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Televisão - Entre a Metodologia Analítica e o Contexto Cultural

Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.

Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.

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de santos para não atrapalhar o pacto. Zé Inocêncio caminha em direção<br />

à saída, abre da porta e trabalhador rural sai de cena.<br />

As operações visuais e sonoras desse diálogo constroem uma<br />

atmosfera mística que tem o protagonista da trama, Zé Inocêncio, como<br />

uma deidade, aquele que não morrerá, nem de “morte matada”, nem de<br />

“morte morrida”. Dessa forma, o coronel não é apenas um proprietário de<br />

uma vasta extensão de terras produtivas, visto que os demais fazendeiros<br />

da região estão em crise, mas uma divindade. As posições das personagens<br />

em cena expressam uma relação de reverência do sem posses diante desse<br />

potentado que, em seu trono, decide o destino do outro, reafirmando a<br />

estrutura de poder e de mando.<br />

É importante não lermos a personagem Zé Inocêncio, apesar<br />

da alcunha de “coronel” 40 que ele ostenta, como uma expressão do<br />

coronelismo ou como uma personagem herdeira do coronelismo. De<br />

fato, a trama, apesar de ambientada em 1993, faz referência ao ciclo de<br />

produção do cacau, na Bahia. O ciclo cacaueiro foi deflagrado entre 1889<br />

e 1930, período em que este produto passou a ser um recurso estratégico<br />

para a economia da Primeira República. É, justamente, neste período<br />

histórico que José Murilo de Carvalho (1997) e Vitor Nunes Leal (1997)<br />

localizam o coronelismo como um momento específico do mandonismo.<br />

Isto é, o coronelismo é um sistema datado, historicamente, teria iniciado<br />

com o federalismo implantado pela República (1889), em substituição ao<br />

centralismo do Império, e terminado com a implantação do Estado Novo.<br />

Para evitar a imprecisão é, pois, necessário um esforço para distinguir<br />

os conceitos de coronelismo, mandonismo e clientelismo. De acordo com<br />

Leal (1997: 40), o coronelismo é um “compromisso de troca de proveitos<br />

entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente<br />

influência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terras”,<br />

ou seja, está relacionado à estrutura de poder agrário brasileiro e ao<br />

declínio das grandes fazendas de monocultura. 41<br />

40<br />

O termo “coronel” deriva dos títulos da Guarda Nacional, criada no Império. De acordo com Carvalho (1997), essa<br />

instituição patrimonial foi um mecanismo de cooptação dos proprietários rurais que compravam suas patentes e<br />

tinham o controle da população local.<br />

41<br />

A progressão de uma série de fatores reduziu o poder da estrutura coronelística: o crescimento demográfico, a<br />

urbanização e a industrialização reordenavam a organização social e demandavam a criação de novas instituições<br />

públicas com trabalho especializado. No entanto, esses fatores se sucederam de maneira desigual em diferentes<br />

regiões do Brasil.<br />

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