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loqueado. A impressão feita por essa diferença é atenuada justamente pelas<br />
interpretações de sonhos que fazemos na prática psicanalítica. Na medida em<br />
que a interpretação do sonho rastreia o curso do trabalho do sonho, segue as<br />
vias que levam dos pensamentos latentes aos elementos oníricos, revela a exploração<br />
das ambiguidades verbais e evidencia as pontes de palavras entre<br />
diferentes grupos de material, ela desperta uma impressão ora engraçada, ora<br />
esquizofrênica, e nos faz esquecer que todas as operações com palavras constituem,<br />
para o sonho, apenas preparação para regredir às coisas.<br />
O processo onírico se completa quando o conteúdo de pensamento, transformado<br />
regressivamente, remodelado numa fantasia-desejo, torna-se consciente<br />
como percepção sensorial, e nisso experimenta a elaboração secundária<br />
a que está sujeito todo conteúdo perceptivo. Dizemos que o desejo onírico é<br />
alucinado e, enquanto alucinação, acha maneira de crer na realidade de sua<br />
concretização. É precisamente a essa parte conclusiva da formação do sonho<br />
que se ligam as mais fortes incertezas, e para o esclarecimento delas vamos<br />
comparar o sonho aos estados patológicos a ele aparentados.<br />
A formação da fantasia-desejo e o seu regredir à alucinação constituem as<br />
partes essenciais do trabalho do sonho, mas não pertencem exclusivamente a<br />
ele. Acham-se igualmente em dois estados mórbidos, na confusão alucinatória<br />
aguda, a amentia (de Meynert), e na fase alucinatória da esquizofrenia. O<br />
delírio alucinatório da amentia é uma fantasia de desejo claramente reconhecível,<br />
com frequência inteiramente ordenada, como um belo devaneio.<br />
Poderíamos falar, de modo bem geral, de uma psicose de desejo alucinatória, e<br />
atribuí-la tanto ao sonho como à amentia. Há também sonhos que consistem<br />
apenas de fantasias de desejo não deformadas e bem ricas de conteúdo. A fase<br />
alucinatória da esquizofrenia foi menos estudada; via de regra parece ser de<br />
caráter composto, mas no essencial poderia corresponder a uma nova tentativa<br />
de restituição, que busca devolver o investimento libidinal às representações<br />
de objetos. 3 Não posso estender a comparação a outros estados alucinatórios<br />
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