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ANO VIII • Nº 86 • FEVEREIRO DE 2017 • R$ 10<br />
E C O N O M I A | P O L Í T I C A | E S P O R T E S | H U M O R | C U LT U R A<br />
OITO MIL<br />
PRESIDIÁRIOS CERCAM<br />
NEVES POR TODOS OS LADOS<br />
A MEIA HORA DE BELO HORIZONTE, A CIDADE ABRIGA CINCO PENITENCIÁRIAS.<br />
CADA REBELIÃO LEVA OS MORADORES AO PÂNICO, POIS LÁ RESIDEM<br />
TRÊS MIL FUNCIONÁRIOS DOS PRESÍDIOS E FAMÍLIAS DOS DETENTOS<br />
EMPRESÁRIOS EVITAM<br />
SE APOSENTAR, COM MEDO<br />
DE CAIR NO ESQUECIMENTO<br />
JORNAIS IMPRESSOS VÃO<br />
DESAPARECER DAS BANCAS<br />
DENTRO DE TRÊS ANOS
MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR<br />
Belo Horizonte, Fevereiro de 2017<br />
Prezado amigo,<br />
Tenho o prazer de lhe apresentar a revista <strong>Matéria</strong><strong>Prima</strong>.<br />
Trata-se de publicação mensal, já na sua edição nº 86, que<br />
chega aos leitores com o compromisso de cumprir um papel<br />
importante e exclusivo: mantê-los bem informados<br />
sobre as questões mais relevantes da economia e da política<br />
de Minas Gerais. Também pretende refletir o pensamento<br />
de Minas, a respeito de assuntos políticos e econômicos<br />
de caráter nacional.<br />
Minas Gerais se posiciona para ser ouvida, por conta da<br />
sua pujança econômica. Sua produção anual de riquezas<br />
tem dimensões semelhantes às do Chile. É maior que as do<br />
Uruguai, Paraguai e Bolívia, somadas.<br />
A sua força decorre da liderança em muitas atividades.<br />
Minas Gerais produz mais automóveis que a Argentina.<br />
Outro objetivo de <strong>Matéria</strong><strong>Prima</strong> é o de transbordar para<br />
os demais estados brasileiros a expressão política dessa<br />
força econômica.<br />
Espero que a publicação agrade ao caro amigo. Caso<br />
seja de seu interesse assiná-la, comunique-se com o Departamento<br />
de Assinaturas, no telefone (31) 2534-0600. O<br />
custo da assinatura é de apenas R$20,00 por ano, na versão<br />
eletrônica.<br />
Com o abraço do<br />
Durval Guimarães<br />
EDITOR CHEFE
08 20 24<br />
REPORTAGEM DE CAPA<br />
A CIDADE AMEDRONTADA<br />
Ribeirão das Neves, uma das cidades<br />
com a maior população<br />
carcerária do mundo: no Brasil,<br />
só perde para São Paulo em número<br />
de presídios e presidiários.<br />
As frequentes rebeliões espalham<br />
o pânico em sua população,<br />
que inclui nada menos que<br />
três mil funcionários das prisões<br />
e parentes dos encarcerados.<br />
NOMES & NOTAS<br />
UMA ESPÉCIE DE MORTE<br />
O professor Emerson de Almeida,<br />
ex-presidente da Fundação Dom<br />
Cabral, admitiu, ao se retirar do<br />
comando daquela instituição,<br />
que abandonar o leme aos herdeiros<br />
é uma forma de morrer. E<br />
diz, de forma corajosa: “Da<br />
mesma forma que os grandes<br />
fundadores de empresas, tive<br />
medo de cair no esquecimento.”<br />
CARREIRAS<br />
O SUCESSO EVITA O RANCOR<br />
Nós telefonamos para vinte pessoas<br />
bem sucedidas com o propósito<br />
de identificar as razões<br />
do triunfo profissional de cada<br />
uma delas. Descobrimos nove<br />
coisas que elas nunca fazem.<br />
Uma é não se curvar a mágoas.<br />
Aprender a se libertar do rancor<br />
faz bem à saúde. As outras<br />
estão neste texto.<br />
ANO VIII - Nº 86 - FEVEREIRO DE 2017<br />
06 OPINIÃO<br />
40 A VIDA É BELA<br />
44 PALAVRA DO LEITOR<br />
ÍNDICE
27<br />
30 38<br />
MEMÓRIA<br />
SAUDADE, MÁRCIO PRADO<br />
Um dos maiores cronistas da<br />
nossa literatura, ele nos deixou<br />
há três anos, vítima de seu traiçoeiro<br />
coração. Era o nosso editor<br />
de texto e seu inesquecível<br />
nome é uma cláusula pétrea no<br />
expediente da revista. Publicamos<br />
a sua divertidíssima crônica<br />
O Fugitivo para os leitores<br />
que estão chegando agora.<br />
ENTREVISTA<br />
CIAO, MÍDIA IMPRESSA<br />
Muitas bancas só abrem por<br />
volta de 10 horas da manhã. A<br />
razão: não há muitos leitores interessados<br />
em comprar notícias<br />
impressas em papel. Os jornais<br />
— assim como as revistas —<br />
estão sendo substituídos pela Internet.<br />
Em 2020, simplesmente<br />
estarão extintos, diz o jornalista<br />
espanhol Pedro J. Ramirez.<br />
ESPAÇO MÁRIO RIBEIRO<br />
CHATOS. E INCORRETOS<br />
Politicamente correto: eis uma<br />
das grandes desgraças deste século.<br />
Se você faz alguma brincadeira<br />
sobre pessoas, grupos<br />
sociais, religiosos, logo surgem<br />
alguns chatos – em nome de<br />
eventuais direitos de gênero, número<br />
e grau – para condenar<br />
suas falas “criminosas”. Palavra<br />
do jornalista Mário Ribeiro.<br />
EXPEDIENTE<br />
Márcio Rubens Prado (IN MEMORIAM)<br />
31 2534-0600<br />
MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR<br />
durvalcg@yahoo.com.br<br />
E C O N O M I A |P O L Í T I C A |E S P O R T E S |H U M O R |C U L T U R A<br />
DIRETOR RESPONSÁVEL E EDITOR GERAL:<br />
Durval Guimarães<br />
EDITOR DE TEXTO: Carlos Alenquer<br />
PROGRAMAÇÃO VISUAL: Antônio Campos<br />
COLABORADORES:<br />
Deca Furtado, Antônio Porfírio, Carlos<br />
Freire, João Paulo Coltrane, Adalberto<br />
Ferraz, Christiano Machado e Sandra<br />
Fiorani.<br />
IMAGENS:<br />
Creative Commons OCO<br />
REDAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E PUBLICIDADE: Rua Canopus, 11 • Sala 5 • São Bento • CEP 30360-112 • Belo Horizonte • MG
OPINIÃO<br />
UMA NOVA CLT SERÁ<br />
NOSSO DESAFIO HISTÓRICO<br />
Lasier Martins (*)<br />
ERA PRECISO PREPARAR AS CIDADES<br />
PARA RECEBER OS NOVOS<br />
TRABALHADORES. SERIA NECESSÁRIO<br />
CRIAR TODO UM ARCABOUÇO PARA<br />
SUSTENTAR O NOVO BRASIL.<br />
Se Getúlio e Alberto Pasqualini estivessem<br />
vivos hoje certamente estariam<br />
pensando no que fazer para dotar<br />
o País de instrumentos eficientes para<br />
acelerar o desenvolvimento. Estava fechado<br />
o negócio e a fábrica da Siderúrgica de<br />
Volta Redonda em andamento, o que significava<br />
que o Brasil armava um salto no<br />
futuro: nossa civilização assentada sobre a<br />
economia da “plantation”, da cana de açúcar<br />
dos tempos coloniais, do café, cacau,<br />
algodão e, também, da exportação de minérios<br />
em bruto, ouro e ferro de Minas Ge-<br />
6<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
e dolorosa a transição da civilização agrícola<br />
para a industrial. Chegando um pouco<br />
mais tarde poderíamos amenizar os conflitos<br />
a um mínimo. Foi o que aconteceu.<br />
O Brasil tornou-se uma das maiores economias<br />
industriais do mundo sem as dores<br />
da violência explícita que ensanguentou<br />
Europa e Estados Unidos.<br />
A CLT, reunida em 1941, foi um achado.<br />
Com 15 anos para se implantar e servir<br />
como mediadora entre capital e trabalho,<br />
depois do grande salto de 1955, chega até<br />
nossos dias como o sustentáculo de nosso<br />
mundo fabril. Entretanto, o futuro mais<br />
uma vez desafia os estadistas: vem aí um<br />
a nova civilização, individualista e dispersa,<br />
muito diferente da sociedade fordiana, das<br />
grandes fábricas, das lojas gigantescas e<br />
dos escritórios com seus relógios de ponto.<br />
É isto que se coloca para o Congresso<br />
neste momento. Não é romper com o passado.<br />
Temos de abrir a porta do futuro. É<br />
um desafio político. Vargas e Pasqualini<br />
criaram um partido que se impôs. Hoje o<br />
PDT é o herdeiro desses estadistas. Nós,<br />
parlamentares do trabalhismo temos de<br />
honrar a nossa História. É disto que se trata.<br />
(*) Lasier Martins é senador (PSD/RS)<br />
rais, daria lugar a fábricas da era industrial<br />
que alcançava seu auge naqueles anos. O<br />
Brasil sairia da II Guerra Mundial não mais<br />
como um país periférico, mas candidato a<br />
um lugar ao sol no espaço das grandes<br />
potências. Parece que eles nos viam entre<br />
as dez maiores economias do mundo, algo<br />
impensável para os céticos.<br />
Era preciso preparar as cidades para<br />
receber os novos trabalhadores. Seria necessário<br />
criar todo um arcabouço para<br />
sustentar o novo Brasil. Olhando para o<br />
passado eles viram como fora conflituosa<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 7
REPORTAGEM DE CAPA<br />
A HISTÓRICA<br />
PENITENCIÁRIA<br />
AGRÍCOLA FOI<br />
CRIADA PARA<br />
PARA OFERECER<br />
UMA PROFISSÃO<br />
A PRESIDIÁRIOS<br />
RURAIS. HOJE É<br />
UMA INDÚSTRIA<br />
DE MONSTROS<br />
UMA CIDADE CERCADA DE<br />
PRESIDIÁRIOS<br />
POR TODOS OS LADOS<br />
A VIDA NUM MUNICÍPIO COM PRESÍDIOS POR TODA PARTE – E ONDE<br />
MUITOS DETENTOS FALSIFICAM DOCUMENTOS PARA TRABALHAR NO<br />
COMÉRCIO LOCAL: ESTA É A CIDADE DE RIBEIRÃO DAS NEVES, A APENAS<br />
35 QUILÔMETROS DE DISTÂNCIA DO CENTRO DE BELO HORIZONTE<br />
DECA FURTADO<br />
Em agosto de 2016, Ribeirão das Neves,<br />
na RMBH-Região Metropolitana<br />
de Belo Horizonte, contava exatos<br />
8.136 presos nas suas cinco penitenciárias.<br />
Em Minas Gerais, na mesma data,<br />
eles eram 69.054. “Respondemos por<br />
11,8% da população carcerária do Estado”,<br />
diz a juíza Miriam Vaz Chagas, titular<br />
da Vara de Execuções Penais de Neves,<br />
a segunda maior do país: só perde<br />
8<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
FOTOS AGÊNCIA MINAS<br />
UMA ESPERANÇA<br />
PARA O SISTEMA<br />
PENITENCIÁRIO E<br />
O PRESÍDIO<br />
CONSTRUIDO E<br />
OPERADO PELA<br />
INICIATIVA<br />
PRIVADA (PPP)<br />
para a da capital de São Paulo.<br />
Na madrugada de 17 de janeiro último,<br />
a cidade foi atingida por mais uma<br />
rebelião de presidiários locais. Por sorte,<br />
ninguém morreu pois, quando elas ocorrem<br />
nas cadeias do município, são idênticas<br />
às dos cárceres do Norte e Nordeste<br />
do país. Com decapitações e<br />
outras selvagerias que envergonham a<br />
humanidade.<br />
O COMEÇO. Neves, como é mais conhecida,<br />
começou a se tornar a capital das penitenciárias<br />
em 1938, ainda distrito de BH<br />
(a emancipação política deu-se em 1952).<br />
Então se inaugurou ali a Penitenciária<br />
Agrícola Nacional, a PAN. Quem foi trabalhar<br />
na PAN levou a família e ocupou<br />
200 casas construídas para abrigá-las.<br />
Em seguida, algumas famílias de condenados<br />
construíram ou compraram casas<br />
no local para ficar mais perto dos presos.<br />
Resultado: Em 1950, segundo pesquisa<br />
da PUC-MG, Neves tinha 2.732 habitantes.<br />
Desses, 1.915 ou eram detentos ou viviam<br />
de empregos oferecidos pela PAN.<br />
O crescimento mais robusto veio a partir<br />
de 1970, quando havia 9.707 moradores<br />
— hoje são 325.000. Parte disso se deve a<br />
que seguiram-se à PAN as penitenciárias<br />
Antônio Dutra Ladeira (inaugurada em<br />
1965), a José Abranches Gonçalves (feminina;<br />
1982), a José Martinho Drummond<br />
(2006) e a da GPA (2013), uma PPP-Parceria<br />
