok? — digo. — Agora pare de me ignorar.<br />
Ele se detém.<br />
você?<br />
— Alg<strong>um</strong>a vez te ocorreu que eu poderia estar preocupado com<br />
Podia mentir, mas que bem isso faria?<br />
— Francamente, não — digo.<br />
Ele passa as mãos pelo seu cabelo. Porque homens fazem isso<br />
quando estão frustrados? Por acaso pensam que serão mais homens? Eu sei<br />
por que as mulheres não fazem. Elas desarr<strong>um</strong>ariam os cabelos que<br />
9 Obrigado em hebraico.
demoraram meia hora para arr<strong>um</strong>ar, por isso. E também as mulheres não<br />
têm pretensões de serem homens.<br />
— Vamos — diz. — No momento que alcançarmos Moshav estará<br />
escuro.<br />
— Moshav? O que é <strong>um</strong> Moshav? Será que é shopping em hebraico?<br />
Quero dizer, pelo que Jéssica me disse, as lojas de Israel têm as melhores<br />
roupas da Europa. Esse vestido preto que tem é realmente lindo. Sei que<br />
seria terrível sair para comprar com o doador de esperma, mas continuo<br />
pensando em todas as roupas incríveis que podia trazer quando voltasse.<br />
É engraçado, quando penso no shopping, esqueço as bombas<br />
terroristas que poderiam estar lá.<br />
À medida que passamos pela avenida em nosso Subaru 10 alugado, é<br />
fácil esquecer que esta é <strong>um</strong>a zona de guerra. Parece <strong>um</strong>a avenida no meio<br />
do Novo México ou algo assim.<br />
Quando chegamos à área de Tel Aviv, o caos no trânsito começou. Eu<br />
olho pela janela os edifícios. Ron aponta para a direita.<br />
— Essa é a torre Azrieli. É o edifício mais alto no Médio Oeste — diz<br />
orgulhosamente.<br />
Talvez seja bom ter <strong>um</strong> bom olho de boi 11 sobre ele.<br />
— Que ótimo alvo terrorista — murmuro, mas logo percebo que Ron<br />
me olha de lado.<br />
26<br />
— Bem, isso é. — Espero que esteja bem protegido, porque 11/9 12<br />
mudou todos os americanos que conheço. Eu olho para fora enquanto<br />
passamos os edifícios de alta tecnologia com nomes de companhias<br />
americanas neles.<br />
— Israel não se parece com <strong>um</strong> país de terceiro mundo — digo.<br />
10 Marca de carro.<br />
11 Acho que ela quer dizer sobre aquela lâmpada no alto do prédio para sinalizar a altura do edifício.<br />
12 Referindo-se ao ataque terrorista aos EUA em 11 de setembro de 20<strong>01</strong>.
27<br />
— Ela não é <strong>um</strong> país de terceiro mundo.<br />
Ela? Israel é “ela”? Bom, ela é muito moderna. Na verdade, o tráfego<br />
parece como se estivéssemos voltando para casa. Enquanto isso, dou-me<br />
conta rapidamente que os israelenses precisam ir à escola por esse caminho<br />
feio.<br />
Todos estavam gritando pelas janelas e mostrando o dedo uns para<br />
os outros. Eu grito quando uns grupos de pessoas que estão em scooters e<br />
motocicletas entram no meio dos carros. Eles nem sequer estão andando na<br />
linha; eles estão dirigindo sobre elas!<br />
digo.<br />
— Estamos neste carro há <strong>um</strong>a hora. Quando vamos chegar? — lhe<br />
— Daqui <strong>um</strong>a hora ou algo assim.<br />
assim?<br />
— Não me respondeu. O que é <strong>um</strong> moshav? É <strong>um</strong> shopping ou algo<br />
Ele ri e começo a achar que <strong>um</strong> moshav não é <strong>um</strong> shopping.<br />
— Já escutou alg<strong>um</strong>a vez sobre <strong>um</strong> kibutz? – me pergunta.<br />
— Você se refere às comunidades onde vivem pessoas e<br />
compartilham tudo? Escuta, se está me levando à <strong>um</strong>a dessas comunidades<br />
saudáveis...<br />
— Por que sempre faz isso?<br />
— Isso o quê?<br />
— Exagerar.<br />
— Para sua informação, eu não exagero. Mamãe exagera,<br />
especialmente quando trato de chegar em casa logo depois do meu toque de<br />
recolher. Oh, sim, você não sabe disso porque não está lá — digo<br />
sarcasticamente.<br />
Silêncio.
28<br />
— Então, porque não vem viver comigo por <strong>um</strong> tempo? — Me<br />
desafia.<br />
Eu, viver com ele?<br />
— Tem namorada? — pergunto. Quero que diga que não porque<br />
tenho planos pra ele e minha mãe. E será mais fácil se não houver restrições.<br />
— Não. Você tem namorado?<br />
Ok, espere <strong>um</strong> segundo. Quando ele começou a fazer perguntas?<br />
— Talvez.<br />
— Amy, quando vai aprender a confiar em mim? Não sou seu<br />
inimigo, você sabe.<br />
— Então, me diga o que é <strong>um</strong> moshav.<br />
— Um moshav é <strong>um</strong>a comunidade muito unida. É similar ao kibuts,<br />
mas cada <strong>um</strong> possui seu território e propriedades. O dinheiro tampouco se<br />
compartilha ou não.<br />
Ainda soa como <strong>um</strong>a comunidade para mim.<br />
— Espero que não fiquemos lá por muito tempo — digo. — Eu tenho<br />
que tomar <strong>um</strong> banho de hotel e desfazer minhas malas. Tenho coisas nela<br />
que provavelmente estão derretendo nesse calor.<br />
— Não iremos ficar n<strong>um</strong> hotel – diz.<br />
Agora eu vou exagerar.<br />
— O quê? — digo muito alto.<br />
— Nós ficaremos com sua tia, tio, primos e Sofia. — Faz <strong>um</strong>a pausa.<br />
Sei o que vê, eu sei. Porém não estou mentalmente preparada quando ele<br />
acrescenta. — No moshav.
— Vamos esclarecer as coisas Ron. Sou <strong>um</strong>a garota completamente<br />
americana com sangue vermelho, branco e azul correndo pelas minhas veias.<br />
Eu não fico em lugares chamados moshavs. A menos que tenha me inscrito<br />
para as garotas Scouts(bandeirantes), o que eu nao fiz. Eu preciso de<br />
serviços. Serviços! Sabe o que é isso?<br />
— Sim. No entanto não espere muito de onde vamos. A última vez<br />
que visitei, só <strong>um</strong>a família tinha eletricidade e era a minha.<br />
Abro o porta-luvas do carro.<br />
— O que está fazendo? — pergunta Ron.<br />
— Buscando <strong>um</strong> mapa para assim saber que direção tomar quando<br />
escapar do moshav — respondo.<br />
Ele ri.<br />
— Ha, Ha, engraçado, muito engraçado. Não acredito que parecerá<br />
engraçado quando acordar <strong>um</strong> dia e se dar conta de que eu voltei à<br />
civilização.<br />
Ron me deu uns tapinhas no joelho.<br />
— Estava brincando, Amy. Eles têm eletricidade.<br />
Brincando? Ron estava brincando comigo?<br />
— Sabia que era brincadeira. Acredita que sou tão crédula?<br />
Ele não responde, mas sei que sabe a verdade pelo modo que sua<br />
boca se move.<br />
— Vai dar-me as chaves para que possa ir sozinha ao shopping?<br />
— Me desculpe. Mas a idade para dirigir aqui é somente com dezoito.<br />
— Quê?!<br />
29
— Eu te levarei aonde quiser. Não se preocupe. E também, se você se<br />
perder não saberá como voltar.<br />
Ótimo, penso comigo mesma. Perder soa como <strong>um</strong>a grande ideia.<br />
Concordo e olho pela janela. De <strong>um</strong> lado do carro está o mar mediterrâneo e<br />
no outro lado há montanhas com casas construídas ali. Se estivesse de<br />
melhor h<strong>um</strong>or talvez pensasse que essa paisagem era bonita, porém estou<br />
irritada, cansada e minha bunda está dormente.<br />
Começo a fazer meus exercícios de glúteos. Estava vendo <strong>um</strong> show<br />
tarde da noite, há alguns anos atrás, quando <strong>um</strong>a estrela de ação, talvez<br />
Seagal ou Antonio Banderas, estava falando como fazia exercícios de glúteos<br />
quando estava em <strong>um</strong> carro. Apenas apertar, logo relaxar. Apertar. Relaxar.<br />
Apertar. Relaxar. Estou “sentindo que queima”, mas logo depois de dez<br />
minutos minhas nádegas começam a doer por estar apertando e relaxando,<br />
assim deixo de fazer.<br />
Por agora, damos <strong>um</strong>a distância do mar e tudo que nos cerca são<br />
pequenas árvores enfileiradas.<br />
— O que é isso? — pergunto.<br />
— Oliveiras.<br />
— Odeio oliveiras.<br />
— Eu as amo.<br />
Eu imagino.<br />
— Espero que não seja desses cuspidores.<br />
— Huh?<br />
— Você sabe, essas pessoas que cospem as sementes na mesa na<br />
frente de todos. É totalmente desagrádavel.<br />
Ele não responde. Poderia apostar a roupa de baixo da mãe de Ron<br />
que ele era <strong>um</strong> desses.<br />
30
— Gosta de que tipo de comida? — me pergunta — Estou seguro que<br />
posso consegui-la.<br />
— Sushi.<br />
— Se refere ao peixe cru? – pergunta, fazendo <strong>um</strong>a careta.<br />
— Sim.<br />
Eu cost<strong>um</strong>ava odiar. Quando minha mãe me deu pra provar, tive<br />
nauseas e cuspi. (Em <strong>um</strong> guardanapo, muito discretamente tenho que dizer,<br />
bem diferente daqueles que cospem as sementes de azeitonas).<br />
Minha mãe ama sushi. Eu acredito que é como o álcool. Quer vomitar<br />
a primeira vez que experimenta, mas logo você cresce e gosta. É por isso que<br />
dizem que há <strong>um</strong>a linha tênue entre o amor e o ódio. Agora não só gosto de<br />
sushi, como o desejo. Ron definitivamente precisa ser apresentado ao sushi<br />
com <strong>um</strong>a comedora profissional como eu.<br />
Agora estamos dirigindo através das montanhas em <strong>um</strong>a estrada<br />
com várias curvas e estou ficando tonta. A última vez que vi a civilização foi<br />
há cerca de quinze minutos. Descemos <strong>um</strong> morro e paramos em <strong>um</strong>a estrada<br />
que nos leva à outra. Eu li <strong>um</strong> cartaz com as palavras “Moshav Menora” em<br />
inglês e outras palavras em hebraico.<br />
Ron toma a estrada para Moshav Menora. Agora o local se parece<br />
com a Suíça, com alg<strong>um</strong>as montanhas cobertas de relva que nos cercam por<br />
todos os lados. Ele para em <strong>um</strong>a parada de descanso cênica construída na<br />
montanha.<br />
— Isso é tudo? — pergunto.<br />
Ele se vira para mim e tira a chave da ignição.<br />
— Estes são os Altos de Golan, <strong>um</strong> lugar muito especial e bonito.<br />
Vamos apreciar a vista.<br />
— Tenho que fazer? — pergunto. — Tenho que ir ao banheiro.<br />
31
— Pode aguentar <strong>um</strong> pouco mais? Realmente preciso falar com você<br />
antes que conheça a minha família.<br />
Eu tinha que ouvi-lo. Abri o carro e saí. Caminhamos em silêncio até<br />
a borda da montanha. Quando olho ao longo da borda, me lembro de <strong>um</strong>a<br />
cena de cartão postal.<br />
— Eles não sabem de você — Ron exclama.<br />
Huh?<br />
— Quem não sabe sobre mim?<br />
— Minha mãe, meu irmão e sua esposa...<br />
Uma pontada de dor se crava no meu peito como se o estivesse<br />
atravessando. Meu coração começa a bater mais rápido e minha respiração<br />
se torna pesada.<br />
— Por quê? — sussurro, apenas pra que entenda as palavras.<br />
— É complicado — diz, então olha pra longe de mim. — Você sabe,<br />
quando fui para a América queria provar a todo mundo que tinha<br />
conseguido. Você sabe, o sonho americano.<br />
32<br />
falo.<br />
— E você não esperava que eu chegaria e <strong>arruinar</strong>ia seu sonho —<br />
— Conheci a sua mãe na primeira semana que estive nos EUA,<br />
quando era <strong>um</strong> arrogante israelense que só queria passar <strong>um</strong> bom tempo.<br />
Poucos meses depois eu descobri que ia ser pai.<br />
Começo a andar para longe dele. O que queria de mim, <strong>um</strong> pedido de<br />
desculpas por ter nascido?<br />
— Te odeio — eu digo enquanto volto para o carro. Eu seco as<br />
estúpidas lágrimas que estão no meu rosto.<br />
— Amy, por favor. Apenas <strong>um</strong>a vez deixe-me explicar as coisas.
— Basta abrir a porta. — Ouço o clique dentro do carro. Ele me olha<br />
como se quisesse explicar mais coisas, mas não quero ouvi-lo.<br />
— Vamos logo! — grito.<br />
Ele entra no carro e dirige entre as montanhas. Pensei que estava<br />
pronta pra conhecer a família de Ron, mas agora tudo o que quero fazer é<br />
cavar <strong>um</strong> buraco.<br />
Porque ele não só vai apresentar-me pra eles, como vai dizer pela<br />
primeira vez que tem <strong>um</strong>a filha ilegítima.<br />
33
34<br />
Capítulo 5<br />
Se eu fechar meus olhos, a vida deixará de girar fora de<br />
controle?<br />
Chegamos à frente de <strong>um</strong>a porta e <strong>um</strong> cara com <strong>um</strong>a metralhadora<br />
se aproxima do nosso carro. Nunca tinha visto <strong>um</strong>a metralhadora antes e<br />
tremo cada vez que penso para quê serve.<br />
Ron diz algo em hebraico. O homem sorri e acena para que abramos<br />
a porta. Dirigimos por <strong>um</strong>a estrada de terra no meio da montanha e<br />
passamos por seis fileiras de casas. Há entre sete a dez casas por estrada em<br />
ambos os lados. Ron vai para <strong>um</strong>a delas e se detém em frente a <strong>um</strong>a casa.<br />
— Não entrarei até que você diga quem sou — digo.<br />
Penso que irá discutir e me preparo para <strong>um</strong>a briga. Porém Ron<br />
simplesmente diz:<br />
— Ok.<br />
Passado o estado de choque fico parada. O observo entrando na<br />
pequena casa térrea.<br />
As janelas do carro estão abertas, mas não há brisa. Não está apenas<br />
quente, eu acho que o próprio diabo deve ter vivido nessa montanha, porque<br />
o suor escorre pelo meu rosto, pescoço e peito. Minha camiseta da<br />
Abercombrie & Fitch tem marcas repugnantes de suor.<br />
<strong>Como</strong> pode essas pessoas suportarem esse calor? Eu olho para<br />
minha unha antes de roê-la.
35<br />
O que Ron está falando? Estará suando tanto como eu? Espero que<br />
sim.<br />
Saio do carro e me apoio contra ele, tentando ouvir a repreensão que<br />
Safta deveria estar dando em Ron. O cara vai conseguir. Se eu fosse Safta lhe<br />
rasgaria em dois por negar, bem, a mim. No entanto eu não o ouvi gritar. Na<br />
verdade, você não ouve quase nada vindo daquela casa.<br />
Em seu lugar, algo golpeia meu braço. Com força.<br />
— Hey! — grito me assustando.<br />
Não sou estúpida. Sei que não é <strong>um</strong>a bala. Não que ficaria<br />
surpreendida se a família de Ron decidisse “acabar” com sua filha ilegítima<br />
<strong>um</strong>a vez que escutassem a verdade.<br />
Logo que acabo de pensar nisso, olho para baixo e vejo o objeto de<br />
ofensa.<br />
Uma bola de futebol.<br />
— Tizreki le’kan. 13 — Uma voz fala atrás do carro. <strong>Como</strong> se eu<br />
pudesse entender. Contudo eu não posso, assim o ignoro. Além disso, eu já<br />
sinto <strong>um</strong>a contusão formando-se no meu braço.<br />
O som de passos correndo ressoa antes que esteja cara a cara com<br />
<strong>um</strong> garoto israelense da minha idade.<br />
— Shalom 14 — diz ele.<br />
Ele usa jeans, está com <strong>um</strong>a camiseta branca rasgada e empoeirada e<br />
usa sandálias gregas. Porém isso não é a pior parte. O garoto usa meias<br />
brancas com sandálias. Meias com sandálias! Vendo que me faria rir, olho<br />
para o seu rosto em vez dos seus pés. Não queria insultá-lo.<br />
— Olá — digo.<br />
13 “Jogue desta forma” em hebraico.<br />
14 Oi em hebraico.
36<br />
Fala inglês? Não sei, por que está aqui em silêncio.<br />
Dois garotos chegam correndo em nossa direção. Um começa a falar<br />
com esse garoto em hebraico, mas fica em silêncio quando me percebe.<br />
— Eu, Estados Unidos — digo devagar e em voz alta como se<br />
estivesse falando com <strong>um</strong> chimpanzé. Estou esperando por <strong>um</strong> milagre pra<br />
que ele me entenda.<br />
Eles se olham com <strong>um</strong> olhar confuso nos seus rostos e me dou conta<br />
que os próximos três meses vão ser como viver em <strong>um</strong>a bolha.<br />
Uma bolha com pessoas que não entendem <strong>um</strong>a palavra do que<br />
estou dizendo, à exceção do Doador de Esperma. Poderiam minhas férias de<br />
verão estarem mais arruinadas?<br />
O primeiro garoto dá <strong>um</strong> passo na minha direção. Seu cabelo é loiro<br />
escuro e tem <strong>um</strong> áspero sorriso jovial. Eu sei, eu sei, áspero e jovial<br />
realmente não combinam. Mas esse tipo é assim, acredite em mim.<br />
— Fala inglês? — pergunta com <strong>um</strong> sotaque pesado.<br />
Hein?<br />
— Sim. E você?<br />
— Sim. No entanto o que significa “Eu, Estados Unidos”?<br />
— Nada. Só esqueça.<br />
— É <strong>um</strong>a amiga dos outros, não? — pergunta.<br />
Huh? É evidente que seu inglês não é bom. Estava perguntando se eu<br />
sou <strong>um</strong>a amiga ou não? Tenho quase medo de dizer que não.<br />
— Sim.<br />
O segundo garoto se vira para mim.<br />
— <strong>Como</strong> se chama?
37<br />
— Amy.<br />
— Oi Amy, sou Doo-Doo – diz. Em seguida aponta para os outros<br />
garotos. – E estes são Moron e O’Dead.<br />
Agora, nunca tinha dito essas quatro palavras n<strong>um</strong>a linha antes. Na<br />
verdade eu não acho que alguém com menos de sessenta anos dissesse, mas<br />
saíram da minha boca automaticamente.<br />
— Você quer pedir desculpas? — digo. Meus olhos se estreitam como<br />
se isso limpasse meus ouvidos para poder ouvir melhor.<br />
Todos me olham como seu eu fosse a pessoa com problema. Tenho<br />
esse desejo de rir. Contudo suprimo porque eles provavelmente não<br />
entendem a brincadeira. O que na verdade torna tudo isso mais engraçado.<br />
Bem, alg<strong>um</strong>as partes da minha viagem serão realmente divertidas.<br />
Entretanto minha surpresa acaba quando outro garoto se aproxima<br />
de nós. Ele tem o cabelo castanho escuro que combina com seus olhos. É<br />
alto, bronzeado, e não está com camisa. Os jeans modelam seus delgados<br />
quadris, <strong>um</strong> tanquinho, e olhando pra ele, é o adolescente mais forte que já<br />
vi alg<strong>um</strong>a vez.<br />
— Americayit 15 — Moron, diz apontando.<br />
O garoto sem camisa diz alg<strong>um</strong>as coisas a Doo-Doo, Moron e O’Dead<br />
em hebraico e me ignoram por completo. O que só demonstra <strong>um</strong>a das<br />
minhas muitas teorias... Os garotos bonitos sempre são os mais idiotas. Pelo<br />
menos os outros garotos sorriram e se apresentaram. Esse garoto sem<br />
camisa só falou alg<strong>um</strong>as palavras aos seus amigos e se afastou.<br />
— Quanto tempo você ficará? — Moron pergunta, olhando as malas<br />
no banco traseiro do carro. Por <strong>um</strong> fodido tempo, mais do que eu quero,<br />
penso.<br />
— O verão inteiro.<br />
15 Americana em hebraico.
— Vamos para a praia amanhã à noite. Quer se juntar a nós? — Doo-<br />
Doo pergunta.<br />
— Claro — digo.<br />
Olho para a porta aberta e há <strong>um</strong>a multidão de quatro estranhos com<br />
Ron de pé. Todos me olham fixamente. <strong>Como</strong> posso ter esquecido porque<br />
estava aqui, em primeiro lugar?<br />
38<br />
Ron se aproxima de mim. Quero perguntar: — <strong>Como</strong> foi? — Contudo<br />
não pergunto.<br />
Então, agora me encontro caminhando por este caminho lamacento,<br />
em direção a essa pequena casa que será minha residência durante os<br />
próximos três meses. <strong>Como</strong> a cereja em cima do bolo da minha vida, vou<br />
viver com membros de <strong>um</strong>a família que nunca havia conhecido antes e <strong>um</strong><br />
pai biológico que não conheço.<br />
— Amy, este é meu irmão, Chaim.<br />
Meu tio estende a mão e estendo a minha. É <strong>um</strong> tipo alto, com <strong>um</strong>a<br />
semelhança clara com Ron. Ambos têm a mesma estrutura forte e<br />
musculosa.<br />
O homem ri, mas posso dizer que há tensão por trás dessa fachada.<br />
Raiva também, só não sei se dirigida a mim ou ao DE(simplifiquei Doador de<br />
Esperma, estou com muito calor e suando para pensar em algo mais do que<br />
DE).<br />
— Me chame de Dodor tio Chaim — diz ele.<br />
<strong>Como</strong> se pudesse dizer este nome. A pronúncia de C-h é como se<br />
estivesse a ponto de cortar o catarro. Juro que não posso fazer esses sons de<br />
novo com a garganta na minha vida sem fazer de mim <strong>um</strong>a completa idiota.<br />
Só irei chamá-lo de Tio Chaim e deixar de fora o barulho borbulhante de<br />
volta na minha garganta.<br />
A senhora ao lado de Tio Chaim dá <strong>um</strong> passo pra frente.<br />
Surpreendentemente quando se aproxima e me abraça com força. Meu<br />
primeiro instinto é empurrar os braços, mas seu abraço é tão cálido e
amoroso. Me encontro apoiada em seus braços. Em seguida me libera após<br />
<strong>um</strong> largo tempo, coloca suas mãos sobre meus ombros, e se sustenta com <strong>um</strong><br />
braço estendido.<br />
— Garota bonita — diz com <strong>um</strong> profundo sotaque israelense.<br />
39<br />
Ela tem aqueles brincos parecendo sinos e nenh<strong>um</strong>a maquiagem no<br />
rosto. Minha mãe não seria pega nem morta fora de casa sem maquiagem.<br />
Ou com brincos parecendo sinos. A verdade é que esta mulher é bonita sem<br />
maquiagem e os sinos só fazem seus olhar parecer angelical ao invés de<br />
estúpido.<br />
Ela me solta e diz com <strong>um</strong> sorriso.<br />
— Eu sou sua tia Yikara. Só me chame de doda Yucky, de acordo?<br />
— Okay — digo em <strong>um</strong>a voz cantante para alertar ao DE que não me<br />
sinto confortável em chamar a esta mulher de Yucky.<br />
— Doda é “tia” em hebraico. — DE explica como se isso fosse parte<br />
deste intercâmbio conjunto que necessita explicação.<br />
Há mais duas pessoas de pé ali. Uma delas é <strong>um</strong> menino pequeno,<br />
provavelmente por volta de três anos, com cachos louros em espiral na sua<br />
cabeça como se fosse as serpentes de Medusa. Estava usando nada mais que<br />
<strong>um</strong> par de cuecas do Power Rangers.<br />
— Shalom, ani Matam — diz com <strong>um</strong>a voz graciosa. Não tenho ideia<br />
do que está falando, mas é tão adorável e seus cachos balançam enquanto<br />
fala. Dou <strong>um</strong> passo e sacudo sua pequena mão carinhosamente.<br />
A última, <strong>um</strong>a adolescente loira <strong>um</strong> pouco mais alta que eu, está ali<br />
com os braços cruzados sobre o peito. Ela está usando a calça jeans mais<br />
apertada que já vi alg<strong>um</strong>a vez em <strong>um</strong> ser h<strong>um</strong>ano e <strong>um</strong>a camisa vintage que<br />
mostra a maior parte da sua barriga lisa. Eu não preciso de <strong>um</strong> sexto<br />
sentindo para saber que está claramente chateada.<br />
— Esta é sua prima, O’snot.<br />
Desta vez, meu riso sai sem aviso prévio. No entanto quando me dou<br />
conta que ninguém mais ri, eu paro rapidamente. O’snot não está apenas
chateada, ela obtém MINHA famosa piada “<strong>um</strong>a de <strong>um</strong> tipo” como se ela<br />
mesma tivesse inventado.<br />
Não ofereço minha mão em sinal de comprimento, porque estou<br />
bastante segura de que minha prima ignorará. Assim que simplesmente<br />
digo.<br />
— Oi.<br />
— Oi — diz ela entre dentes. Genial.<br />
— Vamos entrar para que conheça sua SAFTA – diz Tio Chaim.<br />
Consigo <strong>um</strong> pequeno pedaço de satisfação quando me dou conta que<br />
as axilas de Ron estão úmidas através da camisa. Minhas axilas estão<br />
molhadas do tamanho de <strong>um</strong>a toranja 16 , enquanto as de Ron são do tamanho<br />
de melancias pequenas. Ele também é o que está mais nervoso por causa de<br />
eu conhecer minha avó.<br />
Ha!<br />
40<br />
16 É o cruzamento entre <strong>um</strong> pomelo e <strong>um</strong>a laranja. É igual <strong>um</strong>a laranja só que com o interior<br />
avermelhado.
41<br />
Capítulo 6<br />
Pode escapar de alguns problemas, mas logo encontrará<br />
outros.<br />
Entrei vagarosamente na casa. Uma cozinha está na minha frente.<br />
Sigo Ron na direção esquerda quando encontro <strong>um</strong>a mulher sentada junto a<br />
<strong>um</strong>a janela. Tem cabelos grisalhos.<br />
Ela me olha com olhos azuis tão claros que quase brilham. Nossos<br />
olhares se encontram e sinto que estou olhando meus próprios olhos em <strong>um</strong><br />
espelho. Estou tão emocionada que quase me sufoco. O ar está mais pesado?<br />
Começo a respirar pesadamente, tratando de levar ar aos meus pulmões.<br />
Minha avó.<br />
Minha avó doente.<br />
Parece pequena e fraca. Será que está morrendo?<br />
Olho novamente para o resto da família, e me dou conta que todos<br />
estão me olhando. Parece que estou sendo julgada em alg<strong>um</strong> tipo de<br />
programa de televisão pelo modo que me olham. A voz de <strong>um</strong> apresentador<br />
animado está na minha cabeça, “Amy cometerá alg<strong>um</strong> erro, arruinando o<br />
primeiro encontro? Assistam na próxima semana o episódio de Filhos<br />
Ilegítimos e descubra se a avó doente a aceitará ou negará na frente de<br />
milhares de espectadores.<br />
Antes mesmo de me dar conta, dou a volta e corro para fora da casa<br />
para que ninguém note minhas lágrimas. Continuo correndo até minhas<br />
pernas quererem parar. Passo em frente a <strong>um</strong>a fileira de casas, celeiros,
cavalos, vacas e ovelhas como se estivesse em alg<strong>um</strong>a fazenda produzida em<br />
Hollywood.<br />
Quando paro de correr e começo a andar, penso que Safta deve achar<br />
que sou <strong>um</strong>a estúpida. Queria abraçá-la, de verdade, queria. No entanto não<br />
em frente ao resto da família. Sentia que estavam analisando cada<br />
movimento que fazia.<br />
Continuo andando chateada com DE fazer meu primeiro encontro<br />
com Safta <strong>um</strong> espetáculo. Uma pequena cerca me detém, e enquanto eu<br />
tento passar por cima dela, <strong>um</strong>a voz me para.<br />
— Não pode fazer isso.<br />
Congelo e dou a volta para encontrar a áspera voz. É o garoto sem<br />
camiseta de pé n<strong>um</strong> palheiro de três andares. Uma camada de suor faz com<br />
que seu peito brilhe no sol, mas eu tento não prestar atenção nisso. Em vez<br />
disso, penso em algo repugnante. <strong>Como</strong> por exemplo que está fedendo a<br />
ovelhas e suor e como necessita desesperadamente de <strong>um</strong> banho. Porém, se<br />
esse for o caso, eu também preciso. Eu enxugo as lágrimas que caem pelo<br />
meu rosto com meus dedos.<br />
— Não é <strong>um</strong> país livre? — digo com atitude.<br />
A última coisa que preciso é <strong>um</strong> adolescente detestável pensando<br />
que eu sou fraca.<br />
Ele se vira e lança <strong>um</strong> feixe de feno nos alimentadores das ovelhas.<br />
— O letreiro diz que atrás da cerca há <strong>um</strong> campo minado. Se quiser<br />
arriscar-se, não a deterei — diz o idiota-lindo-sem-camiseta quando entra no<br />
curral de ovelhas.<br />
A esse ponto, entretanto estou na borda da cerca. Diabos. Está é <strong>um</strong>a<br />
zona de guerra. Olho meu pé do outro lado da cerca, me sentindo sortuda de<br />
que não passei. Levanto meu pé lentamente e volto para o campo sem minas.<br />
— Não sabe onde está, certo? — Pergunta bruscamente enquanto<br />
pega outro feixe de feno.<br />
42
—Claro que sei — digo — Estou no topo de <strong>um</strong>a montanha no meio<br />
de Israel. – Duh.<br />
43<br />
— Na verdade, está na parte norte de Israel, não no centro. Em Golan<br />
Heights.<br />
— E..?<br />
— Americanos — sussurra, logo sacode lentamente a cabeça em<br />
desgosto.<br />
— Ok, o que tem de especial Golan Heights?<br />
— Só digamos que a Síria está a dez quilômetros de distância – diz,<br />
apontando. — Para <strong>um</strong>a garota judia, você não parece saber muito sobre a<br />
terra judaica.<br />
Sim, mas não sou judia. Não lhe digo isto, provavelmente tenha algo<br />
para me dizer sobre o assunto. Fico encantada quando dá a volta e retorna<br />
ao curral de ovelhas.<br />
— Argh!<br />
Pulo ao escutar <strong>um</strong> som perto dos meus pés. Um filhote de cachorro<br />
peludo e cheio de sujeira, que eu acho que alg<strong>um</strong>a vez já foi branco, está<br />
abanando o rabo furiosamente contra mim. Uma vez que fazemos contato<br />
visual, tenta pular deixando suas patas no ar.<br />
— Sinto muito – digo ao animal — Não sou <strong>um</strong>a pessoa de cachorros.<br />
Ache outro idiota que passe suas mãos por esse pêlo sujo e cheio de<br />
pulgas e por sua barriga. Não sou <strong>um</strong>a pessoa de gatos, tampouco. Na<br />
verdade, eu não gosto de nenh<strong>um</strong> animal específico. E estar rodeada por <strong>um</strong><br />
ambiente cheio de animais me dá coceira.<br />
Começo a me afastar. Infelizmente o cachorro me persegue.<br />
— Argh! – diz a coisa de novo.<br />
Continuo andando.
— Não sabe que os cães dizem “ruff”, não “argh”? – pergunto — Está<br />
tentando ser <strong>um</strong> pirata?<br />
O cachorro responde com outro “Argh”, esta vez mais forte que a<br />
última, como se estivesse tratando de me chatear de propósito. Hey, depois<br />
do dia que estou vivendo, não duvidaria.<br />
— Ruff! Ruff! Ruff!<br />
Pensaria que o cão está de verdade brincando comigo, certo? No<br />
entanto quando dou a volta, profundos latidos me fazem dar conta que a<br />
pequena praga tem amigos. Muitos amigos.<br />
Em primeiro lugar, estava equivocada ao pensar que o cão estava<br />
sujo. Estes cinco cães estão cobertos de lama e definitivamente mais sujos<br />
que o cachorro praga. Também (em primeiro lugar) são muito, muito<br />
grandes.<br />
Estão correndo em direção a mim, latindo como se eu tivesse<br />
sequestrado seu pequeno filhote.<br />
Pânico não é a palavra para descrever como me sinto nesse<br />
momento. Enquanto minha vida passa diante dos meus olhos, reviso minhas<br />
duas opções rapidamente. Podia andar ao campo de minas ou pular dentro<br />
do curral de ovelhas.<br />
Não tenho tempo para perder, então só posso correr tão rápido<br />
quanto minhas suadas, cansadas e sentidas pernas podem correr. Enquanto<br />
corro, nem sequer estou ciente da opção que escolhi.<br />
Corro mais e mais rápido, apenas posso notar os sons “argh” aos<br />
meus pés e os incansáveis latidos não muito longe de mim. Só <strong>um</strong> pouco<br />
mais, digo à minha mente nublada. Acredito que estou gritando e xingando<br />
obscenidades, mas não estou muito segura porque estou muito ocupada<br />
preocupando-me com o que minhas pernas estão fazendo e eu não posso ser<br />
incomodada para me preocupar com a minha boca, também.<br />
Parece ter passado muito tempo, assim quando alcanço o curral meu<br />
ritmo não muda. O Sr. Haraldson, meu professor de educação física, estaria<br />
muito orgulhoso do meu ritmo. Não estava certa de conseguir <strong>um</strong> prêmio<br />
44
presidencial em atividade física no ano passado, mas provavelmente estou<br />
fazendo <strong>um</strong> recorde mundial de salto.<br />
Realmente não estou prestando atenção pra onde estou indo, tudo<br />
está nublado. E quando aterrisso, fecho meus olhos. Espero não ter<br />
esmagado <strong>um</strong>a ovelha durante minha aterrissagem forçada.<br />
No entanto ao invés de colidir com <strong>um</strong>a ovelha, algo duro e macio<br />
aguenta minha queda.<br />
Tenho medo de abrir os olhos, assim não posso ver, mas meu sentido<br />
de olfato está intensificado. Eu sei, porque a essência de suor de <strong>um</strong> garoto<br />
me rodeia. Não é <strong>um</strong> odor ruim, este odor almiscarado me faz querer inalar<br />
mais profundamente.<br />
Tudo bem, agora me dou conta do que estou fazendo, onde estou, e a<br />
quem estou sentindo – como se fosse <strong>um</strong>a maldita pétala de rosa —<br />
entretanto na realidade é só <strong>um</strong> garoto. Abro finalmente meus olhos.<br />
Não me perguntem como terminei sobre este idiota-lindo-semcamiseta.<br />
Suas mãos estão ao meu redor. Para ser específica, <strong>um</strong>a delas está<br />
nas minhas costas e a outra no meu quadril. Fico surpresa olhando para<br />
estes olhos surpresos que poderiam colocar qualquer <strong>um</strong>a em transe.<br />
Estou a ponto de levantar-me, quando escuto a voz de alguém<br />
caminhando pelo gramado ao lado do curral de ovelhas. Olho para ver quem<br />
é. Estou plenamente consciente de que a posição que estou se vê realmente<br />
promíscua e provavelmente me colocará em muitos problemas.<br />
Quando finalmente me separo dele, consigo ver quem presenciou<br />
minha luta. Dou-me conta que é a última pessoa que quero ver.<br />
O’snot.<br />
Quando vejo seus lábios apertados n<strong>um</strong>a linha fina e suas mãos<br />
acusadoramente paradas no seu quadril chego à única conclusão que<br />
consigo.<br />
O idiota-lindo-sem-camiseta é namorado da minha prima O’snot.<br />
Oh, merda.<br />
45
46<br />
Capítulo 7<br />
Eu nunca me acost<strong>um</strong>arei a ser h<strong>um</strong>ilhada.<br />
— Eu juro Ron, não é minha culpa.<br />
— Você tem falado muitas vezes essas palavras ultimamente, Amy –<br />
diz. — Agora, me explique de novo por que fugiu antes de se encontrar com<br />
Safta e logo em questão de quinze minutos, acaba em cima de <strong>um</strong> garoto. No<br />
meio de <strong>um</strong> monte de feno, nada menos que isso.<br />
Eu tiro <strong>um</strong> pouco da sujeira que está nas minhas unhas, enquanto o<br />
Doador de Esperma está falando muito sério.<br />
— De fato, tecnicamente caí sobre ele — digo, limpando <strong>um</strong>a parte<br />
do meu cabelo que estava com barro. — Na verdade não recordo exatamente<br />
como caí sobre ele.<br />
Estamos sentados no gramado da frente da casa da minha<br />
avó/tio/tia/primos. Ron faz essa coisa novamente de passar as mãos no<br />
cabelo.<br />
Há <strong>um</strong> silêncio interminável. Devo explicar o que aconteceu? Não<br />
tenho medo de admitir que tenho o controle da minha vida.<br />
Não me pergunte o porquê, eu só sei.<br />
— Senti como se todos estivessem me observando e me analisando,<br />
me cansei disso e fugi.<br />
— Beijou o Avi?
47<br />
— Quem é Avi?<br />
Ele me olha com aquela cara de você-deve-estar-brincando.<br />
Levanto-me.<br />
— Não! Por quê? A prima Snotty disse que eu o fiz? Escuta, havia<br />
cachorros me perseguindo...<br />
Olho para baixo, Mutt não tinha se dado conta que meus pés não são<br />
seu pátio particular de diversão.<br />
— <strong>Como</strong> este? – diz.<br />
Sacudo para que saia da minha perna.<br />
— Não. Sim. Bom, parecia com ele, mas eram bem maiores. E, então,<br />
corri e caí em cima do namorado de Snotty.<br />
— Seu nome é O.S.N.O.T. O’snot. É <strong>um</strong> nome bonito.<br />
— Não sei de onde veio.<br />
— Só... apenas lhe dê <strong>um</strong>a oportunidade. Não a julgue antes de<br />
conhecê-la.<br />
Eu realmente gostaria de arg<strong>um</strong>entar, dizer ao DE que foi Snotty que<br />
me odiou antes de conhecer-me, no entanto fico em silêncio. Agora mesmo<br />
vou atribuir a minha falta de capacidade de arg<strong>um</strong>entar à privação do sono,<br />
porque normalmente estou pronta para <strong>um</strong>a boa guerra verbal.<br />
— Ok — digo.<br />
— E pare de chamá-la de Snotty.<br />
Deus, você dá ao cara <strong>um</strong> pouco e como <strong>um</strong> aspirador ele quer<br />
absorver toda a sujeira, não só os pequenos pedaços de pano.<br />
— Ok. Onde está Safta? Estou pronta pra conhecê-la agora, já que<br />
não tem mais expectadores.
48<br />
— Está descansando no seu quarto. Sem expectadores, eu prometo.<br />
Este deveria ser o momento que eu ganho <strong>um</strong> abraço do DE.<br />
Entretanto, me sentiria estranha porque não o abraço em anos. O DE se<br />
levanta e eu o sigo pra dentro de casa. Uma vez que entramos, o cheiro de<br />
pão recém saído do forno está em toda a cozinha fazendo com que meu<br />
estômago ronque.<br />
— Venha comer — Dodo Yucky diz. Ela perdeu <strong>um</strong> pouco do seu<br />
caráter alegre. Será porque pensa que beijei o namorado de O.S.N.O.T?<br />
comer.<br />
— Obrigada, mas não estou com fome. – Estou muito nervosa pra<br />
Ron me leva a <strong>um</strong>a pequena habitação de madeira na parte de trás<br />
da casa, eu dou <strong>um</strong>a olhada através da porta.<br />
Safta está deitada na sua cama. Quando me vê entrar, se senta.<br />
Respiro fundo quando a porta se fecha atrás de mim. O quarto é pequeno, o<br />
piso é como se fosse de telhas, e as paredes de cimento branco estão<br />
marcadas. As cortinas foram fechadas, então estava <strong>um</strong> pouco escuro. No<br />
entanto foi essa a maneira que eu queria, porque não quis que o mundo<br />
ficasse olhando secretamente minha conversa.<br />
— Oi, Safta. Sou Amy – digo. Minha voz se quebra enquanto digo e<br />
me sinto <strong>um</strong> pouco tonta. Ela concorda com a cabeça e acaricia o espaço ao<br />
lado dela na cama.<br />
— Venha aqui, Amy. Sente ao meu lado.<br />
Dou pequenos passos lentos até sua cama. Quando alcanço,<br />
cuidadosamente me sento na beirada. Para minha surpresa, ela pega minha<br />
mão entre as suas.<br />
— Está realmente doente? – pergunto timidamente.<br />
— Vou ficar bem. Você sabe que os médicos gostam de fazer <strong>um</strong><br />
grande alarde por nada.
