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Freud

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contradizer energicamente a senhora, com base em suas próprias experiências<br />

na análise de sonhos: afirmou que no sonho uma nobre americana é tão egoísta<br />

quanto uma austríaca.<br />

Portanto, também a transformação instintual em que se baseia nossa<br />

aptidão para a cultura pode ser desfeita — duradoura ou temporariamente —<br />

por interferências da vida. Não há dúvida de que a influência da guerra está<br />

entre os poderes capazes de produzir tal involução, e por isso não precisamos<br />

negar aptidão para a cultura a todos aqueles que atualmente se conduzem de<br />

modo incivilizado, e podemos esperar que em tempos mais tranquilos se<br />

restabeleça o enobrecimento de seus instintos.<br />

Mas há um outro sintoma de nossos concidadãos do mundo que talvez nos<br />

tenha surpreendido e horrorizado não menos que a queda, tão dolorosamente<br />

sentida, de seu nível ético. Refiro-me à ausência de discernimento mostrada<br />

pelos melhores intelectos, sua incorrigibilidade, inacessibilidade aos mais<br />

forçosos argumentos, sua credulidade acrítica ante as mais discutíveis afirmações.<br />

Isso ocasiona um quadro bem triste, e quero sublinhar expressamente<br />

que de modo algum vejo, como um partidário enceguecido, todos os desacertos<br />

intelectuais apenas num dos dois lados. Esse fenômeno, porém, ainda é<br />

mais fácil de explicar e bem menos preocupante que aquele tratado antes.<br />

Filósofos e estudiosos do ser humano já nos ensinaram há muito que nos equivocamos<br />

em tomar nossa inteligência como um poder autônomo e ignorar sua<br />

dependência da vida afetiva. Nosso intelecto, segundo eles, só pode trabalhar<br />

confiavelmente se estiver a salvo das ingerências de poderosos impulsos afetivos;<br />

caso contrário ele se comporta como um simples instrumento nas mãos<br />

de uma vontade, fornecendo o resultado que esta o incumbiu de obter. Portanto,<br />

argumentos lógicos são impotentes em face de interesses afetivos, e por<br />

isso a disputa com argumentos, que na frase de Falstaff são abundantes como<br />

as amoras, é tão infrutífera no mundo dos interesses. A experiência psicanalítica<br />

enfatizou ainda mais, se é possível, tal afirmação. Ela pode demonstrar diariamente<br />

que as pessoas mais argutas subitamente se comportam como<br />

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