Público Privada entre governo do Estado<br />
e a Gestores Prisionais Associados,<br />
cujas iniciais dão nome ao presídio.<br />
OS ESTIGMAS. Dessa concentração de penitenciárias<br />
e do fato de que em 1950<br />
todo o mundo de lá dependia da PAN, se<br />
originou um preconceito que maltrata a<br />
cidade. “Lá só tem cadeia”, “quem é de<br />
Neves é presidiário, ex, ou filho de”. “Ou<br />
trabalha na penitenciária ou tem familiares<br />
trabalhando nas penitenciárias” — é o que<br />
se diz, destas e de outras formas, da cidade.<br />
Ou seja: quem ali nasce, ou mora,<br />
de alguma maneira estaria ligado ao<br />
crime, à violência.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 9
E tem um agravante: do estigma nasceu<br />
um preconceito que prejudica os habitantes,<br />
por exemplo, na hora de pleitear<br />
um emprego. Podendo escolher<br />
entre vários candidatos com o mesmo<br />
nível de empregabilidade, algumas empresas<br />
selecionariam quem não é de Neves.<br />
“Eu não encaro dessa maneira”,<br />
diz a doutora Míriam. “Esse estigma<br />
parte de quem não conhece. Essa é uma<br />
realidade que cresceu com a cidade. Os<br />
problemas são outros”.<br />
Com ela concorda Mauro Raso Assunção,<br />
diretor da Cerâmica Braúnas. Ela está<br />
há 65 anos em Neves, inicialmente por<br />
causa da argila, que era abundante e há<br />
15 anos acabou. Agora, a empresa, que<br />
diz ser a maior na produção de tijolos —<br />
sua capacidade é para 27.500 toneladas/mês<br />
–, explora a argila em outras localidades<br />
e a processa em duas fábricas<br />
em Justinópolis, distrito de Neves. “Temos<br />
um péssimo acesso, temos problemas<br />
gravíssimos relacionados a saneamento<br />
— as pessoas daqui despejam lixo numa<br />
área nossa e ela é de preservação ambiental.<br />
É tudo clandestino. Eu acho que a<br />
prefeitura tira pouco do governo estadual<br />
e federal. Neves ajuda o sistema prisional<br />
mas recebe muito pouco em troca”.<br />
Na opinião de Rivermar Wanderley Peixoto,<br />
o Rivas, funcionário da Vara comandada<br />
por dra. Míriam, que veio para Neves<br />
há 45 anos (tinha então 21), o preconceito<br />
e as dificuldades de saneamento não impedem<br />
que a cidade seja um bom lugar<br />
para morar. Quando se tornou funcionário<br />
do sistema prisional — seu pai se aposentou<br />
como funcionário da PAN — Rivas assumiu<br />
que gosta de morar em Neves. Não se sente<br />
AS PENINTECIÁRIAS DA<br />
CIDADE PROPORCIONAM<br />
2.241<br />
EMPREGOS DIRETOS<br />
10<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
estigmatizado e nem olhado com desprezo.<br />
Tem amigos e sente-se confortável: “Em<br />
Neves só querem construir prisões’. É o<br />
que dizem alguns políticos”, diz ele. “Já falaram<br />
em fechar a PAN várias vezes. Mas<br />
se está precisando de vaga, deviam é construir<br />
mais. Afinal, quem trabalha em prisão<br />
deve seu emprego aos presos”.<br />
OS EMPREGOS. Mas os empregos são poucos.<br />
Nas cinco penitenciárias há, segundo<br />
informa a Secretaria de Estado de Defesa<br />
Social-SEDS, 2.241 empregos diretos. O<br />
salário inicial de um agente penitenciário<br />
é de R$ 4.098,00, muito melhor do que a<br />
média local, de 1,9 salário mínimo (em<br />
2014). Cada um dos empregos sustenta<br />
DO LADO DE FORA<br />
A PENITENCIÁRIA<br />
JOSÉ MARIA<br />
ALKMIN ESCONDE<br />
O HORROR EM<br />
SUAS CELAS<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 11
quatro pessoas, em média. São portanto<br />
quase 9.000 pessoas vivendo diretamente<br />
da renda proporcionada pelas penitenciárias<br />
em Neves. Somem-se a elas os mais<br />
de 8.000 presos e ainda os serventuários<br />
da Justiça e quem dela vive e teremos<br />
algo ao redor de 20.000 pessoas diretamente<br />
relacionadas ao sistema. Ou ainda,<br />
só 6% do total de habitantes.<br />
O estigma e o preconceito já deveriam<br />
ter sumido do mapa. Até porque Neves<br />
cresceu demais. Houve ali um tremendo<br />
boom demográfico, com uma média de<br />
crescimento, desde 1970, de 8% ao ano (a<br />
EM AGOSTO DE 2016,<br />
NEVES CONTAVA EXATOS<br />
8.136<br />
PRESOS NAS SUAS CINCO<br />
PENITENCIÁRIAS<br />
do país anda, faz algum tempo, abaixo de<br />
2%). Por quê? Vários loteamentos, com<br />
terrenos baratos, foram lançados ao longo<br />
dos anos e atraíram as classes C e D. Houve<br />
também lançamento de condomínios fechados,<br />
clas se B. Comprida e estreita, Neves<br />
transpassou a BR-040. Alguns bairros<br />
— há 180 deles –, como o Veneza, cresceram<br />
como crescem os eucaliptos.<br />
Por outro lado, o programa Minha Casa<br />
Minha Vida financiou ali residências para<br />
centenas de famílias nos últimos anos,<br />
tornando-se um dos maiores responsávei<br />
pela expansão recente da população.<br />
O CRESCIMENTO. O que dá para bancar é<br />
que, com tantos moradores, era de se esperar<br />
uma Neves, senão um brinco, me-<br />
12<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
“DEIXAI AQUI AS<br />
SUAS<br />
ESPERANÇAS”,<br />
DIZ O CARTAZ<br />
DIANTE DO<br />
INFERNO, DE<br />
DANTE. É O QUE<br />
AGUARDA ESSAS<br />
GAROTAS.<br />
lhor organizada, mais bonita — e não o<br />
caos nascido desse Big Bang populacional,<br />
pois somente pouco tempo atrás a<br />
Prefeitura de Neves aprontou um Plano<br />
de Expansão Urbana. Há falta de infraestrutura.<br />
Ruas não têm calçadas acabadas,<br />
avenidas são estreitas, o trânsito é ruim,<br />
o transporte público idem, ibidem o saneamento,<br />
o lixo transborda em alguns<br />
pontos, a saúde é precária, enfim, “miserinha”<br />
há pra todos os lados que se olhe.<br />
Lazer para os moradores? Cinema não há;<br />
shopping center não tem e assim por<br />
diante.<br />
A violência é grande — só neste ano<br />
houve dois homicídios em que as cabeças<br />
foram arrancadas dos corpos. Maria Au-<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 13
xiliadora de Paula, moradora da cidade<br />
há 40 anos, mesmo gostando, espanta-se<br />
com isso. “Não era assim quando me mudei,<br />
vinda de São Pedro dos Ferros”, diz.<br />
“Aqui falta tudo. Emprego e transporte público<br />
decente então nem se fala. Minha filha<br />
Raysila, de 20 anos de idade, nunca<br />
trabalhou porque não encontra emprego<br />
em lugar algum”.<br />
Em síntese, Neves é uma cidade-dormitório,<br />
um bolsão de pobreza nada<br />
muito diferente de outras. “Parece até<br />
que Neves tem um sapo enterrado que<br />
não deixa a cidade melhorar”, diz um<br />
agente penitenciário da Alkimin, que não<br />
quis se identificar.<br />
SÃO QUASE<br />
9.000<br />
PESSOAS VIVENDO<br />
DIRETAMENTE DA RENDA<br />
PROPORCIONADA PELAS<br />
PENITENCIÁRIAS<br />
AS OPÇÕES. Mas não é bem assim. O que<br />
esse povaréu todo que habita Neves precisa<br />
mesmo é de emprego. De acordo com<br />
dados do IBGE, de 2014, havia 2.915 empresas<br />
de todos os portes atuantes na cidade.<br />
Elas empregavam só 27.120 pessoas.<br />
O pessoal ocupado total era superior<br />
a 31.000. Ou seja, apenas 1/3 da população<br />
contava com alguma renda.<br />
Todavia, como diria Galileu Galilei, eppur<br />
si muove. E a cidade progride, ainda<br />
que aos trancos e barrancos. Essa pouca<br />
renda foi suficiente, por exemplo, para<br />
atrair grandes redes varejistas e também<br />
o atacarejo. Lá estão a Casas Bahia, a Ri-<br />
cardo Eletro, a Villefort.<br />
Porém, em Neves, dona de dois distritos<br />
industriais, são poucas as indústrias que se<br />
sobressaem pelo tamanho, caso da BRF, Hypofarma<br />
e Cerâmica Braúnas, que emprega<br />
350 funcionários. A Six Semicondutores,<br />
idealizada pelo falido Eike Batista, ainda é<br />
uma promessa. “O número de indústrias<br />
cresceu muito, mas ainda é pouco”, diz<br />
Mauro Assunção.<br />
14<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
NO REGIME SEMI-<br />
ABERTO, O<br />
TRABALHO FORA<br />
DAS GRADES<br />
DEVOLVE A<br />
DIGNIDADE AOS<br />
ENCARCERADOS<br />
GETÚLIO E HENFIL,<br />
PERSONAGENS DA<br />
PENITENCIÁRIA<br />
AGRÍCOLA<br />
Mas – perguntam todos – por que<br />
Neves tem tantas penitenciárias?<br />
Fácil: o Estado é dono de aproximadamente<br />
90% das terras do município.<br />
Se ele tem de construir penitenciárias, parece<br />
lógico que as construa por lá. Será<br />
mesmo? Tem gente que foi e continua<br />
sendo contra a concentração. O Governo<br />
mineiro, segundo esses, poderia vender<br />
as áreas para as empresas que quisessem<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 15
se instalar em Neves e fomentar a criação<br />
de mais penitenciárias no interior. Segundo<br />
a SEDS, isso já vem sendo feito,<br />
pois nos últimos anos foram construídas<br />
unidades prisionais, incluindo penitenciárias,<br />
em Três Corações, Formiga e outras<br />
localidades.<br />
A EX-PAN GASTA COM<br />
“QUENTINHAS” PARA<br />
PRESOS E FUNCIONÁRIOS<br />
R$ 500 MIL<br />
POR MÊS<br />
EXEMPLO PARA O MUNDO. A primeira “cana”<br />
de Neves foi, como visto, a PAN, depois<br />
rebatizada Penitenciária José Maria Alkimin.<br />
Getúlio Vargas, então ditador, a inaugurou.<br />
À época, ela era portentosa: além<br />
das casas para funcionários contava com<br />
quarto pavilhões para abrigar os detentos<br />
e um pomar com 300 mil pés de laranja.<br />
(Um parêntese: numa dessas casas nasceu<br />
Henrique de Sousa Filho, o Henfil,<br />
grande cartunista brasileiro; seu pai era<br />
funcionário da penitenciária. Ainda hoje<br />
algumas residências são ocupadas por<br />
servidores), Mais ainda, em suas dependências<br />
havia lavouras, gado, padaria, gráfica,<br />
fábrica de calçados, de tijolos, de<br />
brinquedos e de uniformes. Todas foram<br />
sucateadas.<br />
Rivermar, o Rivas, lembra-se bem das<br />
fábricas. “Infelizmente elas se foram,<br />
pois prestaram um grande serviço para<br />
todos do sistema prisional”, afirma ele,<br />
um dos moradores das casas construídas<br />
para abrigar as famílias dos funcionários<br />
(hoje restam cerca de 50 das<br />
200 originais). “Havia marceneiros<br />
muito bons. Havia os mestres, que eram<br />
funcionários, não presos. Eles é quem<br />
ensinavam os detidos, mas hoje todos<br />
são falecidos”.<br />
Com área total ao redor de 1.000 hectares,<br />
a Alkimin foi a primeira penitenciária<br />
autossustentável da América do<br />
Sul – todos os custos eram cobertos pela<br />
produção intramuros –, sendo modelo<br />
para o sistema carcerário do Brasil durante<br />
décadas e pioneira no incentivo ao<br />
trabalho para recuperação de detentos.<br />
Alguns conseguiram. Outros só saíram<br />
de lá mortos. Mas todos, a exemplo dos<br />
irmãos Naves, vítimas do mais famoso<br />
caso de erro judiciário do país, penaram<br />
muito porque penitenciária, no Brasil, a<br />
