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Revista Dr Plinio 167

Fevereiro de 2012

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O pensamento filosófico de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

Dos vikings dos antigos tempos, daquelas tribos com<br />

duzentos, quinhentos homens no máximo, que se aventuravam<br />

em frotas de barcos magníficos, com aquela quilha<br />

parecida com o pescoço do cisne, que vem para trás<br />

e se joga para frente. Tinham ao mesmo tempo a elegância<br />

do pescoço do cisne e a agressividade do bico de uma<br />

águia.<br />

Quinhentos homens utilizavam aproximadamente<br />

cem barquinhos. Eles se chamavam reis do mar, porque<br />

era o reino inteiro que viajava. Enquanto as mulheres<br />

ficavam numa ilha ou num lugar qualquer onde<br />

não pudessem ser atacadas, os homens singravam os<br />

mares para descobrir terras novas a fim de levar as famílias;<br />

ou iam simplesmente à pesca de baleias, arenques<br />

e outros bichos para se alimentarem durante o<br />

inverno.<br />

Podemos imaginar como eles viajavam. Nas horas<br />

de perigo, todos com escudos encostados uns nos outros,<br />

fazendo um paredão de um lado e do outro, com<br />

a mão esquerda seguravam o escudo e com a direita a<br />

lança em ponta, e cantando canções “pré-wagnerianas”.<br />

Depois de uma navegação arriscada, entravam por um<br />

fiorde escarpado da Noruega ou um porto brumoso da<br />

Inglaterra ou, indo mais além, chegavam até a Islândia,<br />

a qual representava já algo do mundo novo que se tratava<br />

de atingir.<br />

Que série de embarcações maravilhosas! Entretanto,<br />

quanta outra coisa se poderia dizer sobre navios!<br />

Veneza, a feérica, perdeu o império<br />

comercial dos mares...<br />

Minha imaginação se reporta a outro quadro completamente<br />

diferente.<br />

Ancien Régime 1 : delicadezas, reverências, elegâncias.<br />

Uma cidade à beira-mar. De noite, brilham luzes e fogos;<br />

de vez em quando, cravados no fundo do mar, uns espetos<br />

com lanternas. É Veneza, a feérica!<br />

Na cidade há uma expectativa geral. De longe, ao<br />

mar, ouve-se uma música de Vivaldi; depois se veem<br />

as luzes e se percebem as flores, das quais se sentem<br />

os perfumes; escutam-se as batidas suaves dos remos: é<br />

uma nau toda dourada, com as elegâncias do estilo do<br />

Ancien Régime; na frente, uma figura alta, com um barrete<br />

frígio, com aquela parte voltada para a frente, e todo<br />

vestido com um traje de cor bordô profundo e que<br />

olha como um rei.<br />

É o Doge de Veneza, que volta na sua famosa nau de<br />

gala, o Bucentauro, da festa dos desponsórios de Veneza<br />

com o mar. Para realizar esses desponsórios, à tarde<br />

miríades de gôndolas saem, cujos gondoleiros tocam violinos<br />

e cantam festivamente; e o Bucentauro com o famoso<br />

conselho dos dez, tendo o Doge, à frente, homens<br />

e damas de sua corte, ao som de músicas. Vão até alto-<br />

-mar do Adriático e, no momento solene, todos param,<br />

os remos se levantam. Expectativa geral. O Doge toma,<br />

de um escrínio precioso, um precioso anel e o joga no<br />

fundo do mar: é o casamento, os desponsórios de Veneza<br />

com o mar!<br />

Isso afirmava outrora o poder de Veneza sobre o Adriático<br />

e o Mediterrâneo; posteriormente houve a Veneza<br />

de Marco Polo, que mandava homens ir a pé até a China<br />

e, quando voltavam, contavam o que viram.<br />

Mas depois uma nação espalhou em Veneza a desolação.<br />

Barcos dessa nação atracaram em Veneza e deles<br />

desceram homens altos e bem largos, robustos, olhos<br />

e cabelos pretos, pele clara, passo firme, decidido, falar<br />

cantante e franco. Mostravam especiarias, dizendo: “Todas<br />

essas coisas procedem do Oriente. Nós as trouxemos<br />

por mar! Demos a volta à África, pelo Cabo da Boa Esperança!”<br />

Contam os historiadores que os nossos ancestrais<br />

portugueses puseram à venda as mercadorias que eles<br />

traziam – pimenta, cravo, canela, açúcar, baunilha – a<br />

preço de arrebentar o varejo veneziano. Era a prova<br />

de que o domínio das especiarias pertencia a Portugal.<br />

Não se vinha mais por terra, mas por água. Portugal tinha<br />

rasgado o monopólio veneziano e, como também a<br />

Espanha faria depois, inundou a Europa com as especiarias.<br />

Houve, então, dias inteiros de pranto e consternação<br />

em Veneza.<br />

...mas ganhou o império da beleza<br />

Não conheço a História de Veneza nos seus pormenores,<br />

mas foi com certeza nessa circunstância que se deu<br />

uma revelação para Veneza; ela perdeu o império comercial<br />

dos mares, mas não tinha percebido que ganhara<br />

um império muito mais precioso: o da beleza.<br />

Veneza aproveitara o tempo de sua riqueza para se<br />

encher de palácios, de obras-primas imortais e para tornar-se<br />

umas das cidades mais belas e talvez a mais original<br />

de todo o universo. E quando ela começou a decair<br />

comercialmente, as nações, inconsoláveis pela sua decadência,<br />

começaram a visitar a feérica moribunda que<br />

ia expirando. E todos lhe traziam a sua contribuição, o<br />

tributo de sua admiração: o ouro do turismo que começava.<br />

Veneza foi, talvez, o primeiro centro internacional<br />

de verdadeiro turismo. O mundo inteiro se encantava<br />

e lá gastava dinheiro, pois não queria que Veneza<br />

morresse!<br />

Então Veneza compreendeu que, continuando a vida<br />

de luxo, de festa, de arte, prolongava sua própria vida; e<br />

que ela estava casada com o pulchrum, possuía uma be-<br />

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