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Observatório do Analista em Revista - 6 Edição

Revista do colaborativa dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil

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Editorial<br />

O <strong>em</strong>buste<br />

Texto: João Jaques Silveira Pena / Fotos: Ricar<strong>do</strong> Pessetti<br />

Não é um fenômeno social<br />

novo, muito menos inusita<strong>do</strong>,<br />

mas com o ingresso de<br />

milhões de brasileiros no<br />

merca<strong>do</strong> consumi<strong>do</strong>r durante<br />

os anos 2000 ficou<br />

mais evidente: a sociedade moderna<br />

padece <strong>do</strong> mal da aparência, para a<br />

qual vive, se esforça e se consome. Essa<br />

vida estilo “Big Brother”, suposta superexposição<br />

da realidade, acaba por<br />

produzir pessoas carentes de valores e<br />

princípios morais clássicos, substituí<strong>do</strong>s<br />

pela ânsia de impressionar, de ser único,<br />

ser insubstituível não pelo que se é, mas<br />

pelo que se ostenta. Somente diante<br />

desse contexto global pod<strong>em</strong>os compreender<br />

os motivos não confessa<strong>do</strong>s<br />

que produziram parte <strong>do</strong>s artigos <strong>do</strong><br />

Projeto de Lei nº 5.864/2016 que dispõe<br />

sobre a carreira específica <strong>do</strong>s cargos<br />

de nível superior da Receita Federal<br />

<strong>do</strong> Brasil.<br />

No s<strong>em</strong>inário Esta<strong>do</strong>, Serviço Público e<br />

Administração Tributária no Brasil, tiv<strong>em</strong>os<br />

a oportunidade de perguntar ao<br />

Coordena<strong>do</strong>r Geral de Planejamento,<br />

Organização e Avaliação Institucional<br />

(COPAV) Sérgio Luiz Messias de Lima<br />

quais eram os próximos passos para a<br />

melhoria <strong>do</strong>s processos de trabalho e<br />

ganho de eficiência da RFB à luz da<br />

gestão por competências e gestão por<br />

processos que parecia estar sen<strong>do</strong> aplicada<br />

no âmbito <strong>do</strong> órgão. A impressão<br />

que passou acaba ganhan<strong>do</strong> contornos<br />

mais claros com o PL 5.864/2016, a<br />

A Receita Federal deveria<br />

estar <strong>em</strong>penhada <strong>em</strong><br />

ganhar eficiência<br />

interna e promover a<br />

melhor distribuição da<br />

carga tributária<br />

cultura interna promove a estagnação e<br />

volta ao passa<strong>do</strong>.<br />

Em to<strong>do</strong> o Mun<strong>do</strong>, os fiscos buscam<br />

abrandar a imag<strong>em</strong> de algoz estatal<br />

para alcançar o papel de colabora<strong>do</strong>r,<br />

<strong>do</strong> órgão que atua para prover o<br />

Esta<strong>do</strong> de recursos para suas atividades<br />

mas que auxilia o contribuinte a exercer<br />

seu papel de forma espontânea. Em<br />

meio a grave crise econômica o Brasil<br />

parece querer seguir caminho inverso.<br />

As mostras de modernização da gestão<br />

com os projetos de Gestão por Pessoas<br />

e a melhoria <strong>do</strong>s processos de trabalho<br />

(um ensaio para a Gestão por Procesos)<br />

parec<strong>em</strong> ter si<strong>do</strong> esquecidas. A<br />

opção noticiada pela imprensa passa<br />

pelo aumento de impostos e, com o PL<br />

5.864/2016, pelo aguçamento das garras<br />

<strong>do</strong> Leão com o <strong>em</strong>poderamento <strong>do</strong><br />

cargo de Auditor-Fiscal.<br />

Se o consumismo é estimula<strong>do</strong> incessant<strong>em</strong>ente<br />