começar pela superlotação carcerária,<br />
ainda é sinônimo de masmorra.<br />
Na Alkmin atual, a superlotação ainda<br />
é administrável. São cerca de 1.200 vagas<br />
para 1.800 ocupantes. Dizem que os presidiários<br />
ganham um prêmio ao ir para a<br />
Alkmin, pois onde deveriam estar três presos<br />
há quarto – enquanto que em outras<br />
prisões, nas celas em que deveriam estar<br />
oito há 20, 30 presos. (A penitenciária da<br />
GPA é a única, na cidade, que se pode<br />
chamar de humanizada. Com capacidade<br />
para 2.160 condenados, ela, por contrato,<br />
nunca pode ter superlotação, pois isso<br />
afetaria o lucro da GPA).<br />
MUDANÇAS NO PERFIL. Já a ex-PAN não é<br />
mais autossustentável e só com “quentinhas”<br />
para presos e funcionários gasta<br />
mais de R$ 500 mil por mês. Ainda se<br />
planta alguma coisa e se produz leite.<br />
Porém, pouco. “Por dois motivos: falta<br />
de incentivo do governo e mudança de<br />
perfil do preso”, diz Reginaldo Soares,<br />
diretor da Alkmin. O detento de antiga-<br />
16<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
JUÍZA MIRIAM VAZ CHAGAS, DA VARA DE<br />
EXECUÇÕES CRIMINAIS DE NEVES<br />
mente fazia exatamente o que fazia<br />
quando em liberdade. Os de agora são<br />
oriundos das zonas urbanas e seus crimes<br />
estão relacionados ao tráfico de drogas.<br />
“Você pergunta: ‘já trabalhou?’ ‘Só<br />
no crime’ é a resposta”, afirma Reginaldo.<br />
“Na hora em que se pega esse rapaz e<br />
se coloca pra mexer com a roça, o serviço<br />
não rende, o corpo dele não aguenta,<br />
pois não está acostumado”.<br />
Mesmo assim, as rebeliões têm sido<br />
cada vez mais raras. Talvez porque está<br />
ali quem foi condenado a uma pena menor.<br />
A unidade também está sendo utilizada<br />
para fazer audiências de custódia.<br />
“É um projeto do governo atual para desafogar<br />
o sistema. Faz-se audiência para<br />
se decidir se o acusado será preso ou<br />
não. Ele fica à parte; se recebe alvará de<br />
soltura, vai embora. Se ordem de prisão<br />
preventiva, transferimos para outra unidade”,<br />
diz Reginaldo.<br />
PRESIDIÁRIOS AMEDRONTAM. Do total de<br />
encarcerados na Alckmin, na média,<br />
cerca de 600 trabalham fora em empresas<br />
da região, além de poucos que trabalham<br />
nas instalações e na fazenda.<br />
“Temos quase 4.000 presos no regime<br />
semiaberto em Neves”, complementa a<br />
dra. Míriam. Como comprovar que estão<br />
labutando se não há equipe para fiscalizar,<br />
e muitos detentos apresentavam cartas<br />
falsas de empresas dizendo que os<br />
contratariam?<br />
A saída foi um convênio envolvendo a<br />
SEDS e o poder judiciário. Por ele, o preso<br />
só pode sair para trabalhar em empresas<br />
que sejam parceiras do sistema prisional.<br />
“É um projeto que eu criei e lhe tenho<br />
muito apreço. Tem dado certo. Agora, eu<br />
não posso inviabilizar o benefício caso<br />
não haja vaga. Então, a minha decisão<br />
tem questões subsidiárias. Na hipótese<br />
de não ter vaga em empresas parceiras,<br />
eu viabilizo se me for apresentada a carteira<br />
assinada”, diz a dra. Míriam, sobrecarregada<br />
pela enorme quantidade de decisões<br />
que tem de tomar – mais de 1.500<br />
atos por mês.<br />
Parece ser supervantajoso para as empresas<br />
– qualquer uma da região pode<br />
contratar. Há 18 parcerias no momento e<br />
as empresas não pagam direitos trabalhistas,<br />
como o FGTS. “Preso com carteira<br />
assinada tem todos os direitos trabalhistas.<br />
Se você optar pelo programa e registrar<br />
sua empresa junto à Secretaria<br />
de Estado de Defesa Social, a SEDS, não”,<br />
diz Reginaldo. Já Mauro Raso Assunção,<br />
Mauro, da Braúnas, não emprega nenhum<br />
presidiário: “Já tivemos. Não temos<br />
mais porque os gerentes e encarregados<br />
têm medo”.<br />
É compreensível, pois medo é humano.<br />
Mas é irracional. Afinal, para os presos é<br />
vantagem também. A cada três dias trabalhados<br />
eles têm um dia de remissão de<br />
pena. Do salário, ficam com 75% (50% é<br />
recebido em dinheiro e 25% na forma de<br />
pecúlio, que o preso só retira quando<br />
acaba de cumprir a pena). Também para<br />
o Estado é bom, pois ele fica com 25%<br />
do salário a título de ressarcimento. Incompreensível<br />
é entender porque o sistema<br />
não funciona.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 17
ENTREVISTA/PREFEITO DE RIBEIRÃO DAS NEVES, JUNYNHO MARTINS (PSC)<br />
OS PRESÍDIOS MALTRATAM A<br />
AUTOESTIMA DA POPULAÇÃO<br />
“A PREFEITURA RECEBE R$ 900 MIL MENSAIS PARA ACOLHER<br />
OS DETENTOS. PREFERIMOS EMPRESAS E NÃO CADEIAS”<br />
Na manhã de seis de janeiro, quando<br />
os mineiros ainda aprumavam o<br />
corpo, após as festa de Ano Novo,<br />
o prefeito recém empossado de Ribeirão<br />
das Neves, Junynho Martins (PSC) disparou<br />
uma desesperada mensagem às redação<br />
de Belo Horizonte. Ele convidava a<br />
imprensa para lhes revelar um grave problema<br />
municipal — mais um — que se<br />
acrescia às monumentais dificuldades de<br />
um munícipio onde trinta porcento da população<br />
sequer paga impostos municipais<br />
porque a prefeitura não oferece àqueles<br />
moradores um único serviço público, como<br />
calçamento, esgotos ou linha de ônibus.<br />
Ribeirão das Neves acolhe quase 400 mil<br />
habitantes (O prefeito fala em 500 mil)<br />
A entrevista foi no dia nove e eu o encontrei<br />
acuado — esse é o termo — por<br />
uma dívida de R$250 milhões de reais<br />
deixada por sua antecessora, Daniela Corrêa<br />
(PT). “O debito será impagável nos<br />
meus quatro anos de mandato” lamentava.<br />
A antiga prefeita deixara também dois salários<br />
em aberto —dezembro e 13º salário<br />
—, o lixo se espalhando pelas calçadas e<br />
pronto socorro de saúde fechado por falta<br />
de condições mínimas de trabalho.<br />
Ninguém tocou no assunto que eu queria<br />
tratar, que era a assustadora presença<br />
dos cinco presídios no municípios. Esse<br />
tema — só se manifestou uma semana<br />
depois, na madrugada de 17 de janeiro,<br />
quando a Penitenciária Dutra Ladeira foi<br />
atingida por uma rebelião de presidiários.<br />
Mas o prefeito Junynho não se recusou a<br />
tratar do assunto com <strong>Matéria</strong><strong>Prima</strong> após<br />
a entrevista coletiva.<br />
Como é viver cercado por oito mil presidiários?<br />
A história da cidade se confunde com<br />
a história dos presídios por mais que as<br />
pessoas não queiram falar sobre isso.<br />
Crescemos em volta dos presídios, com a<br />
cidade abrigando as pessoas que trabalham<br />
lá dentro e também as famílias dos<br />
detentos, que desejam viver perto deles.<br />
O que a gente quer é que não venha mais<br />
presídios para a cidade. Vamos viver apenas<br />
com o que já temos.<br />
A cidade é remunerada pela hospedagem<br />
dos detentos. O dinheiro não é bom<br />
em tempos de crise?<br />
Ribeirão das Neves recebe cerca de<br />
R$900 mil mensais do governo, semelhantes<br />
18<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
aos royalties que os municípios do Rio de<br />
Janeiro recebem do petróleo extraído do mar.<br />
(NR: pelos nossos cálculos são cerca de cem<br />
reais por mês, referentes a cada preso).<br />
Mas nós não queremos viver disso.<br />
Queremos uma faculdade pública e empresas.<br />
Temos ótima geografia. A cidade<br />
é atravessada pela BR-040, que liga o Rio<br />
de Janeiro a Brasília.<br />
Foi construído aqui no município um<br />
excelente presídio, administrado pela iniciativa<br />
privada. Nunca houve rebeliões.<br />
Não sei se existe presídio bom. Mesmo o<br />
da PPP (Parceria Público-Privado), que é admirado<br />
e acompanhado pelo mundo. A cidade<br />
sofre com as penitenciárias. Isso atinge<br />
muito as pessoas. Quando falamos que somos<br />
de Neves, as pessoas acham que somos<br />
ex-presidiários ou parentes deles. Queremos<br />
coisas novas. Eu sou da seguinte política:<br />
cada cidade deve cuidar do seu preso.<br />
‘‘<br />
CRESCEMOS EM<br />
VOLTA DOS<br />
PRESÍDIOS,<br />
COM A CIDADE ABRIGANDO<br />
AS PESSOAS QUE<br />
TRABALHAM LÁ DENTRO E<br />
TAMBÉM AS FAMÍLIAS DOS<br />
DETENTOS, QUE DESEJAM<br />
VIVER PERTO DELES.<br />
O senhor se sente ameaçado pelas rebeliões?<br />
Não deixa de nos preocupar. Sou nascido<br />
e criado na cidade e com o tempo<br />
a gente vai perdendo o medo. Aprendemos<br />
a conviver com o perigo (o prefeito<br />
tem 40 anos). Houve rebeliões nas décadas<br />
de 80 e 90 que fizeram reféns e<br />
todos eram moradores na cidade. Nós<br />
nos assustamos muito. Temos três mil<br />
funcionários dos presídios que vivem no<br />
município.<br />
PREFEITURA DE RIBEIRÃO DAS NEVES<br />
COM UMA<br />
SEMANA DE<br />
GOVERNO, O<br />
PREEITO<br />
JUNYNHO<br />
RECEBEU UMA<br />
CONTA DE R$250<br />
MILHÕES<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 19
NOMES&NOTAS<br />
EMERSON DE ALMEIDA<br />
E O MEDO DE<br />
SER ESQUECIDO<br />
DURVAL GUIMARÃES<br />
Oprofessor Emerson de Almeida, expresidente<br />
da Fundação Dom Cabral<br />
mostrou uma coragem incomum<br />
nas páginas do seu recém lançado livro “A<br />
sucessão como ela é”. Na obra de 207 páginas,<br />
publicado pela Editora Benvirá, o<br />
mestre confessa que temia cair no esquecimento<br />
após se retirar da instituição.<br />
O livro foi publicado com o propósito de<br />
relatar sua experiência num tema de<br />
imensa delicadeza que é a troca de comando<br />
nas empresas. Quando o tempo diz<br />
que está na hora da aposentadoria, muitos<br />
fundadores de impérios comerciais e industriais<br />
relutam em abandonar o leme dos<br />
seus barcos. O resultado é que mais de<br />
70% das organizações desaparecem nas<br />
mãos dos filhos. E da parte que sobra do<br />
naufrágio, nem 10% atracam em qualquer<br />
porto quando recebe ordens dos netos.<br />
Enquanto redigia a obra, Emerson de Almeida,<br />
70 anos – e que foi jornalista na juventude<br />
– iniciava sua própria sucessão, após<br />
30 anos no comando daquela escola de formação<br />
de executivos empresariais, que se<br />
tornou uma das mais respeitadas em todo o<br />
mundo. Foi quando Emerson se deparou com<br />
a tenebrosa constatação: “Quando a retirada<br />
está associada à aposentadoria, essa perda<br />
lembra a morte. Mas não a finitude da vida e<br />
sim a morte pelo esquecimento”.<br />
Apesar dos temores, o professor se retirou<br />
da FDC e hoje ocupa seu tempo cuidado<br />
de uma vinícola no Chile, onde engarrafa<br />
o vinho “Gracias a la vida”. Quando<br />
vem a Minas, refugia-se em seu sítio em<br />
Jaboticatubas, para cultivar mudas de jabuticaba.<br />
A boa notícia adicional é que<br />
Emerson não tem planos de engarrafar<br />
qualquer beberagem a partir do caldo dessas<br />
frutinhas pretas, da qual só se tem notícias<br />