— Ron pensa que está muito doente — digo, e logo quero empurrar<br />
essas palavras de volta para minha boca.<br />
Ela nega com a cabeça.<br />
— Necessitam examinar a cap do seu pai. Isto significa “cabeça” em<br />
Yiddish. Imagine, manter distante de mim minha neta durante dezesseis<br />
anos.<br />
— Sim — falo, a apoiando. Imediatamente gosto da minha Safta.<br />
— <strong>Como</strong> é sua mãe? — pergunta, mudando de assunto.<br />
<strong>Como</strong> descrever minha mãe?<br />
— Ela é bonita, para <strong>um</strong>a mãe – digo — E tem <strong>um</strong> trabalho onde<br />
ganha bem. Não tem muitos amigos, por sempre estar trabalhando.<br />
Estou observando como Safta recebe isto.<br />
— E o que me diz de você?<br />
— Vou bem na escola, acredite. O nome da minha melhor amiga é<br />
Jessica... é judia — falo para fazer <strong>um</strong>a conexão com Safta em relação à<br />
religião. — Gosto de jogar tênis, esqui, e ir às compras.<br />
Assente com a cabeça.<br />
— Vou gostar de conhecê-la Amy. Aparenta ser <strong>um</strong>a garota muito<br />
enérgica e interessante.<br />
— Devo adiantar que não tenho <strong>um</strong>a atitude muito positiva – digo<br />
nervosa enquanto mordo meu lábio inferior. Quero dizer, a menina que<br />
imagina irá s<strong>um</strong>ir mais cedo ou mais tarde, assim tinha que mostrar<br />
diretamente a ela.<br />
— Talvez essa viagem sirva para mudar isso.<br />
Duvido muito, mas não digo.<br />
49
— Acredito que sim – Apenas para fazê-la crer que esta viagem<br />
poderia milagrosamente mudar minha visão da vida.<br />
— Eu era como você na sua idade – diz.<br />
— <strong>Como</strong> assim? Era ilegítima, também?<br />
— Não – diz ela, segurando minha mão — Porém minha família<br />
passou por momentos difíceis e não tivemos <strong>um</strong>a casa por alguns anos.<br />
— Onde viveram?<br />
— Na praia. Já faz muito tempo. A vida te surpreende quando menos<br />
espera.<br />
Essa informação ainda está em processamento no meu cérebro,<br />
quando Safta me diz para ir relaxar e desfazer as malas. Eu sorrio como se<br />
tivesse sido minha avó desde sempre. Não posso continuar culpando-a por<br />
não estar para mim nos últimos dezesseis anos. A pobre mulher nem sequer<br />
sabia da minha existência.<br />
— Onde está minha mala? — pergunto a Ron depois da minha<br />
conversa il<strong>um</strong>inadora com Safta.<br />
— No quarto de O’snot – diz.<br />
Talvez não tenha escutado bem. Ele não podia ter dito isso.<br />
— Está brincando, não é?<br />
— Existem poucos quartos aqui – explica o DE — Irá dormir no<br />
quarto de O’snot. E eu ficarei no sofá.<br />
— E onde fica o menino?<br />
— Matan? Dorme em <strong>um</strong>a cama no quarto dos seus pais.<br />
Estava a ponto de sugerir dormir no chão, mas vi três formigas no<br />
azulejo. Asqueroso. E quando olho Doda Yucky, tem esse olhar patético no<br />
50
seu rosto como se ela fosse ganhar na loteria se meu medidor de felicidade<br />
alcançasse certo nível.<br />
Dou-lhe <strong>um</strong> pequeno sorriso e ao que parece funciona porque se<br />
dirige à cozinha cantando <strong>um</strong>a canção alegre.<br />
Agora falando sério, se há <strong>um</strong>a coisa que <strong>um</strong>a adolescente americana<br />
necessita, é privacidade. Eu posso pedir a O’snot que saia do quarto? Sim, de<br />
fato é seu quarto, assim, não creio. Graças a Deus eu não tenho <strong>um</strong>a gêmea.<br />
Por exemplo, existem estas gêmeas na minha escola, Marlene e Darlene, elas<br />
não só tem que compartilhar o mesmo quarto, como também o dividem com<br />
sua irmã mais velha, Charlene. Não pergunte.<br />
O DE me leva a <strong>um</strong> quarto na parte de trás da casa. Caminho pro<br />
quarto enquanto Snotty está maquiando-se na sua cama. Ela sabia que<br />
estava ali, mas fingiu, como se não tivesse me reconhecido.<br />
O Doador de Esperma fica ao meu lado.<br />
— Precisa de ajuda?<br />
— Não, estou bem – respondo.<br />
Ele toma isso como <strong>um</strong> sinal para sair. Gostaria que tivesse ficado.<br />
Apenas para passar por essa barreira entre mim e Snotty.<br />
— Olhe, sinto muito pelo seu namorado – digo.<br />
Ela levanta a cabeça e me olha e eu vejo como está exagerada a<br />
maquiagem nos seus olhos. É como se tivesse delineado seus olhos com<br />
carvão e agora minha prima parece ter vinte anos ao invés de parecer <strong>um</strong>a<br />
adolescente. Que idade têm, de todo modo? Poderia utilizar alguns conselhos<br />
sobre aplicação de maquiagem.<br />
Um dos clientes de mamãe é de <strong>um</strong>a empresa de cosméticos. De fato<br />
me usaram em <strong>um</strong> dos lançamentos da sua linha para adolescentes. Aprendi<br />
muito sobre como a maquiagem deve ressaltar suas melhores características<br />
e não parecer Gloppy e escura (como Snotty). Depois que minha foto<br />
apareceu na maioria das revistas para adolescentes, meu grupo me apelidou<br />
de guru da maquiagem.<br />
51
52<br />
Coloco minha mala na cama, supondo que é aquela que seria minha<br />
pelos próximos três meses e escolho alg<strong>um</strong>a roupa para trocar-me por algo<br />
que não esteja coberto de barro e palha.<br />
— Avi não é meu namorado.<br />
Não estava segura se foi Snotty que falou, ou se minha imaginação<br />
estava brincando comigo.<br />
Encaro minha prima.<br />
— O quê?<br />
Ela olha com seus olhos de carvão na minha direção.<br />
— Eu não tenho namorado.<br />
Escolho <strong>um</strong> par de shorts curtos roxos iguais à cor da minha mala. A<br />
palavra “CADELA” está escrita na parte da frente com grandes letras<br />
brancas. Jessica me deu esses shorts em razão do meu aniversário como <strong>um</strong>a<br />
brincadeira, junto com <strong>um</strong>a tornozeleira que não era <strong>um</strong>a brincadeira.<br />
Nunca pensei que alg<strong>um</strong>a vez os colocaria de novo, mas também nunca<br />
pensei que estaria em <strong>um</strong> sítio em cima de <strong>um</strong>a montanha no meio de <strong>um</strong>a<br />
zona de guerra.<br />
No entanto, para ser honesta comigo mesma, Israel na realidade não<br />
se parece como <strong>um</strong>a zona de guerra. Bom, exceto pelos guardas fortemente<br />
armados no aeroporto e o campo de minas que eu quase pisei.<br />
Olho para baixo, vendo meus shorts curtos. Acreditava que ninguém<br />
aqui seria capaz de falar inglês, assim o levei. Estive tentada a oferecê-lo a<br />
Snotty em vez de perguntar.<br />
— Avi tem <strong>um</strong>a namorada?<br />
Bem, me desculpe pela minha grosseria, acabei de “meter os pés pela<br />
cabeça”. Não me importo se esse garoto tem <strong>um</strong>a namorada ou não, mas<br />
aqui estou eu perguntando a Snotty sobre ele.
53<br />
ir.<br />
Às vezes minha boca vai n<strong>um</strong>a direção, a qual não tinha intenção de<br />
O pior é que minha prima faz caso omisso da minha pergunta. Assim<br />
mesmo que eu não tivesse intenção de fazer essa pergunta, estou mais<br />
curiosa do que nunca pra saber a resposta. Porém nunca lhe daria a<br />
satisfação de perguntar sobre Avi duas vezes. Ela havia inventado falsos<br />
r<strong>um</strong>ores sobre eu estar em cima de <strong>um</strong> garoto. Seria <strong>um</strong> porre se realmente<br />
pensasse que me interessava se tinha namorada.<br />
Coloco minha roupa sobre a cama, e penso no ÚNICO banheiro de<br />
toda a casa. Estou tratando de não pensar sobre o que acontecerá nos<br />
próximos três meses em <strong>um</strong>a casa com sete pessoas e apenas <strong>um</strong> banheiro.<br />
Assustador, não? Em casa temos três banheiros... E só eu e minha mãe<br />
vivemos ali (junto com Marc com “c” às vezes).<br />
Tenho <strong>um</strong>a amiga, Emily. Ela está obcecada com o cheiro de TUDO.<br />
<strong>Como</strong> quando você cheira a comida antes de colocá-la na boca. Eu odeio<br />
almoçar com ela porque cada vez que escuto seus sons para comer, me irrito<br />
extremamente. E eu não gosto de nada quando estou irritada, exceto talvez<br />
Jessica. Ao entrar no banheiro, meu medidor indicava leituras baixas de<br />
qualquer cheiro estranho que emanava do meu próprio corpo. Cara, Emily<br />
terá <strong>um</strong> dia de campo comigo.<br />
Estou TÃO ansiosa para conseguir ficar limpa. Se pensar no tempo<br />
que passou desde que eu tomei <strong>um</strong> banho, dá pra ficar tonta. Fecho a porta<br />
do banheiro e olho para a maçaneta buscando <strong>um</strong>a fechadura. O problema é<br />
que não existe <strong>um</strong>a. Apenas <strong>um</strong> buraco, como se houvesse <strong>um</strong> buraco no<br />
tempo.<br />
Isso não é legal. Há sete pessoas que vivem nessa casa e não tem<br />
fechadura na porta do banheiro. E a maldita porta tem <strong>um</strong>a rachadura onde<br />
deveria estar a fechadura.<br />
Tenho que ir para a cama rápido antes que este dia piore. Não queria<br />
que existisse a visão de eu ficar nua, então fecho a cortina e tiro minha<br />
roupa. Fico imaginando como ligar a água. Afortunadamente, <strong>um</strong> pouco de<br />
água quente sai forte e rápido. Não posso deixar escapar <strong>um</strong> gemido da<br />
minha boca. As duchas de água quente são as melhores. Estou tão cansada<br />
que apenas suporto, assim rapidamente me lavo.
Depois do banho vou em direção ao quarto, perguntando-me porque<br />
não levei a muda de roupa comigo ao banheiro-que-não-fecha. Estou segura<br />
que não quero me trocar na frente de Snotty. Enquanto penso em como<br />
colocar meu pijama, envolvo <strong>um</strong>a toalha firmemente ao meu redor.<br />
Não quero fazer contato visual com ela, porque quero evitar ter que<br />
fazer gestos faciais alegres, como <strong>um</strong> sorriso. Não tinha nenh<strong>um</strong> gesto<br />
positivo, pelo menos por hoje. De fato, todos meus gestos positivos amanhã<br />
também estarão esgotados.<br />
Então eu olho para o chão quando entro no quarto, fecho a porta e<br />
vou diretamente para a mala. Sabia que Snotty se encontrava no quarto,<br />
podia ouvir sua respiração. Pego <strong>um</strong>a camiseta e a roupa íntima da minha<br />
bolsa. Não poderia voltar ao banheiro porque seria <strong>um</strong>a grande idiota por<br />
estar envergonhada de me trocar na frente dela ou podia suportar e me<br />
trocar aqui, de costas.<br />
Deixo cair a toalha e coloco minha roupa íntima, depois os shorts<br />
curtos que dizem “CADELA”. Quando pego minha camiseta branca, a porta<br />
abre. Rapidamente cubro com minha camiseta meus grandes seios e me<br />
preparo para gritar com o intruso. O intruso suponho que não seja outro<br />
além do DE.<br />
— Se importa? – digo. No entanto a pessoa que entra no quarto não é<br />
DE. É Snotty. O que significa que tem alguém mais na sua cama. Viro minha<br />
cabeça e encontro Avi sentado ali.<br />
— Aaahhhh! – grito com toda a força dos meus pulmões.<br />
Avi acaba de escutar <strong>um</strong> grande grito protagonizado sinceramente.<br />
Desafortunadamente, meu grito apenas avisa o DE e o tio Chime, que entram<br />
no quarto. Os olhos do DE vão de Avi pra mim, meio nua com meus shorts<br />
que dizem “CADELA”.<br />
54<br />
olhos.<br />
— O que está acontecendo aqui? – grita DE, acusando-me com os<br />
Com certeza Avi me viu nua... minha bunda, meus seios, minhas<br />
coxas, minhas celulites. Minha língua está em estado de choque, igual o resto<br />
de mim. Mesmo se pudesse falar, não saberia o que dizer.
55<br />
Salvo que estou cheirando bem.<br />
Olho Snotty, que tem <strong>um</strong> pequeno sorriso de satisfação no seu rosto.<br />
Ela é <strong>um</strong>a ratazana, não há dúvidas sobre isso.<br />
Tio Chime olha acusadoramente para Ron. Sei que não disse nada,<br />
mas me sinto horrível, de verdade. Pelo canto dos meus olhos me dou conta<br />
que Avi se levantou. Ele diz algo em hebraico para DE que não posso<br />
entender.<br />
Ron lhe responde com irritação.<br />
Snotty começa a discutir com Ron.<br />
Tio Chime está tão reto como <strong>um</strong> soldado, bloqueando a porta, com<br />
as mãos na cintura. E eu só estou aqui em pé, meio nua. Empurro tio Chime e<br />
corro para o banheiro. Depois de colocar a camiseta, ainda escuto as altas<br />
conversas que vem do quarto de Snotty.<br />
Sento na borda da banheira até que parem de discutir.<br />
Se este é meu começo em Israel, tenho medo de descobrir o que<br />
acontecerá nos próximos três meses aqui.
56<br />
Capítulo 8<br />
Você pode atrair abelhas com mel, mas porque você<br />
gostaria de fazer isso?<br />
A desculpa do fuso horário serve para enganar Doador de Esperma e<br />
continuar sonhando no meu segundo dia em Israel, com o benefício<br />
adicional, consigo dormir quase o dia inteiro. Porém agora está bem tarde e<br />
já estou totalmente descansada.<br />
Depois de comer alg<strong>um</strong>a coisa, coloco minha roupa de corrida pego o<br />
meu Ipod e vou pra fora. Enquanto subo a estrada, vejo Safta sentada n<strong>um</strong>a<br />
cadeira à beira da montanha. Quando me vê, move as mãos para me<br />
c<strong>um</strong>primentar.<br />
Ando pelo caminho de terra e paro ao lado dela, olhando as<br />
montanhas, o lago ao lado, e as montanhas ao longe, me fazendo perder o<br />
fôlego.<br />
— Chicago é tão reta quanto... – Estou a ponto de dizer “Snotty”, mas<br />
não digo. Ao invés falo outra coisa.<br />
— Não tem montanha onde vivo. Eu acho que é por isso que fazemos<br />
arranha-céus, são como as montanhas de Chicago.<br />
— Nunca estive em Chigaco. – diz Safta.<br />
— Bem, você tem que ir me visitar. Poderia te levar à Sears tower 17 .<br />
Pode ver quatro estados do último andar. É totalmente genial. E tem também<br />
o Lago Michigan. É tão largo que não pode ver através dele.<br />
Emociono-me só de pensar em dar <strong>um</strong> passeio com ela em Chicago<br />
quando for me visitar. Ela vai amar o parque Millenni<strong>um</strong>, onde pode ver<br />
várias pessoas e almoçar no parque justo no centro da cidade. Aposto que<br />
17 É <strong>um</strong> arranha-céu localizado em Chicago, nos Estados Unidos, sendo o mais alto edifício da<br />
América do Norte desde 1974, quando foi inaugurado.<br />
http://www.eluniversal.com.mx/img/2009/07/Nue/torreSears.jpg
gostaria do instituto de Arte de Chicago e o Museu de Ciência e Indústria. O<br />
museu tem exposições geniais. Minha favorita é do bebê morto.<br />
Na verdade é chamado de exibição Neonatal, mas a chamo do que ela<br />
é. É muito real, bebês mortos em todas as etapas, todos envolvidos em<br />
formol e outros líquidos. Têm por volta de trinta embriões e fetos que vão de<br />
<strong>um</strong>a semana de vida até nove meses. Ainda mais, mostram embriões de<br />
gêmeos idênticos. É a coisa mais genial que já vi.<br />
Sim, isso seria adicionado à lista quando Safta me visitar.<br />
Eu olho, tentando aproveitar o momento.<br />
— Sinto como se pudesse olhar o país inteiro daqui. — No entanto,<br />
logo penso sobre os shoppings que estão tão longe daqui – Mas aqui é tão<br />
longe de tudo.<br />
— É <strong>um</strong>a garota da cidade, não?<br />
— Do começo ao fim. Dê-me <strong>um</strong>a bolsa Kate Spade e <strong>um</strong> jeans Lucky<br />
e sou <strong>um</strong>a garota feliz.<br />
Ela ri, o som é suave e cálido no ar.<br />
— Amo estar aqui. Longe de ruídos, longe da multidão. É o lugar<br />
mais perfeito em todo o mundo para <strong>um</strong>a mulher velha como eu. Também,<br />
na minha idade não preciso de <strong>um</strong>a bolsa Kate Spades e jeans Lucky.<br />
— Estou segura que foi <strong>um</strong>a mãe quente quando era adolescente –<br />
digo, e imediatamente desejo não ter falado estas estúpidas palavras. Falar<br />
com ela como se fosse <strong>um</strong>a das minhas amigas é algo estúpido de fazer.<br />
— Me casei com seu avô quando tinha dezoito anos.<br />
— Foi amor à primeira vista?<br />
57<br />
flores.<br />
— Não. Não, suportava nem olhá-lo. Até o dia em que me levou<br />
Flores? É o truque mais velho do livro.<br />
— Então te levou alg<strong>um</strong>as rosas e se apaixonou? É <strong>um</strong>a linda<br />
história, só que algo chato.<br />
Safta segurou minhas mãos.
58<br />
— Não, motek me levou por toda a floresta e o pobre homem era<br />
alérgico a pólen.<br />
— Wow. — Estaria vendida se <strong>um</strong> homem me levasse à minha<br />
própria loja de Abercombrie&Fitch. Agora, isso deveria ser amor verdadeiro.<br />
Safta começou a ficar de pé, então agarrei seu cotovelo para ajudá-la.<br />
Mesmo quando me disse que estava bem, tive <strong>um</strong> sentimento que não estou<br />
sabendo toda a história.<br />
— Vou me deitar — me diz quando para — Vá e explore o moshav,<br />
seu pai já deve estar chegando com a comida.<br />
Fico observando-a enquanto toma o caminho de casa. Respirando<br />
fundo, me dirijo à entrada do moshav. É <strong>um</strong> sinuoso caminho para correr.<br />
Enquanto chego com segurança a casa, <strong>um</strong> garoto enfia a cabeça pra fora da<br />
janela.<br />
— Vou correr — digo.<br />
Ele assente com a cabeça e abre a porta. Quando começo a correr, o<br />
ar fresco nos meus pulmões me dá energia. A vista das montanhas é como se<br />
tivesse saído de <strong>um</strong> filme, e a música nos meus ouvidos me lembram de casa.<br />
Eu estou no céu quando meus passos se sintonizam com a canção que estou<br />
escutando.<br />
Se apenas Mitch pudesse me ver agora, correndo abaixo de <strong>um</strong>a<br />
montanha. É <strong>um</strong> louco por natureza. Minha melhor amiga Jessica também é.<br />
Ela provavelmente estaria com inveja de mim.<br />
Enquanto penso em Mitch e Jess, passo por uns sacos brancos.<br />
Depois de passar por eles me dou conta do que eram. Colmeias.<br />
Que diabos estão fazendo as colmeias ao lado da estrada?<br />
Penso que estou segura, até ver que <strong>um</strong>a das abelhas está me<br />
seguindo.<br />
— Vá embora — digo correndo mais rápido. A abelha me segue, e<br />
está fazendo círculos ao meu redor.<br />
Eu paro tão quieta como posso, assim como os guardas de Londres<br />
que ficam do lado de fora dos palácios, esperando que vá embora. No<br />
entanto ela não vai, isso só atrai outra abelha. E outra. E outra. Sinto como se
o tempo tivesse parado, exceto porque meu Ipod segue tocando nos meus<br />
ouvidos.<br />
— Socorro! — grito. Estou movendo minhas mãos como <strong>um</strong>a mulher<br />
louca, tratando de manter as abelhas longe de mim. Desagradável, penso<br />
quando <strong>um</strong>a delas entra no meu cabelo.<br />
Estou correndo.<br />
Movendo minhas mãos.<br />
E movendo minha cabeça.<br />
Quando vejo <strong>um</strong> carro vindo pela estrada, estou esperando que seja<br />
Ron. Porém como estou movendo minha cabeça de <strong>um</strong> lado para outro não<br />
consigo ver quem é. O carro me passa, então ouço o carro frear. Corro para<br />
onde o carro está, até que vejo quem sai do lado do condutor.<br />
Avi.<br />
A última pessoa do mundo que queria ver.<br />
— Entra — me diz abrindo a porta do passageiro.<br />
Tenho duas opções: entrar no carro com <strong>um</strong> idiota que me viu quase<br />
nua ou ser picada por sete abelhas. Chame-me de louca, estúpida, mas eu<br />
escolho a opção número dois.<br />
— Vai pro inferno — digo enquanto corro para baixo pela montanha.<br />
Mais ou menos depois de três quartos do caminho, as abelhas<br />
finalmente me deixam só.<br />
Por alg<strong>um</strong> milagre, consegui evitar ser picada. No entanto agora<br />
estou presa no meio da montanha. E eu não quero voltar e passar pelas<br />
colmeias novamente. Tenho <strong>um</strong>a ideia brilhante. Vou esperar o Doador de<br />
Esperma. Safta disse que chegaria logo.<br />
Assim que espero. E espero.<br />
Quarenta e cinco minutos e continuo esperando.<br />
Juro que estas férias estão sendo <strong>um</strong> total desastre. Se estivesse em<br />
minha casa estaria jogando tênis e saindo com meus amigos. Demora <strong>um</strong>a<br />
hora antes que <strong>um</strong> carro passe na estrada. Reconheço que é Doo-Doo. Movo<br />
meus braços no ar como <strong>um</strong> desses tipos que controlam o tráfico, para fazê-<br />
59
lo parar. Há <strong>um</strong>a garota dentro do carro com ele. A garota coloca a cabeça<br />
pra fora da janela.<br />
— Precisa de <strong>um</strong>a carona?<br />
— Uh, sim.<br />
— Entra.<br />
Doo-Doo me apresenta a garota enquanto entro no banco de trás.<br />
Seu nome é Ofra, e também vive em Moshav. Inclino-me para trás e desfruto<br />
o ar condicionado do carro.<br />
— O’Dead disse que você vai à praia com os outros esta noite — Ofra<br />
se vira e me encara — É <strong>um</strong>a ocasião especial.<br />
— Seu aniversário? – adivinho.<br />
— Não. Moron vai para o exército.<br />
Isso é algo que tenha que se comemorar? Ofra parece emocionada<br />
quando diz.<br />
— Tem que levar algo seu para dar a ele, e logo oferecer <strong>um</strong><br />
conselho. É <strong>um</strong> ritual do Moshav.<br />
Ritual?<br />
Creio que sou alérgica a rituais.<br />
60
61<br />
Capítulo 9<br />
Antes de falar, assegure-se de saber o que diz.<br />
A praia que vamos é arenosa, e está rodeada por <strong>um</strong> lago que<br />
segundo me disseram se chama Kineret. Somos sete essa noite: Ofra, Snotty,<br />
Avi, Moron, Doo-Doo, O’Dead e eu. Os garotos fizeram <strong>um</strong>a grande fogueira e<br />
estamos sentados ao redor dela.<br />
Avi guia Moron para <strong>um</strong>a cadeira que está colocada na areia. Logo<br />
tira <strong>um</strong>a camiseta do bolso com letras hebraicas escritas nela. Quando a<br />
mostra, todos riem. Exceto eu, claro, porque não tenho a mínima ideia do<br />
que está escrito na camiseta.<br />
— O que diz? – pergunto a Ofra.<br />
— Onde é o banheiro? – fala.<br />
areia.<br />
mim.<br />
— Não sei – digo — Suponho que vai ter que esperar ou urinar na<br />
Todos riem ainda mais forte. E me dou conta que estão rindo de<br />
— O quê? — pergunto.<br />
Ofra me dá <strong>um</strong> tapa nas costas.<br />
— Não estava te perguntando aonde é o banheiro, estava te dizendo<br />
o que é que diz a camiseta.<br />
Oh, Deus.<br />
— Avi, fale em português para que a Amy possa entender — diz Ofra.<br />
Ele fica parado ali, totalmente intimidante.
62<br />
— Beseder 18 — diz relutante — Meu amigo aqui presente, Moron, se<br />
perdeu em muitas ocasiões. Seu senso de lugar é lendário, se não o pior.<br />
Assim com esta camiseta, pode não ser capaz de encontrar o caminho de<br />
casa, mas será capaz de encontrar o sheruteem mais próximo. — Então me<br />
olha e diz — Isso significa banheiro.<br />
Todos riem e aplaudem.<br />
— E meu conselho é.. Não flerte com nenh<strong>um</strong>a das instrutoras<br />
femininas. Todas elas têm acesso a <strong>um</strong>a arma maior que a sua.<br />
Isso entretém a todos. Ass<strong>um</strong>o que Moron tem <strong>um</strong>a reputação por<br />
flertar com garotas. Depois que Avi se senta, Ofra e Snotty param na frente<br />
de Moron para dar <strong>um</strong> presente que está embrulhado. Ele o abre e segura<br />
<strong>um</strong> par de shorts tipo boxer na frente de todos. Na frente é todo branco, mas<br />
atrás tem <strong>um</strong> mapa de Israel desenhado.<br />
— Desta maneira — diz Snotty — Quando se perder poderá<br />
encontrar seu caminho de volta para casa.<br />
rindo.<br />
— Sim, mas ele precisará ficar nu para ver o mapa – diz Doo-Doo,<br />
Eu rio também. Imaginando Moron ocioso no meio do deserto,<br />
perdido, vestindo <strong>um</strong>a camiseta que diz Onde está o banheiro? Enquanto<br />
está nu da cintura pra baixo examinando o mapa na sua cueca, é bastante<br />
hilário.<br />
Ofra se senta em <strong>um</strong>a das pernas de Moron e Snotty na outra.<br />
— Nosso conselho é... Deixe-nos raspar sua cabeça ao invés de<br />
alguém no exército fazer isso.<br />
Vejo Ofra tirando <strong>um</strong> barbeador do seu bolso. Moron sorri nervoso<br />
para nós. Para ser honesta, tem <strong>um</strong> cabelo grande. É marrom arenoso, quase<br />
chegando aos seus ombros e é realmente fino. Permitirá que raspem?<br />
Ofra liga o barbeador, logo Snotty se move e fica atrás dele.<br />
— Tire a camiseta – sugere Doo-Doo.<br />
Moron tira a camiseta sobre a cabeça e logo levanta a cabeça.<br />
18 Significa Ok em hebraico.
63<br />
— Sejam gentis comigo, garotas – brinca.<br />
— Fique com as calças – brinca Ofra e todos, inclusive eu, riem.<br />
Snotty faz a primeira linha justa no meio da cabeça de Moron quando<br />
ele fecha seus olhos. O’dead tira fotos quando Snotty termina com <strong>um</strong>a linha.<br />
Logo Ofra toma o barbeador e faz outra linha. Todos estão passando <strong>um</strong> bom<br />
momento. Até eu, tenho que admitir.<br />
—Dê <strong>um</strong>a oportunidade a Amy – sugere Doo-Doo, logo me dá <strong>um</strong><br />
empurrão de animo.<br />
Nego com a cabeça.<br />
— Não sou muito boa com barbeadores – digo. Especialmente não<br />
sou bom com os elétricos.<br />
Ofra e Snotty terminam de raspar a cabeça de Moron. Divertem-se<br />
fazendo desenhos em sua cabeça enquanto fazem o trabalho.<br />
Depois de terminado, O’Dead se move pro lado de Moron.<br />
— Temos sido amigos desde os três anos, e sei o quanto tem medo<br />
do escuro. –O’Dead pega <strong>um</strong>a pequena lanterna. – Assim, agora, quando<br />
estiver no deserto Negev, não terá nada a temer.<br />
— Exceto as serpentes venenosas — diz Doo-Doo, fazendo com que<br />
todos riam novamente.<br />
— Contanto que sempre tenham mulheres na minha unidade — diz<br />
Moron — Não precisarei de nenh<strong>um</strong>a luz, se é que me entende.<br />
— O que nos leva ao meu presente — diz Doo-Doo, que logo tira <strong>um</strong><br />
pequeno urso cor de rosa. — Isto é para você dormir com ele e abraçá-lo<br />
quando se sentir solitário à noite e necessitar alguém para abraçar.<br />
— Nosso conselho é... Quando dormir armado, tenha certeza que a<br />
arma esteja travada.<br />
Moron assente com a cabeça.<br />
— Bom conselho, garotos.<br />
— Agora é a vez da Amy — diz Ofra.
Olho para Snotty. A garota nem sequer me olha. Logo volto para Ofra.<br />
— Em frente — diz me oferecendo a mão para ficar de pé.<br />
Caminho nervosa até Moron, sustentando <strong>um</strong> pedaço de pano.<br />
— É <strong>um</strong>a bandana – explico — Com <strong>um</strong> signo de paz nela.<br />
Ele a pega da minha mão e observa.<br />
— Todah, obrigado.<br />
— Disseram-me que deveria lhe dar <strong>um</strong> conselho – digo. Logo limpo<br />
minha garganta. Todos estão me olhando, até Snotty. Sinto que estou<br />
suando. Nem fale de pressionada.<br />
— Meu conselho é...<br />
Juro que tinha algo para dizer, mas esqueci. Minha mente está em<br />
branco. Merda. Olho para longe, onde o sol está refletindo na água. A<br />
primeira coisa que penso é o que falo.<br />
— Não nade depois de comer.<br />
Oh meu Deus. Não acredito que acabei de dizer isso. O garoto vai pro<br />
deserto pra seu treinamento básico. Quais são as probabilidades de que irá<br />
nadar no deserto em pleno treinamento militar?<br />
Meu conselho é recebido com silêncio.<br />
— Isto foi muito... Profundo, Amy – diz Snotty, claramente brincando<br />
com a minha cara.<br />
— Está brincando?<br />
Se soubesse como voltar ao Moshav, iria agora mesmo. Porém, não<br />
posso, assim me sento e trato de me esconder o melhor possível.<br />
— Bom, suponho que deveria dizer algo – diz Moron, colocando-se<br />
de pé — Obrigado por essa festa, pelos presentes e os conselhos. A amizade<br />
de vocês significa muito para mim. Agora, se supõe que vocês têm que me<br />
jogar no Kineret, mas nem sequer tentem.<br />
— Você tem que se molhar – diz Avi como se fosse <strong>um</strong> fato,<br />
apontando para o lago.<br />
64
65<br />
Doo-Doo e O’Dead estão prontos para enfrentar Avi enquanto ele<br />
está perseguindo Moron pela praia. Assombro-me quando vejo que o<br />
alcançam e o jogam na água, salpicando muita água. Moron está<br />
completamente molhado, mas não está bravo. Eu estaria se meus amigos me<br />
jogassem, com roupa e tudo, dentro de <strong>um</strong> lago. No entanto ele ri junto com<br />
os outros.<br />
Ofra oferece a mão para ajudar Moron a sair da água, mas ele pega<br />
seu braço e a puxa para dentro também. Snotty se une ao grupo. Observo<br />
como envolve seus braços ao redor de Avi dentro do lago. Que seja. Estas<br />
pessoas não sabem que para nadar precisam de roupas de banho ao invés de<br />
roupa normal? Claro que não estou com inveja de que eles estejam na água,<br />
rindo e divertindo-se. Estou absolutamente feliz de estar aqui sozinha.<br />
— Amy, venha com a gente — Moron me chama.<br />
— Sim — diz Ofra — A água está ótima.<br />
— Não, obrigada — digo.<br />
A primeira a sair do lago é minha prima. Para em frente à fogueira, se<br />
aquecendo. Trato de evitar contato visual, com medo de que minha boca me<br />
meta em problemas.<br />
No entanto deveria tentar conhecê-la como disse Ron. Apesar de ter<br />
sido rude, poderia não saber o quanto sou grandiosa e divertida. Suponho<br />
que não dei <strong>um</strong>a oportunidade de me conhecer. Tratei de tentar corrigir<br />
alg<strong>um</strong>as coisas em primeiro lugar.<br />
— Osnat, de verdade gostei de conhecer seus amigos — digo,<br />
lembrando como Ron disse que pronunciava seu nome.<br />
Juro que mereço <strong>um</strong>a medalha por ser tão amável. Ela<br />
provavelmente irá dizer que está encantada que tenha tentado criar laços<br />
entre nós. Provavelmente no final do verão, ela será a irmã que nunca tive.<br />
Meus pensamentos são afastados quando a vejo me olhando, balançando seu<br />
cabelo.<br />
— Só se lembre Amy. São meus amigos, não seus.<br />
E desta maneira volta a ser a mesma Snotty.
66<br />
Capítulo 10<br />
Às vezes temos que demonstrar aos outros que somos<br />
muito mais fortes do que na realidade.<br />
Estou em Israel há três semanas até agora. Felizmente sou capaz de<br />
evitar Snotty e Avi. Isso significa que estou passando muito tempo em casa<br />
com Safta, que é muito boa comigo.<br />
Ela me contou histórias sobre quando era criança aqui em Israel e<br />
sobre meu avô, que morreu antes que eu nascesse. Também me disse que<br />
seus pais escaparam da Alemanha durante Segunda Guerra Mundial.<br />
Aprender sobre minha extensa família tem aberto meus olhos pra outro<br />
mundo.<br />
No entanto, enquanto eu acordo <strong>um</strong>a manhã, Ron me diz<br />
alegremente.<br />
— Acorde e brilhe dorminhoca! — Só quero voltar a dormir.<br />
Que hora é, de todo modo?<br />
As palavras do DE giram ao redor da minha cabeça como <strong>um</strong>a<br />
daquelas abelhas que não queriam me deixar sozinha. Olho de relance pro<br />
meu relógio.<br />
— Seis e meia! — digo com <strong>um</strong>a voz vacilante. — Por favor, tem que<br />
haver <strong>um</strong>a boa razão para que esteja me acordando antes que o brilho do sol<br />
atravesse a janela.<br />
Agora, sei que estou de mau h<strong>um</strong>or, mas não sou <strong>um</strong>a madrugadora.<br />
Nunca fui, nunca serei. Na minha opinião, seis e meia da manhã nem pode<br />
ser considerado manhã, acredito que continua sendo o meio da noite.
— Amy, temos estado aqui há alg<strong>um</strong> tempo e te deixei sozinha. Se<br />
continuar dormindo todo o dia, nunca superará o fuso horário. Além do que,<br />
existe trabalho para fazer por aqui e todos trabalham. Quero que ao menos<br />
atue como minha filha e me ajude.<br />
Sento-me e digo.<br />
— Escute, ainda estou cansada e de mau h<strong>um</strong>or. Só volte hein,<br />
digamos daqui a alg<strong>um</strong>as horas e podemos discutir qualquer coisa que<br />
deseje.<br />
— Sempre está cansada e de mau h<strong>um</strong>or, e precisa sair da cama para<br />
que Yucky possa lavar os lençóis. Provavelmente tem algo crescendo sobre<br />
eles.<br />
— Muito engraçado.<br />
— Prometi ajudar seu tio a vender alg<strong>um</strong>as das ovelhas nestas<br />
semanas. Depois disso quero te mostrar meu país.<br />
— Sim, vamos fazer isso. Daqui a alg<strong>um</strong>as semanas — digo apenas<br />
para que me deixe em paz.<br />
Deito de novo e coloco a coberta por cima da cabeça. Eu só preciso<br />
dormir <strong>um</strong> pouco mais, não trabalhar durante minhas férias ou passear.<br />
Deixo escapar <strong>um</strong> suspiro quando peço para que saia do quarto.<br />
Olhando a cama de Snotty, vejo que está vazia. Provavelmente está na casa<br />
de Avi.<br />
Não que eu seja ci<strong>um</strong>enta, não sou. Apenas não sei por que ele é<br />
amigo dela. Ela pode ser bonita, mas é má.<br />
Ou apenas comigo seja má, o que me faz odiá-la ainda mais.<br />
67<br />
casa.<br />
Fecho meus olhos e trato de pensar em coisas boas, como voltar para<br />
Nada realmente me faria mais feliz agora. É disso que se trata ter<br />
dezesseis anos? Se for assim, posso entender porque os adolescentes se
expressam de muitas maneiras diferentes. Não é como se fôssemos<br />
estúpidos, só estamos tratando de descobrir aonde pertencemos.<br />
Eu? Não pareço encaixar em nenh<strong>um</strong> lugar esses dias. Sou como <strong>um</strong><br />
pino quadrado tentando me encaixar em <strong>um</strong>a sociedade redonda. Agora que<br />
penso mais, não sou quadrada ou redonda. Mais como <strong>um</strong> octógono. E eu<br />
não me encaixo em nenh<strong>um</strong> lugar agora. Eu pensei no que havia dito, mas<br />
meu bonito e super-ditado mundo tem complicado tudo isso. Pergunto-me<br />
como está Mitch sem mim. Será que sente saudades?<br />
Durmo de novo, e quando acordo meu estômago grunhe, então vou<br />
pra cozinha. Todo mundo já saiu e a casa está em completo silêncio.<br />
Olho de relance pra Sofia, que está sentada em <strong>um</strong>a cadeira de<br />
veludo lendo alg<strong>um</strong> livro.<br />
— Boker Tov, Amy — diz com <strong>um</strong>a voz solene enquanto abro a<br />
geladeira procurando alg<strong>um</strong>a coisa.<br />
— Sinto muito — digo. — Não sei o que isso significa.<br />
Finalmente aprendi que shalom significa três coisas: oi, adeus e paz.<br />
Meu conhecimento de hebreu é patético, na melhor hipótese.<br />
— Boker Tov significa “bom dia”.<br />
— Oh. Boker Tov pra você também.<br />
A avó parece estar tranquila esta manhã. Sentarei com ela e<br />
conversarei enquanto tomamos café da manhã, talvez isso a anime. De fato,<br />
vou preparar algo especial pra ela.<br />
Enquanto pego <strong>um</strong> prato de frutas, tomo meu tempo e corto<br />
pequenos pedaços de banana e melão com formas que a mãe de Jessica me<br />
ensinou. Jessica chama essas coisas de delírios das pessoas sobre “prazeres<br />
da multidão”. Um pouco de fruta picada em forma de <strong>um</strong>a cara de palhaço é<br />
<strong>um</strong> deleite ao público definido.<br />
Coloco o prato diante dela em <strong>um</strong>a mesa ao lado.<br />
68
69<br />
— Todah — diz ela.<br />
— De nada — Olho minha obra. — É <strong>um</strong>a cara de palhaço.<br />
— Muito criativo. Gosta de cozinhar?<br />
— Na verdade não. Gosto de comer. Vamos a todos os restaurantes<br />
perto de casa.<br />
— Seu pai não cozinha pra você?<br />
Sei o que está pensando. Essa é <strong>um</strong>a grande oportunidade para eu<br />
dizer a Sofia o que realmente acontece em casa. No entanto, quando olho<br />
seus brilhantes olhos azuis de <strong>um</strong>a velha mulher, me sinto protetora com<br />
ela. Por mais que gostaria que minha avó tivesse vergonha do Doador de<br />
Esperma, não posso lhe dar <strong>um</strong> mal-estar.<br />
— Bom, quando vai me ver faz <strong>um</strong>a grande lasanha — digo, minha<br />
boca movendo-se sem que meu cérebro pense muito tempo nisso. — E sua<br />
picatta de frango 19 é de outro mundo. Até faz muffins de blueberry assados<br />
para mim nas manhãs de domingo.<br />
— Picatta de frango, huh? — diz.<br />
Oh, merda. Ela está me olhando. Provavelmente deveria ter deixado<br />
de lado os muffins ou deveria ter dito churrasco ao invés de Picatta.<br />
Entretando continuo com minha história para o bem ou para o mal.<br />
— Sim. Estou segura que se pedir te fará alguns – digo enquanto olho<br />
meus pés e vejo que meu esmalte está descascado.<br />
Ouço a porta abrir e Doda Yucky vem entrando pra dentro de casa.<br />
— Amy, Safta começa seu tratamento de quimioterapia em <strong>um</strong>a hora<br />
— diz. Ambas ajudamos minha avó a se levantar. — Todo mundo está com<br />
as ovelhas — diz Doda Yucky. — Estão te esperando.<br />
19 Piccata é <strong>um</strong> método de preparação de alimentos: a carne é cortada, empanadas, douradas, servidos<br />
em <strong>um</strong> molho
Sou lançada para <strong>um</strong>a terrível sensação de preocupação por Safta.<br />
Quimioterapia? Oh, não... isso significa câncer.<br />
— Posso ir com você? — pergunto. — Posso, se você quiser.<br />
Safta acaricia as costas da minha mão suavemente.<br />
— Não se preocupe, estarei bem. Vá com os jovens e desfrute de sua<br />
estadia aqui. Não quer ficar dando voltas por <strong>um</strong> hospital durante o dia todo.<br />
Está bem?<br />
— Ok.<br />
Quero ir com ela para assegurar que o médico saiba que ela é minha<br />
Safta e necessita da melhor atenção possível. Sabem como ela é importante?<br />
Doda Yucky sai com Safta pela porta e estou sozinha de novo.<br />
Continuo evitando as ovelhas hoje. Ron quer me ajudar, mas por que me dá<br />
<strong>um</strong> trabalho que não posso fazer?<br />
Não quero lhe dar <strong>um</strong>a razão para se ressentir de sua filha. E se<br />
ocorre o contrário, se é que pres<strong>um</strong>e a todos o quão ótima eu sou, não quero<br />
que a verdade apareça, que sou tudo, menos perfeita.<br />
Na verdade, apesar de que tenhamos problemas importantes para<br />
superar, quero que se orgulhe de mim. Sei que é <strong>um</strong>a ideia boba, mas é<br />
verdade.<br />
Passo a hora seguinte reorganizando meu lado do armário. Meu olho<br />
vê a pouca roupa do outro lado. Seguramente Snotty gosta de mostrar muita<br />
pele.<br />
Caminho para fora sem saber que <strong>um</strong> filhote de cachorro me<br />
esperava na porta. Genial, o único que gosta de mim aqui é <strong>um</strong> cachorro.<br />
— Arg!<br />
— Estúpido Mutt — murmuro.<br />
— Arg!<br />
70
71<br />
O ignoro, mas ele continua seguindo os meus pés. Meu estado de<br />
ânimo a<strong>um</strong>enta <strong>um</strong> pouco quando o vejo na frente de casa, justo debaixo de<br />
<strong>um</strong>a grande árvore, <strong>um</strong>a rede. Sento-me nela e coloco minhas mãos detrás<br />
da minha cabeça como <strong>um</strong>a almofada.<br />
— Arg!<br />
Olho pelos buracos da rede e observo Mutt debaixo de mim.<br />
— O que quer? — pergunto.<br />
— Arg! Arg! Arg!<br />
Grunho. Os cachorros não são meus. No entanto apenas para calá-lo,<br />
abaixo a rede e me rendo ao aborrecimento. Volto para rede com a coisa em<br />
meus braços. Tive que colocá-lo sobre mim porque podia cair através dos<br />
buracos. Ele encontra <strong>um</strong> lugar cômodo em meu estômago e suspira<br />
satisfeito.<br />
Contra meu bom juízo, me encontro acariciando-o. Provavelmente<br />
tem pulgas e outros insetos que vivem em seu corpo, mas é suave e<br />
esponjoso, como <strong>um</strong> edredon.<br />
— I-me!<br />
Olho pra baixo e descubro <strong>um</strong>a cara angelical que sorri para mim. É<br />
meu pequeno primo Matan. Ele não consegue dizer meu nome e me chama<br />
de “I-me”. Acredito que é lindo, assim não o corrijo.<br />
Mutt sai do meu colo e me sento. Vejo que Matan recolheu flores, e<br />
são para mim. Meu coração gelado começa a derreter-se e as flores silvestres<br />
que me dá são de cores amarela, púrpura e branco(ou ervas daninhas,<br />
mesmo assim fico olhando).<br />
Seu sorriso se amplia quando pego as flores, as cheiro, e digo.<br />
— Mmmm.