pelos meios de comunicação,<br />

a busca pelo <strong>em</strong>poderamento de cargos<br />

públicos notadamente técnicos, t<strong>em</strong><br />

orig<strong>em</strong> na falta de visão coletiva <strong>do</strong>s<br />

servi<strong>do</strong>res e suas representações sindicais,<br />

que não consegu<strong>em</strong> enxergar seu<br />

papel e muito menos sua importância<br />

na complexa máquina pública brasileira.<br />

Assim, o que importa é a diferenciação<br />

de outros cargos, mesmo que não se<br />

saiba qual o efeito prático da titulação<br />

requerida.<br />

No caso <strong>do</strong> PL 5.864/2016, essa distinção<br />

se aplica inclusive entre os cargos<br />

da carreira específica, cujo nome pretende<br />

alterar para Tributária e Aduaneira<br />

da Receita Federal <strong>do</strong> Brasil. Dos <strong>do</strong>is<br />

cargos de nível superior nela presentes,<br />

destaca-se o cargo de Auditor-Fiscal<br />

como autoridade tributária e aduaneira<br />

da União Federal que exerce atividade<br />

essencial e exclusiva de Esta<strong>do</strong> e nada<br />

diz quanto aos <strong>Analista</strong>s-Tributários. Estaria<br />

o Projeto sugerin<strong>do</strong> retirar as atividades<br />

atribuídas ao <strong>Analista</strong> das que são<br />

essenciais e exclusivas de Esta<strong>do</strong>? Pelo<br />

absur<strong>do</strong> que seria a resposta positiva,<br />

percebe-se que a intenção foi apenas<br />

o de destacar e colocar <strong>em</strong> evidência<br />

um <strong>do</strong>s cargos da carreira <strong>em</strong> detrimento<br />

da própria lógica de valorização da<br />

carreira. “Vaidade de vaidades! Tu<strong>do</strong> é<br />

vaidade”.<br />

Teoricamente, seja na visão naturalista<br />

seja na contratualista, autoridade estatal<br />

é a força cogente que t<strong>em</strong> o fim<br />

de fazer valer as normas e os fins <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>.<br />

Na visão corporativista a<strong>do</strong>tada<br />

no PL, ass<strong>em</strong>elha-se a título de nobreza<br />

conferi<strong>do</strong> a um cargo, um status público<br />

s<strong>em</strong> finalidade outra senão destacar,<br />

dar notoriedade. Contu<strong>do</strong>, a leitura de<br />

outros trechos da proposta denunciam<br />

que não é só uma questão de status,<br />

mas real <strong>em</strong>poderamento ou mesmo blindag<strong>em</strong><br />

<strong>do</strong> cargo.<br />

Nesse viés, prerrogativas inerentes às<br />

atividades da RFB como livre ingresso e<br />

trânsito <strong>em</strong> qualquer tipo de estabelecimento<br />

quan<strong>do</strong> somadas à liberdade de<br />

convencimento individual da complexa<br />

e conturbada legislação tributária<br />

(quantos entendimentos ter<strong>em</strong>os?), prisão<br />

especial etc. tornam-se o arcabouço<br />

da satisfação de anseios individuais<br />

que não se comunica com o interesse<br />

público.<br />

Diante da grave crise econômica pela<br />

qual passamos, a Receita Federal <strong>do</strong><br />

Brasil deveria estar <strong>em</strong>penhada <strong>em</strong><br />

ganhar eficiência interna e promover a<br />

melhor distribuição da carga tributária<br />

(hoje suportada indistintamente por to<strong>do</strong>s<br />

de forma regressiva – relativamente,<br />

os mais pobres pagam mais) que possibilitasse<br />

real crescimento da arrecadação<br />

mas com a promoção da Justiça<br />

Fiscal para a população (qu<strong>em</strong> ganha<br />

mais, paga mais) e diminuin<strong>do</strong> a sensação<br />

de confisco que cresce a cada<br />

dia.<br />

Não será com a volta <strong>do</strong>s príncipes da<br />

república* que alcançar<strong>em</strong>os isso! As<br />

proposta anunciadas <strong>em</strong> nada contribu<strong>em</strong><br />

para a fomentação <strong>do</strong> engajamento,<br />

da colaboração e motivação<br />

<strong>do</strong> corpo técnico da carreira <strong>do</strong>s cargos<br />

de nível superior da RFB. Assim não<br />

haverá qualquer inovação e melhoria<br />

nos processos e a promoção da eficiência<br />

<strong>do</strong> órgão e de alterações normativas<br />

que conduzam à simplificação<br />

<strong>do</strong> sist<strong>em</strong>a tributário e promoção da<br />

Justiça Fiscal.Por fim, <strong>em</strong>bora não seja a<br />

primeira investida nesse senti<strong>do</strong> (todas<br />

rejeitadas, por sinal), essas alterações<br />

têm chance de prosperar pois estão<br />

apresentadas como medidas necessárias<br />

para a retomada <strong>do</strong> crescimento<br />

da arrecadação federal. Portanto, hão<br />

de ser provadas e, como está escrito, a<br />

qu<strong>em</strong> muito é da<strong>do</strong>, muito é cobra<strong>do</strong>.<br />

Só esperamos que, quan<strong>do</strong> o r<strong>em</strong>édio<br />

não fizer efeito, o paciente tenha vin<strong>do</strong><br />

a óbito.

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