no Brasil.<br />
20<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
O ORGANOGRAMA<br />
NA PAREDE DE<br />
ADRIANA BRANCO<br />
Amigos desta coluna que visitaram ou trataram<br />
de assuntos profissionais com<br />
Adriana Branco, na chefia de gabinete do prefeito<br />
Alexandre Kalil, se depararam com uma<br />
iniciativa que sugere a imensa eficiência nos<br />
locais por onde passa. Adriana cobriu uma<br />
das paredes da sua sala com um gigantesco<br />
organograma com todos os cargos e seus<br />
ocupantes na administração municipal. Há<br />
também um código que identifica quem os<br />
indicou, caso seja funções re cru tamento amplo.<br />
Quando a dúvida surge, ela vai à parede,<br />
na presença do interlocutor e ali esclarece e<br />
resolve tudo, sem nada ficar para depois.<br />
NOVO MATER DEI,<br />
NA DIVISA BETIM-<br />
CONTAGEM<br />
Enquanto notícias escancaram fechamentos<br />
de hospitais privados no Brasil<br />
(foram mais de 500 nos últimos anos),<br />
uma boa nova foi divulgada nos últimos<br />
dias: a Rede Mater Dei iniciou a construção<br />
de mais uma unidade, agora na divisa,<br />
entre os municípios de Betim e Contagem.<br />
Desmentindo a crise no setor, o novo<br />
hospital Mater Dei terá 300 leitos e atenderá,<br />
com a mesma qualidade, os pacientes<br />
daquela região, que é uma das mais<br />
desenvolvidas de Minas. A inauguração<br />
acontecerá dentro de 36 meses.<br />
A CAMPANHA CONTRA O FUMO<br />
PODE CAUSAR GRAVES PREJUÍZOS<br />
Há gente na área de saúde avaliando,<br />
qual a melhor opção do governo em<br />
relação ao hábito de fumar. De um lado,<br />
há os que preferem liberar o uso do cigarro<br />
em todos os espaços, pois o imposto<br />
cobrado sobre o tabaco é enorme. Outro<br />
grupo avalia os danos aos cofres públicos<br />
que decorrem do vício de fumar. O delito<br />
mais grave é o câncer do pulmão, mas<br />
com repercussão limitada, porque a morte<br />
da vítima ocorre, no máximo, dois anos<br />
após o diagnóstico. O doente não ocupa<br />
demasiadamente o leito dos hospitais. A<br />
questão é ética e não econômica, mas a<br />
liberação pode ser resolvida, como um direito<br />
à liberdade. In others words: a proi-<br />
bição cada vez mais acentuada ao hábito<br />
de fumar, reduz o consumo de cigarros e<br />
portanto a receita auferida com esses impostos.<br />
Há pressões para que se reduza a<br />
campanha contra o tabagismo.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 21
TRÊS ANOS E R$ 60 MILHÕES DEPOIS,<br />
SCHUMACHER AINDA É MISTÉRIO<br />
SANDRA FIORINI,<br />
DE ROMA<br />
Oestado de saúde do piloto alemão<br />
continua a ser um tema mantido em<br />
total sigilo pela família, três anos depois<br />
do acidente de esqui que o deixou em<br />
coma. Mesmo os que o visitam são reservados<br />
nos comentários.<br />
No mesmo mês em que completou o<br />
seu 48.º aniversário, a 3 de janeiro, Michael<br />
Schumacher continua a ter no seu estado<br />
de saúde um tema limitado à família e alguns<br />
amigos mais próximos. Três anos depois<br />
do acidente que chocou os fãs do piloto<br />
e da Fórmula 1, o processo de recuperação<br />
de Schumi continua a ser reservado, sem<br />
que a família admita fugas de informação.<br />
Recentemente, um paparazzo alemão<br />
conseguiu algo que o mundo ainda não<br />
viu: fotos de Michael Schumacher na sua<br />
cama, na Suíça, durante o processo de<br />
recuperação. Segundo a televisão alemã<br />
RTL, o fotógrafo enviou, a vários jornais<br />
europeus, uma proposta para a compra<br />
das fotos por 1,2 milhões de euros.<br />
Porém, a família de Schumacher foi rápida<br />
a reagir e pediu à Procuradoria da Alemanha<br />
para averiguar como o fotógrafo teve<br />
acesso às fotos e ameaçou com processos<br />
quem viole a privacidade do ex-piloto. Houve<br />
até quem publicasse fotos falsas, caso da<br />
revista alemã Bravo, pron ta mente identificadas<br />
como não sendo verídicas.<br />
No entanto, a imprensa internacional<br />
voltou a divulgar dados que estariam reservados<br />
à família. Foi o caso do Daily<br />
Star, que noticiou que os tratamentos a<br />
Schumacher custaram cerca de R$ 60<br />
UM FICHA LIMPA NA<br />
PREFEITURA DE CONCEIÇÃO<br />
As eleições de 2016 para Prefeito em<br />
todo o Brasil foram atípicas. Na<br />
maioria dos casos, político antigo, com<br />
passado obscuro, não teve chance.<br />
Conceição do Mato Dentro, município<br />
mineiro de 18 mil habitantes localizado<br />
na Serra do Cipó, reelegeu pela terceira<br />
vez como seu prefeito, o único político<br />
mineiro de expressão nacional totalmente<br />
ficha limpa.<br />
José Fernando Aparecido de Oliveira, o<br />
Zé Fernando, filho do grande político mineiro,<br />
José Aparecido de Oliveira, honrou a memória<br />
do pai com uma campanha propositiva<br />
que foi contra adversários poderosos e riquíssimos,<br />
os quais derrotou com suor, argumentos<br />
e sua biografia sem manchas.<br />
Em seu terceiro mandato, José Fer-<br />
22<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
milhões nos últimos três anos. De acordo<br />
com o jornal inglês, os tratamentos semanais<br />
têm um custo de 130 mil euros.<br />
O património do antigo piloto estava avaliado<br />
em cerca de 600 milhões de euros<br />
quando se retirou definitivamente da Fórmula<br />
1, em 2012, mas o custo dos tratamentos teriam<br />
forçado a mulher de Schumacher, Corinna,<br />
a vender o jato privado e a casa de férias<br />
na Noruega que o casal possuía.<br />
Muitos fãs têm apelado a que a família<br />
divulgue algumas informações sobre o estado<br />
de recuperação do piloto, mas Sabine<br />
Khemas, representante do alemão, reafirmou<br />
que “o estado de saúde de Michael<br />
Schumacher é assunto de domínio privado<br />
e nunca público”.<br />
O advogado de Schumacher, Felix<br />
Damm, também tem sido muito curto nas<br />
suas intervenções. A última, em setembro,<br />
visou apenas desmentir as informações<br />
avançadas pela revista alemã Bunte, que<br />
garantia que o ex-piloto já era capaz de andar<br />
e levantar os braços. Damm desmentiu:<br />
“Ele não consegue andar. Optamos por não<br />
divulgar nada porque não queremos dar<br />
falsas esperanças a ninguém, que é precisamente<br />
o que as revistas que escrevem<br />
isso estão fazendo. Optamos por manter o<br />
seu estado de saúde reservado, até pela<br />
gravidade das suas lesões”, justificou.<br />
Johnny Herbert, antigo colega de Schumacher<br />
na Benetton, foi dos poucos e o<br />
último a falar publicamente sobre o estado<br />
do recordista de títulos na Fórmula 1. E<br />
nem Herbert pôde revelar muito. “Tudo o<br />
que posso dizer é que tem dias bons e<br />
dias maus. Vou tentando acompanhar de<br />
perto a situação, mas a verdade é que<br />
também não sei muito”, lamentou.<br />
nando pretende fazer de Conceição um<br />
polo educacional (com escolas em período<br />
integral e centro universitário), esportivo<br />
(com a construção de um estádio multiuso)<br />
e hospitalar (com a construção de<br />
um Hospital público com todas as especialidades).<br />
Também deverá resgatar o<br />
ecoturismo e investir na preservação do<br />
rico meio ambiente da região. Nem todos<br />
sabem, mas pertence ao município a cachoeira<br />
de Tabuleiro, a terceira maior do<br />
Brasil, além de vários outros pontos turísticos<br />
formados por uma fauna e flora únicas<br />
no mundo.<br />
PREFEITURA DE CONCEIÇÃO DO MATO DENTRO<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 23
CARREIRAS<br />
NOVE COISAS QUE<br />
PESSOAS BEM SUCEDIDAS<br />
NUNCA FAZEM<br />
Antônio Porfírio<br />
SEGUNDO TRAVIS BRADBERRY (foto), PRESIDENTE DE<br />
UMA EMPRESA QUE SE DEDICA À INTELIGÊNCIA<br />
EMOCIONAL, A CAPACIDADE DE GERIR AS EMOÇÕES E<br />
MANTER A CALMA – QUANDO SOB PRESSÃO – É<br />
FUNDAMENTAL PARA ALCANÇAR O SUCESSO. MAS HÁ<br />
MAIS: DEPOIS DE ANALISAR MAIS DE UM MILHÃO DE<br />
PESSOAS, O CO-FUNDADOR DA TALENTSMART E AUTOR<br />
DE UM BEST SELLER SOBRE O TEMA CONCLUIU QUE A<br />
INTELIGÊNCIA EMOCIONAL ESTÁ DIRETAMENTE LIGADA AO SUCESSO. NO<br />
ARTIGO PUBLICADO DA REDE DE LIGAÇÕES PROFISSIONAIS LINKEDIN, O<br />
ESPECIALISTA IDENTIFICOU NOVE CARACTERÍSTICAS COMPORTAMENTAIS DOS<br />
EMOCIONALMENTE INTELIGENTES.<br />
1. NÃO VIVER NO PASSADO<br />
Quando se vive no passado, o mais<br />
provável é nunca se conseguir seguir<br />
em frente. Desse modo, o fracasso pode<br />
“minar” a sua autoconfiança e impedi-lo<br />
de ser bem sucedido no futuro. “As<br />
pessoas emocionalmente inteligentes<br />
sabem que o sucesso reside na sua<br />
capacidade de ultrapassar o fracasso, e<br />
não podem fazer isso ao viverem no<br />
passado”, explica Bradberry. Apesar dos<br />
fracassos já cometidos, é importante as<br />
pessoas acreditarem que nada se<br />
consegue sem riscos e esforços,<br />
acreditando sempre nas suas<br />
capacidades de vencer.<br />
2. NÃO SE REFUGIAR NOS PROBLEMAS<br />
Para Bradberry, o foco da atenção<br />
determina o estado emocional, ou seja,<br />
24<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
quando uma pessoa se fixa num<br />
problema as emoções serão negativas<br />
e estressantes. Esse tipo de sentimento<br />
vai influenciar de forma negativa o<br />
desempenho pessoal. Deste modo, ao<br />
invés de se “afundarem” nos<br />
problemas, as pessoas<br />
emocionalmente inteligentes focam-se<br />
em procurar soluções para resolverem<br />
o problema.<br />
3. NÃO SE FOCAR NA PERFEIÇÃO<br />
Outro resultado da pesquisa<br />
demonstra que as pessoas bem<br />
sucedidas não procuram a perfeição,<br />
conscientes de que ela não existe.<br />
“Quando a perfeição é o objetivo, a<br />
pessoa sentirá sempre a sensação de<br />
fracasso, gasta o seu tempo a lamentar<br />
o que deixou de fazer e o que poderia<br />
ter feito de forma diferente, em vez de<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 25
apreciar o que era capaz de alcançar”,<br />
acrescenta Bradberry.<br />
4. NÃO VIVER CERCADO DE<br />
PESSOAS NEGATIVAS<br />
As pessoas que estão<br />
constantemente se queixando dos seus<br />
problemas e que são negativas<br />
representam um perigo para o sucesso<br />
dos que as rodeiam. Elas não se<br />
preocupam com soluções, apenas<br />
pretendem levar alguém consigo “para<br />
a cova”, de modo a se sentirem melhor.<br />
Por essas e outras razões, fuja delas.<br />
Mesmo que isso o possa fazer sentir-se<br />
mal e insensível, “há uma linha que<br />
separa emprestar um ouvido simpático<br />
e ser sugado para dentro de uma<br />
espiral emocional negativa”, defende<br />
Bradberry.<br />
5. NÃO TER MEDO DE DIZER “NÃO”<br />
“Dizer não é realmente um grande<br />
desafio para a maioria das pessoas”,<br />
admite o especialista. Contudo, quando<br />
é necessário dizer “não,” as pessoas<br />