É surpreendente o pouco esforço que se necessita para fazer <strong>um</strong><br />
garoto feliz. Por desgraça, todos crescem e se convertem em cínicos<br />
adolescentes de dezesseis anos, como eu.<br />
Levanto Matan e o coloco ao meu lado na rede. Ele ri quando nos<br />
balançamos. Pego <strong>um</strong>a das flores e coloco no seu cabelo, ela se sobressai<br />
sobre seus cabelos longos e encaracolados.<br />
— Bonito — digo, rindo.<br />
Eu sei que ele não entende <strong>um</strong>a palavra em inglês, mas ri de novo,<br />
logo toma <strong>um</strong>a flor das minhas mãos e coloca no meu cabelo. Ficamos<br />
fazendo isso durante uns dez minutos, até que nós dois estamos cheios de<br />
coloridas flores silvestres em nossos cabelos.<br />
Ele fala em hebreu pra mim e eu falo inglês de novo. Não importa<br />
que nós dois não saibamos o que o outro está dizendo, estamos nos<br />
divertindo. E diversão é universal em qualquer idioma.<br />
Uma senhora que eu não tinha visto antes se aproxima e diz algo a<br />
Matan. Ele salta da rede e corre de volta pra ela.<br />
— Yucky o deixou comigo, mas ele queria te ver. Espero que esteja<br />
tudo bem — diz.<br />
— Está bem — digo. — O que significa o nome Matan em hebreu?<br />
— Significa “presente” — explica antes de levá-lo.<br />
Ele olha pra trás, corre até mim, e me dá <strong>um</strong> grande abraço.<br />
— Shalow, I-me — diz, movendo seu cabelo.<br />
— Shalow, Matan.<br />
Quando olha para trás com o cabelo cheio de flores e acenando para<br />
mim, me dou conta que acabo de fazer meu segundo amigo em Israel(Mutt é<br />
o primeiro).<br />
72
73<br />
Capítulo 11<br />
Não confie em homens, h<strong>um</strong>anos ou outra forma.<br />
Entrando em casa, pego meu esmalte e o fico segurando. “Coton<br />
Candy” é o nome da cor dele. É <strong>um</strong> brilhante e reluzente rosa que se destaca<br />
na luz do sol. Acredito que será genial quando refletir na luz do sol.<br />
Decido pintar minhas unhas do lado de fora, no sol, depois de acabar<br />
com <strong>um</strong> esmalte velho. Sentada na frente de casa, abro o vidro. Sinto-me<br />
melhor. Suponho que fazer algo que estou acost<strong>um</strong>ada a fazer em casa me<br />
ajuda.<br />
Mutt se aproxima de mim e fica ao meu lado, usando-me como sua<br />
árvore de sombra. Deixo, apenas porque me irritará de qualquer jeito. Pinto<br />
as unhas dos pés até que escuto <strong>um</strong> som vindo de trás de Mutt que parece<br />
surpreendentemente como <strong>um</strong> peido.<br />
— Eww — digo.<br />
Ele não se levanta, só me olha como se eu estivesse irritando ele.<br />
— Escuta. Se for ficar ao redor de mim, há regras. Regra número <strong>um</strong>:<br />
latir como <strong>um</strong> cão. Regra número dois: tomar <strong>um</strong> banho antes de aparecer<br />
na minha frente. Regra número três: não quero <strong>um</strong> cachorro, então pode ir<br />
atrás de quem perdeu você. Regras números quatro, cinco e seis: sem peidar.<br />
Entendeu?<br />
Mutt se move vagarosamente e vai. Eu disse algo ruim? Talvez<br />
devesse brincar com ele mais tarde. Só pra não haver ressentimento.<br />
Volto a pintar minhas unhas quando escuto alguém caminhar dentro<br />
de casa. Eu olho e vejo que é Avi, o último garoto do universo que eu gostaria<br />
de ver. E ele está me olhando.
74<br />
Molho o pincel no vidro de esmalte.<br />
— O que está olhando? Você já me viu sem roupa — digo, tentando<br />
não olhar na sua direção. É muito difícil, porque ele parece <strong>um</strong> modelo da<br />
Abercrombie.<br />
Entretanto, logo que recordo que me viu seminua, quero-o longe da<br />
minha linha de visão. Não posso andar porque minhas unhas dos pés ainda<br />
não estão secas e não quero borrá-las. De todo modo, por que tenho que ser<br />
eu a ir embora?<br />
Mutt decide voltar nesse momento. Espero que venha em minha<br />
direção, mas vai para perto de Avi.<br />
Traidor.<br />
Bob.<br />
— Não tocaria nessa coisa — digo. — Está mais sujo que meu tio<br />
Tio Bob trabalha n<strong>um</strong>a fábrica. Se limpa bem, mas não importa<br />
quantas vezes lave as mãos, sempre estão pretas com sujeira debaixo das<br />
unhas.<br />
Avi se agacha e o cachorro traidor balança o rabo com tanto<br />
entusiasmo que poderia pensar que é <strong>um</strong>a bandeira em <strong>um</strong> desfile. Logo, me<br />
olha. Não o traidor, e sim Avi.<br />
— Você não é de muita ajuda, não é verdade? — diz.<br />
Nem sequer tento rir. Seu comentário me faz apertar os lábios.<br />
— Que seja — digo.<br />
Em seguida volto a aplicar <strong>um</strong>a segunda mão na unha dos pés.<br />
Porém agora estou com tanta raiva do que Avi me disse que minha mão<br />
começa a tremer e estou passando esmalte em toda a pele do dedo do pé.<br />
Parece agora como se cada pincelada tivesse sido feito por <strong>um</strong>a criança de<br />
dois anos.
O cachorro começa a andar ao meu redor e enterra seu nariz úmido<br />
debaixo da minha mão.<br />
— Vai embora — digo.<br />
Não me deixa, apenas fica na minha frente. Olho para Avi outra vez,<br />
que continua olhando para mim. Por que está fazendo isso?<br />
— Arg!<br />
— Traidor — me queixo com os dentes apertados pra Mutt.<br />
— Arg!<br />
Se eu disser o que Mutt fez depois não vai acreditar. Começa a<br />
balançar o rabo como se estivesse tratando de brincar comigo ou algo assim.<br />
Quando não mordo a isca, pega meu sapato com os dentes e sai correndo.<br />
Agora veja, não é <strong>um</strong> sapato. É meu primeiro e único par de sandálias<br />
de Ferragamo 20 .<br />
— Devolve-me — digo. — Tem <strong>um</strong>a ideia do quanto custa?<br />
Tento agarrá-lo, mas o pequeno diabo começa a sacudi-lo como se<br />
fosse <strong>um</strong> brinquedo mastigável.<br />
— Para — digo, com <strong>um</strong> ruidoso tom de aviso.<br />
No entanto ele não obedece. Começa a correr. Levanto-me, tentando<br />
não <strong>arruinar</strong> minhas unhas dos pés no processo. Porém não adianta nada. À<br />
medida que chego mais perto do cachorro, ele começa a ir na direção oposta.<br />
Agora é guerra.<br />
À maioria das vezes corro em <strong>um</strong> ritmo relativamente lento, mas isso<br />
não quer dizer que não posso correr mais rápido de vez em quando. O único<br />
problema é que meus seios movem-se pra cima e pra baixo quando corro<br />
75<br />
20<br />
marca de <strong>um</strong> estilo de sandália
ápido. Entretanto tento não pensar nisso. Estou concentrada em salvar<br />
minha sandália de Ferragamo.<br />
Mutt para ao lado de <strong>um</strong>a das casas e faço como se eu não estivesse<br />
vendo ele. Escondo-me atrás de <strong>um</strong> limoeiro com os limões mais grandes<br />
que já vi na vida. São tão grandes como a cabeça de <strong>um</strong> bebê.<br />
Quando acredito que deve ter se esquecido que estou atrás da<br />
árvore, o olho escondida. Seu rabo está no ar outra vez e começa a correr a<br />
mil por hora. Está olhando diretamente para mim.<br />
E minha sandália continua na sua sarnenta e babada boca.<br />
— Deveria ser castrado — digo, e dou <strong>um</strong> passo para frente da<br />
árvore. Talvez ele tenha <strong>um</strong> pouco de respeito por Ferragamo.<br />
— Grrr.<br />
— O quê? Não é “arg”? — Enquanto estou falando, continuo<br />
escondida dele. — Deixa de abanar esse rabo para que eu possa ter onde<br />
agarrar quanto te pegar Mutt sarnento.<br />
— Grrr.<br />
— Não tenha medo – continuo, cada vez mais perto. Estou quase o<br />
alcançando. Grrr.<br />
Minha concentração é unicamente na sandália até que dou <strong>um</strong> passo<br />
e sinto algo pressionando contra a sola dos meus pés. Olho para baixo e me<br />
dou conta que acabo de pisar em <strong>um</strong> pepino podre. Porém dando <strong>um</strong>a<br />
segunda olhada, me dou conta que não é <strong>um</strong> pepino e sim <strong>um</strong>a COBRA<br />
MORTA. É negra, mas parece verde florescente na luz do sol.<br />
Nunca havia me sentido tão asquerosa como estou agora, correndo<br />
em direção à casa de meus tios. Obscenidades completas saem da minha<br />
boca. Tentando ser forte e não pensar nas tripas da serpente que deviam<br />
estar entre os dedos dos meus pés, corro tão rápido quanto minhas pernas<br />
permitem.<br />
76
— Man... — digo a Avi entre náuseas. Por favor Deus querido, me<br />
deixe dizer mais <strong>um</strong>a palavra antes da próxima náusea. — Man... — Náusea.<br />
— Mangueira! — Aponto para meus pés caso ele não estiver entendendo.<br />
Escuto <strong>um</strong>a risada curta (atrás de mim) e o sigo até atrás da casa.<br />
Quando vejo a mangueira, corro até ela tão rápido quanto os resquícios da<br />
cobra no meu pé permitem.<br />
Avi abre a água e rapidamente <strong>um</strong> jato de água é apontado aos meus<br />
pés descalços. Pequenos pedaços negros de tripa fibrosa estão no meio dos<br />
dedos dos meus pés. As unhas estão secas agora, com rastros de grama e<br />
feno nelas permanentemente.<br />
Todavia tenho náuseas, não posso evitar. Acho que se parar de olhar<br />
meus pés, posso sair disso. Quando a água começa a sair da mangueira, a<br />
pego e molho meus pés. Meu olhar vai em direção a Avi.<br />
— Obrigada por tudo que está fazendo pra ajudar com minha<br />
sandália — digo sarcasticamente.<br />
77<br />
— diz.<br />
— Obrigado por tudo que está fazendo pra ajudar com os rebanhos<br />
— É rebanho, não rebanhos. Não importa se é <strong>um</strong>a ovelha ou mil,<br />
continua sendo rebanho.<br />
Avi caminha na minha direção e tira a mangueira das minhas mãos.<br />
Vejo com olhos totalmente abertos como se ajoelha e levanta meu pé<br />
descalço e o coloca em suas mãos. Então, mesmo que não acredite, lava meu<br />
pé totalmente.<br />
Estou a ponto de perder o equilíbrio. E não é porque quero que Avi<br />
me sustente ou algo. Não gosto de bancar a donzela em perigo cada vez que<br />
está perto de mim.<br />
Estou aturdida porque o calor não tem piedade conosco e porque<br />
machuquei a parte de trás depois que Mutt me roubou o Ferragamo. Tirando<br />
tudo isso, o garoto que estou decidida a odiar tem <strong>um</strong> dos meus pés em suas<br />
mãos.
— Pode parar com as náuseas, qualquer coisa que tinha no seu pé<br />
não existe mais.<br />
— Era <strong>um</strong>a cobra!<br />
Encolhe os ombros, como se não fosse muito importante.<br />
— Alg<strong>um</strong>a vez já pisou n<strong>um</strong>a cobra?<br />
— Normalmente olho por onde caminho.<br />
Tiro de <strong>um</strong>a vez meu pé das suas mãos.<br />
— Bom, onde vivo não existem cobras, mortas ou de outro modo.<br />
Avi levanta-se, o que não é tão legal já que estava me sentindo<br />
superior quando estava ajoelhado. Porém provavelmente tem cerca de<br />
1,83m e quando baixa o olhar pra mim, me sinto pequena. Em vez de<br />
responder, tira gentilmente <strong>um</strong>a flor do meu cabelo.<br />
— Lindo – diz, girando o talo da flor em suas mãos.<br />
— Hein? — esqueci que Matan colocou flores silvestres no meu<br />
cabelo. Brancas, roxas, amarelas. Devo parecer como <strong>um</strong> pássaro.<br />
— Teu pai quer que te diga que todos estão em minha casa comendo<br />
o que chamamos de almoço. Se quiser ir, me siga.<br />
Dou <strong>um</strong> passo ao seu lado enquanto está caminhando, e logo paro.<br />
— Por que ele mesmo não me disse?<br />
Avi me olha com desdenho.<br />
— Também queria que me desculpasse por te olhar quando estava<br />
se trocando na primeira noite que esteve aqui.<br />
— Então?<br />
78
— Os israelenses não se desculpam por algo que não estão<br />
arrependidos.<br />
Agora de verdade estou ficando irritada.<br />
— Não vai se desculpar?<br />
Ele olha diretamente nos meus olhos.<br />
— O que eu vi foi bonito e natural, assim qual a razão que deveria<br />
dizer que sinto muito?<br />
79
80<br />
Capítulo 12<br />
Garotos são idiotas ou sem noção. Escolha.<br />
— Ron, preciso ligar para casa. Meu celular não funciona. — Já estou<br />
em Israel há quase seis semanas e preciso ligar para casa mais <strong>um</strong>a vez. Em<br />
primeiro lugar, Mitch voltou de sua viagem de acampamento e preciso falar<br />
com ele. Em segundo lugar, preciso ligar para mamãe e Jessica.<br />
Ron está sentado no sofá vendo alg<strong>um</strong> canal de notícias em hebraico.<br />
O tio Chime está com ele, junto com Matan.<br />
Matan está semi nu e vem estado assim durante a maior parte da<br />
minha viagem até agora. Quem sou eu para levantar a questão de que seu<br />
filho não está vestido, e que seu amiguinho está aparecendo pra que todo o<br />
moshav veja? Poderiam se dar conta que não estamos vivendo em <strong>um</strong>a<br />
colônia nudista.<br />
— Acho que sua mãe iria sair da cidade — disse Ron, com seu rosto<br />
ainda mirando a TV.<br />
— Então, ligarei pra <strong>um</strong> amigo.<br />
— Qual é o número? — diz, enquanto vai em direção ao telefone da<br />
cozinha.<br />
Obviamente, como em todo canto aqui, não existe privacidade.<br />
Falo o número de Mitch e então ele me passa o telefone. Acabo me<br />
aproximando do refrigerador, e me encosto ali pra falar.<br />
— Olá — responde <strong>um</strong>a voz áspera.<br />
— Mitch? — digo.
81<br />
— Sim?<br />
— É Amy.<br />
— Ahn?<br />
— Você sabe, sua namorada – digo começando a me envergonhar.<br />
— Hey, carinho. Lamento não ter ligado antes. Sabe que horas são?<br />
— diz, sua voz, no entanto chega cortada.<br />
— Estou em Israel, Mitch. E não, não sei que horas são em Chicago<br />
porque estou praticamente do outro lado do mundo.<br />
— Espera, acabei de me perder. Israel?<br />
— Está dormindo ou me escutando? Porque aqui eu só posso fazer<br />
<strong>um</strong>a chamada e escolhi você. É como <strong>um</strong>a prisão.<br />
Ouço Mitch bocejar e posso dizer que está tratando de se sentar ao<br />
invés de deitar na cama. Espero que agora preste alg<strong>um</strong>a atenção ao que<br />
estou dizendo.<br />
— Mitch?<br />
— Espera, tenho que mijar.<br />
Tenho vontade de bater minha cabeça na parede.<br />
— Não pode esperar?<br />
— Não.<br />
Estou tratando de disfarçar minha raiva na frente do restante da<br />
família.<br />
— Bom, pode se apressar <strong>um</strong> pouco? É <strong>um</strong>a ligação de longa<br />
distancia, sabe?
82<br />
— Estou tentando, carinho.<br />
Ao fundo ouço <strong>um</strong> barulho de urina golpear a água e Mitch deixa<br />
escapar <strong>um</strong> satisfatório e longo suspiro. Não sei se deveria me sentir<br />
estranha de que ele esteja suficientemente cômodo para que urine quando<br />
está no telefone comigo, ou enojada.<br />
— Terminou? — pergunto depois de escutar a descarga.<br />
— Sim – diz. — Estou de volta ao meu quarto.<br />
— Não lavou as mãos.<br />
Quero dizer, se o ouvi urinar e apertar a descarga, definitivamente<br />
teria que ter escutado lavar as mãos.<br />
— Acabo de dizer que terminei. Se lavar as mãos tenho que baixar o<br />
celular. Quer esperar?<br />
— Suponho que não. Só lembre-se de lavá-las quando se livrar de<br />
mim — digo. — E depois, desinfete seu telefone com <strong>um</strong> spray<br />
antibacteriano.<br />
— Deixo isso para você, diga as coisas como estão, Amy.<br />
Por desgraça Snotty abre a porta e caminha pra dentro de casa com<br />
Ofra. Avi, Doo-Doo, e Moron as seguem pra dentro. Ótimo. Que sorte a<br />
minha. Agora tenho <strong>um</strong>a plateia maior para escutar a conversa com meu<br />
namorado.<br />
Olhando de relance vejo Avi me olhando com a mandíbula tensa. Não<br />
tenho falado com ele desde que deliberadamente não se desculpou por me<br />
olhar quase nua. Na realidade, acredito que estamos nos evitando. O que eu<br />
considero <strong>um</strong>a boa ideia.<br />
Volto-me para que eu fique cara a cara com a parede e digo com voz<br />
mais baixa no telefone.<br />
— Sabe que eu gosto de você, certo?
83<br />
skate.<br />
— Merda — diz Mitch. — Acabo de bater o dedo do pé na tábua do<br />
Não é a resposta que esperava.<br />
— Está bem? — pergunto, tentando não perder a paciência.<br />
— Acho que estou sangrando. Espera <strong>um</strong> minuto.<br />
Fico me perguntando quanto custa <strong>um</strong> minuto n<strong>um</strong>a chamada<br />
Israel/EUA, e então começo a enrolar o cabo de telefone no meu dedo.<br />
Enquanto espero é difícil não me virar e dar <strong>um</strong>a olhada no que<br />
fazem os demais. Estão falando em hebraico em voz alta.<br />
Não posso suportar mais. Dou <strong>um</strong>a olhada em Avi. Ele está vestindo<br />
<strong>um</strong>a camiseta preta com alg<strong>um</strong>as palavras em hebraico e jeans desgastados<br />
com buracos em ambos os joelhos. Ele também está usando <strong>um</strong>a corrente de<br />
prata em volta dos pulsos.<br />
Agora, já vi garotos usando joias antes, e nunca imaginei que<br />
realçava sua masculinidade, ao contrário. Porém Avi levava a pulseira como<br />
se fosse <strong>um</strong> acessório másculo. Com certeza faz com que outros garotos<br />
pareçam tontos por não ter <strong>um</strong>a pulseira de prata em volta do pulso.<br />
Quando olho para cima, me sinto <strong>um</strong>a voyerista quando me dou<br />
conta que estava o olhando de cima a baixo. Avi levanta a mão com a<br />
pulseira, me dá <strong>um</strong> oi irônico.<br />
Sinto que meu rosto começa a ficar vermelho e que meu sangue<br />
começa a golpear com força na minha cabeça. Ele me viu o olhando. Quero<br />
morrer agora, ainda mais quando Snotty se aproxima e lhe agarra a mão.<br />
Essa mão que sustenta a mão de Snotty é a mesma que segurou meu pé<br />
coberto de tripas de serpente há alg<strong>um</strong>as semanas.<br />
— Bem, voltei — diz Mitch. — Não há sangue, no entanto dói que é<br />
<strong>um</strong>a merda.<br />
Esqueci que ainda estava esperando, e que para ser honesta não<br />
estava prestando atenção no que Mitch acabara de dizer. Voltando-me à
parede, dou alg<strong>um</strong>as risadas baixas. Avi está tentando se concentrar em<br />
Snotty, mas eu sei com <strong>um</strong>a olhada que está escutando o final da minha<br />
ligação.<br />
— O que é tão engraçado? — pergunta Mitch. — Estou sentindo dor<br />
aqui e tudo que pode faz é rir?<br />
Já tentou alg<strong>um</strong>a vez fingir aos demais que está passando por <strong>um</strong><br />
momento quando não está? É <strong>um</strong>a merda quando a outra pessoa não capta.<br />
Necessito seguir no jogo, mas eu não posso lhe dizer por medo de ser<br />
descoberta. Acompanhe-me no jogo Mitch.<br />
— Não posso esperar pra ir ao acampamento com você — digo.<br />
Deixemos que Snotty e todos eles se deem conta que tenho alguém<br />
me esperando quando voltar pra casa. Por alg<strong>um</strong>a razão, me sinto menos<br />
perdedora por sair sozinha desde que cheguei aqui.<br />
— O que está acontecendo com você? — Odeia acampar.<br />
As risadas veem naturalmente, no entanto faço <strong>um</strong> trabalho bastante<br />
decente fazendo-as soar como autênticas.<br />
Embora agora meu namorado pense que sou estranha.<br />
— O que acontecerá com nossas entradas para o concerto de<br />
BoDeans em Ravinia no próximo fim de semana? — diz. — Gastei quatorze<br />
dólares nos boletos, junto com os trinta extra que gastei nos boletos de<br />
Renaissance Faire 21 . Você disse que iria comigo.<br />
Afortunadamente o grupo se dirige pra fora, assim posso ser eu<br />
mesma novamente.<br />
Olho novamente na sala e observo <strong>um</strong>a coisa em formato de aranha<br />
que está presa no teto.<br />
84<br />
21 Fertival Renascença é <strong>um</strong> encontro de fim de semana ao ar livre, geralmente realizada nos Estados<br />
Unidos, aberto ao público e, normalmente de natureza comercial, que imita <strong>um</strong> período histórico para a<br />
diversão de seus convidados.
— Sim, bem, isso foi antes que fosse obrigada a vir pra <strong>um</strong> país<br />
infestado de cachorros roubadores de Ferragamos e aranhas voadoras.<br />
— O quê?<br />
— Esqueça. Gostaria de estar aí com você, de verdade.<br />
Deus, espero que não peça a Roxanne Jeffries que vá com ele. É sua<br />
vizinha e tem estado flertando com ele durante todo o ano. Até me disse que<br />
ela se troca com as cortinas abertas.<br />
— Olha, tenho <strong>um</strong>a ideia genial. Leve a Jessica. Ela não está fazendo<br />
nada este verão, tirando trabalhar em <strong>um</strong> acampamento de dia para<br />
meninos. Irá com você — E te vigiará pra mim.<br />
— Não acha que seria estranho que fosse com sua melhor amiga?<br />
— Não é como se fosse ser romântico ou algo assim.<br />
Jessica nem sequer pensa que Mitch é lindo. Ela disse que ele lembra<br />
<strong>um</strong> caniche empastelado 22 . Todo mundo tem direito a <strong>um</strong>a opinião. Mamãe<br />
sempre disse: “As opiniões são como bundas, todo mundo tem <strong>um</strong>a e todo<br />
mundo pensa que a do outro fede. — É correto.<br />
— Suponho que posso chamá-la — diz finalmente.<br />
— Diga que sinto saudades.<br />
— Claro. Quando vai voltar?<br />
Se puder manipular Ron, bem rápido.<br />
— Antes que comecem as aulas, mas quem sabe. — Ambos<br />
estudamos na Academia Chicago, <strong>um</strong>a escola preparatória privada.<br />
Ele boceja.<br />
— Divirta-se.<br />
85<br />
22 <strong>Como</strong> <strong>um</strong> cachorro felpudo amontoado
86<br />
<strong>Como</strong> se pudesse.<br />
— Você também. Não sinta muitas saudades de mim.<br />
Dou <strong>um</strong>a pequena risada antes de dizer.<br />
— Adeus, Amy.<br />
Parece que ouço o click de ligação caiu antes que eu pudesse<br />
responder.
87<br />
Capítulo 13<br />
Uma estrela é só <strong>um</strong>a estrela. O que significa?<br />
São nove da manhã do dia seguinte e estou irritada, como de<br />
cost<strong>um</strong>e. Tomo o café da manhã, quando estou prestes a comer novamente<br />
vejo Safta sentada na sua cadeira. Snotty voltou tarde da noite ontem, com<br />
todos os seus amigos rindo e fazendo barulho em plenas duas da manhã.<br />
Odeio admitir, mas estou arrependida de ficar em casa. Com exceção de<br />
Snotty e Avi, ficar com o grupo é divertido.<br />
— Seu aba quer que vá ao curral das ovelhas. Está te esperando —<br />
diz Safta.<br />
— Não quero.<br />
Sei que isso me faz parecer <strong>um</strong>a criança, mas por que entrar em<br />
detalhes e feri-la?<br />
— Ele sente sua falta.<br />
Terra.<br />
O quê? Ele não sentiria minha falta mesmo que eu desaparecesse da<br />
— Não acredito — digo enquanto como <strong>um</strong> pedaço de comida com<br />
homus 23 .<br />
— Ele ama sua pátria, e quer compartilha-la com você.<br />
Estou com a boca cheia de homus, mas deixo escapar.<br />
23<br />
pasta de grão de bico
88<br />
— Por que não volta a morar aqui se ama tanto esse lugar?<br />
— Aposto que sabe a resposta dessa pergunta Amy. Ele continua<br />
longe daqui por você. Você é a sua família. Seu futuro. Seu sangue. Onde você<br />
estiver essa será sua casa.<br />
Aproximo-me e fico ao seu lado enquanto escuto sua voz. É calmante,<br />
e quando ela fala quase parece <strong>um</strong>a cantiga. Eu sou ruidosa. Minha mãe é<br />
ruidosa. Eu falo alto.<br />
Caminho pesadamente. Sou apenas <strong>um</strong>a pessoa ruidosa. No entanto<br />
esta mulher mais velha é como algodão, tudo nela é suave e silencioso. Então<br />
ela se inclina e tira algo do seu bolso.<br />
— Abra sua mão Amy — diz.<br />
A estendo. Vejo algo cair algo dentro dela e ela fechando suavemente<br />
meus dedos sobre minha palma.<br />
— O que é? — pergunto.<br />
— Olhe.<br />
Abro minha mão e vejo <strong>um</strong>a pequena estrela judia de diamantes e<br />
ouro brilhando no centro dela. Está unida a <strong>um</strong>a corrente de ouro fino. A<br />
estrela é menor que <strong>um</strong>a moeda, mas grande o suficiente pra que eu saiba o<br />
que é, porém suficientemente pequena para ser quase... Particular.<br />
Não sei o que dizer. Ser judia não é <strong>um</strong>a parte de mim. Mamãe não<br />
acredita em religião então eu nunca tinha estado n<strong>um</strong>a igreja a não ser pela<br />
boda do meu primo. Tampouco fui a <strong>um</strong>a sinagoga, exceto para o bar<br />
mitzvah de Jessica.<br />
— Gostaria que ficasse — diz Safta. — É chamada Magen David, a<br />
estrela de Davi.<br />
Sério, eu quero. Não sei por que a quero, mas não posso. Não sou<br />
judia e me sentiria como <strong>um</strong>a grande farsante se aceitasse. Quero dizer,
nunca poderia usá-la ou algo assim. É que é tão brilhante e resplandecente, e<br />
realmente significa algo para Safta.<br />
— Não posso ficar — digo. Quando noto a decepção em seus olhos<br />
que são <strong>um</strong>a réplica dos meus, continuo. — É muito bonito.<br />
— Tem algo mais que quer dizer, não?<br />
— <strong>Como</strong> sabe?<br />
Paro e digo.<br />
— Não sou judia.<br />
Não posso vê-la. Se o faço, poderia ver que está brava porque <strong>um</strong>a<br />
garota não-judia é sua neta. Não sei como se sentem os israelenses sobre os<br />
não-judios. Por alg<strong>um</strong>a razão não quero que fique brava comigo. Porque<br />
gosto de Safta. Muito.<br />
— Olha-me, minha querida Amy.<br />
Eu? Querida? Levanto meus olhos e a olho diretamente.<br />
Está sorrindo, as rugas ao redor de seus olhos fazem pregas<br />
profundas enquanto pega minha mão na sua, a mesma que segura o colar<br />
com a pequena estrela judia.<br />
— Ser judia é mais algo de seu coração do que sua mente. Para<br />
alguns ser judeu é seguir fielmente as leis e cost<strong>um</strong>es de nossos<br />
antepassados. Para outros é ser parte de <strong>um</strong>a comunidade. A religião é<br />
muito pessoal. Sempre estarei ali para você se precisar. Pode escolher adotar<br />
o judaísmo, ou decidir que não é necessário. Nada pode impor a religião em<br />
você ou ela não será verdadeira.<br />
Olhando para o colar na minha mão, digo.<br />
— Então, posso ficar com ele? Só por <strong>um</strong> tempo. Devolverei,<br />
prometo.<br />
Ela acaricia minha cabeça.<br />
89
90<br />
— Eu sempre me perguntava por que meu filho continuava longe de<br />
Israel por tanto tempo, mas eu vejo a maneira que te olha. Ele quer te<br />
proteger, evitar que seja ferida ou machucada enquanto tenta respeitar esse<br />
fogo interior que possui. Esse fogo é genuíno e puro. Pegue o colar — diz,<br />
enquanto afasta a mão. — Fique o tempo que quiser com ele.<br />
Olhar esta mulher – que tem olhos parecidos com os meus e que diz<br />
palavras que põem meu mundo ao contrário – perturba meu eu interior.<br />
Aperto o colar em minha mão. Logo me viro e caminho até a geladeira<br />
buscando <strong>um</strong> pouco de água. Embora ela esteja na frente do meu rosto<br />
quando abro a porta, meus membros se sentem paralisados.<br />
Fecho a geladeira e me volto a Safta enquanto caminho pra porta.<br />
— Acho que vou dar <strong>um</strong> passeio — digo.<br />
Dou mais <strong>um</strong>a olhada no colar antes de colocá-lo gentilmente no<br />
bolso de trás da minha calça.<br />
Encontro-me andando a caminho das ovelhas. Quando me aproximo<br />
dos currais, o ladrão-sujo-de-Ferragamo se move na minha direção. Sua<br />
cauda suja está se movendo furiosamente, ventilando suas partes de trás.<br />
Recordo meus pés cheios de tripas de serpente, e caminho passando por ele<br />
e o ignorando, fazendo caso omisso das suas tentativas patéticas de fazer as<br />
pazes.<br />
— Arg!<br />
Olho para baixo pra ver a coisa.<br />
— Arg para você. Onde está minha sandália?<br />
— Arg! — Continua — Arg!<br />
Ele vai para fora onde há <strong>um</strong>a área de colinas além dos currais, e<br />
penso no quão afortunado é esse cachorro por ser livre e fazer o que quiser.<br />
Mesmo roubando o sapato dos outros, não há repercussões.
Caminho em direção aos currais, o som de gemidos de ovelhas e o<br />
barulho das máquinas de tosar me levam a acreditar que estou na direção<br />
correta. Vejo Ron, e vou na sua direção. Tento me convencer de que quanto<br />
mais tempo fique por aqui, não há razão de que Ron pense que sou<br />
incompetente e lamente que seja sua filha.<br />
— Amy, carinho, por aqui!<br />
Meus olhos vagam na direção da voz de Ron. Ele nunca me tinha<br />
chamado de ‘carinho’ antes e isso me surpreende. De todo modo, que<br />
significa isso? Carinho. É doce, mas também pegajoso e não deixa tuas mãos<br />
facilmente. Molestamente doce. Essa sou eu? Não nesta vida.<br />
Ele está se inclinando, e seus joelhos se fecham sobre <strong>um</strong>a ovelha<br />
enquanto tosa seu pelo. Para as ovelhas não parece importante, mas pra<br />
mim sim.<br />
— Ron, isso é des<strong>um</strong>ano.<br />
Ele termina de passar a máquina de tosar através da pelagem da<br />
ovelha enquanto os tufos caem ao seu lado. Por último libera ao pobre e<br />
desnudo animal e me olha.<br />
— Existe <strong>um</strong>a maneira melhor? – pergunta.<br />
É então que me dou conta que Ron não é o único tosando ovelhas.<br />
O’dead está ao lado de Ron, Doo-Doo ao lado de O’dead, Tio Chime ao lado de<br />
Doo-Doo, e Avi ao lado do meu tio. Todos estão esgotados, posso dizer pela<br />
forma que estão respirando com dificuldade e suas camisetas estão<br />
molhadas por causa do suor. Não apenas nas suas axilas e peitos, suas<br />
camisas inteiras estão empapadas de suor.<br />
E todos estão me olhando, tirando O’dead. Ele está olhando Snotty do<br />
outro lado do curral. Hmmm.<br />
Os sons das máquinas de tosar param e sinto como se o mundo<br />
também o fizesse. Penso em algo rápido pra dizer.<br />
Algo vem a mim como <strong>um</strong> raio e deixo escapar.<br />
91
92<br />
— Por que não as deixam com sua pelagem?<br />
Duh. Isso parece tão simples que dou <strong>um</strong>a breve risada curta.<br />
As risadas do meu lado direito me alertam de minha prima e Ofra.<br />
Snotty está com <strong>um</strong>a camisa justa de cor escura, e sua maquiagem escura<br />
está correndo por suas bochechas enquanto alimenta <strong>um</strong> cordeiro com <strong>um</strong>a<br />
mamadeira. Nunca ouviu falar de rímel à prova d’água? Ou o termo de que<br />
menos é mais?<br />
Ron.<br />
— Estarão com muito calor durante os meses de verão — explica<br />
Sento-me n<strong>um</strong>a das grades de metal e observo. Há cães no meio do<br />
curral, comendo alg<strong>um</strong>a coisa vermelha e pegajosa que está no chão. Meus<br />
lábios tremulam.<br />
— O que os cães estão comendo? – pergunto. Talvez eu não queira<br />
saber, mas minha curiosidade leva a melhor.<br />
— Uma das ovelhas teve <strong>um</strong> bebê esta manhã.<br />
— Eles estão comendo <strong>um</strong> cordeiro?<br />
— Não, a placenta. É muito nutritiva.<br />
— Ewww! — digo.<br />
Não deveria ter perguntado. Se não tivesse perguntado não saberia.<br />
ASQUEROSO! Placenta de <strong>um</strong> bebê ovelha. Urg! Deixa de pensar nisso Amy,<br />
deixa de pensar nisso.<br />
No entanto quanto mais trato de deixar pensar nisso não posso tirar<br />
os olhos. Bem parecido como nessas cenas de crimes sangrentos que<br />
mostram na TV. Não quero vê-las, mas não posso evitar.<br />
Pelo rabo de olho vejo Mutt entrando no recinto. Ele é<br />
suficientemente pequeno pra passar debaixo das barras de metal. Quando<br />
me olha, me aproximo dele.
93<br />
— NÃO coma placenta de ovelha — digo.<br />
Ele assente, como se entendesse o que eu digo. Logo anda até a<br />
placenta e começa a lambê-la, então pega <strong>um</strong>a parte da coisa pegajosa e<br />
sangrenta em sua boca e tira de lá. Não posso olhar mais.<br />
Se apenas Jessica estivesse aqui poderíamos rir pela situação<br />
asquerosa. Mas ela não está.<br />
Aproximo-me do lugar onde as ovelhas recém-nascidas estão. Um<br />
cordeiro bebê tropeça em mim e o acaricio.<br />
— Oi, carinho — digo.<br />
Acho que é a primeira vez que sorrio desde que Matam colocou as<br />
flores no meu cabelo.<br />
— Não fique muito apegada, ele vai morrer logo.<br />
Meu coração se funde e meu sorriso some tão rápido como apareceu.<br />
Volto-me pra Snotty enquanto seguro o cordeiro bebê.<br />
— O que? — digo.<br />
— Temos que matá-los aos três meses de idade. Esse é <strong>um</strong> macho,<br />
assim será o primeiro.<br />
Olho nos olhos do recém-nascido pequeno e indefeso e o aproximo<br />
de mim protetoramente.<br />
Sou carnívora. Ver de tão perto e pessoalmente o animal que vou<br />
comer me faz sentir dor de estômago. É tão lindo. <strong>Como</strong> sequer posso pensar<br />
que o pobre será sacrificado? Talvez não corte os carboidratos depois de<br />
tudo.<br />
Matan vem andando em nossa direção com Doda Yucky detrás dele.<br />
Está desnudo, como de cost<strong>um</strong>e. O engraçado é que estou me acost<strong>um</strong>ando a<br />
ver o garoto sem roupa que nem sequer me importo.
Então ele entra no curral e corre ao redor dos cordeiros. Está<br />
brilhando de alegria enquanto corre e trata de pegá-los.<br />
Depois de <strong>um</strong> minuto os cordeiros começam a correr atrás dele. Mas<br />
não é para brincar, me dou conta de que eles pensam que seu pequeno<br />
‘passarinho’ é outro bico de mamadeira. Ele estava rindo e fugindo dos<br />
cordeiros que estavam tentando obter leite de sua pequena coisa como se<br />
fosse <strong>um</strong> jogo. Olhando ao redor, noto que Doda Yucky está rindo, assim<br />
como o resto das pessoas que pararam de tosar as ovelhas.<br />
Corro até Matan e levanto seu pequeno corpo desnudo para protegêlo<br />
dos cordeiros pervertidos.<br />
Depois de levá-lo de volta em segurança, digo em voz alta pra que<br />
qualquer <strong>um</strong> possa me escutar.<br />
— Isso. Não. Está. Bem.<br />
Matan não se importa, e mais ninguém também. Na verdade eles<br />
estavam rindo. Doda Yucky conversa com tio Chime antes que ela e Matan<br />
caminhem felizmente de volta pra casa. Graças a Deus.<br />
As máquinas de tosar são ligadas de novo, e todos os homens exceto<br />
Ron estão inclinados sobre as pobres ovelhas. Ele diz algo a tio Chime em<br />
hebreu antes de vir em minha direção.<br />
— Tenho <strong>um</strong> trabalho pra você — diz.<br />
94
95<br />
Capítulo 14<br />
A determinação e a habilidade fazem a metade do trabalho.<br />
A estúpida da sorte faz a outra metade.<br />
O sigo ao outro extremo do curral, que felizmente está na sombra.<br />
aqui.<br />
— Quando terminarmos de barbear as ovelhas, traz o rebanho até<br />
Olho aos finos e nus animais. Céus, pareciam tão gordos, acolhedores<br />
e grandes com esse pelo suave, é incrível o quão vulneráveis e pequenos que<br />
se viam depois de serem tosquiados. Posso perceber como se sentem<br />
enquanto <strong>um</strong> calafrio corre pelos meus ossos.<br />
Mas estou determinada a ajudar. Acredito. Não arruíne Amy. Meus<br />
olhos procuram Snotty, que alimenta os bebês com garrafas de leite. Isso sim<br />
parece divertido. Porque eu estou levando as ovelhas sem pelo até <strong>um</strong><br />
curral?<br />
O que acontece se ficam rudes comigo? Pior, o que acontece se ficam<br />
rudes entre elas? Ugh!<br />
— É capaz de fazê-lo? — Ron pergunta.<br />
— Claro — digo com mais convicção do que sinto. — Moleza—<br />
adiciono.<br />
Se fizer isto, ele talvez fique orgulhoso de mim.<br />
O tio Chime deixa <strong>um</strong>a das ovelhas ir e esta corre. É <strong>um</strong> macho, me<br />
certifico pelas coisas pendurada que tem entre suas pernas. E está me<br />
olhando fixamente desde o outro canto do curral.<br />
— Vamos — lhe digo.<br />
Mas com todo o som ao redor posso apostar que não me escutou.
96<br />
A ovelha me olha com seus grandes e assustadores olhos cinza.<br />
Pergunto-me se está me cobrando algo. Movo-me <strong>um</strong> passo mais próximo.<br />
Ela não se move.<br />
— Vamos — lhe digo <strong>um</strong> pouco mais forte desta vez.<br />
Sinceramente espero que ninguém esteja me olhando, me aproximo<br />
do animal outro passo mais. Ele afasta-se.<br />
— Por aqui tontinho — digo.<br />
O animal não quer me escutar. Maldição. Olho para Ron, mas<br />
felizmente ele não está prestando atenção.<br />
Sou eu contra a ovelha. Mencionei que a coisa parecia mais<br />
vulnerável e pequena depois de ser tosquiada? Pois retiro o que disse. Antes<br />
de me aproximar da ovelha barbeada, ameaçadora, com quatro patas e com<br />
<strong>um</strong>as coisas penduradas entre suas patas, vejo que outra ovelha se levanta e<br />
se aproxima da primeira. Agora tenho que lidar com duas.<br />
Avi se levanta e vai em busca de outra ovelha peluda e gordinha para<br />
ser tosquiada. Nisso, nossos olhos se encontram. Ainda não o perdoei pelo<br />
incidente com as tripas de serpente. É incrível que ele não pense em se<br />
desculpar por me ver tão nua como as ovelhas sem pelo. Um pouco irônico<br />
certo? Eu supliquei com os olhos, me ajuda.<br />
Olhou-me com desprezo. Não nessa vida Amy. Está sozinha. Idiota,<br />
não é que ele pronunciou essas palavras, mas sei que as estava pensando.<br />
Que apodreça. Dou mais outro passo para a ovelha. Talvez se<br />
canalizar suas emoções, elas fariam o que eu quisesse. Meus olhos se abrem<br />
ao máximo e olho fixamente a ovelha maior intensamente. Entra no curral,<br />
lhe insisto com minha mente. Concentre-se Amy, digo a mim mesmo. Coloco<br />
meus dedos em minhas têmporas para canalizar meus pensamentos até a<br />
maldita criatura de quatro patas que me olha como se eu houvesse me<br />
tornado louca.<br />
Sinto <strong>um</strong>a presença ao meu lado. Viro-me abruptamente e quase me<br />
choco com Avi. A confusão em seu rosto, o cenho franzido e seus olhos cor<br />
de chocolate me dizem que ele pensa que sou purê de batatas (apenas no<br />
caso de que não está familiarizado com a expressão, significa que sou <strong>um</strong><br />
h<strong>um</strong>ano sem cérebro).
