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Televisão - Entre a Metodologia Analítica e o Contexto Cultural

Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.

Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.

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Há algo do maravilhoso que a cena deste diálogo enseja, pois o<br />

estatuto demiúrgico da posse é atribuído pela população local ao coronel,<br />

assim seu poderio não é questionado. A lenda local de que Inocêncio<br />

“plantou” seu facão aos pés de um jequitibá-rei e que ele não morrerá<br />

enquanto o facão e a árvore lá estiverem encontram respaldo no fato de o<br />

coronel ter sobrevivido ileso de diversas tocaias. De acordo com Irlemar<br />

Chiampi (1980), o realismo maravilhoso tem raízes que remontam à<br />

colonização e ao relacionamento que o europeu (espanhol e português)<br />

estabeleceu com o ambiente de flora e fauna consideradas insólitas;<br />

e com diversos nativos de diferentes mitologias e mestiçagens (talvez<br />

o aspecto mais notável em termos dessa matriz cultural). Poderíamos<br />

resumir esse estranhamento na forma como Pero Vaz de Caminha se<br />

referiu ao Brasil, por exemplo: “Nesta terra em se plantando tudo dá”. Um<br />

aspecto notável do maravilhoso é que ele convive com as personagens<br />

em um dado espaço, sem que elas estranhem a sua manifestação, ou<br />

seja, sua existência é observável e classificável, mas não questionada<br />

(CHIAMPI, 1980: 19).<br />

Assim, cremos, em concordância com Martín-Barbero (2009), que o<br />

popular sobrevive dentro do massivo por meio da mestiçagem. A telenovela<br />

Renascer mostra diversas estruturas sincréticas da cultura popular (BAKHTIN,<br />

1993) inseridas no enredo. Já nos referimos ao pacto com diabo, ao facão<br />

aos pés do jequitibá-rei, mas há, ainda, as referências ao bumba-meu-boi, ao<br />

culto aos santos, às festas da colheita, o ritual de “beber o defunto”. Há, ainda,<br />

as formas orais pelas quais a lenda de que Zé Inocêncio tem um pacto com o<br />

diabo e, logo, pertence à outra casta de indivíduos, e as formas do vocabulário<br />

popular em expressões como “mas’ié”, “pr’a mode’que” e “vosmicê” que<br />

evidenciam os processos de formação de palavras (morfologia), por meio de<br />

justaposição e de aglutinação.<br />

Observamos, ainda, a sobrevivência do popular no melodrama 39 ,<br />

quando notamos a sobrevivência de quatro possibilidades dramáticas<br />

baseadas em quatro sentimentos fundamentais (MARTÍN-BARBERO,<br />

2009: 167-172): do medo emerge uma situação terrível, executada pelo<br />

arquétipo do traidor, típico dos romances; do entusiasmo, sobressai uma<br />

situação excitante, encenada pelo justiceiro, típico das epopeias; da dor,<br />

39<br />

Segundo Martín-Barbero (2009: 166-167), proveniente do teatro popular, do século 18, marcado pela censura, que<br />

se valia da expressão corporal, da pantomima e dos efeitos musicais para discutir os padrões morais da época.<br />

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