bem sucedidas dizem isso sem rodeios,<br />
e de forma direta. A investigação<br />
concluiu que a dificuldade em dizer<br />
“não” está relacionada com o estresse e<br />
com a depressão. Ao conseguir dizer<br />
esta palavra, você estará assumindo os<br />
seus compromissos e defendendo o que<br />
quer, o que lhe permite alcançar o<br />
sucesso.<br />
6. NÃO DEIXAR NINGUÉM INFLUENCIAR<br />
A SUA FELICIDADE<br />
Quando as pessoas emocionalmente<br />
inteligentes se sentem bem, elas não<br />
deixam que os outros estraguem essa<br />
felicidade com opiniões e sentimentos<br />
destrutivos. E também não comparam<br />
felicidades. Não importa o que as outras<br />
pessoas pensam ou fazem, a sua<br />
autoestima vem de si. Tem de se<br />
preocupar com aquilo que faz, não com<br />
o que os outros fazem.<br />
7. PERDOAR, MAS NÃO ESQUECER<br />
A investigação concluiu que as<br />
pessoas com maior inteligência<br />
emocional são rápidas a perdoar – o<br />
que não quer dizer que esqueçam. Não<br />
ficam remoendo” o que se passou, mas<br />
isso não significa que irão dar chances a<br />
um novo erro.<br />
8. NÃO DESISTIR DA LUTA<br />
Segundo Bradberry, as pessoas<br />
emocionalmente inteligentes sabem o<br />
quão importante é lutar para viver no dia<br />
seguinte. Deste modo, diante dos<br />
conflitos, enfrentam os problemas e não<br />
se deixam abater pelas dificuldades.<br />
Fazem isso com cautela, controlando as<br />
suas emoções e capacidades com<br />
sabedoria. Esta é a forma mais eficaz de<br />
defenderem o “seu território e saírem<br />
vitoriosos”.<br />
9. NÃO GUARDAR RANCOR<br />
Tendo em conta estudos realizados,<br />
guardar rancor é, na verdade, uma<br />
forma de cultivar o estresse.<br />
Pesquisadores da Universidade de<br />
Emory mostraram que o estresse<br />
contribui para a elevação da pressão<br />
arterial e para doenças cardíacas. Ao<br />
guardar o rancor, você estará guardando<br />
também o estresse, e assim, nunca<br />
alcançará o sucesso. Ou seja, aprender<br />
a libertar-se do rancor não só vai fazer<br />
você sentir-se melhor, como também vai<br />
melhorar a sua saúde. As pessoas<br />
emocionalmente inteligentes sabem que<br />
devem evitar esse sentimento em todas<br />
as situações.<br />
26<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
SAUDADES<br />
TRÊS ANOS SEM O GRANDE<br />
CRONISTA, JORNALISTA E AMIGO<br />
MÁRCIO RUBENS PRADO<br />
OS MINEIROS E, EM ESPECIAL, A REDAÇÃO DE MATÉRIAPRIMA, CHORAMOS A<br />
AUSÊNCIA DO GRANDE JORNALISTA, CONHECIDO PELO TEXTO ÚNICO, A<br />
PAIXÃO PELA ARTE E AS MULHERES, ALÉM DA HABILIDADE DE CONTAR<br />
HISTÓRIAS. ELE ERA O NOSSO EDITOR DE TEXTO. NA PRÓXIMA PÁGINA, VOCÊ<br />
VAI REVER UMA DE SUAS DIVERTIDAS CRÔNICA, O FUGITIVO<br />
Ojornalista Márcio Rubens Prado foi<br />
um dos maiores cronistas brasileiros<br />
e nós o perdemos na madrugada<br />
de oito de janeiro de 2014, em Belo<br />
Horizonte, aos 80 anos. Conhecido por<br />
seu belo texto, a paixão pela arte, a boemia<br />
e as mulheres, além da habilidade<br />
única em contar histórias – que sempre<br />
encantaram quem estivesse por perto –<br />
Márcio estava internado havia uma semana,<br />
com problemas cardíacos.<br />
Filho de Djalma Prado e Iracy Castro, irmão<br />
de quatro homens e uma mulher, Márcio<br />
nasceu em 26 de maio de 1933, em Guanhães,<br />
no Leste de Minas, cidade con si -<br />
derada por ele como “o centro do sistema<br />
solar”, o menino parece já ter crescido finamente<br />
pronto para as letras. Com o amigo<br />
de infância, Roberto Drummond, fundou o<br />
primeiro jornal aos 12 anos, batizado Rio<br />
Branco Notícias, que atualizava o que acontecia<br />
na rua onde morava. Produzido a lápis<br />
em folha de papel almaço, o único exemplar,<br />
semanal, era comprado pelo pai do colega<br />
de ginásio, e os 10 cruzeiros rendiam uma<br />
semana inteira de cinema.<br />
MÁRCIO: TRÊS ANOS DE SAUDADES<br />
AGÊNCIA MINAS<br />
Ainda na escola, Márcio escreveu uma<br />
redação policial de ficção que impressionou<br />
o professor, que disse ao garoto sobre<br />
o talento para ser jornalista. Com essa<br />
ideia na cabeça, ele e Roberto vieram para<br />
Belo Horizonte, cursar o segundo grau. O<br />
trabalho inicial como bancário na capital,<br />
antes apenas para arcar com os estudos,<br />
resultou em uma indicação para Márcio<br />
publicar uma crônica, a primeira, em uma<br />
coluna do Diário de Minas. E o emprego<br />
no jornal estava garantido.<br />
Foi assim o começo da passagem do<br />
jornalista pelas principais empresas de comunicação<br />
de BH. No início da década de<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 27
1960, depois de aprender línguas neolatinas<br />
na Faculdade de Filosofia da UFMG,<br />
deixar o curso superior de Direito por causa<br />
de outro jornal de sua autoria considerado<br />
subversivo pela direita militar (que rendeu<br />
até um “exílio” de quase dois meses em<br />
Guanhães), a vida profissional na cidade<br />
grande continuou com o percurso por locais<br />
como o Diário de Minas, Rede Minas,<br />
TV Bandeirantes, TV Tupi, para citar apenas<br />
alguns. Pouco antes da morte, estava escrevendo<br />
para a revista <strong>Matéria</strong><strong>Prima</strong>.<br />
Amante da literatura (só dormia depois<br />
de uma leitura), Márcio começou a incursão<br />
pelo jornalismo esportivo, uma de suas<br />
principais áreas de atuação, na época da<br />
O FUGITIVO<br />
MÁRCIO RUBENS PRADO<br />
Minha tia me pegou no ato de espiar<br />
a Ludmila, minha prima e<br />
paixão, tomando banho.<br />
O degas aqui, semicurvado, com o olho<br />
na fechadura — fechadura que valia uma<br />
luneta —, me alucinando com as pompas<br />
e circunstâncias da graciosa parenta.<br />
Não percebi a ofídica chegada da tia.<br />
Num bote certeiro, avançou sobre mim e<br />
me levou, em orelhas, arrancos e denúncias,<br />
para a tempestade de chineladas da<br />
minha mãe.<br />
A sova não satisfez mamãe. Em rancores<br />
de absoluta profilaxia, forçou-me a imitar<br />
a prima, vítima de meus invasivos olhares.<br />
Ou seja, obrigou-me a tomar banho.<br />
Num horário humilhante: uma e pouco da<br />
tarde. Para piorar, após um banho cruelmente<br />
esfregatício, me botou de roupa<br />
limpa, empoleirado num tamborete de pernas<br />
compridas. Ambos, roupa e tamborete,<br />
adornados com terrível advertência:<br />
— Pega aí os Contos Pátrios. Você vai<br />
ler e resumir pra mim a história número<br />
nove, a do “O Velho Rei”. E só vai sair<br />
desta cadeira quando seu pai chegar do<br />
cartório. Moleque safado”.<br />
Revoltado, mas calado — a pontaria de<br />
minha mãe com as chinelas eliminava qualquer<br />
ameaça de resmungo — peguei o livro,<br />
sentei-me e fingi ler.<br />
Dora Iracy, após aplicar um beliscão de<br />
despedida, voltou à máquina de costura. E<br />
logo se distraiu, pedalando a Singer com<br />
vontade, na produção de um casaco para<br />
uma afilhada.<br />
Fiquei ali, meditando e esperando.<br />
Mas não esperei muito. Tomei a decisão:<br />
no que ouvi as pedaladas de mamãe na máquina<br />
de costura, fui para meu quarto. Com<br />
todos os silêncios. Arranquei uma folha do<br />
caderno Avante — aquele que tinha na capa<br />
uns soldados carregando a Bandeira Nacional<br />
—, dei umas mordidas pensativas no toco<br />
de lápis e escrevi, bordando as letras: “Senhora<br />
Dona Iracy, minha mãe: estou de viajem<br />
para a Cidade do Panamá. Vou para<br />
nunca mais voltar. Márcio. N. B. Fala com a<br />
Ana para tratar do pintassilgo pra mim”.<br />
Escolhi a Cidade do Panamá porque eu<br />
amava as histórias de piratas. Uma, que eu<br />
gostava muito, contava o ataque do pirata<br />
Henry Morgan à Cidade do Panamá. Era assim:<br />
informaram ao governador que o<br />
28<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
inauguração do Mineirão, e conviveu com<br />
grandes nomes da imprensa nesta época.<br />
É autor de sete livros. Em entrevista recente,<br />
o poeta também enfeitiçado pela<br />
música revelou a frustração de não ter sido<br />
pianista (“queria ser pianista de boate, ficar<br />
ali tocando piano, com um copo de uísque<br />
em cima, vendo a mulher da minha vida<br />
abraçada com outro, só para eu escrever<br />
músicas ainda mais bonitas”). E o sonho<br />
de ver o América-MG, ser campeão da Série<br />
A.<br />
Saindo deste mundo por causa do “coração<br />
pisoteado pelas donas”, como costumava<br />
brincar, Márcio deixou quatro filhos<br />
e três netos.<br />
pirata iria atacar a cidade. Então, o homem<br />
tomou as providências: com ele à frente, as<br />
tropas espanholas ficaram esperando os piratas<br />
na praia... O esperto do bucaneiro (palavra<br />
que sempre achei de altas erudições)<br />
atacou a cidade por terra. Deu uma surra<br />
nos espanhóis e limpou os tesouros da cidade.<br />
Uma dinheirama. Cada um dos piratas<br />
recebeu um prêmio de 200 moedas de ouro.<br />
Lógico, eu só poderia fugir para um lugar<br />
assim.<br />
Bilhete escrito, cuidei de preparar a bagagem<br />
para partir. Comecei pelos víveres: duas<br />
roscas da rainha, quatro traquenéis e duas<br />
broinhas de fubá.<br />
Roupas: as do corpo. Recém-saído do banho,<br />
eu estava em louvável limpidez, com a<br />
camisa de malha que minha madrinha me<br />
dera no Natal, e as calças curtas de brim e<br />
os compridos suspensórios de pano.<br />
Armas: o estilingue e o canivete-corneta.<br />
Pertences: escova de dentes, um toco de<br />
lápis faber nº 2 e duas estampas do sabonete<br />
Eucalol, das difíceis: as pirâmides de Gizé,<br />
no Egito; e a Ponte dos Suspiros, em Veneza.<br />
Assim apetrechado, saí para a rua na<br />
ponta dos pés. Fui beirando muros e portais,<br />
como se todo mundo soubesse que eu era<br />
um fugitivo internacional, em plena rota de<br />
fuga para o Panamá.<br />
Mas não fugi nem duzentos metros.<br />
Quando passava, duro e decidido, rumo<br />
ao meu destino, dei com o campinho que<br />
havia atrás da igreja. Ali, minha turma disputava<br />
um racha sensacional.<br />
O Fábio Banje-Banje (apelido derivado de<br />
ser banguela de todos os dentes da frente,<br />
incapaz de usar o gê duro) me chamou:<br />
— Ô Marcola, entra aqui no meu lugar.<br />
Mamãe mandou a Juvência me chamar. Vou<br />
lá em casa só tomar umas chineladas e volto<br />
já, já. Cê entra no meu lugar?<br />
Topei na hora. De roupa limpa e tudo. Escondi<br />
minha bagagem debaixo da mamoneira,<br />
e entrei firme na pelada.<br />
Fábio não voltou, joguei encapetado até<br />
escurecer. E me esqueci de tudo.<br />
Das coxas da Ludmila. Das chineladas.<br />
Do Henry Morgan. Da Cidade do Panamá.<br />
Do alcaide idiota. Do bilhete. Dos víveres e<br />
armamentos debaixo do pé de mamona.<br />
Voltei correndo pra casa. Sujo, empoeirado,<br />
