Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
de Thomas?<br />
— Isso. — O guarda desvia o olhar para mim, e novamente posso sentir que ele está observando<br />
meu pescoço não marcado. Preciso me conter para não cobrir a pele com uma das mãos. No entanto, ele<br />
deve ter concluído que não somos encrenqueiros, pois olha de novo para Alex e diz: — Frank Dorset.<br />
Fui transferido da Três em fevereiro, depois do incidente.<br />
Algo na maneira como ele diz incidente envia calafrios por minha coluna.<br />
— Dureza, não é? — Alex se apoia na parede, o retrato da casualidade. Só eu consigo detectar a<br />
tensão em sua voz. Ele está enrolando. Não sabe o que fazer ou como entraremos.<br />
Frank dá de ombros.<br />
— Aqui em cima é mais silencioso, com certeza. Ninguém entra, ninguém sai. Pelo menos, quase<br />
ninguém. — Ele sorri de novo, mostrando aqueles dentes horrorosos, mas os olhos mantêm o estranho<br />
aspecto insensível, como se houvesse uma cortina sobre eles. Fico imaginando se isso foi um efeito<br />
colateral da cura ou se ele sempre foi assim.<br />
Ele inclina a cabeça para trás, encarando Alex através de olhos semicerrados, e sua semelhança com<br />
uma cobra se torna ainda mais acentuada.<br />
— Então, como ficou sabendo sobre Thomas?<br />
Alex mantém sua atuação despreocupada, sorrindo e rodando o distintivo.<br />
— Boatos aqui e ali — diz ele, dando de ombros. — Sabe como é...<br />
— Sei como é — diz Frank. — Mas o DIC não ficou muito feliz. Trancou-nos por alguns meses. O<br />
que exatamente você ouviu, afinal?<br />
Percebo que esta é uma pergunta importante, algum tipo de teste. Tenha cuidado, digo mentalmente<br />
para Alex, como se talvez ele pudesse me ouvir.<br />
Alex hesita por um segundo antes de falar:<br />
— Ouvi que ele talvez nutrisse simpatia pelo outro lado.<br />
De repente, tudo faz sentido: Alex ter dito “tenho amigos aqui”, o fato de que parece que ele já teve<br />
acesso à Ala Seis antes. Um dos guardas devia ser simpatizante, ou talvez um membro ativo da<br />
resistência. A frase constante de Alex se repete em minha cabeça: há mais de nós do que você imagina.<br />
Frank relaxa a olhos vistos. Aparentemente, foi a resposta certa. Ele parece decidir que Alex é, afinal,<br />
confiável. E então alisa o cano da arma — que está repousada casualmente entre os seus joelhos —<br />
como se fosse um animal de estimação.<br />
— Isso mesmo. Foi um choque para mim. Claro, eu mal o conhecia; às vezes o encontrava na sala de<br />
descanso, e uma ou duas vezes quando eu ia mijar, mas é só. Ele costumava ficar na dele. Acho que faz<br />
sentido. Devia falar bastante com os Inválidos.<br />
Esta é a primeira vez que ouço alguém de um cargo oficial reconhecer que há pessoas vivendo na<br />
Selva, e inspiro rapidamente. Sei que deve ser doloroso para Alex estar ali, falando de forma casual sobre<br />
um amigo que foi pego por ser simpatizante. O castigo deve ter sido rápido e severo, principalmente por<br />
ele fazer parte da folha de pagamento do governo. Talvez tenha sido enforcado, fuzilado, eletrocutado<br />
ou jogado em uma das celas para apodrecer — se o tribunal tiver sido misericordioso e votado contra<br />
um veredito de morte por tortura. Se é que houve um julgamento.<br />
Incrivelmente, a voz de Alex não se altera.<br />
— Qual foi a pegada?<br />
Frank continua massageando a arma, e algo nesse movimento — suave, quase como se ele tentasse<br />
despertá-la — me provoca náuseas.<br />
— Não foi exatamente uma pegada. — Ele tira o cabelo da frente do rosto e revela uma testa suja,<br />
brilhando com suor. É muito mais quente aqui do que nas outras alas. O ar deve ficar preso nestas<br />
paredes, apodrecendo e supurando como tudo neste lugar. — Parece que ele sabia algo sobre a fuga. Era<br />
o responsável pela inspeção das celas. E o túnel simplesmente não apareceu da noite para o dia.