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experimentos com substâncias explosivas. Paralisa-nos o pensamento de quem<br />
haverá de substituir o filho para a mãe, o marido para a mulher, o pai para os<br />
filhos, caso aconteça um desastre. A tendência a excluir a morte dos cálculos<br />
da vida traz consigo muitas outras renúncias e exclusões. No entanto, o lema<br />
da Liga Hanseática dizia: “Navigare necesse est, vivere non necesse!”. (Navegar é<br />
preciso, viver não é preciso.)<br />
Então é inevitável que busquemos no mundo da ficção, na literatura, no<br />
teatro, substituto para as perdas da vida. Lá encontramos ainda pessoas que<br />
sabem morrer, e que conseguem até mesmo matar uma outra. E apenas lá se<br />
verifica a condição sob a qual poderíamos nos reconciliar com a morte: de que<br />
por trás de todas as vicissitudes da vida nos restasse ainda uma vida intacta.<br />
Pois é muito triste que na vida suceda como num jogo de xadrez, em que um<br />
movimento errado pode nos levar a perder a partida, com a diferença de não<br />
podermos iniciar uma nova partida, uma revanche. No reino da ficção encontramos<br />
a pluralidade de vidas de que temos necessidade. Morremos na identificação<br />
com um herói, mas sobrevivemos a ele e já estamos prontos a morrer<br />
uma segunda vez com outro, igualmente incólumes.<br />
É evidente que a guerra afastará esse tratamento convencional da morte.<br />
Não é mais possível negar a morte; temos de crer nela. As pessoas morrem de<br />
fato, e não mais isoladamente, mas em grande número, às vezes dezenas de<br />
milhares num só dia. Isso já não é acaso. Certamente ainda parece casual que<br />
uma bala atinja este ou aquele outro, mas uma segunda bala pode atingir mais<br />
outro, e o acúmulo põe fim à impressão de acaso. A vida se tornou novamente<br />
interessante, recuperou seu pleno conteúdo.<br />
Aqui se deveria fazer uma distinção entre dois grupos, os que arriscam a<br />
vida na batalha e os que permanecem em casa, à espera somente de perderem<br />
um dos seus entes queridos por ferimento, doença ou infecção. Claro que seria<br />
muito interessante estudar as modificações na psicologia dos combatentes, mas<br />
não sei o bastante a respeito disso. Devemos nos ater ao segundo grupo, ao<br />
qual pertencemos. Já expressei minha opinião de que o desnorteio e a paralisia