— Yah! — grita batendo seu pé contra o chão. Isto vem de <strong>um</strong> garoto<br />
que pensa que sou <strong>um</strong> purê de batatas.<br />
Virei-me para a ovelha, que correu para o curral adjacente pelo<br />
comando. Avi agora tem esse arrogante sorriso em seu rosto como se<br />
houvesse feito <strong>um</strong>a grande coisa.<br />
— Aposto que seu namorado não pode fazer isso — disse.<br />
<strong>Como</strong> se atreve a mencionar Mitch nisso... Nisso... Nisso...<br />
— Aposto que ele nem sequer se daria ao trabalho — respondi.<br />
Pelo resto da tarde, copiei a técnica de bater-gritar que Avi me<br />
ensinou e me converti em <strong>um</strong>a verdadeira pastora.<br />
Em <strong>um</strong> momento Ron disse.<br />
— Bom trabalho carinho. — Nunca saberá o quanto essas palavras<br />
significaram para mim.<br />
Logo depois que os adultos abandonaram os currais pelo dia, olhei<br />
os jovens juntarem-se sobre as pilhas de feno com mais de dois metros de<br />
altura.<br />
Caminho perto deles até que Ofra grita.<br />
— Amy, vem aqui. — Snotty a olha, mas Ofra a ignora.<br />
— Não, obrigada — digo.<br />
Avi estava ali em cima, sentado como se houvesse nascido para estar<br />
desta altura.<br />
— Ela teme subir até aqui — disse. — Tem muitas palavras, mas<br />
pouca coragem.<br />
Incrível. Um minuto ele está tentando me ajudar e no outro está<br />
sendo o maior idiota me insultando. Não faz mais nada para me fazer subir a<br />
amarelada e áspera palha.<br />
Quando chego lá em cima, não sei aonde me sentar. Deixo meus pés<br />
pendurados na borda do feno e dou <strong>um</strong> passo atrás. Todos os olhos estão<br />
sobre mim. Volto-me para Avi para lhe dar algo em que pensar.<br />
97
98<br />
— Porque me odeia? — pergunto.<br />
Sei que não deveria jogar essa acusação em público, mas não pude<br />
evitar. Preciso saber, preciso saber já.<br />
dele.<br />
Avi não responde e todos estão olhando para qualquer parte longe<br />
— Não leve como pessoal — Doo-Doo disse. — Tem estado assim<br />
por <strong>um</strong> tempo.<br />
— Por quê? — dirijo minha pergunta a Doo-Doo, mas continuo<br />
olhando para Avi.<br />
Ninguém diz nada. A tensão está tão intensa como o sol batendo em<br />
minhas costas. Avi joga <strong>um</strong>as palavras em hebreu e eu obviamente não<br />
entendo nada. Meu hebreu está limitado a aproximadamente cinco palavras.<br />
Ele sabe disso. Snotty sabe. Diabos, todos eles sabem.<br />
O que me faz sentir como <strong>um</strong>a aranha-voadora olhando ao interior<br />
de <strong>um</strong>a casa sem poder entrar. Não é <strong>um</strong>a aranha, nem <strong>um</strong>a mosca. Apenas<br />
<strong>um</strong>a mistura das duas.<br />
Todos começam a discutir. Ao mesmo tempo. Muito forte. Soa como<br />
se fosse <strong>um</strong> festival de catarro porque ao que parece cada palavra em<br />
hebreu tem esse som com “ch” saindo da garganta.<br />
Seria genial saber o que estão falando. Estão discutindo porque Avi<br />
me odeia? Parece que sim. Mas estão discutindo.<br />
É óbvio que Avi e Snotty me odeiam, estou encantada com os outros<br />
garotos que são gentis. O´dead se aproxima mais de Snotty quando fala. Uma<br />
observação interessante que guardei para depois. Pergunto-me, o que tem<br />
ela que atrai todos os garotos? Todas poderiam ter excesso de maquiagem<br />
no rosto.<br />
Levantei-me, pronta para descer desta pilha de feno. Sinto-me tão<br />
incomodada ao redor de Avi e Snotty.<br />
— Quer acampar conosco? — Doo-Doo pergunta.<br />
Minhas sobrancelhas se levantaram. Antes de poder responder Avi<br />
me interrompe.<br />
— Mah-pee-tome! — Avi disse a Doo-Doo.
99<br />
— Lama-low? — Doo-Doo responde a seu amigo.<br />
— Olá? Porque não falam inglês? — disse finalmente. — Não sabem<br />
que é de má educação falar em particular enquanto estou de frente a vocês?<br />
Ofra cruza seus braços e assente.<br />
— Ela tem <strong>um</strong> ponto.<br />
Meus olhos pestanejam. Poderia beijar essa garota nos lábios por me<br />
apoiar tanto. Embora eu não vou por esse lado. Mas se o fizesse a beijaria.<br />
Avi grunhiu.<br />
— Eu não acampo — digo.<br />
— Disse que iria com seu namorado. A escutei ao telefone — Avi me<br />
desafia.<br />
Pensa rápido Amy. Ele te pegou.<br />
— Sim, bom, vou apenas com ele. Mitch tem sido parte dos<br />
exploradores desde que tinha cinco anos ou algo assim.<br />
Snotty assovia.<br />
— Amy, você inventa coisas para tentar ficar bem. O que é real e o<br />
que não é? Avi tem razão sobre você.<br />
mim.<br />
Silencio. Até que sinto que minha paciência se quebra dentro de<br />
Sei que não deveria começar com a que compartilho o quarto. E sei<br />
que não é o mais inteligente atacar minha prima na frente de <strong>um</strong>a audiência.<br />
Ela talvez não entenda o que direi por questões de idiomas. Mas não posso<br />
evitar, estou sobrecarregada de adrenalina correndo por meu cérebro.<br />
Mesmo quando digo a mim mesma para manter minha boca fechada,<br />
me escuto dizer:<br />
— Não se cansa de ser toda <strong>um</strong>a puta? Porque desde que te conheci<br />
tem me tratado como <strong>um</strong> pedaço de merda. — Estou feito <strong>um</strong> pacote e<br />
minha boca trabalha além da conta. — Não te suporto, suas saias curtas,
100<br />
suas calças apertadas... Ou sua triste desculpa de peitos. Isso não pode ser<br />
real, certo?<br />
Apontei com meu dedo para Avi.<br />
— E você, tudo o que tem a oferecer é <strong>um</strong>a má atitude e ser <strong>um</strong> peso<br />
em meus ombros. Irei acampar, apenas para... Te incomodar! Se não gosta,<br />
não vá. Dessa maneira pode ser <strong>um</strong> Israelense com muitas palavras e pouca<br />
coragem.<br />
— Você acredita que é valente? — Avi me desafia.<br />
— Maldito seja. Poderia lhe empurrar dessa pilha de feno sem<br />
pensar duas vezes.<br />
Levanta-se, sua boca esconde <strong>um</strong> sorriso.<br />
— A desafio.<br />
Está bem, eu penso. Mas apenas por <strong>um</strong> momento. Depois o empurro<br />
pelo peito com toda a força que tenho.<br />
Não se balança, o garoto é como <strong>um</strong>a rocha.<br />
Quando o escuto rir, me viro e salto a pilha de feno até estar em terra<br />
firme. Não imaginam o sentimento de racionalidade que me oprimiu. Eu<br />
penso.<br />
Não sei por que as lágrimas caem por minhas bochechas.<br />
Não sei por que incomodei as duas pessoas com as quais terei que<br />
viver o mês seguinte.<br />
E estou tão certa como o inferno que não sei por que aceitei acampar<br />
com ele no meio de <strong>um</strong>a zona de guerra com gente que me odeia.<br />
Deus estou em Israel, a Terra Sagrada. Onde você está?
1<strong>01</strong><br />
Capítulo 15<br />
Quando tem pouco onde escolher, pega o que pode.<br />
Essa noite, depois da cena, estava vendo televisão com Doda Yucky<br />
quando os amigos de Snotty irromperam pela porta. Porque o povo daqui<br />
não fecha as portas?<br />
Snotty e Ofra saíram do quarto vestidas com vestidos curtos. Avi,<br />
Doo-Doo e O´dead estavam usando jeans com camisetas de manga comprida.<br />
Não pergunto aonde vão essa noite, porque não me importa. Sou<br />
muito feliz sentada diante da televisão todo o dia. Tenho ficado gratamente<br />
surpreendida, tem <strong>um</strong> montão de shows na televisão americana em Israel.<br />
Isso é provavelmente porque os israelenses sabem tanto inglês.<br />
Ron, que estava falando no telefone a maior parte da tarde, se<br />
aproxima de mim.<br />
— Os garotos vão a <strong>um</strong>a disco.<br />
Uma disco? Disco, isso soava como os anos setenta.<br />
— Bom para eles — lhe digo.<br />
— Não quer ir?<br />
— Não.<br />
— Pode ser divertido sair do moshav.<br />
Se soubesse o que disse a O´snot antes. Insultei sua roupa e seus<br />
peitos. Não vou admitir esses pequenos fatos a Ron.<br />
— Vou lhes pedir que te leve — disse, e antes que pudesse detê-lo<br />
se levantou e se aproximou de Snotty. Ele disse algo em hebreu para ela.
102<br />
Ela disse algo em troca.<br />
Neste ponto Doda Yucky a interrompeu, sua voz <strong>um</strong> tom de censura.<br />
Então minha tia se aproximou e pegou minha mão.<br />
— O´snot quer lhe levar com seus amigos.<br />
Sim, claro. Mas a senhora apenas lutou em meu nome, e não tenho o<br />
coração para discutir com ela. Em troca dei <strong>um</strong> olhar furioso para Ron, a<br />
pessoa que me meteu nessa bagunça em primeiro lugar.<br />
Dez minutos mais tarde me encontro no carro de Avi, conduzindo<br />
pela montanha. Avi e Snotty me ignoram, mas não os culpo. Os odeio, eles<br />
me odeiam. Trata-se de <strong>um</strong>a mutua relação de ódio-e-ódio.<br />
Quando paramos na “disco”, saí do carro e segui Snotty, Ofra, Doo-<br />
Doo, O´dead e Avi para a entrada. Parece como <strong>um</strong> grande armazém. A<br />
música é forte, a todo o vol<strong>um</strong>e desde o lugar e colorido, as luzes<br />
intermitentes estão brilhando através de grandes janelas.<br />
Paro logo que posso examinar a longa fila de pessoas esperando<br />
para entrar.<br />
— É seguro? — pergunto.<br />
— Prometo que não há serpentes no interior para que<br />
acidentalmente as pise. — Snotty diz, em seguida ri de mim.<br />
Meus olhos brilharam com tanta indignação que me concentrei em<br />
Avi. <strong>Como</strong> podia ter dito a Snotty sobre o acidente com as tripas da<br />
serpente? Que traição. Agora me sinto h<strong>um</strong>ilhada por ele.<br />
— Vamos — Ofra disse, pegando o meu braço com o dela quando me<br />
levou para a fila.<br />
Jogo meu cabelo para trás e faço o rabo. Quando chego à parte<br />
dianteira, <strong>um</strong> guarda do exército me faz abrir minha bolsa e comprova o<br />
conteúdo. Espero que me peça identificação, mas não o faz. Suponho que em<br />
Israel não há restrição de idade para os clubes de dança. Quando os militares<br />
fazem sinais para que avance, tenho que passar por <strong>um</strong> detector de metais<br />
para entrar na “disco”.<br />
Garoto, eles não estão permitindo nenh<strong>um</strong> risco. Se tivéssemos <strong>um</strong><br />
soldado na entrada de cada cidade, cada centro comercial em <strong>um</strong> bar nos
Estados Unidos estaríamos sem soldados. Não teria ninguém a quem<br />
proteger nosso país.<br />
103<br />
Entrei o chão vibrando ao ritmo da música porque é muito forte.<br />
Snotty, Ofra, O´dead e Doo-Doo vão diretamente a pista de dança e começam<br />
a dançar. Avi está apoiado em <strong>um</strong> corrimão, melancólico como de cost<strong>um</strong>e.<br />
Mas está rodeado de garotas enquanto está ali de pé, assim não se parece<br />
como <strong>um</strong> solitário.<br />
Eu? Bom, estou aqui sozinha porque não tenho vontade de dançar<br />
neste momento. De parede a parede há gente, mas me disponho a passar<br />
através da multidão, em direção ao bar. Preciso de <strong>um</strong>a Coca-Cola, ou ao<br />
menos algo em mão, assim não fico de pé olhando ao redor das pessoas.<br />
Por sorte, pego <strong>um</strong>a banqueta vazia, antes que alguém mais pudesse<br />
por seu traseiro nela.<br />
Levei <strong>um</strong> momento para assimilar tudo dentro. As pessoas da<br />
discoteca estão usando roupa muito da moda. Também estão dançando,<br />
rindo e bebendo. O ar cheira a cigarros, obviamente não há leis anti-f<strong>um</strong>o<br />
aqui.<br />
Não vou a clubes perto de casa porque tenho apenas dezesseis anos<br />
e não me deixam entrar até que tenha vinte e <strong>um</strong>. Mas quando puder, vou ter<br />
tanta diversão como os Israelenses.<br />
O garçom me diz algo em hebreu e coloca <strong>um</strong>a garrafa de cerveja<br />
diante de mim com o líquido amarelado interior.<br />
— Falo inglês — digo a cima com meus pulmões para que possa me<br />
escutar acima da música.<br />
Inclina-se para frente e diz ao meu ouvido.<br />
— O garoto ali te pagou <strong>um</strong>a bebida.<br />
Assinala o outro lado do bar, onde <strong>um</strong> homem com <strong>um</strong>a camisa<br />
branca e a maioria dos botões sem fechar está sentado. Está brincando? O<br />
homem olha como se estivesse na idade de Avi, e tem o cabelo longo. E não<br />
está bem o cabelo longo, parece que tem sido engraxado atrás com muito gel<br />
para cabelo. É provavelmente o tipo menos genial em todo lugar.<br />
Grandioso. Sou <strong>um</strong> ímã para o garoto menos genial.
104<br />
Para o meu horror, o homem está caminhando para mim como<br />
alg<strong>um</strong> tipo machista. Tem <strong>um</strong> enorme sorriso em seu rosto, parece que não<br />
se barbeou a <strong>um</strong>a semana.<br />
Preciso de ajuda aqui.<br />
Snotty e os demais estão na pista de dança o que não seria de muita<br />
ajuda. Procuro na sala por Avi, que obviamente se afastou do corrimão. Se o<br />
encontrasse poderia fingir que é meu encontro para que este cara me deixe<br />
em paz.<br />
Quando meus olhos finalmente pousam em Avi, me dou conta que já<br />
não está melancólico. Está dançando com alg<strong>um</strong>a imitação de Hilary Duff.<br />
Para piorar as coisas, é <strong>um</strong> bom dançarino. Não como esses tipos que<br />
apenas se movem de <strong>um</strong> lado a outro. Não, Avi se move como se houvesse<br />
nascido para dançar com <strong>um</strong>a garota em seus braços.<br />
Vejo com desgosto que se inclina para frente e diz algo ao ouvido,<br />
depois os dois riem. Por alg<strong>um</strong>a razão gostaria que não houvesse tanto<br />
barulho assim não teria que estar tão perto dela para falar. Não me importa,<br />
apenas estou incomodada que ele esteja passando <strong>um</strong> bom momento e eu<br />
não.<br />
— Alio, cusit ay zeh. — O garoto menos genial me diz <strong>um</strong>a vez que<br />
abriu passo entre a multidão e agora está de pé diante de mim.<br />
— Falo inglês — lhe digo, dando de ombros como desculpa.<br />
— Meu inglês não tão bom — disse. — Você Americana?<br />
— Sim.<br />
Seus olhos se il<strong>um</strong>inaram.<br />
— Quer dançar comigo? Minha dança é melhor que meu inglês.<br />
O olho cuidadosamente e lanço <strong>um</strong> olhar para Avi que continua<br />
dançando com sua loira idiota. Pego a mão do tipo e o levo até o meio da<br />
pista de dança.<br />
Tenho tido aulas no Estúdio de Dança de Julie desde que tinha<br />
quatro anos, assim não tenho medo de me dar rédea solta. Hoje, não<br />
escolheria esse tipo de dança, mas nesse momento não posso ser exigente.
105<br />
Ao escutar a música, finjo que estou dançando com meu namorado.<br />
Quando o tipo põe suas mãos ao redor da minha cintura, quero pensar que<br />
são as mãos de Mitch que me sustentam contra ele.<br />
Fecho os olhos. E o único problema é que na minha imaginação não<br />
são as mãos de Mitch. São as de Avi. O tipo que odeio está rondando meus<br />
pensamentos puros meus e do meu namorado.<br />
Espera <strong>um</strong> minuto. Acredito que o tipo com o que estou dançando<br />
está tocando minhas costas, tentando localizar o fecho do meu sutiã. Abro os<br />
olhos e golpeio a cara do pervertido. Por sorte para mim, meu sutiã se fecha<br />
na parte da frente.<br />
Deixo de dançar. O pervertido se inclina para frente para falar<br />
comigo, está muito alto para escutar a menos que a pessoa esteja gritando<br />
em seu ouvido. Acredito que está a ponto de pedir desculpas, até que sinto<br />
essa coisa úmida e viscosa tentando subir pelo meu canal auditivo.<br />
Que diabos é isso?<br />
Quando me dou conta que o tipo menos genial está tentando deslizar<br />
sua língua de Gene Simmons ao redor do meu ouvido e tentando empurrar<br />
por meu condutor auditivo esterno, grito e o empurro para trás. Qualquer<br />
coisa para conseguir sua língua tão longe de meu ouvido como seja possível.<br />
Por infelicidade, eu o empurrei em alg<strong>um</strong>as pessoas que estavam<br />
dançando. Eles não estavam muito contentes comigo ou o lambedor e o<br />
empurraram para trás. Este começou a empurrar mais, e logo o lugar estava<br />
fora de controle.<br />
Oh merda.<br />
Estou perdida na multidão, incapaz de me mover porque as pessoas<br />
se converteram em <strong>um</strong>a multidão. Quando alguém pegou minha mão e me<br />
levou para a saída, estou agradecida.<br />
Até que reconheço a pulseira de Avi atada a essa mão.<br />
Tropeço fora com Avi e o resto da multidão. Estão limpando o clube.<br />
Quando veio <strong>um</strong> carro de polícia com suas luzes brilhantes, me assusto.<br />
Porque alguém perto do carro de polícia está falando com os soldados e<br />
policiais, enquanto me assinalam.<br />
— Merda. Amy não diga nada — Avi disse. — Me deixa falar.
Quando os soldados e <strong>um</strong> policial chegam até nós, mantenho a boca<br />
fechada.<br />
106<br />
— Mah aseet — o soldado disse.<br />
Quando Avi começa a falar, o homem levanta <strong>um</strong>a mão e me assinala.<br />
Queria manter a boca fechada, realmente o queria. Minha intenção<br />
era ficar aqui e permanecer em silêncio.<br />
— Falo inglês — deixo escapar.<br />
— Você começou a empurrar as pessoas na pista de dança? — O<br />
soldado pergunta bruscamente.<br />
— Apenas por culpa do lambe-ouvidos. Quero dizer, em primeiro<br />
lugar tentou me tocar, mas depois, bom, pensei que ia pedir desculpas. Pelo<br />
contrário, meu ouvido começou a ser lambido e me dei conta que não estava<br />
se desculpando, ele estava dando <strong>um</strong> banho de língua no meu ouvido.<br />
Sei que estou divagando. Tenho medo, e sei que mereço ser castigada<br />
por ter causado tudo, desocuparam o clube por minha culpa. Um nó frio<br />
estava se formando em meu estômago e tento agarrar a mão de Avi<br />
fortemente.<br />
Então de repente, pelo canto do meu olho avisto ao tipo com a língua.<br />
— Ali está! — gritou.<br />
O lambedor retrocedeu e desapareceu atrás de <strong>um</strong> carro.<br />
O soldado gritou ordens a Avi e se foi.<br />
— O que disse?<br />
disse.<br />
— Que a leve para casa agora ou do contrario a prenderá. Vamos —<br />
— Tem <strong>um</strong> Q-tip? — lhe pergunto.<br />
— Porque?<br />
Duh!<br />
— Assim posso desinfetar os germes desse tipo fora do meu ouvido.<br />
Aposto que já tenho <strong>um</strong>a infecção nele devido a esse otário.
Está caminhando tão rápido que posso apenas me manter com ele.<br />
— Não me culpa pelo que passou ali atrás, verdade?<br />
Quando chegamos ao carro, Avi se vira para mim.<br />
— Estava atiçando esse tipo com sua dança. O que esperava?<br />
Encontrei seus olhos acusadores sem pestanejar.<br />
— Ele sabia que era Americana, talvez os Israelenses gostem de<br />
línguas úmidas na orelha, mas na América...<br />
— Sabia que era Americana?<br />
— Sim. Eu disse quando me comprou <strong>um</strong>a cerveja.<br />
— Cerveja? Estava bebendo álcool com esse tipo? Não é de estranhar<br />
que pensasse que era fácil. As garotas Americanas tem essa fama por aqui.<br />
107<br />
— Deixa de me usar como prova dos seus estereótipos Avi. Não é<br />
justo. Além disso, você estava se sacudindo muito essa noite. Está ci<strong>um</strong>ento<br />
porque sua loira idiota não queria chupar sua orelha.<br />
Snotty e seus amigos estavam caminhando para nós. Cruzei os<br />
braços na frente do meu peito, esperando que pudéssemos voltar para casa.<br />
— Alguém começou <strong>um</strong>a luta dentro da discoteca — Ofra me disse,<br />
oferecendo sua explicação para a comoção.<br />
Mordo a língua e me calo, mas Avi me olha de lado.<br />
— Você — Snotty disse. — Você começou, não? Deveria ter<br />
adivinhado. Não pode fazer nada direito.<br />
— Deixa-a em paz — Doo-Doo disse. Quero lhe dar <strong>um</strong> beijo agora<br />
mesmo por dar a cara por mim.<br />
Sentindo como se tivesse seu apoio, eu digo a Snotty desafiante.<br />
— Posso fazer qualquer coisa que você pode fazer. — E logo, devido<br />
a adrenalina que flui através do meu corpo posso adicionar — E posso fazer<br />
melhor.
108<br />
A expressão do seu rosto não tem preço. Está pensando. Quase posso<br />
escutar seu cérebro oxidado, crepitando como se estivesse trabalhando.<br />
— Tosquiar <strong>um</strong>a ovelha — deixa escapar. — Amanhã pela manhã.<br />
— Não tem problema — lhe digo com confiança, apesar de que no<br />
interior estou tremendo ante a ideia de prender <strong>um</strong>a pobre ovelha indefesa<br />
enquanto corto a lã até que fique nua.<br />
tudo.<br />
Mas o farei, apenas para provar a cada <strong>um</strong> que não me saio mal em<br />
Apenas espero não fazer-me ficar como <strong>um</strong>a total idiota.
109<br />
Capítulo 16<br />
Posso fazer qualquer coisa que você possa fazer, e posso<br />
fazê-lo melhor. Acredite.<br />
Somente tem que me chamar de Amy, a Tosquiadora de Ovelhas. Isso<br />
é o que tenho estado tentado me convencer a manhã toda, depois que<br />
encontrei o recado de Snotty. Quer se encontrar comigo depois do café da<br />
manhã para nosso pequeno desafio? É isso.<br />
Infelizmente, a noite não foi <strong>um</strong> pesadelo. Realmente e<br />
verdadeiramente desafiei Snotty, e nem sequer tinha tido algo de cerveja<br />
que me acusou de cons<strong>um</strong>ir. Bom, me dou conta que sou a única estúpida<br />
aqui, mas ainda estou decidida a demonstrar-lhe que não estou à margem de<br />
tudo.<br />
Vesti-me com jeans e <strong>um</strong>a camiseta de manga longa para <strong>um</strong>a<br />
proteção total. Não tenho óculos de proteção, mas coloco meus óculos<br />
esportivos. Caminho para fora, vejo Mutt brincando para mim.<br />
— Não encontrou minha sandália favorita ainda?<br />
Para me responder, roda sobre suas costas. Sua língua está<br />
pendurada em sua boca como <strong>um</strong> pedinte.<br />
— Não se h<strong>um</strong>ilhe — lhe digo. — Não é atraente.<br />
Recolho o vira-lata e o levo comigo. Poderia se voltar útil quando se<br />
está tentando acurralar as ovelhas.<br />
— Está bem — lhe digo. — Vamos ter <strong>um</strong> plano de jogo. Faz-me<br />
parecer bem, e esquecer o incidente da sandália. De acordo?<br />
A resposta de Mutt é <strong>um</strong> grande peido.<br />
Este não vai ser o meu dia.
Ao chegar aos currais de ovelhas, Ofra é a primeira pessoa que vejo.<br />
— Não tem que fazer isso — ela diz.<br />
Oh sim, tenho que fazer. Por mim. Por Mutt. Pelos americanos em<br />
todo o mundo. A falta de confiança de Ofra em mim apenas favorece minha<br />
resolução.<br />
— Isso está bom. Quero fazê-lo. — lhe asseguro.<br />
Doo-Doo se aproxima e me dá conselhos.<br />
— Mantém a ovelha pressionada. Mantém seus olhos nela. Não deixe<br />
cair a máquina de tosquiar em seu pé.<br />
Ele é como <strong>um</strong> treinador de boxe, e o ringue é o meu oponente.<br />
Tem colocado <strong>um</strong>a ovelha no curral, junto com <strong>um</strong>a máquina de<br />
tosquiar pendurada no teto. Doo-Doo me ajuda a pegar a correia da máquina<br />
em minha mão.<br />
Analiso a minha volta. Snotty está sentada em cima de <strong>um</strong> corrimão<br />
com O´dead a seu lado. Ofra e Doo-Doo, meus apoios, estão ao meu lado.<br />
Avi não está à vista. Surpreende-me que não veio me ver ser comida<br />
viva por <strong>um</strong>a ovelha.<br />
Do outro lado do curral está outra ovelha. A de Snotty. Juro que<br />
parece muito menor que a minha.<br />
Tomando <strong>um</strong>a respiração profunda, entro no curral com o animal<br />
desprevenido. É ainda maior do que pensava. Alguém pensaria que Snotty<br />
teria compaixão o suficiente para me dar <strong>um</strong> cordeiro como a da canção<br />
infantil, mas não.<br />
Este definitivamente não é o pequeno cordeiro de Maria. E sua lã é<br />
tão suja quanto à de Mutt, e não é branca como a neve.<br />
Snotty entra no outro curral. Pula exatamente dentro, como o faz<br />
todos os dias. Depois se vira para mim.<br />
— Vai realmente passar por isso?<br />
110
— Claro que sim. — Uma vez vi <strong>um</strong> adesivo que mostrava a foto de<br />
<strong>um</strong>a bandeira estadunidense e o título abaixo Estas Cores Não Correm. Não<br />
estou a ponto de sair como <strong>um</strong>a galinha. Mesmo que realmente o queira.<br />
— Está bem — disse com pura incredulidade no rosto. — No três<br />
começaremos. Quem terminar primeiro ganha.<br />
— Muito bem.<br />
— Um. Dois. Três.<br />
Coloquei Mutt para baixo e sussurrei.<br />
— Vá fazer o seu.<br />
Imediatamente Mutt começou a latir e as ovelhas escapuliram para o<br />
canto. Ligando a máquina me encaminho para o animal ameaçador.<br />
Até que me olha com esses grandes olhos de cor cinza. Continuo<br />
pensando no que Ron me disse, que é muito quente para eles todo esse pelo<br />
espesso.<br />
Entendo e concordo. Bom, estou tentando convencer a mim mesma<br />
que entendo e concordo.<br />
Não está funcionando.<br />
Olho para baixo, para Mutt, que me olha como se dissesse. Faz! Ele<br />
tem razão. Não vou me acovardar agora. Tenho que enfrentar meus medos e<br />
apenas fazê-lo. Tenho a máquina como <strong>um</strong>a espada e a cabeça em batalha.<br />
Exceto que a ovelha estúpida foge com medo. Quando me passa<br />
seguro a máquina feito <strong>um</strong>a idiota. Agora a coisa tem <strong>um</strong>a risca calva em<br />
suas costas.<br />
Tento não escutar ou ver o progresso no outro curral. Estou<br />
tentando me concentrar unicamente em minha missão. Mutt está latindo <strong>um</strong><br />
montão, por isso as ovelhas estão nervosas.<br />
— Luta contra ele no chão e o mantenha ali. — escuto da minha<br />
seção de animadores.<br />
Devo lhes dar a notícia que nunca tive <strong>um</strong> irmão que me ensinasse a<br />
lutar? Ou <strong>um</strong>a irmã por acaso.<br />
111
112<br />
— Mutt, tem que me ajudar aqui.<br />
Mutt é <strong>um</strong> grande pastor de ovelhas. Dou-me conta disto quando o<br />
animal tenta se mover. Mutt espertamente o encurrala no canto de novo.<br />
Com <strong>um</strong> movimento rápido, tenho meu peso contra a criatura de lã e<br />
começo a tosquiar. Não tem sentido ou razão para isso, estou tão feliz<br />
quando a lã suja começa a voar.<br />
Escuto <strong>um</strong> monte de risos, alguns aplausos e varias instruções de<br />
Doo-Doo. Não paro, sou como <strong>um</strong>a animada sineta de ovelhas selvagens.<br />
Dou <strong>um</strong> passo para trás e olho ao pobre animal. Bom, não tenho feito<br />
<strong>um</strong> trabalho tão quente. Tem <strong>um</strong> penteado mohawk e seu corpo parece<br />
como se fosse <strong>um</strong> mapa de rotas. Mas o fiz e me sinto vitoriosa.<br />
Até que escuto o grito de Ron.<br />
— Que demônios está acontecendo aqui?
113<br />
Capítulo 17<br />
Essa montanha-russa chamada vida está me deixando tonta.<br />
— Amy, precisamos conversar.<br />
Eu odeio quando os pais pensam que eles podem se sentar e dizer o<br />
que você tem feito de errado, e eles esperam que você fica quieta como <strong>um</strong>a<br />
estátua de boneco bobblehead 24 .<br />
— O que você quer?<br />
Agora eu estou sentada para fora de casa acariciando Mutt. Estou<br />
orgulhosa dele, ele é <strong>um</strong> grande pastor de ovelhas. Eu posso ouvir o tio<br />
Chime gritando para Snotty dentro da casa. Ele não parecia muito feliz<br />
quando Ron explicou a nossa pequena competição.<br />
— Eu quero saber o que está acontecendo com você. — diz Ron,<br />
sentando ao meu lado.<br />
— Nada, eu digo.<br />
Ele coloca <strong>um</strong>a das mãos no meu braço.<br />
— Acredite ou não, eu quero que você seja feliz. Você não tem que<br />
tosar as ovelhas para provar nada para mim.<br />
Eu dou de ombros com sua mão de cima de mim.<br />
24 Aqueles bonequinhos que mechem a cabecinha.
— Se você quer que eu seja feliz, me dê a passagem para ir embora<br />
agora. Eu não pertenço aqui — eu digo. Então eu acrescento, — e eu não<br />
pertenço a você.<br />
Eu não sei por que eu disse isso. Eu sabia que as palavras que saíram<br />
da minha boca iriam machucá-lo. Talvez no fundo eu quisesse magoá-lo por<br />
não estar lá para mim nos últimos dezesseis anos de minha vida. Eu<br />
continuo olhando para Mutt e esfregando sua barriga para que eu não tenha<br />
que olhar para a maior decepção da minha vida.<br />
— Está bem.<br />
Espere. Será que ele acabou de dizer "Está bem?" Eu acho que ele<br />
disse, mas a palavra não se processou ainda.<br />
Quando eu olho para cima, Ron está de costas para mim. Ele está<br />
voltando para dentro da casa. Minhas pernas estão <strong>um</strong> pouco dormentes por<br />
ter segurado o vira-lata no meu colo por muito tempo, mas eu o tiro e<br />
levanto e começo a segui-lo.<br />
114<br />
mala.<br />
Quando eu entro na casa, eu vou até ele. Ele está vasculhando sua<br />
— O que você disse? —Eu pergunto.<br />
Ele olha de soslaio para mim antes de vasculhar sua mala<br />
novamente. — Eu disse 'Está bem,' Amy.<br />
— Bem como em...<br />
— Em me excluir de sua vida, se isso vai fazer você feliz, então isso é<br />
o que eu quero para você.<br />
Ele tira os papéis para fora da mala e os estende para mim.<br />
— Aqui está sua passagem de volta para os EUA.<br />
Eu hesito por <strong>um</strong> momento. Então minha mão alcança e pega o papel<br />
da sua mão.
Uma onda de tristeza e confusão me faz congelar. Então eu corro<br />
para longe da casa e vou para o lugar onde Safta e eu conversamos sobre seu<br />
amor por este lugar.<br />
Sento na beira da montanha, eu penso sobre tudo o que vou deixar<br />
para trás se eu for embora. <strong>Como</strong> Matan. <strong>Como</strong> a minha tia e tio, que eu<br />
acabei de conhecer. E Mutt.<br />
Mas acima de tudo, eu quero estar aqui por Safta. Eu a amo, e não<br />
pode simplesmente ir embora enquanto eu sei que ela está passando por<br />
tratamentos de quimioterapia.<br />
Abraço os meus joelhos junto a mim, penso sobre minha vida aqui<br />
em Israel. É <strong>um</strong>a parte de mim, mas ao mesmo tempo não é.<br />
Voltando para casa, eu olho para Ron. Eu tenho que dizer a ele que<br />
eu quero ficar aqui por outra razão, também: para descobrir onde eu me<br />
encaixo em sua vida. Quando eu o vejo falando no telefone, eu me sento na<br />
cadeira da cozinha, e espero.<br />
Ron me dá o telefone. — É sua mãe. Eu liguei para ela.<br />
— Nós precisamos conversar, está bem? — eu digo a Ron antes de<br />
pegar o telefone da mão dele.<br />
Eu observo que ele balança a cabeça, põe as mãos nos bolsos, e sai.<br />
Eu coloco o telefone ao meu ouvido.<br />
— Olá?<br />
— Amy, você está bem? Ron apenas me disse que você quer voltar<br />
para casa.<br />
— Eu disse, mas não vou mais.<br />
— Você mudou de ideia?<br />
— Sim, eu acho. — eu digo.<br />
115
Eu a ouvi sair da cama e fechar <strong>um</strong>a porta. Aposto que ela se trancou<br />
no banheiro, porque Marc com <strong>um</strong> "c" está em sua cama e ela não quer<br />
acordar o nerd idiota.<br />
Depois de <strong>um</strong> minuto ela me diz com <strong>um</strong>a voz muito borbulhante —<br />
Eu tenho <strong>um</strong>a grande notícia.<br />
— Você terminou com Marc? — Eu digo com <strong>um</strong> suspiro de alívio.<br />
Finalmente.<br />
— Não, sua boba. Marc me pediu em casamento na noite passada. E<br />
eu disse que sim.<br />
—O quê! — Eu digo e meu coração se afunda em meu peito. Isso não<br />
está acontecendo comigo.<br />
— É tão emocionante. — ela diz, ignorando o fato de que eu estou<br />
totalmente pirando aqui.<br />
— Ele fez <strong>um</strong> jantar especial. O anel estava no fundo da minha taça<br />
de champanhe.<br />
— Ele é <strong>um</strong> idiota, mãe. Definitivamente ele NÃO é original. O anel na<br />
parte inferior da taça champanhe é tão cliché.<br />
— Ele é <strong>um</strong>a das principais incorporadoras imobiliárias do país. O<br />
novo projeto na Gold Coast, o local mais procurado em Chicago, está sendo<br />
feito por sua empresa.<br />
— Então? Nós só temos <strong>um</strong>a vaga de estacionamento no nosso<br />
condomínio. Não há espaço para sua Mercedes. — eu digo.<br />
— Eu pensei em dar <strong>um</strong>a olhada no Subúrbio. Você sabe, algo<br />
maior... Com <strong>um</strong> quintal e tudo mais.<br />
Huh?<br />
— <strong>Como</strong>, você vai mudar para o subúrbio?<br />
— Isso não é maravilhoso?!<br />
116
117<br />
— E como eu fico? Sem teto?<br />
Marc.<br />
— Claro que não, querida. Não seja ridícula. Sua casa é comigo e<br />
Desde quando "você e eu" se converteu em "você, eu, e Marc"?<br />
É bom saber que sou importante o suficiente para ser consultada.<br />
— Marc me odeia, mamãe. — Agora eu sinto como se todo mundo<br />
me odiasse.<br />
— Ele não te odeia. Você não tem dado a ele <strong>um</strong>a chance.<br />
Eu engulo em seco e tento não chorar.<br />
— Eu sei que é <strong>um</strong>a surpresa para você, mas eu juro que é a melhor<br />
coisa para nós. Nós vamos ser <strong>um</strong>a família.<br />
Eu juro que eu vou vomitar. Uma família? Mas Marc não é a minha<br />
família.<br />
— Eu pensei que você ficaria feliz. Depois de voltar de Israel, você<br />
pode me ajudar a planejar o casamento e procurar <strong>um</strong>a nova casa. Nós<br />
vamos fazer <strong>um</strong> novo começo, nós três.<br />
Eu não quero <strong>um</strong> novo começo, eu quero <strong>um</strong>a nova idade.<br />
— Eu te amo. — ela diz.<br />
Se ela me amasse tanto, ela teria pensado antes de seguir em frente e<br />
estragar meus planos.<br />
Eu sinto <strong>um</strong> caroço enorme na minha garganta quando eu digo: —<br />
Parabéns. Eu também te amo.<br />
— Tchau, querida. Me liga na próxima semana, ok? — ela diz. — Eu<br />
só quero que sejamos felizes.
Eu saio para fora de casa e vejo Ron em <strong>um</strong> trator velho, verde<br />
estacionado na parte de trás da casa.<br />
— Você estragou tudo! — Eu grito.<br />
Ele tem a audácia de olhar para mim sem dizer nada.<br />
Eu cruzo os braços na frente do meu peito.<br />
— Apenas fique parado em silêncio, Ron. Você faz isso muito bem.<br />
— O que você está falando?<br />
118<br />
— Eu só fui informada de que o namorado idiota da mamãe a propôs<br />
em casamento e você não pode fazer nada? Teria sido bom ter meus pais<br />
juntos casados! Pelo menos para dizer que meus pais se casaram depois de<br />
<strong>um</strong> longo tempo. Mas você é muito egoísta e preocupado sobre garantia do<br />
sonho americano enquanto se desfruta de ser solteiro. Você nunca lutou por<br />
nós. Pior, você nunca lutou por mim.<br />
Ali, eu finalmente disse. Pode ter me levado dezesseis anos e como<br />
<strong>um</strong>a atitude para cobrir as minhas inseguranças, mas eu finalmente<br />
derramei a verdade.<br />
Ele pisca várias vezes, então diz:<br />
— Ela vai se casar?<br />
— Eu disse isso, não disse?<br />
Ele respira fundo, depois senta no pára-choque do trator.<br />
— Não pense que eu não lutei, Amy. Pedi para se casar comigo. E não<br />
apenas <strong>um</strong>a vez. Antes de você nascer e praticamente toda vez que eu a vi<br />
após o seu nascimento eu me ajoelhei. Você estava muito ocupada fugindo<br />
de mim para perceber isso.<br />
— Se, e eu quero dizer se, você a propôs, por que não se casaram?<br />
Você estava n<strong>um</strong> comando, pelo amor de Deus. Você foi especialmente<br />
treinado para c<strong>um</strong>prir missões.
119<br />
Ele dá <strong>um</strong> suspiro longo e profundo.<br />
— Ela disse que não queria que você crescesse vendo <strong>um</strong> casamento<br />
sem amor. Ela queria encontrar <strong>um</strong> cara sólido para ser seu pai, e não <strong>um</strong><br />
imigrante israelense. Toda vez que eu vinha vê-la, eu recebia <strong>um</strong>a carta de<br />
seu pai ameaçando entrar em contato como INS para cancelar meu visto. Ele<br />
me acusou de tê-la engravidado de propósito, para proteger a minha<br />
cidadania americana ao me casar com ela. Não era verdade, mas eu temia<br />
nunca mais ver você de novo. Ele era <strong>um</strong> homem poderoso, Amy.<br />
Ele olha para mim com <strong>um</strong>a expressão de dor.<br />
— Eu não espero que você entenda.<br />
— Eu, eu não entendo. — eu digo, confusa.<br />
— Quando você me disse que iria parar de vir aqui, eu não sabia o<br />
que eles tinham dito sobre mim. Eu só queria <strong>um</strong> relacionamento com você,<br />
mesmo que fosse <strong>um</strong>a vez por ano.<br />
— Você é <strong>um</strong>a verdadeira decepção. — eu digo.<br />
Espero a palestra me respeitam-porque-sou-o-seu-pai, mas em vez<br />
disso, Ron diz:<br />
— Você está certa.<br />
Estou chocada, mas digo:<br />
— Dane-se se não estou certa. Talvez ainda haja <strong>um</strong>a chance com a<br />
minha mamãe. Você pode chamá-la e...<br />
— Não vai mudar nada — ele diz, — e você sabe disso. No fundo,<br />
você sabe que ela não vai se casar comigo.<br />
— Eu me sinto tão sozinha. — digo, quase n<strong>um</strong> sussurro.
120<br />
— Eu te amo — ele diz. — Não importa que você não me chame de<br />
"pai" ou queira me abraçar. Eu queria isso, mas eu quero a sua amizade e<br />
confiança ainda mais.<br />
Isto é muita informação para mim em <strong>um</strong> dia. Eu preciso de alg<strong>um</strong><br />
tempo para digeri-lo.<br />
— Eu vou ficar em Israel para o verão. — eu finalmente digo. —<br />
Talvez possamos, oh, eu não sei.<br />
O começo de alg<strong>um</strong> sorriso aparece no canto de sua boca.<br />
Com <strong>um</strong> aceno de cabeça eu digo:<br />
— Não fique muito entusiasmado, eu ainda estou chateada.<br />
— Estou feliz que você vai ficar.<br />
Eu me viro e volto para a casa e vou para o meu quarto.<br />
Snotty está lá.<br />
Sinceramente, ela é a última pessoa que eu quero ver. Eu lembro que<br />
eu lhe disse algo sobre ter peitos pequenos ou algo parecido, mas parece que<br />
foi há muito tempo. Eu me atiro na minha cama.<br />
— Você tem embalagens? — ela pergunta, curvando-se sua mochila<br />
enquanto colocar as coisas dentro.<br />
Eu me inclino para trás em meus cotovelos.<br />
— Para quê?<br />
Ela se vira, esses círculos de carvão-preto dirigem-se diretamente<br />
para mim.<br />
— Acampar. Você disse que estava indo.<br />
Deitada na cama, eu digo. — Eu menti.
121<br />
— Assim como <strong>um</strong> americano.<br />
— Desculpe-me? O que isso quer dizer?<br />
— Os israelenses dizem o que querem dizer. Vocês americanos<br />
apenas falam sem querer qualquer coisa que dizem querer.<br />
— Nós não fazemos! — Nossa, todo mundo está no meu pé<br />
ultimamente. — Para sua informação, tenho orgulho de ser americana. Nós<br />
não podemos sempre fazer ou dizer a coisa certa, mas o que se pode<br />
esperar? Ninguém quer policiar o mundo, porque eles querem que façamos<br />
por ele. Nós salvamos a bunda de todos do mundo e depois culpam-nos por<br />
isso. Não é realmente justo?<br />
Agora eu sou como <strong>um</strong>a embaixadora dos EUA.<br />
Snotty levanta a mochila por cima do ombro e sai da sala.<br />
— Shalom, Amy. Estamos saindo em dez minutos.<br />
Ela me deixa com duas opções: provar a Snotty que ela está errada e<br />
ir ao acampamento para salvar a cara. Ou ficar no moshav sem nada para<br />
fazer, exceto ovelhas carecas com Ron e tio Chime.<br />
Eu ando no quarto de Safta e sento na beira da cama. Minha vida<br />
ferrou-se por inteiro e eu estou completamente confusa.<br />
— Eu preciso de seus conselhos.<br />
Ela sorri calorosamente para mim, como sempre. Estou tão feliz de<br />
tê-la em minha vida, mesmo que foi <strong>um</strong> início tardio em conhecer uns aos<br />
outros.<br />
— Você vê, é assim. — eu digo. Eu respiro fundo e boto tudo para<br />
fora quando eu falo. — Minha mãe quer se casar com seu namorado, esse<br />
cara que eu particularmente não gosto. Ron... Você sabe, seu filho, tem sido<br />
<strong>um</strong>a decepção para mim, porque para ser honesta, ele não tem sido <strong>um</strong><br />
elemento permanente em minha vida. Eu me ressinto dos dois, e estou<br />
confusa sobre quem eu sou e onde eu me encaixo. E ainda por cima, O'snot
está indo em <strong>um</strong>a viagem com os seus amigos, e eu meio que quero ir e<br />
provar a ela que sou capaz, então eu estou pensando.<br />
122<br />
Safta acena com a cabeça pensando, obviamente tentando entender<br />
minha situação e me dar <strong>um</strong> conselho certo. — Para <strong>um</strong>a menina de 16 anos<br />
de idade, você tem muito com que lidar.<br />
Soltei outro longo suspiro.<br />
— Isso não é verdade. Talvez você precise de alg<strong>um</strong> tempo afastada.<br />
Eu acho que o acampamento é <strong>um</strong>a boa ideia. Israel é <strong>um</strong> lugar mágico, Amy.<br />
Você simplesmente pode achar o que está procurando.<br />
Ela está certa. Eu preciso fugir da realidade por <strong>um</strong> tempo. Eu beijo<br />
Safta na bochecha e coloco a cabeça para fora do quarto. Mas eu paro na<br />
porta, viro e digo:<br />
— Estou feliz que você é a minha Safta.<br />
Ela inclina a cabeça e sorri.<br />
— Eu também.
