Televisão - Entre a Metodologia Analítica e o Contexto Cultural
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
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pré-produção que circula entre o processo de viabilização comercial do<br />
projeto e a própria realização audiovisual do programa imaginado. A<br />
escrita do roteiro, portanto, com os seus códigos bem delimitados em<br />
um formato rígido de organização sintagmática (capa, cabeçalho, rubrica,<br />
diálogos e transições), já impregna o texto com uma tecnicidade que<br />
difere, de cara, das configurações possíveis do texto literário: a linguagem<br />
verbal, para a literatura, é sempre autocentrada, sua matéria-prima se<br />
abre e se fecha nas próprias possibilidades da escrita de organizar ou<br />
reorganizar a experiência da linguagem. No roteiro, por outro lado, a<br />
linguagem verbal é quase sempre um meio-termo, uma ponte imaginada<br />
para o filme ou a série por vir. É enfim o código técnico através do qual,<br />
durante o processo produtivo da cadeia do audiovisual, os produtores,<br />
diretores, atores e demais técnicos engajados na realização conseguem<br />
visualizar de antemão a dramaturgia ficcional tramada no texto.<br />
Essa condição marginal do roteiro – não é “literatura”, nem é “cinema”<br />
ou “televisão” –, a um passo que sopesa a curiosidade em torno de sua<br />
natureza, coloca também obstáculos no desenvolvimento de qualquer<br />
pesquisa específica sobre o tema. Visto que não é “literatura”, não podemos<br />
simplesmente importar os referenciais teóricos dos estudos literários, tais<br />
como a análise do discurso, a narratologia ou mesmo os estudos de<br />
gênero, bem como suas rotinas metodológicas, sejam elas extrínsecas ou<br />
intrínsecas ao estudo do texto literário. Semelhantemente, visto que não<br />
é “cinema” ou “televisão”, não parece indicado recorrer a esse repertório<br />
teórico, com a preferência por pesquisas sobre a imagem, a montagem,<br />
a mise-en-scène e a autoria, de um lado, e de cunho sociológico e<br />
culturalista, do outro lado, nem mesmo às limitadas especificidades<br />
metodológicas desenvolvidas pelo campo, da análise fílmica à análise<br />
histórica, passando pelos estudos de recepção e das mediações.<br />
Portanto, qualquer percurso que desejemos traçar aqui não pode<br />
ser exclusivo. Isso significa que, dada a posição indeterminada que o<br />
roteiro ocupa para os estudos de cinema/televisão e de literatura, o<br />
caminho teórico-metodológico proposto para a sua análise nunca será<br />
satisfatoriamente desenhado tendo no horizonte ou só o cinema/televisão<br />
ou só a literatura. O desafio, portanto, consiste em pôr em perspectiva os<br />
estudos literários e cinematográficos/televisivos, a fim de pensar zonas de<br />
fronteira, que seriam também zonas de confronto, de desconforto, em que<br />
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