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01- Delírio

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Ele me lança um sorriso torto rápido e começa a andar preguiçosamente pelos corredores, pegando<br />

produtos completamente aleatórios — como um pacote de torresmo e a lata de uma sopa muito nojenta<br />

de couve-flor — e fazendo comentários exagerados de interesse, como “Isso parece delicioso”, então<br />

preciso me empenhar ao máximo para não gargalhar. Em um momento ele tem que se espremer para<br />

passar por Jed, pois os corredores da loja são bem estreitos e Jed não é exatamente um peso-pena, e<br />

quando Jed mal olha para ele, sinto uma forte excitação. Ele não sabe. Ele não sabe que ainda sinto o<br />

gosto dos lábios de Alex nos meus, que ainda sinto sua mão em meu ombro.<br />

Pela primeira vez na vida fiz algo por mim, e porque escolhi, não porque alguém disse que era bom<br />

ou ruim. Enquanto Alex caminha pela loja, penso que há um fio invisível nos unindo e, de alguma<br />

forma, sinto-me mais poderosa do que nunca.<br />

Finalmente Alex se aproxima do balcão com um pacote de chicletes, um saco de salgadinhos e um<br />

refrigerante.<br />

— Mais alguma coisa? — pergunto, tomando cuidado para manter a voz firme. Mas posso sentir<br />

minhas bochechas se ruborizando. Os olhos dele estão incríveis hoje, quase ouro puro.<br />

Ele balança a cabeça.<br />

— Só isso.<br />

Registro os preços, com as mãos trêmulas, desesperada para dizer algo mais para ele, mas<br />

preocupada com a possibilidade de que Jed nos ouça. Nesse instante, outro cliente entra na loja, um<br />

homem mais velho que parece um regulador. Então, conto o troco de Alex o mais lenta e<br />

cuidadosamente possível, tentando mantê-lo diante de mim o máximo de tempo possível.<br />

Mas não há muitas maneiras de se contar o troco para uma nota de cinco dólares. Acabo lhe<br />

entregando o troco. Nossas mãos se tocam quando coloco as notas em sua palma, e um choque me<br />

atravessa. Quero agarrá-lo, puxá-lo para mim e beijá-lo ali mesmo.<br />

— Tenha um ótimo dia.<br />

Minha voz soa aguda, sufocada. Fico surpresa por sequer conseguir pronunciar essas palavras.<br />

— Ah, eu terei. — Ele me lança seu sorriso torto e incrível enquanto recua para a porta. — Vou<br />

para a enseada.<br />

E então ele vai embora, saindo para a rua. Tento vê-lo andar, mas o sol me ofusca assim que ele sai e<br />

se transforma em uma sombra borrada, oscilando e desaparecendo.<br />

Não consigo suportar. Detesto pensar que ele está andando pelas ruas, afastando-se cada vez mais. E<br />

ainda preciso enfrentar mais cinco horas antes de nosso encontro. Não vou aguentar. Antes que consiga<br />

pensar no que estou fazendo, circundo o balcão e arranco o avental que estava usando desde que<br />

precisei lidar com um vazamento em um dos freezers.<br />

— Jed, cuide do caixa por um segundo, tudo bem? — grito.<br />

Ele pisca para mim, confuso.<br />

— Aonde você vai?<br />

— O cliente — respondo. — Dei o troco errado.<br />

— Mas... — Jed começa a dizer. Não espero para ouvir seus protestos. Já posso imaginar quais<br />

serão, mesmo: Mas você contou o troco durante cinco minutos. Que seja. Então Jed vai pensar que sou burra.<br />

Não me incomodo.<br />

No fim da rua, Alex está parado na esquina, esperando a passada barulhenta de um caminhão<br />

municipal.<br />

— Ei! — grito.<br />

Ele se vira. Uma mulher empurrando um carrinho de bebê, do outro lado da rua, para, levanta a<br />

mão para proteger os olhos e acompanha minha corrida pela rua. Estou indo o mais rápido possível,<br />

mas a dor em minha perna impede que eu faça mais do que mancar. Posso sentir o olhar da mulher<br />

espetando todo o meu corpo, como um monte de agulhas.

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