Televisão - Entre a Metodologia Analítica e o Contexto Cultural
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
Este livro tem sua origem no anseio de enfrentar uma dificuldade central para os Estudos de Televisão: como associar a metodologia analítica dos produtos televisivos com o conhecimento de aspectos contextuais? Análise e síntese – a combinação desses dois procedimentos cognitivos nunca é tão fácil quanto parece. Mais difícil ainda configura-se no caso dos Estudos de Televisão.
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
A recorrência das mesmas imagens, símbolos e referências tidas como<br />
“brasileiras” revela uma tentativa de incluir uma “iconografia” da identidade<br />
nacional que abarque todo o país por meio da televisão. Contudo, se a<br />
TV no Brasil nasceu regional, gradualmente as redes de micro-ondas e os<br />
satélites contribuíram para a consolidação de um modelo de produção<br />
centralizada no eixo RJ-SP que promoveu a circulação de um imaginário<br />
homogêneo pretensamente “brasileiro”. Tais aspas são explicadas por<br />
Gabriel Priolli (2003), que lembra que<br />
a televisão brasileira, assim como o próprio país, é controlada por uma<br />
elite majoritariamente branca, radicada na região sudeste mas exógena,<br />
voltada para a Europa e os Estados Unidos, de onde acredita provirem<br />
todo o progresso e a civilização que a espécie humana pode almejar.<br />
Essa elite, que vive de costas para o restante do Brasil, cria a sua peculiar<br />
imagem do país, quase sempre folclorizando e discriminando índios,<br />
negros e asiáticos, pelo ângulo racial; mulheres e homossexuais, pelo<br />
ângulo do gênero; e nordestinos e nortistas, pelo ângulo geográfico<br />
(PRIOLLI, 2003: 16).<br />
Ana Lúcia Medeiros (2006) lembra que durante muito tempo<br />
na TV notava-se a ausência de sotaques variados, os quais foram<br />
homogeneizados para a consolidação de um padrão estético – uma<br />
“norma culta da televisão brasileira” que reduzia as características locais<br />
a uma prosódia pretensamente neutra, mas fortemente influenciada por<br />
sotaques paulistas e cariocas – um “carioquês paulistano”. <strong>Entre</strong>tanto, a<br />
autora reconhece que esse padrão vem sendo flexibilizado, e hoje se dá<br />
mais espaço a outros sotaques. Porém, permanecem incongruências, já<br />
que, conquanto na telenovela haja tentativas de aproximação com falas<br />
locais, no telejornalismo ainda ocorre um distanciamento.<br />
Como consequência desse posicionamento excludente, Priolli (2003:<br />
17) destaca a difusão, no plano cultural, de uma determinada imagem do<br />
Brasil – construída por um grupo de profissionais, redatores, produtores,<br />
roteiristas e artistas – influenciada por valores, mentalidade, expressões,<br />
gírias e inflexões das coloquialidades carioca e paulista:<br />
A “identidade nacional”, portanto, ou a visão que os brasileiros têm<br />
de si mesmos e do país passou a ser mediada fortemente pelo ponto<br />
de vista das duas maiores metrópoles. [...] Culturas regionais fortes,<br />
como a nordestina ou a gaúcha, perderam qualquer chance de uma<br />
105