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Freud

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provavelmente vinha do pequeno relógio sobre a mesa. Tomarei a liberdade<br />

de explicar essa comunicação como um equívoco da memória. Parece-me bem<br />

mais plausível que primeiramente ela não tivesse qualquer reação ao ruído, e<br />

que apenas depois do encontro com os dois homens na escada ele lhe parecesse<br />

significativo. O amante talvez não tenha ouvido o barulho, e fez a tentativa de<br />

explicação envolvendo o relógio depois, quando assediado pela suspeita da garota.<br />

“Não sei o que você pode ter ouvido; talvez o relógio, que às vezes faz<br />

um ruído.” Essa utilização a posteriori de impressões e esse deslocamento das<br />

recordações são frequentes na paranoia e dela característicos. Mas, como<br />

nunca falei com o jovem nem pude prosseguir a análise da moça, não há como<br />

provar minha suposição.<br />

Eu poderia ousar ir mais adiante na análise das supostas “casualidades”.<br />

Não creio que o relógio tenha batido, ou que tenha havido algum ruído. A<br />

situação em que ela estava justificava uma sensação de batimento ou palpitação<br />

no clitóris. Foi isso, então, que ela projetou para fora, a posteriori, como percepção<br />

de um outro objeto. Algo bastante similar é possível no sonho. Uma de<br />

minhas pacientes histéricas relatou, certa vez, um breve sonho que a fazia despertar,<br />

com o qual nenhuma associação se produzia. Ele era o seguinte. Houve<br />

uma batida na porta, e ela acordou. Ninguém havia batido na porta, mas nas<br />

noites anteriores ela havia despertado com penosas sensações de polução, e então<br />

quis acordar tão logo sentiu os primeiros sinais de excitação genital. Havia<br />

“batido” * no clitóris. Eu gostaria de colocar, em nossa paranoica, essa mesma<br />

projeção no lugar do ruído ocasional. Certamente não posso garantir que em<br />

nosso breve conhecimento, com todos os sinais de uma desagradável imposição,<br />

a doente me fornecesse um relato fiel do acontecido nos dois encontros<br />

amorosos; mas uma contração isolada do clitóris combinaria com sua<br />

afirmação de que não houve união dos genitais. Na subsequente rejeição do<br />

homem, a insatisfação certamente desempenhou um papel, ao lado da<br />

“consciência”.<br />

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