123<br />
Capítulo 18<br />
Você já se sentiu em menor número?<br />
Meu coração está disparando enquanto observo <strong>um</strong>a mochila vazia<br />
nos pés da minha cama. Eu talvez não tenha percebido que estava ali. Foi,<br />
provavelmente, deixada por mim. Apresso-me e soco alg<strong>um</strong>as roupas na<br />
bolsa e vou para fora.<br />
Quando chego à frente da casa, todos os adolescentes estão subindo<br />
na parte de trás de <strong>um</strong> Jeep. É como <strong>um</strong>a caminhonete com caçamba, mas<br />
não. O carro tem <strong>um</strong>a parte de táxi na frente e atrás, é como <strong>um</strong>a caçamba,<br />
mas tem bancos nos dois lados e corrimãos em cima da caminhonete.<br />
Avisto Snotty e ela me dá esse meio-sorriso. Tá, tá. Eu sei. Ela<br />
percebe agora que tem vantagem porque ela meio que me enganou para ir<br />
nessa viagem. Meio que. Foi realmente minha decisão vir.<br />
Ron me alcançou. — Eu não quero que você vá. — ele disse. — Você<br />
é muito nova e está passando por muita coisa agora.<br />
Percebendo que todos já estão no carro e nos observando, congelo.<br />
— Você está me dizendo que não posso ir?<br />
— Eu não estou dizendo isso… exatamente.<br />
— Eu quero ir.<br />
Avi, que estava no banco do motorista, sai do carro e caminha até<br />
Ron. Ele leva Ron até o lado da casa, longe do meu campo de visão. Quero<br />
saber o que ele está dizendo. Quero saber o que os dois estão dizendo.<br />
Eu vejo como Ron e Avi apertam as mãos depois de alguns minutos.
124<br />
Então Avi caminha até mim. Posso dizer que ele não está de bom h<strong>um</strong>or.<br />
— O quê? — eu digo.<br />
— Avi me assegurou que cuidará de você. — Ron diz, então volta<br />
para casa, pois Doda Yucky o está chamando.<br />
— Eu posso cuidar de mim mesma. — Eu asseguro a Avi, quando<br />
Ron está fora do campo de visão.<br />
— Entra no carro — Avi manda.<br />
— Eu não gosto de receber ordens de você.<br />
— E eu não gosto de <strong>um</strong>a vadia Americana mimada atrasando<br />
minhas férias. — ele diz baixo o suficiente para que apenas eu possa ouvir.<br />
Se meu olhar matasse, eu estaria encarando <strong>um</strong> garoto morto agora<br />
mesmo. Vadia Americana <strong>um</strong>a ova. Eu não sou mimada. Sei disso porque tive<br />
dois pais que querem destruir minha vida. Eu explico isso. Um me colocou<br />
nessa viagem para que pudesse provar para mim que é <strong>um</strong> bom pai. Mas<br />
aposto que, depois da viagem, voltará para sua confortável vida de solteiro.<br />
A outra quer se livrar de mim no verão para que possa ficar noiva de <strong>um</strong><br />
babaca.<br />
Se eu fosse mimada, estaria cercada por pessoas que me amam.<br />
<strong>Como</strong> Jessica. Os pais dela estragam seus podres. E eu digo podres com P<br />
maiúsculo. Ela não só tem dois irmãos e <strong>um</strong>a irmã, ela tem dois pais que<br />
vivem juntos. Eles gostam <strong>um</strong> do outro, tanto que até dão as mãos enquanto<br />
assistem TV. Eu até já os vi se beijando. E isso depois de terem quatro filhos.<br />
E eles são velhos, em seus quarenta e poucos anos.<br />
Para completar, a mãe de Jessica faz aqueles cookies fofinhos de<br />
baixa caloria que derretem na boca. E você sabe por que ela os faz? Eu lhe<br />
direi por que. Pelo simples motivo de que Jessica gosta deles. Eu não só não<br />
tenho cookies fofinhos de baixa caloria que-derretem-na-boca, mas também<br />
Mamãe nunca comprará nada de baixa caloria nas lojas. Por quê? Porque<br />
minha mãe não acredita em dietas de baixas calorias.<br />
<strong>Como</strong> Avi se atreve a me chamar de mimada?
Avi caminha de volta para frente do carro e acho que ele pode<br />
apenas partir sem esperar por mim. É como <strong>um</strong> teste.<br />
Odeio testes.<br />
Pior, eu sinto como se essa viagem inteira estivesse cheia de testes.<br />
125<br />
Ponho a mão no bolso e sinto a estrela judia que Safta me deu. Ela<br />
me disse que o guerreiro ancião judeu, Judah Maccabbee, pôs <strong>um</strong>a estrela de<br />
seis-pontas em seu escudo. As seis pontas fincam em minha palma. Eu estou<br />
guardando isso em meu bolso onde quer que eu vá… como meu próprio<br />
escudo.<br />
Quando escuto a caminhonete dar a partida novamente, não leva<br />
muito tempo até jogar a mochila na caçamba e subir.<br />
Dentro de minutos, estamos n<strong>um</strong>a estrada suja, a sujeira atrás de nós<br />
é prova da nossa jornada. Tenho que segurar nas laterais da caminhonete, as<br />
pedras na estrada fazem o caminho parecer <strong>um</strong>a montanha-russa<br />
acidentada.<br />
E meus peitos estão rodopiando como loucos. <strong>Como</strong> se não<br />
estivessem presos em meu corpo. Pensei que fosse ruim o suficiente eu ter<br />
<strong>um</strong>a mochila e ser responsável por não atirá-la para fora da caminhonete.<br />
Agora tenho que ter certeza de que meus peitos fiquem dentro da<br />
caminhonete, também.<br />
Pelo menos, é o que parece. Um rodopia de <strong>um</strong> jeito, <strong>um</strong>, de outro.<br />
Toda vez que cruzo meus braços na frente do peito para mantê-los em <strong>um</strong><br />
lugar, perco meu equilíbrio e bato em Doo-Doo (que está de <strong>um</strong> lado) ou<br />
Ofra (que está no outro).<br />
Avi não consegue dirigir <strong>um</strong> pouco devagar? Parece que essa estrada<br />
suja e empedrada nunca foi viajada antes.<br />
O Sol está se pondo além das montanhas. É muito bonito ver os<br />
vermelhos, laranjas e amarelos descolorirem atrás das montanhas,<br />
contornando a paisagem antes de, finalmente, desaparecerem para a noite.<br />
Está ficando escuro enquanto dirigimos, a luz s<strong>um</strong>indo com cada minuto que<br />
passa. Logo, está escuro.
126<br />
Uma hora depois, nós finalmente paramos. Não há nada por aqui,<br />
embora eu possa ver luzes brilhantes das cidades distantes como estrelas na<br />
noite.<br />
Eu me esqueci, desde que comecei essa jornada selvagem, de que<br />
estou em Israel. Também conhecida como zona de guerra.<br />
Ninguém parece se importar enquanto se empilham atrás da<br />
caminhonete. Sondo a área o tanto que consigo, o que não é muito. Ainda<br />
estou na caminhonete quando Avi vem para a parte de trás dela.<br />
Nossos olhos se encontram. — Você vem? — pergunta.<br />
Ainda tenho <strong>um</strong> sentimento ruim, como se houvesse algo que eu não<br />
entendesse. E ainda não superei o fato de que ele me chamou de vadia<br />
americana mimada.<br />
Quando não respondo, ele dá de ombros e começa a caminhar. Não<br />
consigo ver para onde ele está indo, pois está muito escuro. Mas sei que está<br />
caminhando, porque posso ouvir o cascalho moer sobre seus pés.<br />
— Espere! — digo.<br />
Ouço o cascalho parar. Então o ouço se aproximar da caminhonete.<br />
Está me encarando, posso sentir.<br />
— Eu, ah, preciso de ajuda para descer da caminhonete — digo<br />
desajeitadamente.<br />
Sinto sua mão aparecer e procurar pela minha. Agarro-a e ele me<br />
leva gentilmente até a ponta da caminhonete. Antes que eu perceba, está<br />
soltando minha mão e sinto as suas envolverem minha cintura então me<br />
levanta da caminhonete e me deixa cuidadosamente no chão.<br />
Nós dois estamos lá, em pé, cara a cara, enquanto ele mantém as<br />
mãos em minha cintura e não me solta. Sua força quase parece carícia e não<br />
quero que ele me deixe. Sinto-me segura com seu toque, mesmo que no<br />
fundo da minha cabeça, ainda posso ouvi-lo me chamar de vadia americana<br />
mimada.<br />
Apenas pensar nisso me faz endireitar e dou <strong>um</strong> passo para trás.
— Você se importa de deixar suas mãos com você? — me encontrei<br />
dizendo.<br />
Ele deixa cair suas mãos e diz: — Cuidado com as cobras.<br />
— Cobras?<br />
<strong>Como</strong> se eu não estivesse tensa o bastante no momento. Ele vai para<br />
longe de mim e o ouço dar <strong>um</strong>a pequena risada. Cobras? Ele está brincando?<br />
— Não se preocupe. — Doo-Doo diz enquanto me entrega <strong>um</strong>a<br />
lanterna. — Ele está apenas tentando te assustar.<br />
— Bem, ele está fazendo <strong>um</strong> bom trabalho — resmungo sob minha<br />
respiração.<br />
Olho as meninas se sentarem, perto de onde os garotos tentam<br />
acender <strong>um</strong> fogo. E estou aqui, de pé, perto do Jeep.<br />
127<br />
Eu deveria ter trazido Mutt, ele me protegeria das cobras e de<br />
garotos estúpidos. Ficar apegada ao cachorrinho não era minha ideia, ele<br />
meio que entrou em mim. Mesmo que ele seja <strong>um</strong> animal irritante, ladrão de<br />
Ferragamo.
128<br />
Capítulo 19<br />
Odeio quando outros sabem mais de mim do que eu.<br />
— Você está bem, Amy? — perguntou Ofra. Sentando perto da<br />
fogueira.<br />
— Super. — eu disse.<br />
Guardei minha mochila na parte de trás do jipe e me juntei às<br />
meninas. Estão falando em hebraico. Estou acost<strong>um</strong>ada a isso, mas ainda me<br />
incomoda.<br />
Eu tenho que sentar lá e sorrir quando sorriem e como <strong>um</strong>a idiota<br />
gargalhar quando elas gargalham. Sou como <strong>um</strong>a mímica idiota, porque nem<br />
mesmo sei o que estão falando!<br />
Pelo que sei, estão dizendo. — Amy tem <strong>um</strong>a meleca pendurada no<br />
nariz. — Então vou e sorrio junto, tornando mais divertido para elas, mas<br />
fazendo de mim e meu muco pendurado grandes perdedores. Quando penso<br />
nisso, cada vez que sorriem finjo coçar meu nariz e procuro algo estranho<br />
pendurado nele.<br />
— Então, me diga sobre os rapazes americanos? — perguntou Ofra,<br />
eu poderia beija-la só por começar <strong>um</strong>a conversa comigo. — São tão lindos<br />
como eu vejo na televisão? Eu gosto dos que aparecem no The young and the<br />
restless 13 25 .<br />
Acredite ou não, eu vejo The young and the restless 13. Talvez eu<br />
tenha algo em com<strong>um</strong> com <strong>um</strong>a garota Israelense depois de tudo.<br />
25 13“The young and the restless”: Série de televisão.
129<br />
Depois de todas as primeiras novelas. Não posso acreditar como<br />
estão tão atrasados com os episódios aqui.<br />
— Gosto muito — disse Ofra.<br />
Sinto-me <strong>um</strong> pouco melhor agora, graças a Ofra. Até mesmo Snotty<br />
parece estar escutando sem o famoso desprezo em sua cara.<br />
Depois de <strong>um</strong>a hora de rir, conversar, beber e comer, Ofra e eu<br />
estamos indo encontrar <strong>um</strong> lugar para urinar. <strong>Como</strong> não há banheiros no<br />
meio do nada, temos que nos abaixar. Felizmente Ofra trouxe <strong>um</strong> pouco de<br />
papel higiênico, ou não saberia o que fazer.<br />
Deixamos o grupo para encontrarmos <strong>um</strong> bom lugar para ficarmos<br />
em privado. Nós duas com nossas lanternas acesas. Estou com tanto medo<br />
de pisar em <strong>um</strong>a cobra ou em outro animal que mantenho a luz se movendo<br />
de <strong>um</strong> lado para o outro.<br />
Agora que estamos <strong>um</strong> pouco separadas do grupo, deveria apagar<br />
minha lanterna para que Ofra não tenha que assistir ao espetáculo de me ver<br />
agachada? O que importa? Eu seguro a lanterna entre meu queixo e pescoço,<br />
para poder ver o que estou fazendo.<br />
Percebo rapidamente que não sou boa abaixada, muito menos com<br />
<strong>um</strong>a lanterna debaixo do meu queixo. Na verdade, sou péssima. Claro que,<br />
com <strong>um</strong> banheiro eu não tenho problemas. As meninas não foram feitas<br />
biologicamente para isso.<br />
Enquanto me ponho de joelhos tanto quanto posso, tento relaxar.<br />
Porém posso sentir a urina escorrendo por minhas pernas, então me coloco<br />
rapidamente em <strong>um</strong>a posição de caranguejo, com minhas mãos e pés no<br />
chão. Pelo menos assim a gravidade pode trabalhar ao meu favor.<br />
Será que da para ver a Ofra? Ela pode me ver? Deveria apagar minha<br />
lanterna, mais é impossível na posição que estou e estou me sentido <strong>um</strong><br />
pouco tonta. Eu sei o que está pensando, que provavelmente vou cair justo<br />
sobre a urina, porque estou em <strong>um</strong>a posição de caranguejo e estou me<br />
sentindo <strong>um</strong> pouco desequilibrada.
130<br />
Porém para minha surpresa, sou capaz de manter minha posição de<br />
caranguejo-urinando muito bem. E quando acabo de me limpar o melhor<br />
que posso, coloco de novo meus shorts.<br />
Estou absolutamente orgulhosa de mim mesma por esta realização.<br />
Provavelmente agora poderia fazer <strong>um</strong>a audição para o programa Survive 26 ,<br />
agora que consegui ficar sem <strong>um</strong> banheiro apropriado.<br />
— Por que O”snot me odeia? — pergunto a Ofra enquanto nós<br />
caminhamos de volta para o acampamento. Eu não quero saber, mas eu acho<br />
que pensando bem, sim eu quero.<br />
Ela para e olha para mim pensativa.<br />
— É <strong>um</strong>a coisa de orgulho.<br />
— Poderia ser mais específica.<br />
— Bom, Avi e O”snot tem <strong>um</strong>a história...<br />
— Eu sabia! — digo em voz alta.<br />
— Não, não como isso. Bom, é como, uh...<br />
Eu fico esperando pacientemente para que ela termine. Bom, não<br />
tão pacientemente. Acho que ela nem se deu conta.<br />
Ofra começa a morder <strong>um</strong>a unha.<br />
— Me matará se eu lhe disser — disse<br />
— Eu vou te matar se você não me falar.<br />
— Eles sempre foram mais do que apenas amigos. Eles eram como<br />
irmãos. Avi sempre saiu com muitas meninas, mas não tem feito por <strong>um</strong> ano.<br />
— E...<br />
26 Survive: Programa de sobrevivência.
131<br />
— Avi está passando por <strong>um</strong> momento difícil agora. Tem sido <strong>um</strong><br />
idiota com todos. O”snot pensou que se ela e Avi fossem <strong>um</strong> casal, ele<br />
superaria o que for que o está roendo por dentro. Ele a rejeitou e acho que<br />
ela ainda está magoada com isso.<br />
— Me odeia sem sequer me conhecer.<br />
— Bem, não esteve planejando dividir <strong>um</strong> quarto para o verão com<br />
<strong>um</strong>a Americana.<br />
— Que há de errado em ser Americana? Eu pensei que os Estados<br />
Unidos e Israel eram aliados.<br />
— Nós somos — ela diz quando começamos a voltar para o fogo. —<br />
Eu acho que nos incomoda <strong>um</strong> pouco que as crianças americanas não<br />
tenham que entrar para o exército, enquanto que nós temos que ir assim que<br />
completamos 18. As meninas por 2 anos, os meninos por 3. Não me<br />
interprete mal, eu quero ir. Porém vocês judeus americanos se sentam em<br />
suas lindas casas, seus lindos pedaços de terra e fazem parte em suas<br />
universidades, enquanto os judeus de Israel colocamos nossas vidas em<br />
risco, para evitar a destruição de nossa gente e nossa pequena parte de<br />
terra.<br />
— Sério? É tão pequeno?<br />
— Todo o estado de Israel é do tamanho de New Jersey.<br />
— Não está brincando?<br />
— Não.<br />
Homem, como parece, estou começando a pensar que as crianças<br />
americanas realmente levam a maior parte do palito.<br />
Ofra e eu caminhamos de volta para a fogueira, onde o resto do<br />
grupo está colocando sacos para dormir.<br />
Agora eu estou com medo.
132<br />
Eu não fiz planos para sacos de dormir. Onde estão as tendas?<br />
Quando as pessoas vão acampar em casa há tendas. Ou cabanas. Ou<br />
teepees 27 .<br />
— Não trouxe <strong>um</strong> saco de dormir. — digo suavemente a Ofra.<br />
— Está bem — disse ela. — Tenho certeza que Avi compartilhará<br />
com você.<br />
Pisco, como se assim eliminasse meu problema de audição.<br />
— Vamos, Amy — disse Ofra empurrando meu ombro para trás. —<br />
Sabe que Avi gosta de você.<br />
Avi? Gosta de mim? Acho que não.<br />
— Odeia-me — digo.<br />
Olho ao tipo, e está sentado sobre seu saco de dormir em estilo<br />
indiano, com <strong>um</strong>a guitarra descansando sobre sua perna.<br />
— Ele me chamou de vadia americana mimada — digo para provar<br />
meu ponto.<br />
— Talvez ele goste das vadias mimadas americanas — ela disse<br />
antes de sair caminhando para se juntar com Snotty, Doo-Doo e O”dead.<br />
ouvir.<br />
— Claro — murmuro em resposta, quando sei que não pode me<br />
E pela primeira vez desde que cheguei a Israel, estou realmente<br />
confusa, ao ponto de ter essa estranha sensação em meu estômago cada vez<br />
que vejo Avi.<br />
Sim, ele é sexy tanto quanto possível.<br />
27 teepees : Tenda em forma cônica feita de pele de animais, típicos<br />
das tribos africanas e nativas norte-americanas durante o período colonial.
Sim, me ajudou com as entranhas da serpente e pastoreando as<br />
ovelhas.<br />
Porém também é arrogante, grosseiro e totalmente ignorante.<br />
Poderia <strong>um</strong> cara assim se sentir atraído por mim.<br />
133<br />
ele?<br />
Por outro lado, eu poderia realmente ser atraída por <strong>um</strong>a cara como
134<br />
Capítulo 20<br />
Fingindo... É <strong>um</strong>a outra maneira de manipular as pessoas<br />
para fazer o que queremos.<br />
Estamos todos sentados em frente à fogueira, que está acesa agora,<br />
graças aos três garotos. E nós estamos ouvindo Avi tocar seu violão. Eu<br />
tenho que admitir, sua voz é muito reconfortante. Claro que eu não tenho a<br />
menor ideia do que ele está cantando porque é em hebraico. Quem sabia que<br />
o idioma catarro poderia realmente se tornar <strong>um</strong> som harmonioso na<br />
música?<br />
Ele não está olhando para mim enquanto canta. O'dead e Snotty<br />
estão cantando a música, tudo muito suave devido ao clima da noite. Doo-<br />
Doo e Ofra estão de mãos dadas e estão balançando ao som do violão.<br />
Snotty e O'dead estão sentados perto <strong>um</strong> do outro. Ele está olhando<br />
para ela com olhos carinhosos enquanto canta. Ela é indiferente.<br />
Quando a música acabou, eu pergunto para Avi. — Essa é <strong>um</strong>a bela<br />
canção. Você escreveu isso?<br />
Ainda posso ouvir o z<strong>um</strong>bido da última nota quando Avi responde:<br />
— Sim.<br />
— É sobre o quê? — Eu pergunto.<br />
Sua expressão fica séria. — Um cara que perde <strong>um</strong>a pessoa<br />
importante em sua vida.<br />
Eu automaticamente pres<strong>um</strong>o quem seja essa menina e <strong>um</strong>a onda de<br />
ciúme toma conta de mim. Eu não respondo. O silêncio enche o ar. Eu acho
que ele me odeia, mas de alg<strong>um</strong>a forma tenho a estranha sensação de que há<br />
<strong>um</strong> pouco de dor por trás de suas palavras.<br />
135<br />
Pensando sobre o que Ofra disse, não posso deixar de me perguntar<br />
como eu posso descobrir sobre seus verdadeiros sentimentos para mim. Não<br />
que eu me importe com o que são, mas escute, <strong>um</strong>a menina informada é <strong>um</strong>a<br />
garota inteligente.<br />
Todas as indicações até agora dizem que ele se ressente da minha<br />
presença em Israel e ele pensa que eu sou mimada (que eu não sou).<br />
Silêncio ainda paira no ar. É como se todo mundo estivesse<br />
esperando que algo aconteça entre mim e Avi. Amar ou odiar. Paz ou guerra.<br />
Eu não vou dar-lhe a satisfação de saber o que eu estou sentindo. Heck, eu<br />
nem sei o que estou sentindo metade do tempo ou onde minha vida está<br />
indo, graças a meus pais.<br />
Eu venho tentando colocar para fora da minha mente o fato de que<br />
minha mãe quer se mudar para os subúrbios. A próxima coisa que você sabe<br />
é que ela vai querer ter bebês com esse cara. Eu posso ser apenas <strong>um</strong>a<br />
garota de dezesseis anos de idade, mas eu sei <strong>um</strong>a coisa: eu não vou, repito,<br />
não vou trocar fraldas sujas.<br />
Apenas o pensamento de mudar faz meu estômago ficar fraco. Talvez<br />
os pais de Jéssica me deixem ficar em seu condomínio para o ano júnior e<br />
sênior. Eu poderia até pagá-los com o dinheiro que Ron coloca no banco para<br />
mim. Normalmente eu não tocaria no dinheiro, mas o orgulho não tem sido<br />
<strong>um</strong>a palavra no meu vocabulário desde que cheguei em Israel. Por que<br />
deveria haver algo diferente quando eu voltar para casa?<br />
Enquanto eu estive sonhando acordada, percebo o resto do grupo<br />
começou a entrar em seus sacos de dormir.<br />
Só que eu não tenho <strong>um</strong>. Eu faço a varredura da área. Há três rapazes<br />
e três meninas, agora que Moron foi embora para o serviço militar. Eu podia<br />
dormir com Ofra, mas ela e Doo-Doo encontraram <strong>um</strong> lugar <strong>um</strong> ao lado do<br />
outro e têm fechado seus sacos de dormir juntos. Eu nem sabia que eles<br />
eram <strong>um</strong> casal até esta noite.
136<br />
Avi está colocando seu violão de volta em sua capa. Não há nenh<strong>um</strong>a<br />
maneira de eu pedir para Snotty se eu podia dormir com ela, ela é a pessoa<br />
que me manipulou para vir aqui nessas pequenas férias estilo sobrevivente,<br />
em primeiro lugar.<br />
Avi sabe que eu estou de pé aqui assistindo todos. Isto é <strong>um</strong>a droga,<br />
porque eu quero fazê-lo se contorcer. Oh, ótimo. Agora ele está caminhando<br />
até mim. Em vez de esperar por ele, <strong>um</strong>a lâmpada acende-se no meu<br />
cérebro.<br />
Agora eu tenho <strong>um</strong> plano.<br />
Ok, não é bem pensado e exige alg<strong>um</strong>a manipulação, mas eu acho<br />
que vai ter o resultado desejado.<br />
Ignoro Avi chegando perto de mim e às pressas eu agacho ao lado de<br />
O'dead.<br />
— O'dead. — eu digo docemente. Imagino Avi observando cada<br />
movimento meu. Seus olhos são como os lasers na parte de trás da minha<br />
cabeça.<br />
O'dead finalmente olha na minha direção. — Huh?<br />
Agora que eu estou fazendo isso eu bocejo bem alto e alongo o braço<br />
e tudo. Isso pareceu autêntico, eu acho. E começa definitivamente despertar<br />
a atenção de todos, exceto Ofra e Doo-Doo. Eles ainda estão dentro dos sacos<br />
e provavelmente não vai sair por <strong>um</strong> tempo.<br />
— Estou muito cansada e eu esqueci de trazer <strong>um</strong> saco de dormir. —<br />
eu digo, certificando-se-sabe-quem ouve. — Você se importaria em<br />
compartilhar o seu?<br />
O'dead agora se parece com <strong>um</strong> rato encurralado por <strong>um</strong> gato. Por<br />
outro lado, eu sou o gato. Meow! O'dead olha através de mim para Avi.<br />
Estou tão tentada a olhar para trás para ver a expressão de Avi. Eu<br />
também estou querendo saber o que pensa Snotty, ela parece estar alheia a<br />
tudo por aqui.
137<br />
Antes que o pobre rapaz possa me responder, eu digo: — Obrigada.<br />
— e volto para o carro onde há <strong>um</strong> pouco de privacidade para colocar os<br />
meus PJs (pijamas).<br />
Eu tenho <strong>um</strong> enorme sorriso no meu rosto e eu nem sei por quê. Eu<br />
sei que Avi ia oferecer seu saco de dormir para mim, como ele estivesse<br />
bancando o herói ou algo assim. Então, ele poderia ter mais munição e eu<br />
sou <strong>um</strong>a cadela mimada americana que está arruinando suas férias. Confuso<br />
isso. Eu vou ficar longe dele, tanto quanto possível nesta viagem.<br />
Começando a dormir com O'dead.<br />
Claro que eu não estou realmente dormindo com O'dead. Apenas<br />
dormir com ele. Embora, eu penso sobre como quão pequeno o saco de<br />
dormir é, eu provavelmente não vou conseguir dormir muito esta noite.<br />
Eu não posso acreditar que está ficando tão frio. É muito quente<br />
durante o dia eu poderia fritar <strong>um</strong> ovo em <strong>um</strong>a pedra em segundos. Mas<br />
agora, quando eu tiro o meu sutiã debaixo da minha blusa e rapidamente<br />
troco para <strong>um</strong>a outra blusa, eu tenho arrepios por todo meu corpo. Brr! Eu<br />
gostaria de ter trazido blusa e calças compridas.<br />
Eu amarro o meu cabelo em <strong>um</strong> rabo de cavalo alto, escovo os dentes<br />
com água mineral da parte de trás do caminhão, e percorro rapidamente de<br />
volta ao saco de dormir de O'dead. Estou esfregando meus braços com as<br />
mãos para me aquecer, mas não adianta.<br />
— Está tão frio. — eu digo para ninguém em particular.<br />
onde.<br />
Avi está sozinho com seu saco de dormir. O resto foi para quem sabe<br />
Eu abro o saco e examino por dentro.<br />
— O que você está fazendo? — Avi pergunta.<br />
— Verificando se tem cobras. — digo antes de ter certeza que o saco<br />
está seguro e começo fechar de volta.
— Você sabe, você deve fazer o mesmo. Eu não quero que você<br />
receba <strong>um</strong>a mordida ou algo assim.<br />
Ele se senta e encara-me com aqueles grandes olhos escuros.<br />
— Aposto que você gostaria eu recebesse <strong>um</strong>a mordida.<br />
138<br />
— Não. O que eu gostaria é que você me deixasse sozinha. Você tem<br />
18. Você não tem que se juntar ao exército ou algo assim? — Eu digo quando<br />
eu resolvo entrar no saco de dormir do O'dead.<br />
De repente percebo que tento me deitar, mas estou sem travesseiro.<br />
Isso significa sem nenh<strong>um</strong>. Avi lança <strong>um</strong> para mim, o que me bate no rosto.<br />
Eu sorrio e o pego enquanto Avi vira e deita, com a cabeça apoiada no braço<br />
dobrado. Eu deveria me sentir culpada por tomar seu travesseiro, mas eu<br />
não sinto.<br />
— Em dois meses. — ele murmura.<br />
Sento-me. — O quê?<br />
Ele não responde. Em vez disso, ele diz: — Lyla tov, Amy.<br />
Eu não sei muito hebraico, mas eu estive em Israel tempo suficiente<br />
para saber lyla tov significa "boa noite". Ele está tentando me irritar. Eu sei<br />
disso.<br />
Eu descompacto o saco de dormir e me levanto. Então eu estou de pé<br />
perto de Avi e agacho ao lado dele. Seus olhos estão fechados. Falso.<br />
— Oláaaaaaa?<br />
Ele abre <strong>um</strong> olho. — O quê?<br />
Suspiro alto. — Um segundo atrás, você disse dois meses. O que tem<br />
em dois meses, além de ser eu a deixar este lugar horrível que é tão quente<br />
como o inferno de dia, mas gelado como o Pólo Norte à noite.
139<br />
Ele não se mexe, diz apenas com os olhos fechados como se ele<br />
estivesse falando em seu sono. — Eu começo o treinamento básico para o<br />
IDF, em setembro.<br />
— O que é o IDF? — Eu pergunto.<br />
— Forças de Defesa de Israel.<br />
A formação básica das Forças de Defesa de Israel? Eu me sinto <strong>um</strong><br />
pouco mal por Avi, ele tem que ir se juntar ao exército, ele queira ou não.<br />
— Sinto muito. — eu digo.<br />
Desta vez, ele abre os olhos. — Por quê? Tenho orgulho de ser capaz<br />
de proteger o meu povo, meu país. O que você faz para proteger o seu?<br />
Que cara amargo, amargo.<br />
— Eu faço o suficiente. — digo. — Se Israel não irritasse todos os<br />
seus vizinhos, em seguida, talvez...<br />
Ele se inclina para frente, sua expressão é dura. — Não se atreva a<br />
julgar o meu país. Até que você ande em nossos sapatos — ele diz, — você<br />
não tem ideia o que é ser israelense.<br />
Eu estou tentando não ficar nervosa, mas do jeito que ele está<br />
falando faz-me tremer <strong>um</strong> pouco.<br />
— Sim, bem, não julgue o meu país também. — eu digo de volta.<br />
baixo.<br />
Eu começo a levantar. Ele agarra meu pulso e me puxa de volta para<br />
— Essa é a diferença entre nós. Eu sou do meu país. Você é apenas<br />
<strong>um</strong> produto do seu.<br />
Puxo meu braço eu digo: — Essa não é a única diferença, Avi. Eu vou<br />
para a faculdade e serei bem sucedida após o colegial. E você, você<br />
provavelmente vai ser apenas <strong>um</strong> criador de ovelhas de Israel pelo resto de<br />
sua vida.
Piso de volta ao saco de dormir de O'dead, sinto melhor em pensar<br />
que agora eu realmente provei para ele que eu sou <strong>um</strong>a cadela.<br />
140<br />
Eu desfaço o saco de dormir mais <strong>um</strong>a vez para verificar se há<br />
criaturas com presas que decidiram fazer ninho no lugar que eu vou dormir.<br />
Felizmente, não há nada, eu fecho a coisa e volto para cima e entro dentro.<br />
Olhando para trás, vejo Avi virado de costas é para mim. Boa.<br />
Infelizmente, assim que eu estou ficando confortável O'dead e a<br />
turma voltam. Eu estou tentando pegar o mínimo de espaço possível, mas<br />
não adianta. Este saco não foi feito para duas pessoas.<br />
O'dead se ajoelha e entra no saco comigo. Dou-lhe <strong>um</strong> pequeno<br />
sorriso. Eu não quero que ele pense que eu não sou grata por ele concordar<br />
em compartilhar o seu saco de dormir quente comigo. Mas eu<br />
definitivamente não quero que ele pense que eu estou tendo <strong>um</strong>a queda por<br />
ele também.<br />
Ele pode suspeitar que eu vá rasgar suas roupas ou algo assim. <strong>Como</strong><br />
se eu fosse. Eu nem sequer fiz mais do que beijar o meu próprio namorado.<br />
Eu sou o que vocês chamam de <strong>um</strong>a garota sexualmente lenta. Porque eu sei<br />
que o que eles ensinam na educação sexual é realmente verdade. Há<br />
consequências na vida e em ter relações sexuais antes do casamento.<br />
<strong>Como</strong> a AIDS.<br />
<strong>Como</strong> outras doenças sexualmente transmissíveis que duram para<br />
sempre.<br />
<strong>Como</strong> <strong>um</strong> bebê indesejado – como eu!<br />
Não há nenh<strong>um</strong>a maneira no inferno que eu vou correr o risco de<br />
trazer <strong>um</strong> bebê ao mundo sem ser casada com o homem que eu amo. Ao<br />
contrário de meus pais. Quer dizer, o que eles estavam pensando? Não me<br />
interpretem mal, eu estou feliz por estar viva. Mas a merda que eu tive que<br />
passar por toda a minha vida, incluindo a viagem e a mente de vento da<br />
minha mãe, ao concordar em se casar com Marc e <strong>arruinar</strong> a minha vida.
Quero dizer, se fôssemos <strong>um</strong>a família normal eu estaria no céu - e<br />
não em Israel.<br />
Ótimo. Agora eu estou descansando em estilo com <strong>um</strong> cara que eu<br />
não estou nem remotamente interessada. Na verdade, eu sei que ele gosta da<br />
minha prima.<br />
<strong>Como</strong> faço para me meter nessas situações, em primeiro lugar? Este<br />
saco de dormir é muito pequeno para nós dois. E eu estou dolorosamente<br />
consciente que meus peitos grandes estão sendo pressionados contra as<br />
costas de O'dead.<br />
Fechando os olhos, rezo para o sono venha rápido. Mas agora que eu<br />
não posso ver, os meus outros sentidos estão intensificados. <strong>Como</strong> o som do<br />
fogo crepitando, os grilos cantando. <strong>Como</strong> o cheiro almiscarado e másculo de<br />
Avi impregnado em seu travesseiro. <strong>Como</strong> meus peitos cutucando as costas<br />
de O'dead, porque está <strong>um</strong> frio maldito lá fora. É tudo para me manter<br />
acordada, o que me dá <strong>um</strong>a ótima ideia.<br />
Espero cinco minutos antes de eu começar a roncar.<br />
Claro que eu estou acordada, mas eu preciso fazer soar autêntica. Eu<br />
certifico se minha boca está perto da orelha de O'dead antes de eu começar.<br />
Primeiro, eu faço <strong>um</strong> ronco bem lento que realmente não soa como <strong>um</strong><br />
ronco, mais como <strong>um</strong> chiado.<br />
Mantenho os olhos fechados, eu respiro e expiro em voz alta com as<br />
costas da minha língua vibrando contra o teto da minha boca.<br />
O'dead se move, provavelmente tentando me acordar. Só que eu<br />
realmente não estou dormindo para que isso funcione.<br />
Eu ronco <strong>um</strong> pouco mais alto, e dessa vez adiciono <strong>um</strong> pouco de<br />
nariz e alguns ruídos extras com <strong>um</strong> toque certo.<br />
E continuou por vários minutos, ignorando sua agitação e<br />
movimentação pelo saco de dormir por mais da metade. Na verdade, eu<br />
deveria ganhar até <strong>um</strong> Oscar por este desempenho. Alguns diriam que não é<br />
bom enganar as pessoas. Mas ouça, o sono é mais importante do que<br />
141
qualquer coisa. E se não dormir o suficiente, eu vou estar mais<br />
temperamental do que eu sou normalmente no período da manhã.<br />
Respiração pesada. Expire alto. Combinando nariz e garganta. Expire<br />
mais suave. Nariz apenas. Expire alto. Respiração pesada. Expire normal.<br />
142<br />
certo?<br />
Eu estou misturando a ordem para que o som seja autêntico. Genial,<br />
O fim está próximo. Eu sei, mas ninguém mais sabe.<br />
Respiração pesada. Expire suavemente.<br />
Lá vai...<br />
Imitando o tipo de apneia do sono tão forte quanto possível... Expiro<br />
normal. Eu sei como fazer isso porque Marc ronca. Mamãe acha que eu não<br />
posso dizer quando ele dorme porque ele sai às cinco da manhã ou algo<br />
parecido. O cara ronca mais alto do que <strong>um</strong> desastre de trem. Pergunto-me<br />
como minha mãe pode suportar, isso me mantém acordada até a metade da<br />
noite e meu quarto fica no caminho do corredor.<br />
Faço mais <strong>um</strong> som daqueles de apneia de sono e ronco desagradável<br />
e O'dead começa a se contorcer para fora do saco de dormir.<br />
Missão c<strong>um</strong>prida.<br />
Eu ouço O'dead ficar de pé e eu abro <strong>um</strong> olho para espiá-lo. Eu sei<br />
que ele vai pedir para Snotty para dormir em seu saco de dormir. Ha! Eu sou<br />
tão inteligente...<br />
Mas, como meu olho passa a área discretamente, eu percebo <strong>um</strong><br />
sentimento estranho de que alguém está me observando. Então eu percebo<br />
porque me sinto assim. Avi está me olhando diretamente, e ele me dá aquele<br />
olhar de eu-sei-que-você-é–<strong>um</strong>a- fingida com apenas a profundidade de seus<br />
olhos castanhos.<br />
Ele está começando a se tornar <strong>um</strong> verdadeiro pé no saco.
Eu dou <strong>um</strong> harr<strong>um</strong>ph, e rapidamente fecho meus olhos e volto a<br />
fingir que estou dormindo.<br />
143
144<br />
Capítulo 21<br />
Se os seres h<strong>um</strong>anos estivessem destinados a estar na água,<br />
teríamos nascido com barbatanas.<br />
— Amy, acorda.<br />
Olhei de soslaio em direção ao som da voz da minha prima e para o<br />
sol da manha.<br />
— Estou dormindo — lhe digo, então fecho os olhos e dou a volta.<br />
— Pode dormir mais tarde — Snotty disse. — Partimos em cinco<br />
minutos.<br />
Reclamo, porque como disse antes não sou <strong>um</strong>a pessoa<br />
madrugadora. Eew, às vezes nem sequer sou <strong>um</strong>a pessoa diurna. Virei de<br />
novo e olhei de soslaio, abrindo os olhos de novo quando a olho.<br />
— Pensei que isso de acampar supunha-se serem <strong>um</strong>as férias.<br />
— Sim. E daí?<br />
— Sim, assim que... Porque me despertar tão cedo? — digo.<br />
Snotty se agacha e desliza a almofada debaixo da minha cabeça. O<br />
qual, diga-se de passagem, me atira na pedra debaixo dela.<br />
— Ai! — grito. — Devolve!<br />
Mas não me escuta, porque as costas da minha querida prima estão<br />
de frente a mim enquanto se afasta. Com, certamente, minha almofada<br />
debaixo de sua axila fedida.<br />
Bom, não é exatamente minha almofada. Mas foi por hoje à noite e<br />
era muito macia e esponjosa e cheirava muito reconfortante. Sei que<br />
provavelmente não é possível. Mas é assim como me sentia.
De má vontade me levanto e me dirijo para o jeep onde o resto do<br />
grupo passa o tempo.<br />
— É muito cedo — digo em <strong>um</strong> gemido, com voz de idiota.<br />
145<br />
Ninguém me responde, todos estão empacotando suas coisas. E estão<br />
todos vestidos. O que acontece com essa gente, de se levantar e se vestir ao<br />
amanhecer?<br />
— Pronto para ir — me disse Avi.<br />
Abro os braços, lhe mostrando meu pijama.<br />
— Pareço preparada?<br />
— Talvez tenha falta de comunicação. Não lhe perguntei se estava<br />
preparada para ir. Estou dizendo que vamos. Agora. Não é sempre sobre<br />
você Amy.<br />
Dou-lhe minha famosa olhada de desprezo.<br />
— Não acredito que se trate de mim — lhe digo.<br />
Vejo como <strong>um</strong>a de suas sobrancelhas se levanta com divertido<br />
desprezo. Então ele tem a audácia de buscar minha mochila e jogá-la para<br />
mim.<br />
— Te aconselho a colocar <strong>um</strong> traje de banho — disse.<br />
— Porque, aonde vamos? — lhe pergunto.<br />
— Remar de caiaque. Abaixo no rio Jordão.<br />
Quando devo lhe dar a notícia de que não vou navegar de caiaque<br />
pelo rio Jordão ou qualquer outro rio por acaso? Não faço caiaque. Não vou à<br />
canoagens. Nem sequer sei nadar bem.<br />
Mas apenas para lhe mostrar que não acredito que tudo se trata de<br />
mim, furtivamente decido me trocar atrás de alguns arbustos.<br />
Quando volto, tudo está empacotado e no caminhão. O´dead está<br />
conduzindo e próximo dele na parte dianteira está O´snot. Claro, Ofra se<br />
aconchega próxima a Doo-Doo. E isso significa que tenho que me sentar<br />
perto de Avi.
146<br />
Super, somente o que eu precisava na primeira hora da manhã.<br />
Sento-me junto a ele e me asseguro de não fazer contato visual. Está<br />
começando a fazer calor lá fora, mas estou de shorts e a parte superior de<br />
<strong>um</strong> biquíni.<br />
Mas à medida que começamos a nos mover, me dou conta de que<br />
minha escolha na parte superior não é a melhor. Maldito seja, se me esqueci<br />
de que o caminho rochoso pelo que estamos conduzindo não pressagia nada<br />
de bom para os meus peitos.<br />
A parte superior do biquíni que uso não é <strong>um</strong> sutiã com sustentação,<br />
nem sequer está próximo. E quando O´dead começa a conduzir mais rápido,<br />
não tenho mais remédio do que me segurar no corrimão. O que significa que<br />
meus peitos estão pulando como boias em <strong>um</strong> dia de ventania. Talvez vá<br />
fazer <strong>um</strong>a redução de peitos, depois de tudo, partes rosadas a separar ou<br />
não.<br />
Suponho que Avi se dá conta de que estou incomoda, porque muda<br />
para mais próximo de mim e coloca seu braço ao redor dos meus ombros.<br />
Ele me tem com tanta força que não tenho mais que segurar em qualquer<br />
coisa e meus seios são esmagados com tanta força que não se movem.<br />
Afasto-me dele. Devia lhe dar <strong>um</strong>a bofetada por me sustentar como<br />
se lhe pertencesse. Mas me sinto tão bem... Estável estando contra ele. Nada<br />
pula fora do controle e isso é algo bom. Assim fico onde estou.<br />
Até que, minutos mais tarde, finalmente nos desviamos para <strong>um</strong><br />
caminho pavimentado. Saio de seu abraço e empurro os ombros para trás de<br />
<strong>um</strong>a maneira digna. Ou, o mais digna que posso enquanto estou usando esse<br />
biquíni.<br />
Por sorte, quando olho Ofra e Doo-Doo, estão muito envolvidos<br />
olhando-se nos olhos para se darem conta do que está acontecendo. Bem.<br />
Em pouco tempo entramos em <strong>um</strong> grande estacionamento. Todo<br />
mundo sai do Jeep e se dirige para a entrada do lugar. Exceto eu.<br />
— Vamos — Snotty diz enquanto coloca sua mochila.<br />
— Eu não vou.<br />
— Por quê?<br />
— Vou esperar até que voltem.