suado.<br />
Ao entrar, fui efusivamente recebido por<br />
nova manada de chineladas. Desta vez, na<br />
presença do meu pai.<br />
Seu Djalma, o rosto afogueado de rir, tinha<br />
meu bilhete na mão.<br />
Esperou minha mãe encerrar a surra, deume<br />
um coque (carinhoso) na cabeça e me<br />
fulminou de vez:<br />
— Além de fujão, analfabeto! Viajar é com<br />
jota, rapaz; viagem é com gê!. Vou contar<br />
pra sua avó...<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 29
ENTREVISTA/PEDRO J. RAMÍREZ<br />
“EM TRÊS ANOS,<br />
NÃO HAVERÁ MAIS JORNAIS<br />
IMPRESSOS NO MUNDO”<br />
SETENTA ANOS, 42 DE JORNALISMO, 37 DELES COMO DIRETOR DE JORNAIS E<br />
UM TÍTULO: PEDRO J. RAMÍREZ, O ENFANT TERRIBLE DA IMPRENSA<br />
ESPANHOLA. SOMOU POLÊMICAS E DENUNCIOU CASOS QUE, GARANTE, LHE<br />
VALERAM A DEMISSÃO DOS CARGOS QUE OCUPAVA. PRIMEIRO, NO DIÁRIO 16;<br />
DEPOIS, NO EL MUNDO – JORNAL QUE<br />
FUNDOU EM 1989. QUANDO SE VIU<br />
DESEMPREGADO, INVESTIU TUDO NUM<br />
NOVO JORNAL, 100% DIGITAL. O EL<br />
FILOMENA MARTINS<br />
(Do jornal digital português Observador)<br />
Em outubro de 2013 o senhor disse: “O<br />
futuro é digital ou não haverá futuro. O negócio<br />
da imprensa no papel não vai se recuperar<br />
nunca mais”. Já nessa altura tinha<br />
na cabeça um projeto como o El Español?<br />
Sim. Nós somos a demonstração de<br />
que há um futuro digital. Em pouco tempo,<br />
um novo título pode ocupar um lugar importante<br />
num país desenvolvido. É o que<br />
está acontecendo aqui, em Espanha, com<br />
o El Español, e em Portugal também, com<br />
o Observador.<br />
Os jornais tradicionais, impressos, demoraram<br />
muito a aderir ao modo on-line?<br />
Não. Os chamados legacy papers, os<br />
30<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
jornais que vêm do mundo tradicional são<br />
em toda a parte os players principais do<br />
mundo digital. O que se passa é que o número<br />
de novos utilizadores dos jornais tradicionais<br />
é muito baixo e isso tem permitido<br />
que novos projetos, inéditos, ocupem<br />
um espaço importante em pouco tempo.<br />
Isso significa que os jornais tradicionais<br />
levarão vantagens na disputa pelo mercado<br />
on-line?<br />
Os legacy papers têm a vantagem de<br />
ter uma grande infraestrutura ao seu serviço.<br />
Mas isso tem também inconvenientes:<br />
é muito difícil serem sustentáveis. Manter<br />
o negócio tradicional exige um lastro financeiro<br />
cada vez maior. Já nós, os novos<br />
atores, os nascidos no mundo digital, temos<br />
menos meios, mas em compensação mais<br />
flexibilidade e menor risco empresarial.<br />
Até quando vai ser possível conciliar<br />
os jornais em papel e os sites, onde já<br />
são colocadas 90% das peças que sairão<br />
no dia seguinte na edição impressa?<br />
O meu prognóstico é que até ao final<br />
desta década, até 2020, a maioria dos jornais<br />
deixará de imprimir. Se houver alguma<br />
edição impressa em Espanha, será residual.<br />
Quando era diretor do El Mundo havia quatro<br />
jornais com vendas nacionais de mais<br />
de 100 mil exemplares e dois com vendas<br />
PARA RAMIREZ, O<br />
PAPEL NÃO FAZ<br />
FALTA AO JORNAL.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 31
‘‘<br />
de mais de 200 mil. Agora só há um, o El<br />
País, com mais de 100 mil, que dentro de<br />
um ano ou dois baixará desse número. Não<br />
ficará nenhum jornal que venda mais de<br />
100 mil cópias nas bancas, num país de 45<br />
milhões de habitantes. Isso é insustentável!<br />
Do ponto de vista dos custos, da distribuição…<br />
Os jornais tradicionais teriam de custar<br />
dez euros para poderem sobreviver!<br />
Essa situação não é exclusiva de Espanha.<br />
Está acontecendo em Portugal, em to -<br />
do o mundo. O The In de pen dent deixou as<br />
TEMOS 5.500<br />
PROPRIETÁRIOS<br />
CONSEGUIDOS VIA<br />
CROWDFUNDING, QUE<br />
PAGARAM CADA UM CERCA<br />
DE 650 EUROS NUM TOTAL<br />
DE 3,6 MILHÕES, E<br />
INVESTIDORES<br />
TRADICIONAIS PRIVADOS<br />
O NÚMERO DE<br />
LEITORES DE<br />
JORNAL VAI<br />
DIMINUINDO POR<br />
TODA PARTE.<br />
32<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
ancas há poucos meses, ficou só digital…<br />
É exatamente isso. Porque com o preço<br />
que custaria comprar um único exemplar<br />
nas bancas será possível oferecer conteúdo<br />
premium online durante todo um mês.<br />
O que acha agora dos conteúdos pagos<br />
na internet? Há quem aceite pagar com<br />
tanta informação grátis?<br />
O El Español tem mais de 13 mil assinantes.<br />
Mas reconheço que é mais difícil<br />
crescer em assinantes do que em leitores.<br />
Neste país nenhum dos principais meios<br />
tem aberta essa linha de negócio e é muito<br />
difícil a um recém-chegado, a um nativo,<br />
consegui-lo. Ainda assim, 13 mil assinantes<br />
pagos é muitíssimo! Mas, da mesma maneira<br />
que disse “O futuro será digital ou não<br />
será”, digo agora “O modelo de negócio ou<br />
será misto, ou não será”. Há que estabelecer<br />
no mundo digital a combinação de receitas<br />
de publicidade com a venda de conteúdos,<br />
através de assinantes ou micro pagamentos<br />
por reportagens e ensaios especiais. Os<br />
grandes meios que resistem a seguir esse<br />
caminho terão que render-se à evidência.<br />
O senhor lançou o El Español menos<br />
de dois anos depois de sair do El Mundo,<br />
a 31 de janeiro de 2014. Arrancar com<br />
um projeto destes em tão pouco tempo<br />
parece impossível. Esse projeto já estava<br />
alojado em sua mente?<br />
Eu tinha um acordo de incompatibilidades<br />
(segundo o qual não podia trabalhar<br />
em jornais concorrentes ao El Mundo) que<br />
teoricamente durava dois anos, mas na<br />
prática só durou um. Eles deixaram de publicar<br />
os meus artigos porque eram muito<br />
críticos e acabaram por me libertar do<br />
compromisso. O El Español nasceu em finais<br />
de outubro de 2015. Mas não, não tinha<br />
nada pensado. Porque nunca pensei<br />
que me fossem demitir de diretor do El<br />
Mundo. Podia ter continuado até ao fim<br />
da vida como diretor do El Mundo.<br />
Mas depois de sair do El Mundo lançou<br />
o blogue ‘Nohacefaltaelpapel’ (naofazfaltaopapel).<br />
Foi aí que começou a fazer<br />
este caminho ou era apenas um nome<br />
para provocação?<br />
Creio que era já uma constatação. O El<br />
Español é já um dos cinco, seis grandes<br />
meios, do ponto de vista da influência e de<br />
peso político, e não nos faz falta o papel…<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 33
A VELHA ORDEM<br />
“PAREM AS<br />
MÁQUINAS!” SE<br />
TORNOU INÚTIL.<br />
ELAS ESTÃO<br />
PARANDO POR<br />
CONTA PRÓPRIA<br />
É um projeto de 18 milhões de euros<br />
Esse foi o capital que reunimos. Até<br />
agora gastamos menos, dois milhões na<br />
fase de arranque, mais dois milhões investidos<br />
em tecnologia e ativos e no nosso<br />
primeiro ano teremos três milhões de prejuízo.<br />
No segundo ano devemos perder<br />
um milhão, um milhão e meio.<br />
Qual o modelo do El Español?<br />
O modelo do El Español é misto com<br />
base em publicidade tradicional e subscrições.<br />
Temos 5.500 proprietários conseguidos<br />
via crowdfunding, que pagaram cada<br />
um cerca de 650 euros num total de 3,6<br />
milhões, e investidores tradicionais privados,<br />
conhecendo-se, além de Pedro J. Ramírez,<br />
a Institución Educativa SEK e a Spainmedia,<br />
editora da revista Forbes en Espanha.<br />
A sua perspectiva era zerar esse investimento<br />
em três anos. Vai ser possível?<br />
Creio que sim. Nos primeiros seis meses<br />
estamos cumprindo estritamente o business<br />
plan.<br />
Diz-se que o senhor investiu bastante<br />
da indenização que recebeu do El Mundo…<br />
Bastante, não. Investi toda a indenização!<br />
Tudo o que me deixou o Governo,<br />
depois de cobrar os impostos. No total foram<br />
quase seis milhões. Lamento que os<br />
34<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
‘‘<br />
DA MESMA<br />
MANEIRA QUE<br />
DISSE ‘O FUTURO<br />
SERÁ DIGITAL OU NÃO<br />
SERÁ’, DIGO AGORA ‘O<br />
MODELO DE NEGÓCIO OU<br />
SERÁ MISTO, OU NÃO<br />
SERÁ’.”<br />
impostos tenham sido tão altos e eu não<br />
tenha podido investir mais.<br />
Qual é mesmo a linha editorial do jornal?<br />
A denúncia de casos importantes,<br />
como os de corrupção na política, que foi<br />
sempre a sua imagem de marca; notícias<br />
mais imediatas; ou reportagens, análises<br />
e trabalhos de fundo?<br />
A combinação de todos esses elementos.<br />
Exclusivos do jornalismo de investigação.<br />
Análises e artigos de opinião tomando<br />
posição nos grandes debates com<br />
uma agenda de reforma do sistema democrático.<br />
E as reportagens e as histórias<br />
bem contadas.<br />
Nos primeiros meses do El Español saíram<br />
muitos profissionais. Agora acaba de<br />
perder figuras importantes da redação,<br />
incluindo um subdiretor. São as dores de<br />
crescimento ou diferenças de posicionamento<br />
editorial?<br />
Num projeto, ao princípio, há contribuições<br />
diversas que combinam sensibilidades<br />
distintas, mas só a prática demonstra<br />
se isso funciona ou não. Foi assim em todos<br />
os projetos por onde passei. Foi assim<br />
na fundação do El Mundo. O nosso núcleo<br />
fundador tem uma grande estabilidade.<br />
Há pessoas que se incorporam, outras que<br />
saem e podem ou não ser substituídas.<br />
O senhor disse, também, no resumo<br />
das suas obsessões editoriais, que o principal<br />
objetivo do El Español seria defender<br />
o cidadão acima de todos os tipos de<br />
poderes. É um objetivo muito nobre, mas<br />
também genérico.<br />
É uma filosofia, mas tem de se concretizar.<br />
Falamos dos cidadãos como consumidores,<br />
como usuários de serviços financeiros,<br />
de bancos, dos cidadãos eleitores,<br />
que têm direitos como votantes ante os<br />
partidos políticos, como pessoas que pagam<br />
impostos e têm direitos nas suas relações<br />
com o Governo e o fisco. Estamos<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 35
falando da “pessoa”, do “cidadão”, como<br />
elemento central da sociedade. E a defesa<br />
dos direitos do cidadão é a razão de ser<br />
de um jornal como o nosso.<br />
O jornal adapta seu conteúdo às preferências<br />
dos leitores? Há algumas tentações<br />
par se cair nesse clientelismo? Como faz<br />
o equilíbrio?<br />
Seria um erro ignorar as audiências que<br />
têm diferentes conteúdos, mas também<br />
seria um erro ser escravo dessas medições.<br />
É verdade que não mostram a importância<br />
que têm certos temas e, em<br />
sentido contrário, potenciam temas mais<br />
ligeiros. Mas há uma fórmula que nunca<br />
falha no jornalismo e que serve tanto para<br />
o mundo tradicional como para o mundo<br />
