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Televisão - Entre a Metodologia Analítica e o Contexto Cultural

Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.

Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.

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a ser conhecida e nomeada como Tião Galinha, carregará o estigma<br />

de louco, será apartado do convívio social (ele é preso acusado de<br />

assassinato) e morrerá no final da trama sem conseguir realizar o sonho<br />

de ter “um bocadinho de chão”. Observamos, ainda, que as personagens<br />

em cena oscilam suas composições estruturais. No caso de Zé Inocêncio,<br />

ele se assenta na posição de herói de um homem justo, mas se expressa<br />

numa postura de mando e de forma consciente trai seu interlocutor e<br />

admirador. No caso de Tião, a ingenuidade e a credulidade o arrebatam<br />

na estrutura de clown, mas esta ainda enseja outra dimensão que diz da<br />

piedade que o conduz à representação da vítima.<br />

A cena de O rei do gado, por sua vez, reúne o fazendeiro Bruno<br />

Mezenga (Antônio Fagundes) 42 e Regino (Jackson Antunes). Bruno é o<br />

protagonista da telenovela, um homem que possui terras no Sudeste,<br />

Centro-oeste e Sul do país. O pecuarista vive em Ribeirão Preto (SP), é<br />

criador de gado de corte e conhecido, popularmente, como o “Rei do<br />

gado”. Portanto, temos, novamente, o potentado. A personagem ostenta<br />

a obstinação capitalista de ampliação de suas propriedades e partidário<br />

da ideia que uma pessoa deve vencer por seus próprios méritos, ditar as<br />

regras e não estabelecer uma dependência com as ações do Estado, a não<br />

ser relações de concessão de benefícios fiscais e de crédito.<br />

Bruno Mezenga rejeita, veementemente, a alcunha de coronel: “Isto<br />

é coisa do passado” – ele diz, em certa altura do enredo, aludindo ao<br />

momento histórico de declínio das grandes fazendas de monocultura e o<br />

caráter arbitrário do poder político dos fazendeiros, na Primeira República.<br />

Mas, nem por isso, a sua composição deixa de se assentar numa estrutura<br />

de mando, ele tem a pretensa tendência conciliadora para tentar preservar<br />

“tudo como está”. Na trama, quando algumas de suas fazendas foram<br />

invadidas por trabalhadores rurais sem terra, Bruno evita confrontos e<br />

tenta, ainda no início da trama, retira-os para outros assentamentos do<br />

governo. O fazendeiro é amigo do senador Caxias (Carlos Vereza), um<br />

político honesto preocupado com a reforma agrária. Ambos estabelecem<br />

uma relação de apoio, embora Bruno não reconheça vigor no político.<br />

42<br />

É, pois, sugestivo que em ambas as obras, o mesmo ator, Fagundes, tenha sido escalado para os papéis de<br />

protagonista e potentado. Sabemos que o ator era proprietário de uma fazenda de três mil hectares fica próxima<br />

à Campo Grande (MS) e foi “garoto propaganda” das Fazendas Reunidas Boi Gordo. A empresa foi à falência, em<br />

2001, após ser condenada pela justiça por prática de pirâmide financeira. Retornaremos ao tema em texto futuro.<br />

62

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