— Vai ficar esperando muito tempo Amy. Moron vai se encontrar<br />
conosco no final do rio. Não vamos voltar aqui por vários dias.<br />
Meu coração começa a bater rapidamente.<br />
— Disse <strong>um</strong> par de dias?<br />
— Sim. Não tenha medo. Fazer caiaque é divertido.<br />
Dou-lhe <strong>um</strong> ligeiro bufar quando penso nas rápidas águas brancas e<br />
todas as diferentes formas que poderia morrer na água.<br />
— Não tenho medo. Apenas... Bom, não gosto muito de água. Talvez<br />
tenha <strong>um</strong> telefone por aqui e posso...<br />
Ela colocou suas mãos nos quadris e me interrompeu dizendo.<br />
— Tem medo, mas não quer admitir. Se for tão covarde, vou viajar<br />
com você.<br />
147<br />
Pego minha mochila e pulo da caminhonete, meus pés aterrissam no<br />
estacionamento de cascalho com <strong>um</strong> ruído surdo. Coloco meus óculos de sol<br />
e olho para ela.<br />
— Não sei do que fala.<br />
— Sei que acredita que é forte, mas realmente não é.<br />
Começo a caminhar para a entrada do lugar de caiaque e digo.<br />
— E eu sei que gosta de O´dead muito mais do que como amiga.<br />
Ela corre para me acompanhar.<br />
— O que disse?<br />
— Que gosta de O´dead.<br />
— Apenas como amiga.<br />
Puxo minha mochila sobre meu ombro.<br />
— Vejo a forma que lhe olha. É definitivamente mais que amizade.
148<br />
voz.<br />
— Pode se saber a ciência exata? — pergunta com esperança em sua<br />
Dou de ombros.<br />
— É israelense — lhe digo — Porque não vai diretamente a ele e<br />
pergunta? Mantenha na lembrança que os israelenses não mentem ou não se<br />
vão pelas filiais.<br />
— Eu... Não posso.<br />
Irrito-me em voz alta, zombando dela como ela zomba de mim o<br />
tempo todo.<br />
— Está bem, eu vou perguntar por você. — Começamos a caminhar<br />
para o rio juntas. — Claro, não acredito que sou forte — lhe digo — Sou<br />
forte.
149<br />
Capítulo 22<br />
Ser <strong>um</strong> bom beijador tem <strong>um</strong>a conexão direta com o quanto<br />
você gosta da pessoa que está beijando.<br />
Caminhar com determinação para o lugar onde o caiaque está é<br />
difícil, enquanto eu tenho <strong>um</strong> sentimento afundando em meu estômago de<br />
que eu não vou sair desta situação viva. Mas pelo menos Snotty vai vir em<br />
meu caiaque, eu vejo que eles são feitos para dois.<br />
Escuta, eu sei, se eu afundar todos ficarão felizes, incluindo minha<br />
prima. Será muita ruindade com ela que se eu cair, ela vai comigo.<br />
Eu observo atentamente como Doo-Doo e Ofra entram no caiaque<br />
primeiro. Parece instável, para dizer o mínimo. O caiaque não é feito por<br />
aqueles plásticos duros, é <strong>um</strong>a borracha inflável. Quem diabos pensou em<br />
<strong>um</strong> caiaque inflável é <strong>um</strong> otário idiota. Eles não sabem que <strong>um</strong> pedaço de<br />
madeira afiado ou <strong>um</strong>a piranha com fome fará o caiaque estourar?<br />
— Você está bem? — Avi pergunta. Eu olho para ele e ele está<br />
vestindo <strong>um</strong> traje de banho azul da Nike com <strong>um</strong>a listra branca dos lados.<br />
Eu dou-lhe <strong>um</strong> olhar. — Claro que eu estou bem. — eu digo. — O que<br />
faria você pensar que eu não estou bem?<br />
Eles estão todos olhando para mim como se fosse <strong>um</strong> puré de batata.<br />
— Entre. — Snotty diz enquanto joga as mochilas para o caiaque.
150<br />
Meus olhos giram de <strong>um</strong> lado e do outro entre ela e o cara que está<br />
lançando os caiaques infláveis. Parece que ele vai me empurrar em <strong>um</strong> se eu<br />
não andar mais rápido.<br />
— Você precisa de <strong>um</strong> colete salva-vidas? — o cara me pergunta.<br />
Sim. — Não. Mas esse caiaque está com problemas. — eu digo<br />
apontando para a coisa flutuante. — Eu acho que tem <strong>um</strong> buraco no meio.<br />
O cara do caiaque tem a audácia de achar graça maliciosamente de<br />
mim até Avi tirar o colete salva-vidas da mão do cara e me dizer: — Entre, eu<br />
vou te ajudar.<br />
— O'snot vai comigo. — eu aponto. Então eu olho para Avi por cima<br />
dos meus óculos de sol. —Você vai com O'dead.<br />
Digo isso eu coloco os meus óculos de sol de volta.<br />
Antes de eu perceber o que ele está fazendo, Avi me pega e me joga<br />
como <strong>um</strong> fardo de feno por cima do ombro. Em seguida, ele pula direto para<br />
o caiaque. É instável e eu estou assustada e eu estou agarrando-o e eu estou<br />
gritando obscenidades.<br />
remos.<br />
Ele me deixa de lado no fundo do caiaque e empurra com <strong>um</strong> dos<br />
— Por que você fez isso? — Eu grito, obviamente, recuperando <strong>um</strong><br />
pouco de tempo para controlar o meu medo.<br />
Ele me ignora e mantém o nosso caiaque rio abaixo, deixando O'dead<br />
e O'snot passar por nós.<br />
— Coloque o colete. Vai ficar difícil. — diz ele depois de ter remado<br />
por alguns minutos.<br />
Eu enfio os braços através dos buracos, mas não posso fechar o cinto.<br />
— Meus seios são grandes demais para isso. — eu digo irritada. —<br />
Ela não encaixa.
Ele dirige o caiaque para o lado do rio e se agarra a <strong>um</strong> ramo para<br />
nos impedir de avançar. — Incline-se para mim. — Avi diz.<br />
Eu espero que ele faça alg<strong>um</strong> comentário sobre meu decote agora<br />
que graças ao colete salva-vidas, se assemelha a <strong>um</strong> b<strong>um</strong>b<strong>um</strong>. Mas ele não<br />
faz. Em vez disso, ele se inclina para frente e solta a corrente, e volta a remar.<br />
Quando percebo que não estamos em movimento e ainda estamos<br />
contra a margem do rio, eu olho para cima. Avi ainda está perto de mim, seu<br />
rosto a centímetros do meu.<br />
De repente eu começo a sentir alg<strong>um</strong>a coisa na boca do meu<br />
estômago. <strong>Como</strong> se fosse ficar doente, mas não.<br />
Ele está me olhando intensamente e sua proximidade está me<br />
deixando tonta. Em seguida, ele se inclina cada vez mais perto.<br />
— O que você está fazendo? — Eu pergunto.<br />
Ele toca com os dedos levemente em meu rosto e tudo o que posso<br />
pensar é a suavidade de seus dedos na minha pele.<br />
— Eu vou te beijar. — ele explica.<br />
No início, eu fico sem ar.<br />
— Eu tenho <strong>um</strong> namorado. — eu deixo escapar suavemente.<br />
— Eu sei. — ele diz, enquanto esfrega o meu lábio suavemente com o<br />
polegar.<br />
— E... E você é <strong>um</strong> idiota a maior parte do tempo.<br />
Seus lábios estão tão perto que eu posso sentir o calor deles.<br />
— Amy?<br />
— Sim — eu digo nervosa.<br />
— Pare de falar para que eu possa te beijar.<br />
151
152<br />
Antes que eu possa responder com alg<strong>um</strong> comentário inteligente, os<br />
seus lábios estão nos meus. E se eu disser que é algo que eu já senti antes,<br />
estarei mentindo.<br />
Eu tenho que detalhar isso para que você obtenha toda a imagem.<br />
Então, <strong>um</strong>a mão dele está no meu rosto, colocando-a suavemente<br />
como se eu fosse de porcelana e pudesse quebrar ao menor toque. Então ele<br />
lentamente esfrega seus lábios contra os meus, quase como se estivesse<br />
pintando cada parte da minha boca com a sua.<br />
É maravilhoso. É inebriante. E é totalmente intenso ao ponto de que<br />
minha mente está ficando fora de controle. Mitch nunca me beijou assim.<br />
<strong>Como</strong> se ele apreciasse e memorizasse os meus lábios para sempre.<br />
Quando ele me puxa lentamente para trás e os dedos saem do meu<br />
rosto, eu digo: — Por que você fez isso?<br />
Sua boca torce-se n<strong>um</strong> sorriso irônico. — Por que eu te beijei ou por<br />
que eu parei de beijar você?<br />
— O primeiro.<br />
Ele se instala em seu lugar no caiaque e se inclina para trás. Eu ouço<br />
os pássaros cantando nas árvores e o vento balançando as folhas. <strong>Como</strong> se<br />
eles estivessem sussurrando sobre o que aconteceu entre mim e Avi. Eu me<br />
pergunto o que estão dizendo.<br />
— Você precisava disso. — ele finalmente diz.<br />
Em alg<strong>um</strong> lugar em tudo isto meus óculos de sol caíram e estão<br />
sobre a parte inferior do caiaque. Eu os pego, os coloco de volta antes que ele<br />
possa dizer o que eu estou realmente sentindo.<br />
— Desculpe-me? — Eu digo. Eu precisava ser beijada? Que<br />
comentário é esse?<br />
Ele empurra o caiaque para longe da margem do rio, pega <strong>um</strong> remo,<br />
e começa a remar. Então ele me entrega o outro remo. O que eu realmente
quero fazer é bater-lhe na cabeça com isso. Em vez disso, eu arranco meu<br />
remo de suas garras e digo estupidamente: — Você me beijou.<br />
153<br />
Ele encolhe os ombros e a pá <strong>um</strong> pouco mais, os músculos em seus<br />
braços flexionando cada vez que ele pincela contra a corrente pequena. —<br />
Apenas esqueça sobre isso.<br />
<strong>Como</strong> se eu pudesse. Isso não era apenas alg<strong>um</strong> beijinho - era como<br />
<strong>um</strong> gol de placa nos jogos playoffs da NBA. E não era <strong>um</strong> beijo francês, mas<br />
era mais íntimo. Eu não sei exatamente o que eu estava sentindo durante.<br />
Todo o meu ser, meu espírito inteiro, estava envolvido. Não apenas os meus<br />
lábios. Eu sei que estou soando como <strong>um</strong>a nerd, mesmo assim. E antes que<br />
você pense nisso, não era a palavra de quatro letras chamada amor.<br />
— Espere.<br />
— <strong>Como</strong> em espere, eu tenho algo a lhe dizer? — Eu pergunto.<br />
— <strong>Como</strong> em segure o caiaque, estamos atingindo as corredeiras.
154<br />
Capítulo 23<br />
Se você começar <strong>um</strong>a briga, eu a terminarei.<br />
Se eu te contar que minha vida simplesmente reluziu diante dos<br />
meus olhos, estaria lhe contando a verdade. Até o beijo de Avi parece que foi<br />
há <strong>um</strong> milhão de anos quando me viro e vejo as ondas correntes, a água<br />
borbulhante e o topo branco, esp<strong>um</strong>oso das corredeiras.<br />
— Não quero morrer! — grito.<br />
— Você não vai morrer — ele diz alto sobre o som pesado da<br />
agitação da água. — Só fique naquele lado do caiaque para que não viremos.<br />
— Eu não sei nadar. — admito a ele.<br />
— Você está vestindo <strong>um</strong> colete salva-vidas. Relaxe. Se virarmos,<br />
você estará segura.<br />
— Estou com medo. — E tudo que quero fazer é que ele me abrace<br />
para que me sinta segura. Fecho meus olhos com força enquanto agarro com<br />
<strong>um</strong> aperto mortal os lados do caiaque.<br />
— Não se preocupe, eu nunca deixaria algo acontecer com você. Fale<br />
comigo e isso estará acabado antes que você perceba.<br />
— O que você quer que eu fale? — digo.<br />
Ele quer que eu lhe diga onde eu queria ser enterrada ou quem que<br />
eu gostaria que fizesse minha homenagem depois que MORRERMOS nesse<br />
rio? Acho que ele talvez não esteja conseguindo me ouvir porque sei que<br />
está trabalhando duro pela forma como o caiaque é manobrado em torno
155<br />
das corredeiras.<br />
— Conte-me sobre sua mãe.<br />
Não é o melhor começo de <strong>um</strong>a conversa no momento. Acho que é<br />
melhor do que falar sobre meu enterro.<br />
— Ela vai se casar com o namorado.<br />
— Você não gosta do cara?<br />
— Não muito. — digo enfaticamente.<br />
— Então se mude com seu aba.<br />
Abro meus olhos. — Meu aba?<br />
— Você sabe... Ron. Aba é pai em hebraico.<br />
— Eu sei disso. Mas eu com certeza não me mudarei com ele.<br />
— Ele não mora em Chicago?<br />
— Sim.<br />
— Então qual é o problema?<br />
— O problema é que ele não é meu pai. Biologicamente falando,<br />
talvez. Temos muito que melhorar entre nós antes que possa ser<br />
considerado <strong>um</strong> pai de verdade.<br />
— Se você diz. — ele diz com naturalidade.<br />
De repente, estou consciente que passamos das corredeiras e<br />
estamos agora deslizando pelo rio.<br />
— Não me diga que Moisés sobreviveu indo por esse rio n<strong>um</strong>a cesta<br />
quando recém-nascido. — digo.<br />
Ele jogou a cabeça para trás e deu <strong>um</strong>a risada alta, a primeira que eu<br />
vejo e ouço dele.
156<br />
— Aquele seria o Rio Nilo, Amy.<br />
— Sim, bem, eu vou ficar com as banheiras. Elas são muito menos<br />
perigosas.<br />
Nós vamos pelo resto do caminho em silêncio e descanso minha<br />
cabeça no aro do caiaque. Espero que alguns raios de Sol me deem <strong>um</strong><br />
bronzeado dourado e não queimem minha pele como <strong>um</strong>a batata-frita.<br />
Acredite ou não, estou tentando não pensar sobre aquele comentário que<br />
Avi me disse depois de nosso beijo. Mas, na verdade, estou obcecada por<br />
isso.<br />
Você precisava disso. Sim, foi o que ele disse. Você acredita?<br />
Talvez ele precisasse. De qualquer maneira, não vai acontecer de<br />
novo. O que eu diria para Mitch? Talvez eu não devesse nem dizer que beijei<br />
outro cara. Não é como se ele fosse descobrir sozinho ou qualquer coisa; foi<br />
só <strong>um</strong>a vez inocente.<br />
Se comida caindo no chão tem a regra dos cinco segundos, não<br />
deveria <strong>um</strong> beijo inocente ter a regra do <strong>um</strong>a vez? É claro que sim, embora<br />
eu ache que exista essa partezinha do meu cérebro me resmungando que<br />
não foi <strong>um</strong> beijo inocente.<br />
E estou definitivamente ignorando o fato que exista essa partezinha<br />
de mim que quer tentar de novo. Mas não porque eu precise, isso é pela<br />
minha maldita certeza.<br />
Eu me sento. Quando eu estou quase perguntando a Avi o que ele<br />
quis dizer com seu comentário sobre o beijo, aproximamo-nos dos outros<br />
dois caiaques.<br />
— O que fez vocês demorarem tanto? — Sotty pergunta.<br />
Instantaneamente, ruborizo quando todos focam em nós. Meus olhos<br />
correm de Avi para o resto do grupo culposamente.<br />
Um sorriso manhoso atravessa o rosto de O’dead e ele ergue as<br />
sobrancelhas alg<strong>um</strong>as vezes.<br />
Ao invés de admitir que nos beijamos e pensando em maneiras de
desviar da atenção dos outros, pego meu remo (o qual até agora não usei) e<br />
bato na água para molhar Snotty e O’dead.<br />
Batida certeira!<br />
Minha prima e O’dead estão chocados, e me sinto triunfante. Há! Isso<br />
os ensinará por se intrometer nos meus negócios.<br />
157<br />
Snotty e O’dead tentam remar perto de nós e eu remo<br />
freneticamente para longe deles. Olhando para o meu parceiro de caiaque,<br />
percebo que seu remo nem está na água.<br />
— Ajude-me! — grito, rindo.<br />
— Essa é sua briga, não minha. — ele diz.<br />
Em resposta, enfio meu remo na água e bato em sua direção. Avi está<br />
agora ensopado com a água do Rio Jordão.<br />
Mostro a língua para ele, então digo — Agora é sua briga.<br />
Oh, eu sei o que está por vir. Eu não sou estúpida o suficiente para<br />
pensar que ficarei seca por muito tempo. Quando o remo de Avi entra na<br />
água e longe do canto do meu olho, vejo o caiaque de O’dead e Snotty se<br />
aproximar, só fico batendo meu remo no rio como louca.<br />
Água de todos os lados está vindo para mim. Ofra e Doo-Doo devem<br />
estar participando do caos. Não que eu pudesse ver qualquer coisa, na<br />
verdade, porque meus olhos estão fechados com força. Pelo que sei, poderia<br />
estar batendo toda a água sobre mim com todos os outros.<br />
De repente, está quieto, exceto pelo meu remo batendo na água.<br />
Então paro e abro os olhos.<br />
Claro que quando abro, percebo que esse é o truque mais velho do<br />
livro. Porque assim que abro meus olhos, água me molha com a vingança de<br />
todos.<br />
— Trégua! — grito, especialmente quando percebo quanta água está<br />
no fundo de nosso caiaque. — Vamos afundar!
A água para e percebo que estamos todos rindo juntos. E isso me faz<br />
pensar que eu sou realmente parte do pequeno clube de amigos deles.<br />
158<br />
Quando Avi e eu alcançamos o trapiche, nosso caiaque está<br />
milagrosamente ainda flutuando. E esperando por nós está <strong>um</strong> soldado com<br />
<strong>um</strong>a metralhadora sobre seu ombro.<br />
Primeiramente, estou chocada. Então percebo quem o soldado é... É<br />
Moron, amigo de Avi do moshav. E a bandana que dei a ele com o símbolo da<br />
paz está enrolada em volta da ponta de sua arma.<br />
Wow. Meu presente significa alg<strong>um</strong>a coisa para ele.<br />
— Oi, Moron. — digo quando saio do caiaque.<br />
Ele sorri para mim. — Oi, Amy.<br />
Desejo poder tirar <strong>um</strong>a foto dele sorrindo assim, em seu uniforme e<br />
arma com <strong>um</strong> símbolo da paz. Ele parece tão... Legal e sem maldade, não<br />
como alguém que atiraria com aquela arma em pessoas. Eu poderia ver<br />
agora a legenda em alg<strong>um</strong>a revista nacional: Moron, soldado israelense.<br />
Do jeito que a mídia gosta de distorcer as coisas por aí, a legenda<br />
provavelmente seria assim: soldado israelense Moron. <strong>Como</strong> se ele fosse <strong>um</strong><br />
completo idiota ao invés de perceber que esse é o nome do cara.<br />
Moron caminha até mim e diz: — Serei a escolta militar de vocês<br />
pelo resto da viagem.<br />
Escolta militar? Por que precisamos de escolta militar?<br />
— Você está brincando, né?<br />
— Não.<br />
Não quero que ninguém ria de mim, então não faço as outras<br />
perguntas que estão correndo pela minha cabeça. Olha, eu só comecei a me<br />
sentir confortável com essas pessoas e não quero fazer de mim <strong>um</strong>a excluída<br />
de novo.<br />
Pegamos <strong>um</strong> micro-ônibus e dirigimos por horas e horas. A paisagem
159<br />
dessa ilha bonita é de tirar o fôlego... N<strong>um</strong> minuto estamos dirigindo pelas<br />
montanhas gramadas que se assemelham com as colinas onduladas de O<br />
Som da Música e então estamos no meio de <strong>um</strong>a cidade grande e populosa.<br />
Se aquele não fosse contraste suficiente, em outra hora estamos bem no<br />
meio do deserto sem nenh<strong>um</strong>a árvore ou casa à vista.<br />
Da janela, vejo o pastoreio dos Beduínos Árabes no deserto. É como<br />
se eu estivesse olhando <strong>um</strong> pedaço de vidro em centenas de anos no<br />
passado.<br />
Meio hora depois, vejo tanques militares no chão do deserto,<br />
atirando.<br />
— O que eles estão fazendo com aqueles tanques? — pergunto,<br />
nervosa.<br />
— Prática de alvo. — Avi diz<br />
Espero que a mira deles seja precisa.<br />
Em menos de dois meses, Avi será <strong>um</strong> soldado, também, aprendendo<br />
a atirar com <strong>um</strong>a arma. E ele é menos de dois anos mais velho que eu.<br />
É a coisa mais estranha. Estou, na verdade, acost<strong>um</strong>ando-me em ver<br />
soldados à volta e armas e tanques diariamente... Isso confunde minha<br />
cabeça com o quão diferente a vida é aqui.<br />
Paramos n<strong>um</strong>a pequena loja para pegar Cocas (graças ao poderoso<br />
Deus) e lanches.<br />
Eu vejo pela janela da loja Avi sair do estacionamento sozinho. Pago<br />
pelo meu Kit Kat com os poucos shekels que Snotty me deu e vou atrás dele.<br />
— Ok, vamos resolver isso. — digo.<br />
Ele se vira para mim como se, surpreso, estou o encurralando. — O<br />
que quer dizer?<br />
— Dã! Por que você me disse no caiaque que me beijou porque eu<br />
precisava? Se isso não fosse o maior blefe, não sei o que é.
160<br />
— O que é <strong>um</strong> blefe?<br />
Reviro os olhos. — Você sabe, usar o caminho fácil ao invés de<br />
admitir que gostou de me beijar. Admite, Avi.<br />
— Eu disse ao seu aba que cuidaria de você nessa viagem e que nada<br />
aconteceria a você.<br />
— Sim, você pode jogar essa promessa pela janela.<br />
— Desculpe-me se te conduzi além, mas isso não vai acontecer<br />
novamente entre nós.<br />
Estou cansada de discutir. Em vez disso, para provar minha teoria, o<br />
alcanço e agarro a parte de trás de sua cabeça e o puxo para frente de mim.<br />
Instantaneamente, nossos lábios tocam e é como se estivesse naquele<br />
caiaque com ele de novo. Fecho os olhos e envolvo meus braços em volta de<br />
seu pescoço, feliz quando seus braços vão para minha cintura e ele me puxa<br />
para mais perto. Não me importo com quem está olhando. Eu não mudaria<br />
isso por nada.<br />
Mas, de repente, ele deixa cair suas mãos da minha cintura e se<br />
afasta. Então assisto com horror quando ele bate em sua boca com as costas<br />
da mão, como se quisesse apagar o beijo de seus lábios.<br />
— Eu não posso fazer isso, Amy. Não dificulte para mim.<br />
Lágrimas estão brotando dos meus olhos e nem estou tentando<br />
impedi-las ou enxugá-las.<br />
— Não chore. — ele diz, estendendo a mão para enxugar <strong>um</strong>a<br />
lágrima escorrendo pelo meu rosto. — Você é <strong>um</strong>a ótima garota<br />
— Não diga isso apenas para me fazer sentir melhor. Na verdade,<br />
não diga nada para mim. Eu entendi, alto e claro.<br />
Começo a me afastar dele e vou para o micro-ônibus.<br />
— Amy, deixe-me explicar. — ele diz, segurando-me pelo braço.<br />
Eu fico lá, esperando por palavras que, com certeza, não quero ouvir.
Olho seu rosto e, pela primeira vez, vejo algo que nunca tinha visto antes<br />
nele. Aflição. Está tão prevalecente que me deixa com medo.<br />
Ele fecha os olhos por <strong>um</strong> segundo, como se as palavras saindo de<br />
sua boca causassem dor só por serem ditas.<br />
— Meu irmão Micha morreu ano passado n<strong>um</strong> bombardeio.<br />
Ele olha para mim pela minha reação, mas estou muito atordoada<br />
para dizer qualquer coisa. Em vez disso, abraço Avi forte, desejando que eu<br />
conseguisse tirar parte de sua dor, ainda que, no meu coração, eu não posso.<br />
— Sinto muito. — sussurro em seu peito.<br />
Ficamos assim por muito tempo. Quando ele se afasta, percebo que<br />
seus olhos estão vermelhos. Ele os cobre com a palma das mãos.<br />
— Odeio ser emocional. — diz.<br />
— Sou, provavelmente, <strong>um</strong>a das pessoas mais emocionais que<br />
conheço. — admito.<br />
Ele me dá <strong>um</strong> de seus raros sorrisos, então sua expressão fica séria.<br />
— Gosto de você, Amy. Provavelmente mais do que quero admitir,<br />
até mesmo para mim. Mas não quero ter nada sério com ninguém agora.<br />
Tenho <strong>um</strong> sobrinho sem pai e <strong>um</strong>a cunhada que fica em casa de luto pelo seu<br />
falecido marido. Vou estar no exército mês que vem. Se alg<strong>um</strong>a coisa<br />
acontecer...<br />
— Se eu prometer não ficar de luto se você morrer, você ficará<br />
melhor? — digo.<br />
Ele balança a cabeça. — Não é engraçado, Amy. Vou ser treinado<br />
como <strong>um</strong> comando.<br />
— Ouça, estou falando apenas de <strong>um</strong> lance de verão, não <strong>um</strong> caso de<br />
amor para vida toda. — Não estou nem pensando em Mitch agora. E tenho a<br />
sensação de que Mitch não está pensando em mim, também. Avi e eu temos<br />
<strong>um</strong>a conexão. Não posso ignorar.<br />
161
— Você está muito emocional para não se envolver. Você nunca<br />
poderia ter <strong>um</strong> lance de verão. Não da maneira que tem sido entre nós, pelo<br />
menos.<br />
162<br />
— Então que tal terminarmos isso quando essa pequena viagem de<br />
aventura acabar. Se você quer ser <strong>um</strong> covarde pelo resto de sua vida,<br />
continue. Mas se você quer ter <strong>um</strong> tempo ótimo com <strong>um</strong>a garota foda, você<br />
terá que enfrentar seus medos. — Eu quero dizer por favor, por favor, por<br />
favor, mas não faço. Olha, <strong>um</strong>a garota precisa ter <strong>um</strong> pouco de dignidade se<br />
ela é rejeitada pelo cara de quem ela gosta.<br />
<strong>um</strong>a.<br />
— Quem é a garota foda? — ele pergunta, fingindo procurar por<br />
Brincando, soco-o no estômago.<br />
Nada mais é dito sobre nosso não-relacionamento, mas ele me beija e<br />
diz: — Você está pronta para isso?<br />
Eu pisco para ele e digo, brincalhona: — Absolutamente.<br />
Quando ele segura minha mão e me leva para o resto do grupo, não<br />
estou surpresa que os olhos deles estejam cheios de espanto. Olha, se eu<br />
estivesse no lugar deles, acharia que o mundo girou sobre seu eixo <strong>um</strong> pouco<br />
rápido demais para ver a mim e a Avi tentando <strong>um</strong> relacionamento de<br />
verdade. Mesmo que seja apenas <strong>um</strong> não-compromisso, <strong>um</strong> lance rápido.<br />
A única coisa me incomodando no fundo da mente é... <strong>Como</strong> serão os<br />
acampamentos de dormir hoje à noite?<br />
Avi tem dezoito, e mais experiência que eu.<br />
Ele espera de mim mais do que estou disposta a dar?
163<br />
Capítulo 24<br />
Fazendo coisas más alg<strong>um</strong>as vezes nos sentimos tão bem.<br />
Moron nos conduziu a <strong>um</strong> hotel. Para ser honesta, não sei como ele<br />
encontrou este lugar. É no meio do deserto com nada em quilômetros ao<br />
redor, pelo menos isso é o que parece.<br />
Todo o caminho a Beersheva, Avi e eu ficamos realmente próximos,<br />
é como se <strong>um</strong>a parede invisível tivesse sido levantada de entre nós.<br />
Descansei comodamente em seus braços e até dormi em seu colo durante a<br />
viajem. E adivinhem? Acariciou meus cabelos, como se lhe agradasse. Sentime<br />
tãooooooo bem, quase bem demais, porque tinha aquela sensação de<br />
formigamento em todo o meu corpo só de pensar que logo nos beijaríamos<br />
outra vez.<br />
Porém quando estávamos no hotel e estávamos na recepção do hall<br />
de entrada, eu fiquei <strong>um</strong> pouco nervosa. Dormindo junto com o O’dead eu<br />
estava segura e tranquila. Para ser justa, nunca dormimos juntos, por isso o<br />
meu falso ronco.<br />
Olhei para Avi. Sei que com ele não poderia fingir <strong>um</strong> falso ronco,<br />
sabe quando estou fingindo. Além disso, eu não quero ser falsa com ele.<br />
Estou nervosa do que ele espera de mim. Não quero ser <strong>um</strong>a dessas<br />
garotas que se envolvem com <strong>um</strong> garoto e logo diz “Sim, dormi na cama com<br />
ele, mas não esperava que ele se descontrolasse...” Eu sempre penso “Não<br />
deveria ter dormido na cama com ele em primeiro lugar, idiota”.<br />
— Quais são os arranjos para dormir? — eu perguntei a Ofra.<br />
— Com quem você quer dormir? — diz com <strong>um</strong> tom de sarcasmo em<br />
sua voz.
164<br />
Snotty balança três chaves em nossos rostos e diz.<br />
— As meninas vão dormir com as meninas e meninos com meninos.<br />
Estou aliviada que os meninos e as meninas vão dormir em quartos<br />
separados. De alg<strong>um</strong> modo tenho <strong>um</strong> pressentimento de que as coisas<br />
podiam se descontrolar comigo e Avi. Nosso relacionamento é tão explosivo<br />
em outras maneiras, que tenho certeza que vai seguir esse caminho se<br />
estivermos sozinhos.<br />
Estabelecemos-nos em nossos quartos, tiramos <strong>um</strong>a soneca e fomos<br />
para o restaurante do hotel para jantar à noite.<br />
hotel.<br />
Depois do jantar, fui sentar perto de O’dead que estava no lobby do<br />
— O’dead, você poderia me ajudar com algo? — eu perguntei.<br />
Ele encolheu os ombros.<br />
— Claro.<br />
Pisquei o olho para O’snot e o levei para meu quarto de hotel. O qual<br />
estou compartilhando com Ofra e O’snot . Quando chegamos ao quarto me<br />
movi para a cama e disse.<br />
— Sente-se.<br />
Ele arrastava os pés, desconfortável.<br />
— Amy, eu não estou interessado em você dessa maneira.<br />
Apoiei-me contra a parede.<br />
— Existe alguém em quem você está interessado? <strong>Como</strong> O’snot ?<br />
Ele ficou boquiaberto.
165<br />
— <strong>Como</strong> você sabe?<br />
Revirei os olhos.<br />
— É óbvio. E você precisa de <strong>um</strong> chute na bunda para que algo<br />
aconteça entre vocês dois.<br />
Uma batida na porta nos interrompe. Quando abriu, era Avi. E ele<br />
não parecia muito feliz.<br />
— O que está acontecendo aqui? — pergunta Avi.<br />
Coloco meus braços ao redor de Avi e o beijo nos lábios para<br />
acalmar-se.<br />
— Está com ciúmes?<br />
Só ficou olhando em meus olhos sem dizer nada.<br />
— Tento corrigir algo com O’dead e O’snot. — eu explico.<br />
disse.<br />
Os olhos de Avi vão de mim a O’dead, cujo o gesto confirma o que eu<br />
Eu digo a O’dead.<br />
— O’snot quer saber como você se sente, então vá atrás dela e<br />
desembucha. — Quando apareceu sulcos em sua testa me dei conta que meu<br />
modismo o deixou confundido. — Vá atrás dela e lhe diga o que você sente.<br />
Agora, antes que ela encontre a outro rapaz.<br />
Ele saiu do quarto mais rápido do que eu já tinha visto alguém se<br />
mover antes.<br />
Avi sorriu.<br />
— O que? — eu perguntei.<br />
— Você fez algo muito bom, Amy. Totalmente desinteressada.
166<br />
Eu fico longe dele.<br />
— Não, não o fiz. Só estava doente e cansada de ver como ele a vê,<br />
como se fosse morrer se ela não prestasse atenção nele. — Deus me livre de<br />
ser vista como caridosa.<br />
Ele ficou atrás de mim e colocou os braços em volta da minha<br />
cintura.<br />
— Vamos dar <strong>um</strong> passeio?<br />
Concordo.<br />
Ele pega minha mão e saímos do hotel, caminhamos sem r<strong>um</strong>o<br />
através de <strong>um</strong> caminho de cascalho. Eu tenho <strong>um</strong>a doce sensação que vibra<br />
no meu coração apenas por estar perto de Avi.<br />
— Conte-me mais de seu irmão.<br />
O ritmo de Avi se desacelera e toma <strong>um</strong> profundo suspiro.<br />
— Não falo muito sobre ele.<br />
— Por quê?<br />
Ele duvida antes de dizer.<br />
— Dói. Aqui no fundo. — ele aponta para o coração. — Eu sei, não é<br />
o melhor.<br />
Aperto sua mão.<br />
— Não, é o melhor. Quero dizer, isso mostra que você quer. Mas tem<br />
que falar sobre isso. Se não, parte do espírito do seu irmão morre com ele.<br />
Ele para e pensa sobre isso por <strong>um</strong> minuto. Logo assente lentamente<br />
com a cabeça.<br />
— Amava jogar futebol. Era muito melhor que eu, mas ele me<br />
deixava ganhar a maioria das vezes para a<strong>um</strong>entar meu ego.
167<br />
— Soa como <strong>um</strong> irmão maravilhoso. Você tem sorte.<br />
— Sim. — Sacode a cabeça e suspira. — Preferia que eu estivesse<br />
morto em seu lugar.<br />
— É por isso que é o Sr. Furioso todo o tempo?<br />
— Eu não sei — disse. — Eu acho.<br />
— Não pode mudar o passado, Avi. Acredite, eu tentei. Não funciona.<br />
— Essa conversa é profunda.<br />
Eu sorrio.<br />
— Tem razão.<br />
— Vamos falar de outra coisa. <strong>Como</strong> quanto eu gosto de você.<br />
isso:<br />
Quero dizer que gosto dele completamente, mas em vez disso, digo<br />
— Ofra disse que já namorou com <strong>um</strong> monte de meninas. É verdade?<br />
Este sentimento em meu coração me dá medo e acho melhor não<br />
pensar. Se eu encontrar suas outras namoradas, será mais fácil para<br />
proteger-me, porque eu estou indo para me distanciar emocionalmente com<br />
ele.<br />
— Já namorei — responde. — Porém não desde alg<strong>um</strong> tempo. Tive<br />
medo de que no caiaque fosse <strong>um</strong> beijo ruim, já faz muito tempo.<br />
— Seu beijo estava bom — digo. Mais que bem. Começamos a subir<br />
<strong>um</strong>a rochosa colina perto do hotel. — Quero saber mais de você — digo<br />
enquanto me ajuda a alcançar <strong>um</strong>a grande rocha que fica no topo da colina.<br />
Avi se sentou vendo através do deserto escuro de <strong>um</strong> lado e luzes piscando<br />
como diamantes do outro, das pessoas na distância. É <strong>um</strong> lugar muito<br />
romântico e me pergunto se Avi trouxe outras garotas aqui. Ele me guia e me<br />
senta na frente dele, entre suas pernas estendidas.
168<br />
— O que quer saber? — pergunta ele.<br />
Muito, para ser honesta. Mas devo fazer as perguntas mais comuns<br />
que <strong>um</strong>a garota faz a <strong>um</strong> rapaz, odeio que não consigo pensar em algo<br />
original ou que soe mais maduro.<br />
— Com quantas meninas você já esteve?<br />
— Estive? — disse atrás de mim. Sinto sua respiração quente atrás<br />
em minha cabeça enquanto se inclina para mais perto de mim. Resisto à<br />
tentação de curvar e fechar os olhos. — Beijado?<br />
Não quero pensar em outras coisas que ele fez com as meninas então<br />
eu digo.<br />
— Sim. Beijando.<br />
— Incluindo minha mãe?<br />
— Não, bobo, não tua mãe. Sabe ao que me refiro. Um beijo<br />
verdadeiro.<br />
— Um cara não pode sair falando com quantas garotas ele beijou. Só<br />
direi que se você me disser, eu o digo.<br />
Dou-lhe <strong>um</strong> olhar como se eu fosse matá-lo se ele não abrisse a boca.<br />
— Você primeiro.<br />
— Acho que cerca de oito — admite finalmente.<br />
— Oito! — digo, atordoada.<br />
— Por quê? — ele pergunta, eu posso sentir o alarme em sua voz. —<br />
Com quantos você beijou? Aposto que é muito mais pela forma que me<br />
beijou no caiaque.<br />
Sorrio pelo elogio, mas disse.
169<br />
— Menos que você.<br />
São dois, embora o primeiro não devesse contar, porque esse foi<br />
durante <strong>um</strong> acampamento para mochileiros e aconteceu acidentalmente no<br />
escuro.<br />
Pode perguntar-se como alguém acidentalmente beija. Bom, pensei<br />
que estava beijando <strong>um</strong> menino que eu gostava, durante “sessão de<br />
acasalamento com as luzes apagadas” e provou ser o rapaz que beijou<br />
metade das meninas em todo acampamento. Ainda me lembro do gosto de<br />
sabão na minha boca quando lavei para tirar os germes. Sabem o que<br />
dizem... É como haver beijado a todas que ele beijou. Asqueroso!<br />
Infelizmente, quando as luzes voltaram novamente, durante a<br />
“sessão de acasalamento com as luzes apagadas” eu estava lábio com lábio<br />
com o Sr. Equivocado, porém o Sr.Correto nos olhou e terminou com Jessica<br />
em vez de comigo.<br />
— Sete?<br />
— Não, não sete, prostituto — falo.<br />
— Sabe o que, não fale. Não quero pensar em outros meninos que te<br />
beijaram. Eu não sou o que vocês chamam de prostituto. Além disso, só<br />
quero que concentre seus pensamentos em mim... Em nós.<br />
— Pensei que você me odiava.<br />
— Eu só queria te afastar porque não conseguia deixar de te ver. —<br />
Sua voz era rouca e cheia de emoção. — Às vezes não consigo dormir à<br />
noite, só fico pensando em você — disse com seu acento mais profundo que<br />
o normal.<br />
— Pensa em mim todas as noites? — Pergunto e por erro digo<br />
pensa em vez de pensava. — Por quê? — Por favor, não diga por causa de<br />
meus seios.<br />
— Primeiro de tudo — disse enquanto acariciava os cachos no final<br />
de meu cabelo que tinha começado a enrolar pelo calor do deserto. — Você<br />
é linda. Mas é a maneira que você lida com cada situação com seu próprio
170<br />
estilo é que me fascina. Você é forte, é exageradamente honesta, tem essa<br />
personalidade de espírito que eu nunca sei o que você vai fazer ou falar.<br />
Você é inquietante. E ainda por cima, tem <strong>um</strong> coração enorme, embora não<br />
abra com frequência.<br />
Virei para olhar para ele.<br />
— Nunca ninguém me descreveu assim.<br />
— Quando você tentou me empurrar no palheiro no moshav, isso me<br />
impressionou completamente.<br />
— Sim, exceto que não funcionou. Você é quase <strong>um</strong>a massa de<br />
músculo.<br />
Ele começou a rir.<br />
— Não alimente meu ego. Agora me diz o que te atrai em mim. Além<br />
da minha grande massa de músculos.<br />
— Tá, tá. É sério. — digo, então levantei meu dedo e lentamente<br />
traço <strong>um</strong>a rota a partir do canto do olho, para a barba no queixo e<br />
terminando nos seus lábios grossos. — Além de que você é <strong>um</strong> belo<br />
exemplar masculino, eu gosto que você sempre esteja ali por mim quando<br />
me torno louca. Apesar de que você fez isso parecer <strong>um</strong>a tarefa, me ajudou<br />
com todos os desafios que tive aqui. Deixou-me cair sobre você quando os<br />
amigos de Mutt estavam a ponto de atacar-me. — eu digo e beijo<br />
suavemente sua boca. — Me ajudou com o rebanho de ovelhas — continuei<br />
e o beijei outra vez. — E foi meu herói tirando as tripas da cobra.<br />
Antes de poder beijá-lo outra vez e continuar lhe dizendo as coisas<br />
incríveis agora que vejo e que não podia ver antes, ele esmaga seus lábios<br />
contra os meus.<br />
— Amy — disse contra meus lábios. — Acho que vamos entrar em<br />
problemas. Quantos anos você tem?<br />
— Em breve terei dezessete — falo sem conseguir respirar.<br />
Ele disse algo em hebreu que obviamente não consegui entender.
171<br />
— Não deveríamos estar fazendo isso.<br />
— Não estamos fazendo nada exceto nos beijarmos.<br />
— Sim, mas...<br />
— Podemos nos beijar, não? — digo passando meus lábios em seu<br />
pescoço.<br />
— Sim — disse com voz tensa e baixa. — Podemos nos beijar.<br />
Não quero que ele pense sobre minha idade agora. Quero que<br />
desfrute do momento e dos beijos. Especialmente os beijos. Pressiono meus<br />
lábios com os deles, porque não posso imaginar ficar sem tocar seus lábios<br />
nos meus. Ele intensifica o beijo e eu o sigo, sou apenas consciente de que<br />
trocamos de posição e agora estamos deitados lado a lado.<br />
Bem, nunca em meus dezesseis (quase dezessete) anos me senti<br />
assim antes. É como se houvesse cruzado o ponto de ser <strong>um</strong>a menina, a <strong>um</strong>a<br />
mulher só experimentando a sensação estranha e desconhecidamente<br />
quente e profunda do meu corpo. Minhas reações corporais a<strong>um</strong>entaram<br />
dez vezes, quando o meu cavalheiro israelense com sotaque, acariciou<br />
minhas costas. Sinto que vou morrer se parar e eu tenho a sensação de que<br />
ele sente o mesmo.<br />
— Vou lembrar desta noite quando eu estiver no treinamento básico<br />
— disse beliscando o nódulo da minha orelha. — Quando me porem à prova<br />
e estiver exausto, vou lembrar desse momento e vou superar tudo.<br />
Meu corpo parece <strong>um</strong>a tortura doce e quer assimilar tudo sobre Avi<br />
e seu corpo agora mesmo. Agarro sua cabeça para mais perto de mim e<br />
depois acaricio seu corpo com as mãos. Nossos lábios e bocas se explorando<br />
uns aos outros e as nossas mãos estão fazendo o mesmo.<br />
Quando eu o toco de volta, seus músculos tensos contra meus dedos.<br />
Minha mão se move ao redor da frente de sua camisa e puxa para cima pra<br />
sentir sua pele suave e seu abdômen bem formado contra minha mão. Seu<br />
coração estava batendo rápido, eu podia sentir bombear em <strong>um</strong> ritmo<br />
irregular.
