Televisão - Entre a Metodologia Analítica e o Contexto Cultural
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
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Esse foi o cenário de meados do século XX que levou à mencionada<br />
rejeição à narrativa realista europeia, sobretudo no que tange à sua causalidade<br />
e continuidade linear. Na narrativa realista maravilhosa é marcante a<br />
multicausalidade, a transitoriedade de tempos, a autorreferencialidade, a<br />
disjunção dos contrários e o estranhamento. Todas essas características<br />
assumem o propósito de contemplar a realidade sui generis da América<br />
Latina na qual convivem em condições de igualdade o acontecimento<br />
histórico e o mito, a lenda e o milagre. E esses aspectos poderiam ganhar<br />
forma em eventos encantadores, estranhos, insólitos; em metáforas que<br />
revelavam uma riqueza imaginativa que diz muito sobre a resistência desse<br />
povo diante dos fatos e acontecimentos muitas vezes absurdos.<br />
Ao tornar o insólito compreensível e possível, através da construção de<br />
metáforas, o realismo maravilhoso se tornou presente em nossa paisagem<br />
televisiva valendo-se de inúmeras possibilidades para resistir cultural e<br />
simbolicamente às limitações impostas ao Continente pelas mais diversas<br />
circunstâncias. Em que medida o realismo maravilhoso televisivo dá conta<br />
da diversidade cultural de uma América mestiça?<br />
O que queremos evidenciar, portanto, é que o realismo maravilhoso<br />
está presente em nossa televisão, quais seriam suas características e<br />
em que medida a articulação entre uma análise cultural e uma análise<br />
estilística detecta sinais de sua existência.<br />
O realismo maravilhoso nos tempos da ditadura: O Bem<br />
Amado (1973), Saramandaia (1976) e Roque Santeiro (1985)<br />
Eventos insólitos como o de Zelão, no ano de 1973 em O Bem Amado,<br />
voltaram à televisão na primeira versão da telenovela Saramandaia<br />
(1976), também de Dias Gomes. A história se passou na cidade fictícia<br />
de Bole-Bole e girou em torno da disputa pela mudança de seu nome<br />
para Saramandaia. Envolvidos nessa questão disputavam, de um lado, um<br />
coronel que soltava formiga pelo nariz toda vez que se sentia irritado,<br />
uma mulher que explodiu de tanto comer, um lobisomem que há anos<br />
não dormia, um homem que expunha o coração pela boca, sempre que<br />
ficava nervoso e, de outro, um jovem rapaz que possuía visões do futuro<br />
e escondia sob um colete de gibão um enorme par de asas e uma jovem<br />
virgem que era mal vista porque se incendiava quando se excitava.<br />
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