digital. Um bom jornalista tem que tornar<br />
fácil e compreensível o que é complexo e<br />
tem de dar envergadura, sustentação e<br />
substância ao que é ligeiro e leviano.<br />
Sempre se disse “facts are sacred, opinions<br />
are free” (“os fatos são sagrados, as<br />
opiniões são livres”), ao que acrescento um<br />
terceiro elemento do mundo contemporâneo:<br />
“Explanations are necessary”. As explicações<br />
são necessárias. E esse é o grande desafio<br />
que enfrenta o novo jornalismo: explicar às<br />
pessoas as coisas complexas. De resto, cito<br />
um autor francês de que tanto gosto. Robespierre<br />
disse “A virtude sem o terror é impotente,<br />
o terror sem a virtude é fatal”. Eu<br />
adapto: o bom texto sem o clique é impotente,<br />
o clique sem o bom texto é fatal.<br />
O que consome mais recursos, o papel<br />
ou o digital? É possível fazer jornalismo<br />
digital com menos pessoas?<br />
Com menos pessoas, sim. Com menos<br />
jornalistas, não. A grande diferença e a<br />
grande vantagem do mundo digital é que<br />
os custos não sobem quando se aumenta<br />
o número de leitores. No mundo tradicional,<br />
cada exemplar que se vende tem um<br />
custo adicional de papel, rotativa, tinta,<br />
transporte. Quando esse custo é maior que<br />
o preço de capa, a dependência da publicidade<br />
é grande. Quando a publicidade cai<br />
e a circulação também baixa, esse custo<br />
sobe. E a maior parte dos jornais tradicionais<br />
está vendendo com um preço de capa<br />
inferior ao custo industrial de produzir esse<br />
jornal: é o caminho para a ruína. Para o<br />
Observador ou para o El Español, esse<br />
custo é zero. E essa é a chave. Podemos<br />
concentrar todos os recursos nos conteúdos,<br />
em fazer bom jornalismo.<br />
O senhor trabalhava com 300 pessoas<br />
no El Mundo. Tem cerca de 100 no El Español.<br />
É possível fazer mais com menos?<br />
Ou reduz porque agora também é patrão?<br />
No total da empresa somos 105, na redação<br />
72, 73. É mais difícil porque a ambição<br />
e o desejo de oferecer conteúdo de<br />
interesse é o mesmo e são menos para<br />
os fazer. Mas também é mais emocionante<br />
porque se trabalha de forma mais direta<br />
com todas as pessoas da redação.<br />
O El Español não deixou de apostar<br />
nessa sua “especialidade”: denunciar casos<br />
de corrupção, sobretudo na área po-<br />
‘‘<br />
CREIO QUE MESSI É<br />
MELHOR<br />
FUTEBOLISTA, MAS<br />
O RONALDO É MUITO MAIS<br />
FASCINANTE. É UMA<br />
PERSONAGEM. A OBSESSÃO<br />
DE RONALDO POR SER O<br />
MELHOR.<br />
36<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
Quantos amigos o senhor perdeu ao lon -<br />
go dos anos?<br />
Quase todos os que ganhei. Se o jornalista<br />
fizer o seu papel, qualquer relação estável,<br />
de confiança ou de continuidade com<br />
um político, a certo momento estraga-se.<br />
O EDITOR RAMIREZ E O SEU ÍDOLO CRISTIANO<br />
RONALDO, O CRAQUE QUE QUER VENCER TODAS<br />
lítica… Também já sofreu pressões aqui?<br />
Há muito tempo que os poderes deste<br />
país, o político e o financeiro, me deram<br />
como um caso perdido. Uma notícia comigo,<br />
quando me chega, é como o “lasciate<br />
ogni speranza” (“deixai toda a esperança,<br />
vós que entrais!”), que está à porta<br />
do Inferno de Dante. Antes diziam “O Pedro<br />
J. está louco, não há forma de negociar<br />
com ele, tem uma notícia e publica”. Pois<br />
sim! As notícias só têm um sentido e uma<br />
função: a de serem publicadas.<br />
Qual é o seu maior inimigo: Rajoy, o rei<br />
(emérito) Juan Carlos, Felipe González?<br />
Eu não tenho nenhum inimigo. Para mim<br />
são protagonistas da atualidade, da vida pública.<br />
A Felipe González já não dedico nenhum<br />
dos meus pensamentos, porque já<br />
não é um político no ativo, embora às vezes<br />
tenha intervenções públicas. Até acho que<br />
tem estado muito bem no papel que tem na<br />
relação com a Venezuela. De Rajoy deixarei<br />
de falar no dia em que deixar de ser presidente.<br />
De Juan Carlos só saem à luz do dia<br />
coisas do seu passado como rei, o presente<br />
de Juan Carlos já importa pouco. O problema<br />
é que Felipe, Rajoy e Juan Carlos continuam<br />
a considerar-me como inimigo.<br />
Até no futebol o senhor cria polémicas.<br />
Andou em discussões com Piqué (jogador<br />
do Barcelona) no Twitter…<br />
Foi uma coisa um pouco tonta. Um dia<br />
mostraram-me uma foto em que se via a<br />
bola mesmo colada à mão do Piqué, dentro<br />
da área. Publiquei-a no Twitter e escrevi<br />
“Era pênalti e cartão”, sem querer fazer<br />
polêmica, foi um comentário como tantos<br />
outros. Ele veio responder, dizendo “Antes<br />
de comentar, dispa a camiseta”, sugerindo<br />
que eu era do Real Madrid. No dia seguinte<br />
publiquei uma foto minha com uma camisola<br />
do Barcelona que o anterior presidente,<br />
Laporta, seu grande amigo, me deu.<br />
O senhor é do Real ou do Barcelona?<br />
Do Real, mas no basquetebol. O meu<br />
desporto é o basquetebol.<br />
Vale a pena fazer a pergunta do costu -<br />
me: Ronaldo ou Messi?<br />
Creio que Messi é melhor futebolista,<br />
mas o Ronaldo é muito mais fascinante.<br />
É uma personagem. A obsessão de Ronaldo<br />
por ser o melhor. A dependência,<br />
a drogodependência de Ronaldo sobre o<br />
seu ego é fascinante. Porque lhe dá motivação<br />
para todo o tipo de façanhas.<br />
Sente no dia a dia que há pessoas que<br />
o odeiam?<br />
Sim, que me odiaram ou me odeiam.<br />
Mas “adversarum impetus rerum viri fortis<br />
non vertit animum “(citação de Sêneca),<br />
ou seja, o ímpeto do adversário não altera<br />
o ânimo do homem forte.<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 37
ESPAÇO MÁRIO RIBEIRO<br />
ILUSÕES<br />
À-TOA<br />
Há sinceridade<br />
nisso em tudo<br />
que se fala sobre<br />
uma vida comprometida<br />
com as posturas<br />
politicamente<br />
corretas e a verdade<br />
dos fatos? Não estaremos<br />
fantasiando a respeito<br />
de lealdade, de<br />
valores morais e éticos<br />
como nunca antes<br />
neste país e no<br />
mundo? Não estaríamos<br />
criando novas leis<br />
surgidas nas ruas para<br />
dissimular a velhacaria<br />
e a subversão de valores<br />
consagrados?<br />
Pode ser difícil responder<br />
perguntas co -<br />
mo essas que, em outros<br />
tempos, quan do<br />
havia os confessionários<br />
e os padres,<br />
diante de narrativas pecaminosas, gritavam<br />
“Absurdo!!!” ecoando pelas velhas catedrais.<br />
A tecnologia e a ciência têm nos surpreendido<br />
e encantado a ponto de a ética<br />
e a estética cairem na vala comum da mediocridade<br />
que domina escolas, partidos e<br />
meios de comunicação cada dia em busca<br />
de mascarar a realidade com apresentadores<br />
risonhos e felizes diante das câmeras.<br />
Os avanços atuais parecem ter desenvolvido<br />
e sofisticado a banalidade como marca<br />
de uma civilização incapaz de enxergar o<br />
óbvio ululante acentuado tempos atrás por<br />
Nélson Rodrigues. Considerado o maior reacionário<br />
de todos os tempos, Nélson era a<br />
38<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
voz solitária a escancarar o atraso do país<br />
envolto em filosofias retrógradas que ameaçavam<br />
nossa democracia.<br />
Na época, a palavra da moda era alienação,<br />
forma de tampar a realidade de<br />
que era preciso avançar em termos econômicos<br />
e políticos.<br />
E hoje parece vivermos em um tempo<br />
edulcorado por fantasias, enquanto cresce<br />
o drama da civilização fascinada por novidades<br />
tecnológicas em contraste à bagunça<br />
política de um mundo em guerra e<br />
à adoração aos bezerros de ouro da frivolidade<br />
e da liberdade sem compromisso.<br />
O CORAJOSO PONDÉ<br />
Luíz Felipe Pondé, que nos brinda toda<br />
segunda-feira com artigos na “Ilustrada”,<br />
acaba de lançar o livro “Filosofia para Corajosos”.<br />
Realmente é preciso coragem<br />
para ler a nova obra do Pondé, na qual o<br />
autor vai fundo ao dizer, entre outras preciosidades,<br />
que “coragem não é algo que<br />
se compra em free shop ou que “só se<br />
sabe o que é coragem quando se é corajoso”.<br />
E mais: “as visões materialistas levam<br />
mais pessoas a remédios ansiolíticos<br />
do que à coragem”. Enfim, um livro imperdível<br />
para quem ainda não entendeu o<br />
real significado da palavra coragem.<br />
QUAL É A GRAÇA,<br />
GUARDIOLA?<br />
Alguém já contou quantos canais de esporte<br />
existem hoje e quantos toques de<br />
bola um time gasta para entregar a bola ao<br />
adversário que, em contrapartida, gasta outro<br />
tanto de passes sem objetividade? Credite-se<br />
isso a Pepe Guardiola, técnico que<br />
inventou o futebol sem graça de toques e<br />
hoje sofre com atuações ridículas do Manchester<br />
Ciry, seu time atual. Bem feito!!!<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 39
A VIDA É BELA<br />
OS DOZE MELHORES<br />
LUGARES PARA ENCONTRAR<br />
O HOMEM DA SUA VIDA<br />
Adalberto Ferraz<br />
MATÉRIA PRIMA É UMA REVISTA MASCULINA, JÁ QUE 87% DOS SEUS LEITORES<br />
SÃO HOMENS. MAS VOCÊ PODE ESTAR ENTRE AS 13% E NÓS SABEMOS COMO<br />
É DIFÍCIL A VIDA DE UMA GAROTA EM BELO HORIZONTE, ONDE HÁ 150 MIL<br />
MULHERES DESACOMPANHADAS, SEGUNDO O IBGE. NUM GESTO DE<br />
COMPAIXÃO MOSTRAMOS ABAIXO ONDE VOCÊ SEMPRE PODERÁ NOS<br />
ENCONTRAR.<br />
1. PARTICIPE DE UMA TORCIDA<br />
ORGANIZADA.<br />
Sempre há muitos rapazes em torcida<br />
organizada já que a gente não sabe exatamente<br />
que tipo de pessoa você procura.<br />
Os homens mais barra pesadas estão na<br />
Galoucura. E na Máfia Azul. Mas se isso é<br />
demais, participe, então, da torcida de vôlei<br />
masculino do Minas ou do Cruzeiro.<br />
Mas muito cuidado, que há garotões que<br />
estão mais interessados nos rapazes em<br />
quadra do que no esporte, propriamente.<br />
2. VISITE UMA ACADEMIA DE ESCALADA.<br />
Este é o lugar para se encontrar alguém<br />
que ama o ar livre e tem o prazer de compartilhar<br />
contigo todas as paixões do montanhismo.<br />
Não se esqueça de como é<br />
montanhosa esta Belo Horizonte e dos<br />
enormes penhascos da Serra do Curral.<br />
40<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
SOLTEIRAS QUE<br />
NÃO GOSTAM DE<br />
FUTEBOL NÃO<br />
IMAGINAM O QUE<br />
ESTÃO<br />
PERDENDO; O<br />
MESMO VALE<br />
PARA ESPORTES<br />
RADICAIS<br />
3. UM JANTAR DE TRABALHO.<br />
Não defendemos a mistura de negócios<br />
com prazer, necessariamente. Mas, caso<br />
você encontre aquele bonitão do Departamento<br />
Jurídico numa reunião sobre<br />
marketing empresarial, nada impede que<br />
se inicie ali mesmo, uma discussão sobre<br />
estratégias comerciais.<br />
4. FAÇA UM MBA DEPOIS DO EXPEDIENTE<br />
Todo mundo sabe que um curso de especialização<br />