172<br />
Baixando minha mão, cheguei ao cós da calça jeans e deslizei o dedo<br />
indicador dentro do cinto. Pouco a pouco, meus dedos se moveram mais<br />
para baixo.<br />
Avi reclamou em voz baixa e gentilmente pega a minha mão.<br />
— Não podemos... — ele disse.<br />
— Porque não? — pergunto sem fôlego, ainda agitada pelos nossos<br />
beijos intensos. Sinto-me bêbada (embora eu nunca estive bêbada, tenho<br />
certeza que é assim como se sente) e fora de controle.<br />
— Além de seu aba me matar?<br />
vida.<br />
Grande, o meu pai nem sequer está aqui e ainda pode <strong>arruinar</strong> minha<br />
— Não me importa o que Ron pensa.<br />
— Talvez você não. — ele diz e se senta. — Mas eu sim. Não quero<br />
nenh<strong>um</strong> de nós nos arrependendo amanhã.<br />
Sento-me também.<br />
— Não me arrependerei de nada. — Nunca.<br />
Ele beija minha testa.<br />
— Deixa eu te levar para o seu quarto. Já está ficando tarde.
173<br />
Capítulo 25<br />
Aproxime-me de seu próprio risco.<br />
— Boker tov. — Avi diz bom dia para mim na fila do café-da-manhã.<br />
Ele se inclina para me beijar, mas eu me afasto.<br />
— O que há de errado? — ele pergunta.<br />
Duh! Ele totalmente me rejeitou ontem à noite.<br />
— Nada.<br />
Eu continuo colocando o que está na minha frente em meu prato. Eu<br />
mal percebo que essa coisa cremosa com pedaços inteiros de sardinhas<br />
pequenas - como peixes dentro (com as escamas de prata conectados, muito<br />
obrigada) DEFINITIVAMENTE, não é como sushi. É nojento, mas agora que<br />
eu já o coloquei no meu prato, eu vou ter que ficar olhando enquanto eu<br />
como.<br />
Antes que eu possa acrescentar mais na minha bandeja, Avi toma o<br />
prato da minha mão e coloca na mesa mais próxima.<br />
Eu coloco minhas mãos em meus quadris. — Hey! Esse é o meu caféda-manhã.<br />
Eu percebo que eu estou fazendo <strong>um</strong>a cena. Eu não me importo.<br />
Ele agarra a minha mão e me leva para a saída. — Ele vai esperar.<br />
Nós precisamos conversar.
Ele me leva para fora. Uma lufada de ar quente do deserto me dá <strong>um</strong><br />
tapa na cara.<br />
— Ok, fale. Antes que eu me derreta, por favor.<br />
174<br />
Ele esfrega seus olhos em frustração. A próxima coisa pra você saber<br />
que eles terão de enfrentar a frustração é que ele está correndo os dedos<br />
pelos cabelos.<br />
Ele olha diretamente para mim e diz: — Você acha que a noite<br />
passada eu parei para pensar antes que as coisas ficassem fora de controle<br />
porque eu não queria ter mais intimidade com você?<br />
— Bingo. — eu digo sarcasticamente. — Mas eu estou mais sábia<br />
esta manhã e não me atirei em você. Além disso, não é como se nós fôssemos<br />
fazer sexo ou qualquer coisa.<br />
— Onde você e eu estamos fisicamente, nossas emoções estão fora<br />
do controle. Eu não posso lidar com isso.<br />
— Você está certo. Deus me livre, devemos ser pessoas racionais.<br />
Devemos apenas nos chamar ‘amigos com benefícios’. Ou, melhor ainda,<br />
porque não simplesmente acabamos com tudo isso para que você possa<br />
encontrar outra garota que você não se emocione? — eu digo quando eu<br />
volto para dentro antes que minhas axilas comecem a molhar a camisa que<br />
estou usando. Em retrospecto, eu estou feliz por ter decidido pedir a<br />
blusinha de alças de Snotty.<br />
— Você é tão teimosa. — ele diz.<br />
Eu me viro e o enfrento antes de eu chegar à porta. — Eu não sou.<br />
— Amy, você é a pessoa mais teimosa que já conheci. Você joga em<br />
sua mente e cria <strong>um</strong> drama que não existe, só para irritar todo mundo,<br />
incluindo você.<br />
Acabo olhando incrédula para ele.<br />
Ele toma minhas mãos nas suas. — Olhe para mim. — Quando eu não<br />
olho, ele diz novamente: — Olhe para mim.
175<br />
Eu levanto os meus olhos e olho para os seus, que são grandes e<br />
sinceros.<br />
— Eu queria mais na noite passada. — diz ele. — Não minta para si<br />
mesma achando que não te quero. Eu me bati cerca de <strong>um</strong> milhão de vezes<br />
depois que eu deixei você ir. Acredite em mim, eu quero fazer isso com você.<br />
Mas essa coisa entre nós é mais séria do que podemos admitir. Você está<br />
indo embora em alg<strong>um</strong>as de semanas querendo ou não. E eu vou ficar no<br />
exército durante três anos.<br />
Eu não posso discutir os seus pontos, então eu fico ali parada<br />
olhando em seus olhos castanhos.<br />
Ele deixa minhas mãos de lado e diz: — Você quer acabar com isso,<br />
basta dizer.<br />
Então ele simplesmente volta para o hotel e me deixa aqui no quente<br />
calor do deserto, axilas suadas e tudo.<br />
Porra. Por que Avi tem que ser tão lógico sobre tudo? Eu odeio ser<br />
lógica. Mas eu estou muito quente para ter <strong>um</strong>a atitude realista e Avi está<br />
certo. Estamos ficando muito apegados já.<br />
Lentamente eu ando de volta para o hotel e entro no restaurante. Avi<br />
está sentado em <strong>um</strong>a mesa, conversando com seus amigos. Há <strong>um</strong> lugar<br />
vazio ao lado dele com o meu prato na mesa em frente a ele.<br />
Eu sei que é <strong>um</strong> fato que eu não quero terminar com ele agora. Eu<br />
quero manter isso o maior tempo possível.<br />
Nossos olhos se encontram e ele me dá <strong>um</strong> pequeno sorriso. O<br />
problema é que todo mundo está olhando para mim, também. Ok, eu acho<br />
que eu mereço por causar <strong>um</strong>a cena. Quero me encolher de vergonha, mas<br />
eu mantenho minha cabeça erguida e sento ao seu lado.<br />
Eu desvio meus olhos de todos ao nosso redor, incluindo Avi. Mas<br />
quando ele pega a minha mão debaixo da mesa e dá <strong>um</strong> aperto, eu aperto de<br />
volta. Eu posso lidar com essa relação, eu digo a mim mesma. Mesmo com<br />
seus altos e baixos.
176<br />
— Você já foi a <strong>um</strong>a fazenda de alpaca? — Ofra me pergunta.<br />
— O que é <strong>um</strong> alpaca? — Eu pergunto.<br />
— Parece como <strong>um</strong>a espécie de lhama. — Avi responde.<br />
— Legal.<br />
Ofra dá <strong>um</strong> tapinha nas minhas costas. Saímos depois do almoço<br />
para ter certeza de eu estar pronta.<br />
Por volta das dez da manhã, estamos estacionados na entrada da<br />
fazenda de alpaca. Então, nós compramos sacos de comida para alimentar os<br />
altos animais peludos com pescoços longos. Espero que as alpacas estejam<br />
em gaiolas, mas estão todas abertas. Na verdade, entramos no grande salão<br />
com eles.<br />
Examino as Alpacas com cuidado. Eles são todos com tons de<br />
marrom, vermelho, preto e castanho. E seus dentes inferiores são tão<br />
grandes que parecem caipiras de alpaca.<br />
Eu assisto avidamente como Avi detém <strong>um</strong> punhado de comida para<br />
<strong>um</strong> grande salpicado cinza e preto. Ele come direto da sua palma da mão.<br />
— Cuidado. — advirto. — Ele poderia arrancar sua mão fora com os<br />
seus dentes salientes e maciços.<br />
isso.<br />
— Eles são inofensivos. — ele diz. — Eles não te morderão. Tente<br />
Eu olho para o saco marrom de comida que eu acabei de pagar dez<br />
sheckels (nome do dinhiero de israel ). Dez sheckels para o risco de ter <strong>um</strong><br />
enorme dente de alpaca na palma da mão. Não muito obrigado. Eu ando até<br />
<strong>um</strong> bebê alpaca e apenas o acaricio. Sua pele é macia, mas <strong>um</strong> pouco dura. E<br />
dou <strong>um</strong>a risada quando ele me olha com seus grandes olhos e grandes<br />
dentes tortos. Meu ortodontista, Dr. Robbins (também conhecido como<br />
Milagre de seus pacientes), poderia ter <strong>um</strong> dia de campo com este animal.
177<br />
Eu sinto que eu posso tentar alimentá-lo, porque ele é pequeno. E ele<br />
olha para a minha bolsa marrom do mesmo jeito quando eu vejo <strong>um</strong> bom<br />
restaurante de sushi. Pego meu saco e retiro alg<strong>um</strong>a 'Comida'. O pestinha<br />
não pode mesmo esperar eu colocá-los em minha mão antes de enfiar todo o<br />
seu rosto e pegar tudo com sua língua.<br />
— Ei, você não tem boas maneiras?<br />
A alpaca começa a mastigar a comida de <strong>um</strong>a forma muito vulgar;<br />
pequenos pedaços de alimentos estão caindo fora de sua boca a cada<br />
mastigação.<br />
— Cuidado. — diz Ofra andando atrás de mim.<br />
— Com o quê? — Eu passo para trás em várias etapas, longe do<br />
animal. — Avi... Avi me disse que eles são inofensivos.<br />
— Eles são. — Moron advertiu. — Mas eles cospem.<br />
— O que você quer dizer em 'cospem'? — Eu digo, me movendo mais<br />
para trás longe do cuspidor dentuço.<br />
— Bem. — diz Snotty. — É mais parecido com <strong>um</strong> grunhido, <strong>um</strong><br />
arroto, depois cuspe. Pelo menos você receberá <strong>um</strong> aviso.<br />
<strong>Como</strong> se alimentando <strong>um</strong> alpaca pequeno com todo o saco de comida<br />
não fosse suficiente, <strong>um</strong>a vez que eles ouviram eu fechar a minha bolsa, ouço<br />
o som de alerta de uns 10 vindo atrás de mim, também.<br />
— Eu não sou <strong>um</strong>a pessoa animal — eu digo quando eu corro para<br />
Avi. — Eu não sou <strong>um</strong>a pessoa animal. — Eu grito várias vezes até eu chegar<br />
a ele.<br />
— Eles te amam. — diz Avi. — Olhe, eles estão todos seguindo você.<br />
Eu coloco o saco de papel pardo com 'Comida' (o que é exatamente<br />
que tem dentro desse material para torná-lo 'Comida'?) na sua mão e me<br />
escondo atrás dele.
178<br />
O destemido Avi pega o saco inteiro e despeja-o em <strong>um</strong>a de suas<br />
mãos. Quando ele os alimenta, eu ouço o que Snotty estava falando... Este<br />
som de <strong>um</strong> grunhido alto, como <strong>um</strong> arroto. Eu agacho mais atrás de Avi com<br />
medo.<br />
— Merda. — Eu o ouço dizer.<br />
dele.<br />
— O quê? — Eu não posso ver nada, porque eu ainda estou atrás<br />
— Ele me pegou.<br />
— Quem tem você?<br />
Ele se vira e eu o vejo, preso no cabelo Avi, <strong>um</strong>a baba de catarro com<br />
pequenos pedaços de algo mastigado no cabelo dele.<br />
— Eca, nojento! — Eu digo, afastando-me dele.<br />
— Cuspiram-me por tentar protegê-la.<br />
— Você é meu herói, agora fique longe de mim. Você está nojento. —<br />
eu digo, então sorrio para ele.<br />
— Não foi há muito tempo eu tirei a serpente de seu pé. Isso foi<br />
muito desagradável. Agora me dê <strong>um</strong> beijo. — ele diz, se movendo em<br />
direção a mim.<br />
Eu me escondo atrás de <strong>um</strong>a Ofra rindo. — Eu não lhe pedi para me<br />
beijar depois do incidente de cobra.<br />
Ele para. E parece tão bonito mesmo com toda a 'alimentação'<br />
pegajosa nele. Eu ando até ele, mantenho a distância, e arco e só toco os<br />
meus lábios nos dele. Então, me puxo de volta.<br />
— Agora você tem que lavar o cabelo. — Então eu acrescento —<br />
Duas vezes.
179<br />
Capítulo 26<br />
A história é para ser lembrada, mas não para ser repetida.<br />
Nossa seguinte parada (depois que Avi lavou o cabelo na pia da<br />
fazenda de lhama) é <strong>um</strong> lugar chamado Monte Masada. Nunca tinha<br />
escutado sobre ele e me perguntava por que <strong>um</strong> “monte” podia ser <strong>um</strong> lugar<br />
onde muita gente queria ir.<br />
Mas enquanto dirigíamos (me dei conta de que a maioria de Israel é<br />
<strong>um</strong> deserto. Realmente me pergunto por que é muito procurado) e<br />
chegamos ao Monte Masada, eu perguntei a Avi.<br />
— Porque vamos a esse lugar?<br />
— Para lhe mostrar <strong>um</strong>a parte da história da sua gente. Imagino que<br />
gostará.<br />
Minha gente? Exatamente quem é minha gente? Não estou muito<br />
segura, mesmo se os demais pensam que sou judia. O interessante é que fui<br />
criada como nada. Mamãe não acredita em religião como nem mesmo<br />
acredita nas dietas de baixa caloria.<br />
Decorávamos a árvore de natal até que me dei conta de que Papai<br />
Noel não existe. Deveriam dizer aos mais velhos que no ônibus da escola não<br />
lhes diga aos menores sobre Papai Noel ou a Fada dos dentes. Poderia se<br />
surpreender com o que se aprende nesses ônibus amarelos.<br />
Bom, depois de descobrir que Papai Noel não existia, eu pedi para<br />
minha mãe que já não o colocasse. A árvore não simbolizava o cristianismo<br />
ou o Natal. Simbolizava o Papai Noel. E como a crença em Papai Noel tinha<br />
ido, não havia razão para ter a árvore. Isso era toda a minha experiência<br />
religiosa, que não era religiosa em primeiro lugar.
180<br />
Olhei para essa coisa vermelha de massa que chamavam de Monte<br />
Masada enquanto saía do carro. Todos estavam tirando suas garrafas de<br />
água do carro e me perguntei por que ninguém estava olhando o monte.<br />
— Quantos anos têm? — perguntei a ninguém em particular.<br />
Moron com sua arma que sempre trazia no ombro disse.<br />
— A guerra aqui foi em setenta e três.<br />
O olhei.<br />
— Mil novecentos e setenta e três? — Tentei adivinhar.<br />
— Não. Antes.<br />
— Mil quatrocentos e setenta e três?<br />
— Não — Doo-Doo disse. — Simplesmente em setenta e três.<br />
Simplesmente em setenta e três?<br />
— Se refere a, como, há quase dois mil anos?<br />
— Sip.<br />
A olhei outra vez, desta vez mais cuidadosamente, este importante<br />
monte em meio ao deserto de Israel. Tentei imaginar aqui <strong>um</strong>a guerra faz<br />
dois mil anos antes entre os judeus e seus inimigos.<br />
— Pergunto-me como se sente ali em cima — disse.<br />
— Bom, está a ponto de descobrir — Avi disse enquanto me<br />
entregava <strong>um</strong>a garrafa de água. — Precisa tomar água regularmente ou se<br />
desidratara durante a subida.<br />
— Imagina que posso subir essa coisa? — perguntei.<br />
— Sei que pode Amy. <strong>Como</strong> seus ancestrais antes de você. Vê esse<br />
caminho em forma de serpente?<br />
— O chama de caminho da serpente porque tem serpentes? —<br />
Porque sou rude, mas já tive o suficiente de serpentes por <strong>um</strong>a viagem,<br />
muito obrigada.
— É chamado assim por sua forma — disse apenas temporariamente<br />
tranquilo.<br />
181<br />
Caminhamos próximos da parte inferior do monte e pude ver o<br />
caminho longo e sinuoso que conduzia para cima. Estava vendo como Doo-<br />
Doo, Snotty, Ofra, O´dead e Moron começavam sua subida para a montanha.<br />
À minha esquerda vi <strong>um</strong> cabo grande que ia para cima na parte superior.<br />
Sigo até onde conduz e no final era <strong>um</strong> teleférico, localizado ao pé da<br />
montanha.<br />
— Porque não pegamos o teleférico?<br />
Avi começou sua caminhada para o não-infectado caminho da<br />
serpente.<br />
— Porque então, perderia o sentimento de vitória ao ter chegado lá<br />
em cima por sua conta. Eu o fiz muitas vezes, e se sente grandioso.<br />
Segui Avi até o início da rota da serpente. No princípio é fácil...<br />
Apenas coloco <strong>um</strong> pé diante do outro e chegarei lá em cima em muito pouco<br />
tempo.<br />
Mas vinte minutos mais tarde, estou arquejando e meus músculos<br />
das coxas começam a tremer. Dizem-me que em Illinois não tem muitos<br />
montes, apenas colinas, e eu não estou acost<strong>um</strong>ada a isso. Paro, e Avi fica<br />
comigo. Sei que ele pode subir mais rápido ao monte.<br />
— Continua — lhe digo quando chegamos perto do meio ponto da<br />
coisa. — Se não morro de cansaço, vou morrer afogada em meu próprio<br />
suor.<br />
Nega com sua cabeça.<br />
— Digo a sério.<br />
— Sei que o faz, assim, mova esses pés para chegar antes do<br />
anoitecer.<br />
O faço, somente porque ele agarra minha mão e me guia.<br />
— A quem os judeus combateram aqui? — perguntei. — Os<br />
palestinos.<br />
— Não. Os romanos.
182<br />
Porque os romanos queriam vir aqui?<br />
— Então, porque os judeus odeiam aos palestinos?<br />
Ele para e vira para me ver.<br />
— Não odiamos a todos os palestinos.<br />
Bufou com incredulidade.<br />
— Pensei isso quando o vi na CNN — lhe digo.<br />
Finalmente, o topo do Monte Masada está à vista e somente levou<br />
<strong>um</strong>a hora para subir a coisa. Não posso acreditar que na realidade cheguei a<br />
escalá-la.<br />
Quando chego lá em cima, as ruínas antigas me surpreendem.<br />
— Aqui mesmo que os judeus ganharam a batalha contra os<br />
romanos? — pergunto.<br />
O´dead disse.<br />
— Não realmente, os judeus cometeram suicídio aqui.<br />
— Eh? — disse em choque e <strong>um</strong> pouco assustada.<br />
Ofra se coloca diante dele.<br />
— Nossos antepassados subiram ao Masada e viveram aqui durante<br />
a guerra. Os romanos iam perder, eles não podiam subir a montanha sem ser<br />
atacados de cima do Masada.<br />
Avi me leva para <strong>um</strong>a das ruínas.<br />
— Se diz que novecentos e dezesseis judeus viveram aqui. Eles<br />
lutaram o melhor que puderam, mas sabiam que com o tempo as armas dos<br />
romanos seriam capazes de chegar aqui em cima. Se fossem capturados<br />
pelos romanos, os teriam matado ou vendido como escravos.<br />
Olhei para Moron que olhava para baixo, ao colorido mosaico dentro<br />
de <strong>um</strong>a das casas construída no Monte. Era absolutamente lindo e comoveu<br />
meu coração que as pessoas vivessem no Monte para salvar a si mesmos e<br />
suas famílias.
183<br />
— Assim cometeram suicídio? — perguntei.<br />
Avi continuou.<br />
— Eles concordaram que os judeus somente deviam servir a Deus e<br />
somente a Deus. Ser vendidos como escravos não era <strong>um</strong>a opção. Preferiram<br />
morrer com orgulho, como pessoas livres a serem convertidos em escravos<br />
pelos romanos.<br />
— Destruíram todas as suas coisas, exceto sua comida, assim os<br />
romanos saberiam que a fome não os levou à morte, mas sim lhes mostrar<br />
que preferiam a morte a serem escravos.<br />
Meus joelhos se debilitaram pela história e <strong>um</strong> calafrio percorreu<br />
meu corpo. Não podia acreditar quão forte os judeus tinham sido... E<br />
continuavam sendo. Eu continuo sem r<strong>um</strong>o caminhando o Monte e<br />
desfrutando as meias paredes de pedra que meus antepassados<br />
construíram.<br />
Toquei o azulejo com meus dedos, imaginando as mulheres e<br />
homens que faz dois mil anos conheceram que suas probabilidades de<br />
sobreviver eram escassas, mas tiveram coragem o suficiente para construir<br />
casas lindas para eles que durariam milhares de anos.<br />
Enquanto examinava o Monte, vi <strong>um</strong> grupo de soldados chegarem à<br />
cima e felicitar. Fixei-me que tinha uns pequenos bolsos nas laterais de suas<br />
botas.<br />
— O que são esses pequenos bolsos em suas botas? — perguntei a<br />
Moron.<br />
— Os Americanos têm identificações ao redor do pescoço dos<br />
soldados?<br />
— Sim.<br />
— Bom, os soldados de combate Israelenses levam a identificação no<br />
pescoço e em suas botas. No caso de partes do seu corpo sejam separadas<br />
durante o combate e possam identificá-las. É <strong>um</strong> cost<strong>um</strong>e judeu que cada<br />
pessoa seja enterrada com todas as partes do seu corpo, mesmo que seja<br />
impossível ocorrer com nossos soldados.<br />
Wow. Que coisa tão sombria é pensar nisso.
184<br />
— O que estão fazendo? — lhe perguntei, enquanto os via junto<br />
recitando <strong>um</strong>as palavras em hebreu.<br />
— Eles estão fazendo <strong>um</strong> juramento para que o Masada não volte a<br />
cair outra vez — Moron me explica. — Este é <strong>um</strong> lugar muito espiritual para<br />
a gente judia.<br />
<strong>Como</strong> se a rocha que estivesse queimada me retirei.<br />
— Oh meu Deus. — digo e tropeço para trás.<br />
— O que? — Avi diz consternado.<br />
— Nada. — Não quero admitir que Masada fosse <strong>um</strong> lugar espiritual<br />
para mim também. E pela primeira vez desde que cheguei em Israel sei<br />
porque estou aqui e me assusta.<br />
Lembrei o que Safta disse.<br />
Ser judeu está mais em seu coração que em sua mente. A religião é<br />
pessoal. Sempre estará ali para quando a queira e a necessite. Pode escolher<br />
segui-la...<br />
Meu passado talvez seja borrado e está com sombras, mas meu<br />
futuro está claro, graças a esta horrível, maravilhosa viagem a <strong>um</strong>a terra<br />
muito diferente, mas <strong>um</strong>a parte dela também é parte de mim.<br />
Olhando montanha abaixo e tentando entender como os judeus...<br />
Meus antepassados... Se sentiram com os poderosos soldados romanos<br />
estando abaixo, e me dou conta de que esta terra tem sido <strong>um</strong>a zona de<br />
guerra desde o início dos tempos.<br />
Porque o século vinte e <strong>um</strong> deve ser o primeiro diferente?
185<br />
Capítulo 27<br />
Às vezes, nossos inimigos são nossos amigos mais próximos.<br />
— Onde você está me levando? — Eu pergunto a Avi.<br />
Enquanto os outros estavam tomando café da manhã na nossa última<br />
manhã no sul de Israel, ele alugou <strong>um</strong> carro no hotel e está me levando para<br />
<strong>um</strong> passeio. Ele não vai me dizer para onde estamos indo, embora, por isso<br />
estou nervosa.<br />
— Para encontrar <strong>um</strong> amigo.<br />
Nós dirigimos pela estrada de terra estéril, ele olha para mim com<br />
aqueles olhos escuros e misteriosos.<br />
— Está com medo?<br />
— Eu deveria estar? — Eu pergunto.<br />
— Não. Você nunca deve ter medo de mim.<br />
Deus, a maior parte do tempo eu estou com medo de estar com ele.<br />
Mas principalmente é porque eu tenho medo de meus próprios sentimentos,<br />
que ficam fora de controle quando estou com ele.<br />
Eu coloquei minhas mãos no meu colo e olho para a bela paisagem.<br />
Quem adivinharia que rochas e a paisagem do deserto poderiam ser tão<br />
bonitas e tão diferentes das montanhas verdejantes do moshav.<br />
Estamos ouvindo <strong>um</strong>a música israelense no rádio, mas eu preciso me<br />
livrar da minha energia nervosa. Eu começo meus exercícios de glúteo.<br />
Aperte. Solte. Aperte. Solte.
186<br />
— O que você está fazendo? — Avi pergunta.<br />
Olho para ele e digo casualmente. — Exercícios de glúteo.<br />
Ele me olha por <strong>um</strong> segundo, então começa a rir.<br />
— Não é engraçado. — Eu me oponho. — Se você ficar sentado por<br />
<strong>um</strong> longo tempo, a sua bunda vai parecer como <strong>um</strong>a bolha enorme de geleia.<br />
— Nós não queremos isso, queremos? — ele diz.<br />
Mostro o dedo para ele. — Vá em frente e tire sarro de mim. Você vai<br />
se arrepender quando você tiver a maior bunda do moshav. — Eu me inclino<br />
para trás no assento do carro. — Antes de tirar sarro de mim você deve<br />
experimentá-lo primeiro.<br />
— Você tem <strong>um</strong> b<strong>um</strong>b<strong>um</strong> legal. — Os lábios de Avi se contorcem em<br />
diversões. — Ok, me diga como fazê-lo.<br />
— Não, se você vai tirar sarro de mim. — Eu não quero fazer <strong>um</strong><br />
papel de tola novamente.<br />
— Vamos lá. — ele insiste. — Eu não vou tirar sarro de você. Eu<br />
prometo.<br />
— Tudo bem. — eu digo.<br />
Eu respiro fundo e percebo que estou prestes a dizer a <strong>um</strong> menino<br />
muito masculino como fazer exercícios de glúteo. Estou morrendo de<br />
vergonha, mas ele realmente parece sério.<br />
Eu digo logo: — Você vai só apertar os músculos do glúteo assim e<br />
depois solta. Quanto mais você segurar a parte interna, mais duro ficará.<br />
Tento demonstrar a ação sem me sentir como <strong>um</strong>a idiota completa.<br />
Mas então eu olho para ele e ele está realmente tentando o exercício.<br />
Eu posso dizer pelo olhar concentrado em seu rosto.
187<br />
— Você já pode variá-la, apertar <strong>um</strong>a bochecha depois a outra? —<br />
ele pergunta.<br />
Eu tento reprimir <strong>um</strong>a risadinha, mas não posso. Na verdade, eu não<br />
consigo parar de rir quando vejo Avi tentando apertar cada bochecha no<br />
ritmo da música tocando no rádio. Ele está tirando sarro de si mesmo,<br />
enfatizando cada movimento de sua bunda junto com o ritmo da música.<br />
Tento, também, e não posso parar de apertar o ritmo da música. É<br />
contagiante, e eu estou tendo <strong>um</strong> dos melhores momentos da minha vida.<br />
— Eu não sabia que você podia ser tão engraçado. — digo-lhe, ainda<br />
tentando manter meus risos parecerem mais sérios para ele.<br />
— Sim, bem, você me pegou desprevenido.<br />
— Seja desprevenido com mais frequência. — eu digo de <strong>um</strong>a forma<br />
muito sedutora e sorrio para ele quando ele olha para mim.<br />
Ele balança a cabeça e suspira, resignado. — Você vai me causar<br />
problemas com Ron. Eu lhe disse que ia cuidar de você.<br />
— Você está.<br />
Eu quero dizer isso. Avi era realmente <strong>um</strong> pé na minha bunda (com o<br />
perdão do trocadilho) quando cheguei a Israel. Mas agora que ele abriu e me<br />
deixou entrar em sua vida pessoal, eu me sinto mais perto dele do que eu<br />
senti com ninguém há muito tempo. Mesmo Mitch.<br />
E agora percebo que Mitch e eu não somos compatíveis. Na verdade,<br />
ele provavelmente nem me conhece. Eu mantenho <strong>um</strong>a parede sobre mim<br />
para não me machucar. Eu gosto de Mitch. Mas eu achava que se ele me<br />
conhecia, eu quero dizer REALMENTE achava, ele nem sequer considera ser<br />
meu namorado.<br />
Por quê? Porque eu sou de alto sustento, em primeiro lugar. E em<br />
segundo lugar eu preciso de <strong>um</strong> cara forte para pegar minhas merdas e<br />
entregar de volta corrigido para mim. Acho Avi <strong>um</strong> pouco parecido com Ron<br />
a esse respeito. Poderia ser compatível com <strong>um</strong> cara que é igual ao meu<br />
doador de esperma?
188<br />
Voltamo-nos para <strong>um</strong> pequeno caminho pavimentado e<br />
movimentação por mais de quinze minutos.<br />
— Onde estamos? — Eu pergunto quando ele estaciona o carro na<br />
frente de <strong>um</strong>a casa pequena.<br />
Ele abre a porta do carro. — Aqui.<br />
— Onde é aqui?<br />
Ele sorri aquele sorriso bem grande, vem para o meu lado do carro, e<br />
abre a minha porta. Eu sei que é considerada a coisa cavalheiresca de fazer,<br />
mas vamos ser honestos. Eu não sou <strong>um</strong>a dama, e Avi... Vamos, ele não é<br />
nenh<strong>um</strong> cavalheiro. Ele é <strong>um</strong> áspero, áspero israelense que pode chicotear<br />
fardos de feno com pouco de esforço. Do jeito que eu gosto.<br />
Eu saio do carro e olho em volta. Eu estava errada antes - moshav é o<br />
Pólo Norte em relação a este lugar no meio do deserto. Acredito seriamente<br />
que se eu quebrasse <strong>um</strong> ovo na rua, vai ficar cozido no sol quente em menos<br />
de dez segundos.<br />
Há casas em frente a mim, feitas de cimento, e elas são todas iguais.<br />
Com isso, quero dizer as casas são todas brancas. Sem tijolos, sem pintura...<br />
Apenas cimento todo branco.<br />
— Quem mora aqui? — Eu pergunto silenciosamente. É como <strong>um</strong>a<br />
pequena aldeia no meio do nada.<br />
Ele caminha em direção à entrada para <strong>um</strong>a das casas primitivas, e<br />
eu sigo em silêncio.<br />
— Palestinos. — ele responde.<br />
O QUE?!<br />
Por que <strong>um</strong> israelense me leva para <strong>um</strong>a casa de pessoas palestinas?<br />
Eu quero fazer perguntas, mas eu não tenho tempo suficiente, porque a<br />
porta da frente da casa começa a se abrir.
189<br />
Um adolescente, de nossa idade, abre a porta. Sua pele é mais escura<br />
que a minha, com o mesmo tom de Avi. Na verdade, se Avi não tivesse me<br />
dito que este cara era <strong>um</strong> palestino, eu teria pensado que ele era israelense.<br />
Eu sei os eventos atuais. Você teria que viver em <strong>um</strong>a caverna para<br />
não saber que palestinos e israelenses não veem olho no olho em qualquer<br />
coisa. E isso é dizer pouco.<br />
Mas enquanto eu assistia esse cara palestino apertar a mão de Avi e<br />
puxá-lo para <strong>um</strong> abraço curto, mais <strong>um</strong>a vez o que eu sei está inclinado em<br />
seu eixo.<br />
— Tarik, esta é minha amiga, Amy Barak. Ela é <strong>um</strong>a americana.<br />
Ninguém nunca me chamou Amy Barak antes e eu estou surpresa. Eu<br />
nasci com o nome de Amy Nelson, porque esse era o nome de solteira de<br />
minha mãe. Eu sou Amy Barak?<br />
Alg<strong>um</strong>a parte de mim, bem no fundo, gosta do jeito como isso soa. Ou<br />
talvez eu goste do jeito que soa saindo dos lábios carnudos de Avi.<br />
De qualquer maneira, não importa. Estou nervosa. Eu faço tudo ao<br />
meu alcance para não roer as unhas ou agir tão chocada quanto eu sinto por<br />
dentro.<br />
Mas Tarik sorri para mim, pondo-me <strong>um</strong> pouco à vontade. E é <strong>um</strong><br />
sorriso verdadeiro, e não <strong>um</strong> daqueles falsos que as pessoas fazem apenas<br />
para ser educado (como Marc faz). Não, este sorriso de Tarik chega a seus<br />
olhos.<br />
—Venha! — Tarik diz ansiosamente. — Tem sido <strong>um</strong> longo tempo,<br />
amigo. — ele diz para Avi que lhe dá <strong>um</strong> tapinha no ombro.<br />
— <strong>Como</strong> está a caça à universidade? — Avi pergunta.<br />
Tarik ri. — Não vale a pena falar. Apesar de eu receber <strong>um</strong>a carta do<br />
UCLA e Northwestern. Então me diga, Amy, o que a traz aqui? — ele<br />
acrescenta enquanto nos leva a <strong>um</strong>a pequena sala.
190<br />
Há almofadas no meio do chão e na parede revestida. Tarik nos<br />
indica para sentarmos. Eu assisto Avi quando ele se senta em <strong>um</strong> travesseiro<br />
laranja e eu sigo o seu exemplo, sentando em <strong>um</strong>a luz azul.<br />
— Eu vim com meu pai para o verão. — eu digo.<br />
Eu vejo <strong>um</strong>a mulher, com a cabeça coberta e em traje tradicional<br />
muçulmano completo, trazendo <strong>um</strong>a bandeja de frutas e entrega para Tarik.<br />
Ela não diz nada, apenas entrega e sai.<br />
Tarik pega <strong>um</strong>a laranja e as indica para mim. — Da nossa árvore.<br />
Aposto que é melhor do que na América.<br />
Eu olho para Avi, que tira <strong>um</strong> cacho de uvas da bandeja e começa a<br />
comê-los. Só depois que eu comecei a descascar a minha laranja Tarik<br />
começou a comer a sua. É cost<strong>um</strong>e, deixar seus convidados comer primeiro?<br />
Eu simplesmente não posso acreditar que estou sentada em <strong>um</strong>a<br />
casa de palestinos e ele está alimentando <strong>um</strong> judeu israelense e <strong>um</strong>a<br />
estranha americana. Com <strong>um</strong> sorriso no rosto, nada menos.<br />
— Vocês dois estão namorando? — Tarik pergunta.<br />
— Somente no verão — Eu gritei e meu rosto fica quente com<br />
embaraço. — Isso é tudo.<br />
Tarik ri. — E depois do verão?<br />
Ele dirige a pergunta para mim, mas Avi diz: — Depois do verão, ela<br />
vai voltar para seu país. Ela tem <strong>um</strong> namorado lá.<br />
— Ah, a história fica mais interessante agora. Eu acho que eu gosto<br />
destas mulheres norte-americanas.<br />
Avi com <strong>um</strong>a uva verde grande em sua boca fala. — Por favor, Tarik,<br />
não deixe ela te enganar. Amy Isanha Taweel.<br />
— Desculpe-me? — Eu digo. — Se você vai falar de mim, fale em<br />
Inglês para que eu possa me defender.
191<br />
Tarik olha para mim com <strong>um</strong> olhar malicioso no rosto. — Ele diz que<br />
você tem <strong>um</strong>a língua afiada, como <strong>um</strong>a cobra.<br />
Minha boca se escancara e eu digo: — Eu não tenho. <strong>Como</strong> é que é?<br />
— digo a Avi.<br />
— Amy, você deve saber que este cara não pede desculpas — diz<br />
Tarik. — Não está em sua natureza.<br />
Avi ri e coloca outra uva verde em sua boca, terminando o último. —<br />
Tarik, você tem que ser <strong>um</strong> advogado, em vez de <strong>um</strong> médico. Você gosta de<br />
arg<strong>um</strong>entar ambos os lados, confundindo a todos.<br />
Um arranhar da porta interrompe-nos quando duas garotas entram<br />
no quarto com xícaras e <strong>um</strong> bule. Elas estabeleceram os copos na frente de<br />
nós.<br />
— Estas são as minhas irmãs, Madiha e Yara.<br />
Meu Deus, minha vida é tão diferente dessas meninas. Elas sorriem e<br />
se curvam ligeiramente em saudação e eu levanto e faço o mesmo, embora<br />
eu me sinta <strong>um</strong> pouco mal vestida. Eu me pergunto o que elas pensam de<br />
mim. Eu não cubro a cabeça ou uso roupas compridas como elas fazem e<br />
imagino o quão diferente as nossas vidas são.<br />
Depois que saem, eu me sento para baixo e dou <strong>um</strong>a mordida da<br />
minha laranja. Ela é tão doce como se eu tivesse lambido <strong>um</strong>a colher de<br />
açúcar. Y<strong>um</strong>!<br />
Quando as irmãs nos deixam sozinhos, Avi diz a Tarik : — Amy acha<br />
que todos os israelenses odeiam os palestinos.<br />
A última coisa que quero fazer é começar <strong>um</strong>a discussão política com<br />
estes dois. Avi il<strong>um</strong>inou-se. Eu quase engasguei com a minha laranja.<br />
Quando eu finalmente fui capaz de engolir, eu abro minha boca para dizer<br />
alg<strong>um</strong>a coisa. Não sai nada.<br />
Tarik se inclina para trás e diz: — Os palestinos tem o mesmo direito<br />
à terra que os israelenses. Não há maneira de contornar esse fato.
192<br />
— Mas — Avi continua — nem todo palestino odeia todos os<br />
israelenses e não todos os israelenses odeiam todos os palestinos.<br />
— <strong>Como</strong> vocês podem ser amigos? — Eu pergunto. Viro-me para<br />
Tarik e digo: — Ele vai para o exército israelense!<br />
Tarik encolhe os ombros. — Esta é a sua vida, a minha não é tão<br />
diferente, mas o meu povo escolheu lutar de <strong>um</strong>a maneira diferente. É a<br />
única maneira que meu povo achou ser mais eficaz.<br />
— Ninguém ganha. — eu digo. — Por que você não pode<br />
simplesmente chegar a alg<strong>um</strong> tipo de acordo e ficar com ela?<br />
— Esperamos que no futuro as coisas vão mudar. — Tarik admite. —<br />
Para alguns, a paz com os israelenses não é <strong>um</strong>a opção. Para mim? Eu quero<br />
paz, mas também quero o meu povo vivendo suas vidas com respeito.<br />
Avi olha para mim e diz: — Muitos israelenses querem a mesma<br />
coisa, Amy. Paz, mas com a garantia de nossas mulheres e crianças possam<br />
andar nas ruas e ônibus de passeio sem ter que se preocupar com sua<br />
segurança.<br />
— Mas o que vem primeiro? — Tarik pergunta.<br />
— No Oriente Médio, nada jamais foi simples — diz Avi.<br />
— Certo. — Tarik concorda. — Nós dois somos pessoas fortes em<br />
nossas crenças.<br />
Eu me movi desconfortavelmente sobre o travesseiro. — Se você<br />
visse Avi no campo de batalha, você o mataria?<br />
Tarik olha diretamente para Avi e diz com <strong>um</strong>a voz sombria: — Sim.<br />
E eu não poderia esperar nada menos dele.<br />
Avi se inclina e pega a minha mão na sua. — Eu trouxe você aqui<br />
para lhe mostrar que não estamos todos cheios de ódio e você está aqui<br />
perguntando se dois amigos se matariam. Boa forma de fazer esse encontro,
querida. Ouça, nós dois fazemos o que tem que fazer para sobreviver. É a<br />
nossa forma de vida.<br />
193<br />
Ficamos na casa de Tarik <strong>um</strong> pouco mais, os caras sorriam sobre a<br />
escola e suas famílias e me perguntaram sobre meus amigos de casa. Eles<br />
pararam o debate político, parece que eles sabem seus limites em falar sobre<br />
isso. É bom discutir coisas sem pensar como se eu não tivesse que agir de<br />
determinada maneira ou responder a <strong>um</strong>a determinada maneira para me<br />
encaixar.<br />
Eu gosto de Tarik. E eu tenho novo conceito por Avi, porque eu sei<br />
que ele deixa de lado suas crenças políticas e é amigo de Tarik, porque ele é<br />
<strong>um</strong> cara com <strong>um</strong> bom coração e cabeça. A notícia soa tão diferente da<br />
realidade, acho que programas de notícias devem mostrar os lados positivos<br />
das pessoas ao invés de se concentrar no negativo.<br />
Quando estamos prontos para sair, Tarik me dá <strong>um</strong> abraço de adeus<br />
e diz: — Cuide do meu amigo.<br />
Deus, eu me sinto <strong>um</strong> peso sobre meus ombros agora. A vida em<br />
Israel é difícil em comparação com a vida de <strong>um</strong> adolescente na América.<br />
Nossas maiores preocupações de volta para casa são o filme que veremos ou<br />
que roupa vamos comprar. E depois do colégio, ficamos obcecados por qual<br />
faculdade vamos entrar. 11 de Setembro mudou nossas vidas, mas ainda é<br />
mais fácil do que para as pessoas no Oriente Médio.<br />
Israelenses nem sequer vão para a faculdade após o ensino médio.<br />
Eles têm de colocar suas vidas em risco e entrar para o exército. Cuide do<br />
meu amigo, Tarik acabou de dizer.<br />
Não é tão fácil como se poderia pensar, especialmente quando essa<br />
afirmação vem de <strong>um</strong> cara que está do outro lado.<br />
Minha própria vida e a maneira que separei de Ron passa diante dos<br />
meus olhos e me sinto <strong>um</strong> pouco doente. Eu tenho <strong>um</strong>a família aqui em<br />
Israel, talvez eu devesse agir como se me preocupasse com eles. Se Avi e<br />
Tarik podem cuidar uns dos outros, talvez eu possa encontrar <strong>um</strong> pedacinho<br />
do meu coração para amar Ron. E Safta. E me atrevo a pensar até em Snotty.<br />
Quero dizer, Osnat.
194<br />
Mas e se eles me decepcionarem?<br />
Eu vejo como Avi e Tarik dão tampinha nas mãos e batem nas costas.<br />
Um sorriso atravessa em meu rosto. Porque eu sei que, mesmo se não o<br />
fizerem, iriam proteger <strong>um</strong> ao outro com toda a sua força, mesmo que<br />
estiverem cara a cara no campo de batalha. Ambos os meninos têm alma<br />
pura e verdadeira.<br />
Paz entre israelenses e palestinos? Quem sabe? Tudo é possível.<br />
Talvez, apenas talvez, a forte amizade entre esses dois caras seja <strong>um</strong> sinal de<br />
esperança para o futuro.
195<br />
Capítulo 28<br />
Há muito o que aprender por se aventurar fora do caminho<br />
planejado.<br />
— <strong>Como</strong> você conheceu Tarik? — pergunto quando estamos no<br />
carro, voltando ao hotel.<br />
— Vamos apenas dizer que eu o ajudei quando ele precisava de <strong>um</strong><br />
amigo, e ele fez o mesmo.<br />
— Estou feliz que você me fez conhecê-lo. — digo.<br />
— E estou feliz que você esteja aqui comigo — ele diz, então<br />
completa, — eu sabia que você não acreditaria em mim se eu lhe dissesse<br />
que nem todos os israelenses odeiam os palestinos. Você é do tipo de garota<br />
que precisa de provas. Você não deveria acreditar tanto na televisão.<br />
— Não confio nas pessoas em geral.<br />
— Aposto que se você confiasse, abriria seus olhos para <strong>um</strong> mundo<br />
mais colorido lá fora.<br />
— Provavelmente, mas ao menos eu não me decepciono, porque já<br />
sei que as pessoas vão me decepcionar.<br />
Ele diminui a velocidade e para no acostamento. Então se vira para<br />
mim. — Quero lhe agradecer.<br />
De repente, minha boca está seca. — Pelo o quê?<br />
— Por me lembrar que há <strong>um</strong> mundo aí fora que vale a pena viver.
196<br />
— <strong>Como</strong> eu fiz isso? — pergunto.<br />
— Você é a primeira pessoa que fez a dor da morte do meu irmão<br />
suportável. — Ele me beija aqui mesmo no carro ao lado de <strong>um</strong> <strong>um</strong>a estrada<br />
deserta e improdutiva. — Quando estou com você, estou inteiro novamente.<br />
Sorrio, por dentro e por fora. Mas estou envergonhada, então olho<br />
para baixo e coloco o dedo na corrente de prata suspensa em seu pulso.<br />
— Você quer? — ele pergunta.<br />
— Se você quiser me dar. — respondo, timidamente.<br />
Ele tira e prende a corrente no meu pulso.<br />
— É como se você dissesse para todo mundo que é minha. — ele diz.<br />
— Pelo menos por enquanto.<br />
Inclino-me para Avi e retomo seus lábios com os meus. <strong>Como</strong> antes,<br />
seus beijos estão me drogando e me sinto sonhadora e delirante.<br />
Antes que eu perceba, estou deitada em cima dele. Posso sentir seu<br />
corpo forte debaixo de mim, o calor e a força de seus músculos sob os meus.<br />
— Devemos parar. — ele diz.<br />
Mordisco sua orelha e digo. — Aham.<br />
Ele joga a cabeça para trás e geme. — Quero dizer, Amy. Estamos<br />
n<strong>um</strong> carro alugado no meio da estrada.<br />
Dessa vez eu lambo o caminho do lóbulo de sua orelha até sua boca.<br />
— Aham.<br />
— Você quer me cons<strong>um</strong>ir, não quer?<br />
— Aham.<br />
Gosto do jeito como eu o faço se sentir quando estamos juntos.<br />
Também gosto muito das sensações selvagens correndo pelo meu corpo<br />
agora mesmo, também, quando movo meu corpo contra o dele.
197<br />
Quando o sinto começar a se entregar a minhas mãos e boca, paro e<br />
sento. Quero dizer, estamos em público e qualquer <strong>um</strong> poderia espiar pela<br />
janela. Será que as janelas se embaçariam se continuássemos? Não acho que<br />
ficaria mais quente dentro do carro do que fora, mas estou me sentindo<br />
muito quente, mesmo com o ar condicionado ligado.<br />
mover.<br />
Ele lambe os lábios lentamente e abre os olhos. — Não consigo me<br />
Eu rio. — Eu fiz você se esquecer de estar com raiva o tempo todo?<br />
— Definitivamente.<br />
— Bom. Posso fazer isso para sempre se isso o faz feliz.<br />
Seus dedos se movem para o meu ombro e deslizam a alça da minha<br />
blusinha para baixo. — Eu gostaria... — diz, inclinando a cabeça para frente e<br />
beija meu ombro lentamente.<br />
Eu sei o que ele quer dizer. Quero que ele diga, mas então me lembro<br />
de nosso pequeno acordo. Não se envolver demais.<br />
Muito ruim, eu já estou tão na dele que assusta.<br />
Mas sei que ele se arrependeria se fôssemos longe demais. E<br />
estamos, na verdade, estacionados no acostamento da estrada. — Se você<br />
não parar de me beijar assim, vou rasgar todas as suas roupas. — digo.<br />
Um pequeno gemido escapa de sua boca e ele se inclina para trás. —<br />
Sou louco por você.<br />
— Que bom. Lembre-se disso quando alg<strong>um</strong>a garota israelense<br />
bonita olhar você depois de eu ir embora. Agora vamos voltar para os<br />
outros, ou eu realmente vou seguir minha promessa.<br />
Meia hora depois, quando nós voltamos para a estrada que leva ao<br />
hotel, Avi diz: — Então, qual é a história dos seus pais? — ele me faz essa<br />
pergunta pesada e me viro para a janela. — Não quero falar sobre isso.<br />
— Por que não? Muitos pais se divorciam.
198<br />
Sim, só que meus pais nunca foram casados, para começar. Tente<br />
contar essa história para seus colegas na escola. Eu sempre acho que eles<br />
pensam que minha mãe dormiu com <strong>um</strong> cara qualquer na faculdade e<br />
engravidou. E a pior parte é que isso não está muito longe da verdade.<br />
— Conte-me sobre os seus pais. — oponho-me. — Eu nunca escuto<br />
muito sobre eles de Ron ou meus tios.<br />
— Não há muito a dizer. Minha mãe trabalha como professora no<br />
moshav e meu pai é sócio de seu tio. Ok, sua vez.<br />
Respiro fundo. — Meus pais nunca se casaram e eu nunca deveria ter<br />
nascido. Eu fui, digamos, <strong>um</strong> erro. Um erro muito grande de dezesseis anos.<br />
Pronto, eu disse. Meu rosto está quente e meus olhos estão úmidos.<br />
Estou me segurando junto da melhor forma possível sob as circunstâncias.<br />
Pensei sobre a minha vida e que erro ela é mais <strong>um</strong> milhão de vezes. Eu<br />
nunca tinha dito isso alto antes, na verdade.<br />
Chegamos ao hotel e Avi estaciona o carro no estacionamento. — Eu<br />
não sou <strong>um</strong> cara muito religioso — ele diz, — mas eu sei que existe <strong>um</strong>a<br />
razão muito importante para você ter nascido.<br />
— Você soa como <strong>um</strong> rabino. — digo.<br />
— Não, sou apenas <strong>um</strong> criador de ovelhas.<br />
— Avi, você é MUITO mais que isso e você sabe. — inclino-me para<br />
trás no banco do passageiro e suspiro. — Não quero que hoje acabe.<br />
Ele me reluz <strong>um</strong> de seus sorrisos desl<strong>um</strong>brantes. — Eu também não.<br />
Olho em seus olhos e ele segura meu olhar por <strong>um</strong> longo minuto. Não<br />
dizemos mais nada, não existem palavras que possam dizer o que quero<br />
dizer a ele. Ou existem? — Avi...<br />
sei.<br />
— Shh. — ele sussurra, cobrindo meus lábios com seus dedos. — Eu<br />
Eu relutante saio do carro e sigo para o saguão do hotel.
199<br />
O resto do grupo está esperando por nós.<br />
Quando reconheço Snotty... Corrijo para Osnat... Sentada sozinha no<br />
canto, vou até ela. — Desculpe-me por eu ter dito que você veste saias<br />
curtas, calças apertadas e tem <strong>um</strong>a lamentável desculpa para peitos.<br />
Osnat mexe a cabeça, em confusão.<br />
Mudo meus pés e olho para o chão. — Quero dizer, você realmente<br />
usa calças apertadas... E seus peitos são menores que os meus. Mas são<br />
peitos atraentes. Tenho certeza de que é estiloso em Israel ter calças<br />
apertadas.<br />
Suas sobrancelhas estão levantadas e ela diz: — Você está tentando<br />
pedir desculpas a mim? Se estiver, você está fazendo <strong>um</strong> péssimo trabalho.<br />
Abro meus braços largamente e digo: — Dê-me <strong>um</strong> tempo aqui, não<br />
estou acost<strong>um</strong>ada a ser sentimental e pedir desculpas.<br />
Osnat se levanta e diz: — Desculpe-me por dizer que seus peitos são<br />
caídos. Seus seios caídos não são ruins, também. — Então ela levanta a mão<br />
para eu apertar. — Trégua?<br />
Espero só <strong>um</strong> segundinho.<br />
— Você nunca me disse que meus peito são caídos! — digo,<br />
ignorando sua trégua falsa.<br />
— Na sua frente, não. — ela admite.<br />
Acho que mereci esse insulto. E vou guardar para mim mesma que<br />
eu a chamava de Snotty desde que a conheci.<br />
Nós duas começamos a rir histericamente e todos estão olhando<br />
para nós como se fôssemos purê de batatas. Duas primas purês de batata.<br />
— Podemos dar <strong>um</strong>a volta? — ela pergunta, chateada.<br />
Saímos do hotel e começamos a caminhar sem r<strong>um</strong>o no<br />
estacionamento.
200<br />
Chuto <strong>um</strong>a pedra na estrada enquanto ando. — Eu não quis vir a<br />
Israel neste verão. — digo. — E não quis gostar de ninguém aqui.<br />
Ela chutou a mesma pedra, continuando seu caminho pela estrada.<br />
— E eu fiquei chocada que Ron tivesse <strong>um</strong>a filha secreta. Acho que, de<br />
alg<strong>um</strong>a maneira, eu tive ciúmes de você.<br />
Eu? Uma filha secreta? Ser pensada como <strong>um</strong> segredo com certeza<br />
bate ser pensada como ilegítima. — Acredite, você não tem nada do que<br />
sentir ciúmes. Ao menos você tem pais que se amam.<br />
— Mas Ron tem o melhor emprego de todos. Você deve estar tão<br />
orgulhosa dele.<br />
Ok, você deve estar imaginando o que Ron faz da vida. Tudo que sei é<br />
que ele está em negócios de segurança.<br />
— Não é grande coisa. — digo. Afinal, todo mundo está nos negócios<br />
de segurança nesses dias.<br />
Osnat puxa meu ombro para trás e me impede de caminhar. — Você<br />
está brincando? — ela diz. — Minha mãe me disse que ele foi contratado<br />
como consultor do Diretor de Segurança dos E.U.A.<br />
O quê? Eu não sabia disso. Acho que nunca tinha perguntado a ele, ao<br />
menos. Estive muito ocupada estando chateada com ele por não ser <strong>um</strong><br />
Superpai.<br />
— Sim, bem, ele não fala muito sobre isso.<br />
— Ele provavelmente não pode porque isso é secreto.<br />
Estou tendo <strong>um</strong> tempo difícil pensando em Ron como <strong>um</strong> super<br />
consultor de segurança contratado pelo governo dos E.U.A... Afinal, estou<br />
acost<strong>um</strong>ada e pensar nele como <strong>um</strong> Doador de Esperma.<br />
Osnat se vira para mim e diz: — Você não sabia o que ele fazia até eu<br />
lhe contar, né?<br />
— Eu não sou chamada de garotinha do papai, se é isso que quer<br />
dizer. — digo. — Na verdade, não sou chegada a ninguém em minha família.
2<strong>01</strong><br />
Minha mãe meio que está em seu próprio mundo e Ron não é exatamente o<br />
melhor pai. Eu nem ao menos tenho <strong>um</strong> primo que goste de mim. Bem, além<br />
do seu irmão, mas porque ele nem fala inglês. Se ele falasse, provavelmente<br />
não gostaria de mim, também.<br />
diz.<br />
— Você não é exatamente a pessoa mais divertida por aí. — Osnat<br />
— Você está brincando? Eu tenho muito a oferecer. — digo. — Por<br />
exemplo, posso lhe mostrar como colocar maquiagem e não vai parecer<br />
exagerado nem manchar. Sou <strong>um</strong> gênio quando se trata de penteados. Posso<br />
até fazer <strong>um</strong>a trança francesa. E posso bater a maioria das pessoas que<br />
conheço em tênis. O que você tem a oferecer? — pergunto, colocando<br />
minhas mãos na cintura enquanto esperava por <strong>um</strong>a resposta.<br />
— Posso andar de cavalo sem sela e sou muito boa em dança. E sou<br />
<strong>um</strong>a pessoa ótima <strong>um</strong>a vez que você me conhece. — ela diz, absolutamente<br />
certa de que me conquistou.<br />
Posso imaginar que andar a cavalo sem sela não é muito diferente do<br />
que andar naquele jeep sobre as pedras, mas tem seu mérito.<br />
— E?<br />
— E posso dizer que Avi mudou desde que conheceu você. Ele sorri<br />
agora... Algo raro desde que seu irmão morreu. Acho que não me importo<br />
que vocês estejam juntos, desde que você o faça feliz.<br />
Nós nos abraçamos e me senti com sorte em ter <strong>um</strong>a prima que<br />
consegue andar de cavalo sem sela. E ser <strong>um</strong>a amiga, também.
202<br />
Capítulo 29<br />
A ameaça de perder alguém, nos faz apreciarmos mais <strong>um</strong><br />
ao outro.<br />
Dois dias depois, sete de nós voltamos para o jipe de moshav. Estou<br />
ansiosa para ver Ron e dizer a ele que quero começar de novo.<br />
Entramos na casa de Osnat e parecia que todas as pessoas do bairro<br />
estavam lá dentro. E todos tinham seus olhos na tela da televisão. Vi a cabeça<br />
cacheada do meu pequeno primo Matan e a Doda Yucky. Não vi o Ron nem o<br />
tio Chime.<br />
O clima é sombrio.<br />
— O que está acontecendo? — pergunto. Eu não consigo entender o<br />
apresentador, obviamente, está cobrindo <strong>um</strong>a notícia muito importante.<br />
A casa explode em hebraico, todo mundo explicando a Osnat, Ofra,<br />
Avi, Doo-Doo, O’dead e Moron o que eles estão tão irritados. Só que eu não<br />
entendo nada disso.<br />
— Houve <strong>um</strong> atentado — Avi me explica depois de escutar os outros.<br />
— Em Tel Aviv.<br />
— Onde está meu pai? — entro em pânico. — Onde está Ron? Eu<br />
preciso dele agora mais do que nunca.<br />
Avi me dá <strong>um</strong> abraço.<br />
— Amy, vai ficar tudo bem.<br />
As lágrimas enchem meus olhos e volto a dizer, desta vez dirigindo a
203<br />
pergunta a Doda Yucky.<br />
— Onde ele está? — Não tenho nenh<strong>um</strong>a resposta e sinto o a<strong>um</strong>ento<br />
da bílis em minha garganta. Saio do abraço de Avi. — Quero vomitar.<br />
— Seu aba foi com Chime a Tel Avi para entregar carnes em alguns<br />
restaurantes — explica.<br />
— Eles estão bem, Doda Yucky? — digo, chorando totalmente agora,<br />
sem me preocupar por isso. Lágrimas escorrem pelo seu rosto também.<br />
— Eu não sei. Está <strong>um</strong>a grande confusão. Depois do bombardeio, as<br />
pessoas correram para ajudar <strong>um</strong> terrorista... Uma segunda bomba...<br />
— Oh meu Deus — digo.<br />
Eu não posso saber se Ron está bem, mas eu definitivamente sei que<br />
se alguém ficou ferido, ele é <strong>um</strong> dos primeiros a correr para ajudar. A<br />
segunda bomba... Não posso pensar nisso.<br />
— Não sabemos onde estão. — disse. — O telefone celular não<br />
funciona.<br />
Vou ao quarto de Osnat e freneticamente mecho em minha mochila.<br />
Em <strong>um</strong> dos bolsos da minha calça jeans pego a estrela judaica que Safta me<br />
deu. Os diamantes estão brilhando para mim, quase como se me dissessem<br />
que sou judia como o resto de minha família. Temos sobrevivido a milhares<br />
de anos, embora tenhamos sofrido a maior parte deles, recordo a mim<br />
mesma.<br />
Caminhando de volta à sala principal, coloco as mãos sobre meu<br />
rosto. Não quero que ninguém olhe para mim agora. Sinto-me tão impotente.<br />
Quantas pessoas foram feridas ou mortas hoje? Fico doente só de pensar.<br />
Tento afastar a imagem de Ron estendido na rua da minha mente. Porém e<br />
se estiver e eu não estar lá para ajudá-lo? Preciso de forças, pois acredito<br />
que perdi as minhas. Abaixo as mãos e olho para Avi.<br />
Eu preciso dele.
204<br />
Eu preciso tanto que não sei o que fazer comigo mesma.<br />
— Avi — eu digo, correndo ao seu encontro para que me abrace em<br />
seu peito e me mantenha apertada. — Por favor não me deixe, não acho que<br />
posso lidar com isso sem você.<br />
— Eu estou aqui — me assegura com <strong>um</strong>a voz suave e acaricia meus<br />
cabelos. — Eu não te deixarei.<br />
Ele perdeu seu irmão em <strong>um</strong> atentado. Deve estar sofrendo pela dor<br />
de sua própria perda. Podemos ajudar <strong>um</strong> ao outro nisso.<br />
— Posso ter isso? — eu digo, segurando o colar.<br />
Esperamos pelo tempo mais longo de minha vida, por sua vez, Avi e<br />
eu nos sentamos ao lado de Safta em seu quarto e evitamos ver a cobertura<br />
das notícias. Ela me contou de sua infância em Israel e de sua experiência<br />
quando chegou ao que chama de “Terra Santa”. Posso dizer que tem medo. A<br />
perda de dois filhos a assombra.<br />
Quando o telefone toca, pulo e corro para a cozinha.<br />
Doda Yucky pega o telefone e me olha diretamente enquanto<br />
responde. Meu coração acelera.<br />
— Amy — disse e me apoio em Avi, me preparando para as más<br />
notícias. — É a tua mãe.<br />
Minha mãe! Corro ao telefone e o coloco no meu ouvido.<br />
— Mamãe!<br />
— Oi, querida. Ouvi no noticiário que houve <strong>um</strong> atentado em Israel.<br />
Liguei para me certificar que você estava bem. Jessica ligou, também está<br />
preocupada.<br />
— Estou... Estou bem — eu digo, mal capaz de fazer que as palavras<br />
saiam através de meus soluços. — Porém... Eu estava viajando e Ron estava<br />
em Tel Aviv... E não sabemos nada dele e eu estou ficando louca. Não sei o<br />
que fazer. Estamos esperando <strong>um</strong> telefonema, mas...
205<br />
— Oh, não. Isso é terrível, nunca pensei...<br />
— Mamãe, tenho que desligar, se ele ligar.<br />
— Está bem, está bem — diz em pânico. — Vou desligar. Ligue para<br />
mim assim que você souber algo... Qualquer coisa? Certo? E fique em casa.<br />
Eu preciso de você de volta em <strong>um</strong> único pedaço.<br />
— É o que eu quero, mamãe — digo.<br />
Assim que desligo, o telefone volta a tocar. Eu passo para Osnat, que<br />
está tão ansiosa e assustada como eu.<br />
— Ze aba! — Grita para a multidão depois de falar com a pessoa do<br />
outro lado da linha. — Hakol beseber!<br />
Avi me pega em seus braços e me gira ao redor.<br />
— Estão bem!<br />
Eu não posso acreditar. Volto ao quarto de Safta para contar as boas<br />
notícias. Sei por Doda Yucky que o tio Chime e Ron ficaram no local de<br />
bombardeio para ajudar os mais de quarenta feridos.<br />
Há <strong>um</strong> monte de abraços e alegria, apesar de que todos sofrermos<br />
pelas pobres almas que perderam as vidas no atentado. É <strong>um</strong>a coisa<br />
estranha ficar feliz e triste ao mesmo tempo. Eu não sei como tratar com os<br />
israelenses o tempo todo.<br />
Avi espera na porta de entrada do moshav comigo, junto com Mutt. O<br />
pequeno está encostado junto comigo, como se fosse meu protetor.<br />
— Não posso acreditar no que aconteceu. Foi <strong>um</strong> pesadelo — digo.<br />
— Eu quase perdi o meu pai. Antes de sequer realmente conhecê-lo.<br />
É muito aterrorizante para pensar.<br />
— Porém você tem <strong>um</strong>a segunda chance — disse Avi pensativo.
206<br />
Eu me inclino sobre ele.<br />
— Sim, eu tenho. E a partir de agora vou aproveitar cada segundo.<br />
— Eu também — disse e me dá <strong>um</strong> de seus incríveis beijos para<br />
comprovar.<br />
Quando a porta se abre e eu vejo os faróis de <strong>um</strong> carro, me coloco de<br />
pé. O carro para e meu pai, cuja camisa tem sangue salpicado, salta para fora<br />
e me aperta em seus braços.<br />
— Você está bem? — Estou olhando sua camisa manchada.<br />
— Não se preocupe, estou bem.<br />
— Aba — digo em hebraico. — Eu te amo tanto.<br />
— Oh, Amy, eu também te amo.<br />
mão.<br />
Aperta-me de novo e limpa minhas lágrimas com as costas de sua<br />
— Sinto muito por não haver dito antes. Eu sei que tenho te tratado<br />
mal. Quero que seja <strong>um</strong>a parte importante da minha vida agora. Quero ser<br />
judia também. E quero aprender hebraico. Pode me ensinar?<br />
— Reduz a velocidade, não posso te alcançar. Ainda estou<br />
desfrutando do “Te amo, Aba” — Eu vejo que seus olhos estão vermelhos e<br />
lacrimejantes. — Não quero que pense que não lutei para estar com você,<br />
querida. Eu errei em muitas maneiras.<br />
Ele enxuga <strong>um</strong>a lágrima escorrendo pelo rosto e estou chocada.<br />
— Tinha a esperança que esta viagem a Israel iria mudar tudo. Não<br />
quero te perder para Marc. Você é minha filha, não dele — diz enquanto me<br />
abraça.<br />
Está chorando como <strong>um</strong> bebê. E eu também.
207<br />
— Eu pensei que tivesse perdido você — digo, enquanto<br />
caminhamos de volta para casa, deixando o tio Chime conduzindo.<br />
Avi nos deixou sozinhos também, dando a mim e meu pai<br />
privacidade.<br />
— Te perdi há muito tempo, filha. Fico feliz que finalmente nos<br />
encontramos.<br />
mim?<br />
— Será que pode encontrar <strong>um</strong> quarto em seu apartamento para<br />
— O que você quer dizer? Eu amaria que você se mudasse comigo.<br />
Durante <strong>um</strong> ano. Os finais de semana. Para sempre. Vou receber o que você<br />
quer me dar.<br />
— Isso é, se não estiver muito ocupado como o Diretor de Segurança<br />
dos Estados Unidos.<br />
Ele ri e coloca o braço ao redor de meus ombros.<br />
— Sempre terei espaço em minha casa para minha filha número <strong>um</strong><br />
e eu não vou esquecer.<br />
— Certeza que não tem namorada? — pergunto.<br />
— Ninguém importante o suficiente para trazer para casa, filha.<br />
você.<br />
— Eu acho que você precisa de alguém... Que tire essa infelicidade de<br />
— E a quem devo agradecer por tirar infelicidade da minha filha de<br />
tão longe?<br />
— Ele tem sido <strong>um</strong> perfeito cavalheiro.<br />
— Quem? Doo-Doo?<br />
— Você pode me imaginar com <strong>um</strong> cara chamado assim?
208<br />
— Seu verdadeiro nome é David.<br />
— Huh?<br />
— Doo-Doo é <strong>um</strong> apelido para David.<br />
Apelido estúpido se você me perguntar.<br />
— É o Avi.<br />
O rosto de Ron se torna sério agora.<br />
— Tem dezoito anos, Amy. E perdeu a seu irmão...<br />
— Sei tudo isso. Temos nos ajudado <strong>um</strong> ao outro durante a viagem e<br />
eu... O amo.<br />
Papai aperta a mandíbula e o músculo começa a tremer.<br />
— Não é assim. Ele me respeita e eu o respeito. Talvez até demais.<br />
— Tenho que me acost<strong>um</strong>ar em ter <strong>um</strong>a filha adolescente — diz.<br />
Olho fixamente em seus olhos.<br />
— Não. Tem que se acost<strong>um</strong>ar comigo.
209<br />
Capítulo 30<br />
Você nem sabe o que quer até que ele é colocado em seu colo.<br />
Bem, é o penúltimo dia antes de ir para Chicago. Avi e eu estamos<br />
indo em <strong>um</strong> encontro duplo com Osnat e O'dead.<br />
Olho para a minha prima, que parece ótima agora que eu mostrei<br />
como colocar <strong>um</strong>a maquiagem, para que ela não se pareça com <strong>um</strong> alvo.<br />
Ela está me olhando a escolher roupas para vestir. Eu posso dizer<br />
pelo jeito que ela está olhando ansiosamente para o meu vestido de verão da<br />
Ralph Lauren que ela gosta.<br />
— Eu não gosto desse vestido. — eu digo. — Você o quer?<br />
Seus olhos se il<strong>um</strong>inam. — Sério?<br />
— Absolutamente. Não faz meu olhar ficar chocado. — eu digo, e<br />
jogo para ela.<br />
Eu estou vestindo <strong>um</strong>a saia curta e apertada e <strong>um</strong>a blusa azul<br />
marinho com branco e mangas e babados... É a primeira vez que eu o visto<br />
desde que eu estive em Israel. Espero que Avi goste - tudo no que ele me viu<br />
foi em jeans e shorts.<br />
Quando eu ouço a voz de Avi no corredor, meu corpo inteiro fica<br />
cheio de expectativas e eu não aguento.<br />
Mitch realmente vai ficar puto quando ele perceber que eu me<br />
apaixonei por outro cara, mas seria impossível ignorar a emoção que eu<br />
sinto quando sequer penso em Avi.
210<br />
Assim que eu estou prestes a sair pela porta do quarto, meu aba<br />
entra no quarto. Ele se senta na minha cama e me agarra de surpresa. —<br />
Você está linda. — diz ele. — <strong>Como</strong> sua mãe. Isso me assusta.<br />
— Você prefere que eu seja feia?<br />
Sua boca se curva em <strong>um</strong> sorriso torto. — Talvez.<br />
— Você quer que eu cancele o meu encontro para fazer você se<br />
sentir melhor? — Pergunto séria.<br />
Ele olha para cima. — Não, não é claro.<br />
— Bom. Porque eu não iria.<br />
— Amy... — ele diz em <strong>um</strong> tom de aviso.<br />
— Controle-se, papai. Eu não vou fazer qualquer coisa que você não<br />
faria na minha idade.<br />
Ele se levanta e diz: — É isso. Você está cancelando esse encontro.<br />
Osnat sai da sala e volta com sua mãe. Doda Yucky diz algo para o<br />
papai em hebraico. Ele se senta novamente, obviamente derrotado, e, em<br />
seguida, Doda Yucky leva-me para o vestíbulo.<br />
Avi dá <strong>um</strong>a olhada para mim, sorri, e coloca a mão em seu coração.<br />
— Wow.<br />
Grande reação.<br />
Então ele pega a minha mão, e a aperta e me leva até seu carro. Osnat<br />
e O'dead já estão esperando no banco de trás.<br />
— Aonde vamos? — Eu pergunto.<br />
— Na discoteca. — ele responde.<br />
Na discoteca? Eu realmente não tenho visões de passar minha última<br />
noite em Israel em <strong>um</strong> alto, bar, lotado de f<strong>um</strong>aça. Mas eu guardo as minhas<br />
opiniões para mim mesma. Ele está tentando, mesmo que meu coração
211<br />
esteja <strong>um</strong> pouco vazio no momento.<br />
Quando chegamos ao lugar, percebo que a fila está ainda maior do<br />
que a última vez que estivemos aqui. Ótimo, agora eu vou passar a maior<br />
parte desta noite em <strong>um</strong>a fila. Que lástima.<br />
Avi dirige-se para frente do clube. Osnat e O'dead saem, e eu abro a<br />
porta do carro.<br />
— Onde você vai? — Avi pergunta.<br />
— Uh, esperar na fila como o resto das pessoas que querem entrar.<br />
— eu digo sarcasticamente.<br />
— Vou levá-la em outro lugar.<br />
Eu ergo minhas sobrancelhas. — Você disse que nós estávamos indo<br />
para a 'discoteca'. Eu ouvi você dizer especificamente a palavra 'discoteca'.<br />
Ele diz: — Nós estávamos. Mas só deixar e Osnat O'dead.<br />
Quando Avi pisca para mim, eu resolvo voltar para o carro e fecho a<br />
porta. Eu realmente tenho borboletas no estômago, porque agora eu estou<br />
sozinha com ele. Eu nunca me senti assim com mais ninguém na minha vida.<br />
Ele segura minha mão quando afastamos do clube e fomos até <strong>um</strong>a<br />
estrada de terra sinuosa que provavelmente não foi percorrida em séculos.<br />
Ele para o carro, se vira para mim, e me mostra <strong>um</strong> lenço.<br />
— O meu nariz está escorrendo? — Eu pergunto. — Quero dizer, é<br />
<strong>um</strong>a dica ou o quê?<br />
— É para vendar você, Amy. Feche os olhos.<br />
Eu fecho, apoio-me nele e sinto-o amarrar a venda em torno de<br />
minha cabeça, enquanto ele esfrega <strong>um</strong> beijo suave em meus lábios. Depois<br />
que ele me ajuda a sair do carro, ele me leva a alg<strong>um</strong> lugar.<br />
Isso é emocionante, é emocionante. Eu não posso esperar para todas<br />
as surpresas que ele planejou para mim.
212<br />
Ele desamarra o lenço. — Abra seus olhos.<br />
Eu pisco alg<strong>um</strong>as vezes antes que eu possa focar no escuro.<br />
Velas. Muitas delas. Dois travesseiros. E entre os travesseiros está<br />
<strong>um</strong> prato vazio.<br />
— Sente-se.<br />
Eu sigo as suas instruções.<br />
— Ok, espere aqui. — Ele parece nervoso, o que é tão fofo.<br />
Normalmente ele é tão calmo e tranquilo.<br />
Eu olho ao meu redor. Estamos no meio do nada, em <strong>um</strong> terreno<br />
estéril, deserto com grilos cantando para nós. Sento-me em <strong>um</strong>a das<br />
almofadas e espero. Avi volta com <strong>um</strong>a caixa de isopor.<br />
Ele hesita antes de abrir. — Você está com fome?<br />
— De quê?<br />
Uma de suas sobrancelhas levanta. — Você sabe que tem comida<br />
aqui, mas se você está com fome de algo mais...<br />
— Comida está ótimo. — eu digo, interrompendo-o.<br />
Ele me dá <strong>um</strong> de seus sorrisos impressionantes, senta ao meu lado, e<br />
abre a embalagem. Quando vejo o que está lá dentro, eu fico tão emocionada<br />
que eu tenho de engolir <strong>um</strong> caroço na minha garganta.<br />
— Você comprou sushi! Minha comida preferida no mundo inteiro.<br />
<strong>Como</strong> você sabia?<br />
Os rolos de sushi são pequenos, redondos com rostos felizes<br />
sorrindo para mim.<br />
Ele me entrega <strong>um</strong> conjunto de pauzinhos. — Ron me disse.<br />
— Desejei comer sushi nestes últimos meses. — eu explico. — Você<br />
sabe o que <strong>um</strong> peru frio pode fazer a <strong>um</strong>a pessoa?
Ele está olhando para mim como se eu fosse louca. Mas eu não me<br />
importo.<br />
213<br />
— Quer <strong>um</strong> pouco? — Eu pergunto, minha boca já está cheia com <strong>um</strong><br />
rolo de at<strong>um</strong> picante. Eu estou gemendo de prazer enquanto eu como o rolo,<br />
doce e picante, o som vem da minha garganta automaticamente.<br />
Avi admite que nunca comeu sushi, então eu irei treiná-lo. Nós<br />
compartilhamos da refeição, Avi provisoriamente tenta dar pequenas<br />
mordidas, enquanto eu estou devorando em minha boca. Vou ter que<br />
lembrar Jessica de dizer aos israelenses para fazerem sushi.<br />
Quando termino a refeição, Avi se levanta. — Tenho outra surpresa<br />
para você.<br />
— O que é? — Eu pergunto, totalmente animada. Até agora, esta<br />
noite está absolutamente perfeita.<br />
— Pô, eu esqueci alg<strong>um</strong>a coisa. — Ele sai e volta com <strong>um</strong> pequeno<br />
buquê de flores.<br />
Ok, eu não estou tentando ser <strong>um</strong>a cadela. Mas Safta ganhou <strong>um</strong>a<br />
floresta inteira do meu avô. E o que Avi espera que eu faça com flores<br />
quando eu vou pegar <strong>um</strong> vôo de 12 horas amanhã? Eu tento não mostrar<br />
minha decepção quando ele coloca na minha frente, então eu sorri tão<br />
docemente quando pude.<br />
— Você não gosta de flores?<br />
— Eu gosto. — eu digo.<br />
Ele pega <strong>um</strong>a rosa vermelha para fora do bouquet e quebra parte do<br />
tronco. Em seguida, ele se ajoelha ao meu lado e coloca a rosa no meu cabelo.<br />
— Eu queria ter algo para se lembrar de mim, mas eu não sabia o que você<br />
gostaria.<br />
— Então você me dá flores. Isso é bom.<br />
Ele ri. — As flores eram da minha mãe. Ela é antiquada. Para ser
214<br />
honesta, ela comprou para eu dar a você.<br />
Este não é o cara romântico que eu achava que ele era.<br />
— O sushi foi ótimo. — eu digo. — Mas você está perdendo pontos<br />
rapidamente, amigo.<br />
— Espere aqui. — diz ele. —Eu tenho <strong>um</strong>a última surpresa. —<br />
Quando ele volta e vejo que ele está segurando, eu não posso acreditar.<br />
Avi está segurando Mutt. O cachorro tem <strong>um</strong>a fita azul no pescoço. E<br />
ele está lindo.<br />
— Você o lavou. — eu digo, com lágrimas escorrendo pelo meu rosto.<br />
— Ele é oficialmente seu agora. — ele diz, e coloca Mutt no meu colo.<br />
— Eu tenho arranjado para você levá-lo de volta para os EUA.<br />
limpo.<br />
Eu não posso acreditar o quão fofo e macio, ele está agora que está<br />
— Arg!<br />
— Posso realmente levá-lo para casa?<br />
— Sim. Ele provavelmente vai ter que passar por <strong>um</strong> período de<br />
quarentena, mas...<br />
Eu abafo suas palavras com meus lábios, porque esta é a noite mais<br />
perfeita da minha vida.<br />
Passamos o resto da noite conversando, beijando, sendo boba, e<br />
brincando com Mutt.<br />
Logo antes de arr<strong>um</strong>ar as almofadas e velas, eu sei que temos que ter<br />
a conversa.<br />
— Então... Eu acho que nosso caso de verão é longo. — eu deixo<br />
escapar, dedilhando a sua pulseira ainda no meu pulso. Eu desfaço o fecho e
215<br />
seguro para ele.<br />
Avi se inclina para frente, apoiando os cotovelos sobre os joelhos<br />
dobrados.<br />
— Fique com ele. Então você não se esquecerá de mim.<br />
<strong>Como</strong> se eu fosse.<br />
— Eu nunca vou te esquecer. E eu percebo que eu sou <strong>um</strong>a cadela<br />
mimada americana.<br />
— Amy, eu sinto muito, eu nunca disse que...<br />
— Não. — eu digo. — Eu sou mimada porque eu quero que nós<br />
mantenhamos contato e talvez <strong>um</strong> dia, depois de terminar o exército,<br />
poderíamos, você sabe, ficar juntos novamente.<br />
— Está muito longe. — ele diz. — E se você estiver namorando com<br />
alguém?<br />
— E se você estiver? — Eu me oponho.<br />
Ele ri.<br />
— Você me ensinou muito sobre mim.<br />
Ele delicadamente pega o cabelo perdido no meu rosto e enfia atrás<br />
da minha orelha, seus dedos remanescentes na minha orelha. Quando seus<br />
dedos arrastam até a estrela judaica ainda em torno de meu pescoço, ele diz:<br />
— Você realmente é <strong>um</strong> dom de Deus, Amy.<br />
— Não, você é.<br />
Quando ele se inclina para me beijar pela última vez, eu sei de fato<br />
que em alg<strong>um</strong> lugar, alg<strong>um</strong> dia, em alg<strong>um</strong> lugar, eu vou estar beijando Avi<br />
novamente.<br />
E da próxima vez, ele só poderá estar no topo do Monte Massada.
216<br />
Epílogo<br />
O fim de <strong>um</strong>a coisa é apenas o começo de outra.<br />
Estou voltando para minha casa em Chicago... Yep, papai e eu<br />
fazemos a longa viagem de volta no avião.<br />
Estava <strong>um</strong> pouco nervosa em dizer a Mitch sobre Avi, mas quando<br />
Jéssica derramou as favas e me disse que ela e Mitch meio que ficaram<br />
juntos depois de sua noite na Ravinia me senti muito melhor. Claro que fiz<br />
ambos suarem <strong>um</strong> par de horas. Então derramei minhas próprias favas e<br />
lhes falei sobre Avi.<br />
Meu não-namorado israelense está no exército agora, treinando para<br />
estar em <strong>um</strong> comando estúpido. Escreve quando pode, o que é<br />
aproximadamente <strong>um</strong>a vez por semana.<br />
Dou-me conta em suas cartas que o nome de O´dead se escreve Oded<br />
e Moron se escreve na realidade Moran (graças a Deus por eles). Doo-Doo<br />
ainda vai por seu apelido, mas espero que mude no próximo verão.<br />
Avi nunca disse que me amava, mas ele não tem que dizê-lo. Sei que<br />
se preocupa por eu estar preocupada por ele e me ama. Tem algo difícil dizêlo<br />
em voz alta.<br />
Meu pai e eu vamos passar minhas férias de verão em Israel no<br />
próximo ano. Desta vez estou planejando <strong>um</strong>a viagem de acampamento de<br />
duas semanas de duração em todo o país. Posso ensinar ao papai <strong>um</strong> par de<br />
coisas desta vez, como quando <strong>um</strong>a lhama começa a fazer ruídos de<br />
gorgolejo. Avi será capaz de pegar duas semanas de descanso logo, não<br />
posso esperar para vê-lo. Safta está bem, começa sua seguinte série de<br />
tratamentos de quimioterapia no mês que vem. Estou enviando-lhe <strong>um</strong><br />
pacote de cuidados hoje em dia.<br />
O casamento de minha mãe e Marc com “c” estava bem. Marc e eu<br />
tivemos <strong>um</strong>a conversa antes do casamento. Ele disse que poderia ser <strong>um</strong>
amigo para mim, mas eu já tenho <strong>um</strong> pai. Levou a notícia melhor do que o<br />
esperado. Ron estava no casamento, era <strong>um</strong> parceiro de dança para mim.<br />
217<br />
Tenho vivido no apartamento do meu pai até que Marc e a nova casa<br />
de mamãe nos subúrbios (a que decidiu construir do zero) esteja pronta, já<br />
passaram meses até agora. Enquanto estou aqui, tenho muito trabalho por<br />
fazer... <strong>Como</strong> ensinar Ron a se vestir para impressionar <strong>um</strong>a mulher. Não<br />
está pronto ainda, mas está no caminho para se converter em <strong>um</strong><br />
aposentado graduado. Tudo o que tenho que fazer é encontrar a mulher<br />
adequada para ele. Enquanto isso, está me ensinando hebreu e jura a seus<br />
amigos que tenho <strong>um</strong> dom natural quando se trata da criação de ovelhas.<br />
Eu e minha religião? Bom, estou tendo aulas de conversão com o<br />
rabino Glassman mais a Bait Chaverin (que para você que não fala hebreu<br />
significa casa de amigos). Mamãe se surpreendeu quando lhe disse que estou<br />
me convertendo em judia. O fato é que me prometeu se assegurar que não há<br />
produtos com carne de cervo ou mariscos na comida para mim. Manter-me<br />
assim é parte do que sou agora.<br />
— Arg!<br />
Sim, esse é o Mutt. E sim, meu cachorro tem <strong>um</strong> impedimento de fala.<br />
Não pude deixar de amar ao pequeno filhote. Come a maior parte dos<br />
sapatos de mamãe, mas sabe deixar apenas os meus. Também acredita que é<br />
<strong>um</strong> cachorro de colo, apesar de que vai estar perto dos noventa quilos<br />
quando estiver maior. Temos passado por muitas coisas juntos e ele me<br />
ensinou a amar os animais.<br />
Meu nome é Amy Nelson Barak e fui a Israel para minhas férias de<br />
verão. Eu aprendi o significado minha família, minha herança, <strong>um</strong>a linda<br />
terra cheia de rica história e o amor. Você não sabe, mas as arruinadas férias<br />
de verão resultaram ser os melhores três meses da minha vida.<br />
Fim…
218<br />
Próximo Livro:<br />
How to Ruin My Teenage Life<br />
Nesta sequência de How to Ruin, toda a vida de Amy Nelson de<br />
dezesseis anos de idade vai mal. Sua mamãe se casou e se mudou para os<br />
subúrbios, e agora vai ter <strong>um</strong> bebê. Amy se mudou com seu papai para<br />
Chicago e lhe contratou <strong>um</strong> serviço de encontros por telefone. Seus<br />
primeiros quatro encontros eram essa noite...<br />
O que mais? Seu cachorro Mutt deixou grávida a preciosa poodle do<br />
seu vizinho resmungão, assim Amy teve que encontrar tempo para<br />
conseguir <strong>um</strong> trabalho de meio período para pagar a metade do veterinário.<br />
E agora este garoto totalmente chato, Nathan Rubin, se mudou ao seu<br />
edifício de apartamentos. Felizmente Amy tem <strong>um</strong> namorado lindo chamado<br />
Avi. Apesar de que mais parece sem namorado considerando que Avi estará<br />
no exército israelense durante os próximos três anos.<br />
O que pode fazer <strong>um</strong>a jovenzinha, quando todo o mundo está<br />
conspirando para <strong>arruinar</strong> sua vida?
219<br />
Tradução<br />
PatiPlm<br />
Micaah<br />
Anju<br />
Cris<br />
Kitten<br />
Revisão Inicial<br />
Lud<br />
Revisão Final<br />
Leidy
220<br />
Sobre o Autor:<br />
Simone Elkeles nasceu e cresceu em Chicago. Foi designada Autora<br />
do Ano pela Associação de Professores de Língua de Illinois. Entre seus<br />
livros publicados destacam-se: Leaving Paradise, How to Ruin a S<strong>um</strong>mer<br />
Vacation e How to Ruin My Teenage Life.<br />
Em Química Perfeita, para dar vida a Fairfield, Simone se inspirou<br />
em <strong>um</strong> subúrbio próximo a sua casa, onde duas comunidades muito<br />
diferentes compartilham <strong>um</strong> mesmo instituto.<br />
Atualmente Simone reside com sua família em Illinois.
221