não é o lugar apenas para se<br />
aprender, mas, principalmente, para se fazer<br />
um indispensável network. Mesmo se<br />
você não conhecer ninguém, você estará<br />
aperfeiçoando seus conhecimentos, o que<br />
será muito útil mais pra frente.<br />
5. COMPRAS NO SUPERMERCADO.<br />
Todo mundo precisa se alimentar. E<br />
você sabe que quase todos os rapazes<br />
que moram sozinhos fazem suas próprias<br />
compras. Apenas mantenha seus olhos<br />
abertos e você se surpreenderá com o<br />
que vai aparecer na sua frente na seção<br />
de bebidas ou nos corredores de biscoitos<br />
e guloseimas.<br />
6. A LOJA DA APPLE.<br />
Esta é a loja dos grandes encontros.<br />
Indo para consertar o seu aparelho atual<br />
ou adquirir o novo iPhone ou Mac, a loja<br />
da Aple é um local para se fazer grandes<br />
colheitas.<br />
7. UMA VISITA AO HOSPITAL.<br />
Nós não estamos sugerindo que você<br />
simule uma lesão ou qualquer coisa pare -<br />
ci da. Mas da próxima vez que você visitar<br />
uma amiga doente, confira alguns dos mé-<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 41
DELICIOSAS<br />
SURPRESAS<br />
PODEM SER<br />
ENCONTRADAS<br />
ATRÁS DE UMA<br />
BANCA DE<br />
FRUTAS<br />
dicos perambulando pelas salas. Nada<br />
melhor do que um profissional médico<br />
em um casaco de médico para jogar sua<br />
pressão arterial lá nas grimpas. Pense em<br />
todas as brincadeiras de paciente-médico<br />
que você poderia jogar.<br />
9. APRENDA DANÇA DE SALÃO<br />
As pessoas que têm o hábito de dançar<br />
em salões apresentam uma mudança significativa<br />
de comportamento: menos timi-<br />
8. AULA NUMA ACADEMIA<br />
DE MUSCULAÇÃO<br />
Todos sabem que a academai é o último<br />
lugar do mundo onde onde as pessoas<br />
vão fazeer ginástica. Quem está à<br />
fim de perder calorias corre na avenida<br />
Bandeirantes e depois usa dos aparelhos<br />
da Praça JK, que são bons e gratuitos.<br />
Mas alí você não sabe com quem está falando.<br />
Nas academias você pode saber,<br />
com certeza se o gatão ali na esteira é o<br />
dono do superesportivo Mercedes SLK parado<br />
na porta.<br />
42<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
dez, mais confiança, mais vontade de encontrar<br />
os amigos e de sair para as baladas.<br />
O equilíbrio emocional, tão importante<br />
para emagrecer e manter o peso<br />
desejado é mais facilmente alcançado e<br />
se torna um fator decisivo para conquistar<br />
um corpo mais saudável.<br />
Caso você tenha encontrado o seu par<br />
dançar aumenta a frequência cardíaca,<br />
estimula à circulação do sangue, melhora<br />
a capacidade respiratória e queima muitas<br />
calorias. A dança de salão é essencialmente<br />
uma atividade social e provoca uma<br />
sensação de bem-estar psicológico. Permite<br />
a troca de experiências, estimula o<br />
diálogo e aumenta a motivação.<br />
10. VOLUNTÁRIO EM ORGANIZAÇÕES<br />
SOCIAL<br />
Em primeiro lugar, você estará ajudando<br />
sua comunidade ou, no mínimo a humanidade.<br />
É local para se conhecer mentes apaixonadas.<br />
Mas certifique-se bem de onde<br />
você vai trabalhar. Em nenhuma hipóteses<br />
aceite uma vaga num hospital na frente de<br />
batalha dos rebeldes na Síria.<br />
Quem realiza pelo menos quatro horas<br />
de trabalho voluntário por mês tem dez<br />
vezes mais chances de ter uma boa saúde<br />
do que quem não voluntaria. E claro, você<br />
pode encontrar ali o seu par perfeito.<br />
11. UM BAR ESPORTIVO<br />
Por que assistir o seu jogo favorito em<br />
casa sozinha, quando você pode compartilhá-lo<br />
com a galera que torce pelo seu<br />
clube. Nem todos os bares são desconfortáveis,<br />
como o Bar do Salomão, que<br />
não passa de uma calçada não muito distante<br />
numa região perigosíssima tanto<br />
para o seu carro quanto para você mesma.<br />
Mas não se preocupe com a forma e nem<br />
com o conteúdo do local.<br />
12. EXCURSÃO NO TREM PARA<br />
MACHU PICHU.<br />
Dê uma chance parra o inesperado. Tá<br />
certo, a viagem é absolutamente desconfortável.<br />
Mas convide aquele garoto que<br />
você conheceu no show do Black Sabatth<br />
para uma viagem aos Andes. Pode ser o<br />
início de uma grande e inesquecível. Mas<br />
não se esqueça: a volta é de avião, alegue<br />
compromissos no trabalho, pois você está<br />
apenas a fim de um namorado, e não desesperada.<br />
O AMOR DA SUA<br />
VIDA PODE ESTAR<br />
NA CADEIRA AO<br />
LADO NUM<br />
CURSO DE MBA<br />
ECONOMIA │ POLÍTICA │ ESPORTES │ HUMOR │ CULTURA 43
PALAVRA DO LEITOR<br />
MATÉRIAPRIMA É A MATÉRIA PRIMA<br />
Amigos, essa revista é a própria matéria<br />
prima. Parabéns!<br />
E a matéria sobre o serviço de hemodiálise<br />
do Mater Dei é primorosa. Que todos<br />
nós possamos, se necessário, nos<br />
beneficiar dessa tecnologia que domina<br />
o setor de assistência à saúde!<br />
Abração e obrigado.<br />
WASHINGTON MELLO/<br />
BH-MG<br />
CASAMENTO É PIOR QUE A MORTE<br />
Vocês perguntaram a muitos figurões<br />
sobre o que eles aprenderam em 2016.<br />
Nada me perguntaram, mas vou responder<br />
assim mesmo. Descobri que a morte<br />
é a morte e acabou-se; o casamento é<br />
mais cruel: é como uma doença. Daí a<br />
expressão “contrair matrimônio”. Estar<br />
casado é uma condição que se contrai,<br />
como um vírus. O fato de o Código Penal<br />
de alguns países prever a condenação à<br />
pena de morte, mas não a condenação<br />
ao casamento, tem intrigado as pessoas<br />
casadas de vários tempos e lugares.<br />
Creio que o celibato dos padres tem<br />
como objetivo fazer com que a instituição<br />
do casamento perdure: se os sacerdotes<br />
soubessem o que o casamento é, sendo homens<br />
de Deus não teriam coragem de infligir<br />
o mesmo castigo a outro ser humano.<br />
JOSÉ RONALDO MARTINS<br />
CARVALHO/<br />
BH-MG<br />
NADA É TÃO RUIM QUE NÃO POSSA<br />
PIORAR<br />
Sei que minha opinião não é importante<br />
para vocês, mas quero listar o que<br />
aprendi em 2016.<br />
1. A minha necessidade de arranjar um<br />
emprego está muito acima das minhas<br />
possibilidades. É possível que a minha<br />
necessidade de comer também esteja.<br />
2. O governo fala que a única saída<br />
para o país será a austeridade. No entanto,<br />
não se pode dizer que a alternativa<br />
à austeridade é o caos, uma vez que a<br />
austeridade já é o caos. Desemprego galopante,<br />
espiral recessiva, legislação ilegal.<br />
O caos não tem nada para nos oferecer.<br />
3. O ideal seria que todos os estabelecimentos<br />
comerciais brasileiros tivesse a<br />
palavra “banco” escrito no nome. Por<br />
exemplo: “Padaria Banco Pão Quente”,<br />
ou “Sapataria Banco Calce bem”. Nenhum<br />
negócio iria à falência, porque o<br />
Estado acudiria a todos.<br />
4. O Brasil é um país católico e, dificilmente<br />
haverá país que viva mais de<br />
acordo com a lei de Cristo do que o<br />
nosso: estamos nos despojando dos bens<br />
materiais e abdicando da riqueza. Se os<br />
países morressem (e acho que não estejamos<br />
longe do pé na cova), o Brasil seria<br />
certamente dos que iriam para o céu.<br />
5. É difícil entender o que brasileiro<br />
quer. Há uns anos, a palavra de ordem<br />
era “Basta de salários de miséria!” Agora<br />
é “Deixem os nossos salários de miséria<br />
como estão!”<br />
MARCUS OTÁVIO LIMA/BH-MG<br />
UMA COISA QUE APRENDI SOBRE A FAMA<br />
Na edição de novembro do ano passado,<br />
o colunista João Paulo Coltrane,<br />
respondendo a carta do leitor Ernesto<br />
Silva Faria (BH), afirmou que a explicação<br />
pelo fato de ninguém, com um mínimo<br />
de massa cefálica, elogiar o infatigável<br />
Paulo Coelho, estava na página<br />
582 do Aurélio. Na definição, o dicionário<br />
fala de “inveja”.<br />
Se verificasse a página 2344, do<br />
Houaiss, JPC iria encontrar uma explicação<br />
mais apropriada: “qualidade”.<br />
44<br />
FEVEREIRO DE 2017 • MATERIAPRIMAREVISTA.COM.BR
Só para ficar num exemplo: um poeta<br />
que o jornalista deve ter lido em algum<br />
momento da vida, Carlos Drummond de<br />
Andrade, no auge de sua fama (escrevia<br />
três vezes por semana uma coluna no<br />
imprescindível Jornal do Brasil), não emplacava<br />
mais de três mil exemplares de<br />
tiragem em seus livros.<br />
Isso diminui o poeta? Se diminui,<br />
tendo em vista as milhões de cópias alcançadas<br />
pelo ex-letrista de Raulzito, estão<br />
tá. Vamos de Lair Ribeiro mesmo.<br />
ANTONIO MARIA DE OLIVEIRA/<br />
BH-MG<br />
PAULO COELHO E CARLOS DRUMOND DE ANDRADE.<br />
NÚMEROS NÃO SÃO TUDO.<br />
ODEIO A PAIXÃO DOS JORNALISTAS<br />
PELAS REDES SOCIAIS<br />
Há vários motivos para abominar jornalistas<br />
e o mais recente talvez seja a admiração<br />
que vocês dedicam às chamadas<br />
redes sociais. Tudo o que se diz nas<br />
redes sociais é notável, ao contrário do<br />
que se diz nos botequins como naquele<br />
em que bebo depois do expediente.<br />
As pessoas também dizem coisas em<br />
botequins. Normalmente, as mesmas<br />
coisas que se dizem nas redes sociais, o<br />
que é curioso. No entanto, os jornalistas<br />
nunca repercutem o que se fala nos botequins.<br />
Nunca noticiaram: “Tal caso está<br />
gerando a maior polêmica nos botequins”.<br />
Talvez porque seja impossível saber<br />
o que se diz em todos os bares da<br />
cidade. No entanto, também há milhares<br />
de milhões de usuários de redes sociais,<br />
pelo que custa a crer que seja possível<br />
saber qual é a opinião das redes sociais.<br />
Em princípio, estão lá todas as opiniões<br />
possíveis. Provavelmente por razões<br />
de deslumbramento tecnológico, atitudes<br />
de botequins, quando tomadas em redes<br />
sociais, ganham, para os jornalistas, outra<br />
credibilidade. Digo que são atitudes de<br />
botequins porque, tal como no bares, nas<br />
redes sociais também não há conversas<br />
em voz baixa – circunstância que os próprios<br />
jornalistas reconhecem.<br />
Como frequentador da noite, exijo que<br />
a nossa opinião seja respeitada.<br />
CARLOS HEITOR MACHADO/<br />
BH-MG<br />
OS ROMANOS INVENTARAM A MENTIRA<br />
Nesta edição (dezembro de 2016) nós<br />
descobrimos porque os romanos tiveram<br />
tanto poder. Mesmo que não saibam,<br />
nossos marqueteiros são discípulos de<br />
Quinto!!! A picardia é o molho da política,<br />
desde eras remotas. É por isso que<br />
o Poder não tem amigos!<br />
Boas festas e fecundo 2017!<br />
JOSÉ CARLOS CARVALHO/BH-MG<br />
NÃO HÁ NADA MAIS A CORTAR. A NÃO<br />
SER OS PULSOS<br />
Não entendo nada de economia, mas<br />
depois de tantos aumentos nas coisas<br />
que temos que pagar, e nos cortes no que<br />
temos que fazer, imagino que o próximo<br />
(e último) corte a fazer será nos pulsos.<br />
RADAMÉS CAVALCANTI/<br />
ARAÇUAÍ-MG<br />
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