21.08.2016 Views

Observatório do Analista em Revista - 6 Edição

Revista do colaborativa dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil

Revista do colaborativa dos Analistas-Tributários da Receita Federal do Brasil

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Servi<strong>do</strong>r público é toda pessoa que t<strong>em</strong> vínculo <strong>em</strong>pregatício com o poder público.<br />

Essa é a definição corriqueira que se encontra nos manuais de concurso público Brasil<br />

afora. É o que diz o Wikipédia. É o que consta na maioria <strong>do</strong>s artigos que tratam <strong>do</strong><br />

t<strong>em</strong>a. É o que está assimila<strong>do</strong> pelos servi<strong>do</strong>res públicos. É a resposta que será exigida<br />

de um candidato a servi<strong>do</strong>r. Mas é uma resposta limitante: não satisfaz o conceito<br />

de servir ao público, <strong>em</strong>bora retrate a cultura atual <strong>do</strong> funcionalismo público, onde o<br />

interesse pessoal v<strong>em</strong> se sobrepon<strong>do</strong> ao interesse público e ao interesse nacional. É<br />

colocan<strong>do</strong> o de<strong>do</strong> nessa ferida que o jornalista econômico Luís Nassif avalia o serviço público no<br />

Brasil, o perfil <strong>do</strong>s servi<strong>do</strong>res, e ainda dá uma pincelada no sist<strong>em</strong>a tributário. A entrevista que Luís<br />

Nassif concedeu ao <strong>Observatório</strong> <strong>do</strong> <strong>Analista</strong> seria de 40 minutos. Mas o bate-papo rendeu, e o<br />

resulta<strong>do</strong> foi duas horas de uma conversa cujos principais trechos você confere a seguir.<br />

Entrevista<br />

Luís Nassif<br />

De olho nos interesses nacionais<br />

Entrevista: <strong>Observatório</strong> <strong>do</strong> <strong>Analista</strong> / Fotos: Ricar<strong>do</strong> Pessetti<br />

<strong>Observatório</strong> <strong>do</strong> <strong>Analista</strong> – Vamos começar<br />

falan<strong>do</strong> sobre o papel das instituições<br />

públicas brasileiras. Como elas<br />

atuam para o desenvolvimento <strong>do</strong> país?<br />

Luís Nassif - Se a gente for pegar o desenvolvimento<br />

brasileiro no Século XX,<br />

ele foi toca<strong>do</strong> fundamentalmente por<br />

funcionários públicos. Desde o início,<br />

com o Código de Águas1. Os grandes<br />

negocia<strong>do</strong>res internacionais eram os<br />

diploma<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Itamaraty. Os grandes<br />

planos econômicos que se tentou na<br />

época, já tinha o Banco <strong>do</strong> Brasil atuan<strong>do</strong>.<br />

Nos anos 50 chega o BNDES.<br />

Tínhamos o funcionário com a visão <strong>do</strong><br />

serviço público como instrumento de<br />

desenvolvimento. Isso aí se perdeu <strong>em</strong><br />

algum momento. Saímos <strong>do</strong> Regime Militar,<br />

<strong>em</strong> que havia muita força para o<br />

funcionário público, e caímos num perío<strong>do</strong><br />

de descrédito <strong>do</strong> serviço público.<br />

No t<strong>em</strong>po <strong>do</strong> Fernan<strong>do</strong> Henrique Car<strong>do</strong>so<br />

passa aquela percepção de que<br />

o desenvolvimento se daria a partir <strong>do</strong><br />

merca<strong>do</strong>. Com a chegada <strong>do</strong> Lula e<br />

no perío<strong>do</strong> de bonança que teve nas<br />

contas públicas, você recompõe o serviço<br />

público. Mas <strong>em</strong> algum momento<br />

você quebrou a correia de transmissão<br />

geracional, desenvolvimentista. Mesmo<br />

o Ministério Público, que não é necessariamente<br />

desenvolvimentista. Ele teve<br />

nos anos 90 aquela visão de direitos<br />

humanos, direitos difusos. Hoje t<strong>em</strong> uma<br />

visão penalista rasteira. A própria Receita:<br />

você cria uma elite (digamos assim)<br />

<strong>do</strong>s novos concursa<strong>do</strong>s que chegam<br />

s<strong>em</strong> aquela gana <strong>do</strong> <strong>em</strong>preende<strong>do</strong>rismo<br />

público, que é um ponto central.<br />

“Nos Esta<strong>do</strong>s<br />

Uni<strong>do</strong>s há uma<br />

noção muito clara<br />

<strong>do</strong> que perpassa o<br />

serviço público,o<br />

que é interesse<br />

nacional.”<br />

OA - É um probl<strong>em</strong>a apenas no Brasil?<br />

Nassif - Não, é uma visão subdesenvolvida.<br />

Nos Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s há uma noção<br />

muito clara <strong>do</strong> que perpassa o serviço<br />

público, o que é interesse nacional. O<br />

interesse nacional não é o Esta<strong>do</strong> se<br />

sobrepon<strong>do</strong> ao país, mas é o Esta<strong>do</strong><br />

como agente estimula<strong>do</strong>r de desenvolvimento.<br />

O servi<strong>do</strong>r público se vê como<br />

agente <strong>do</strong> desenvolvimento nacional.<br />

OA - Isso se relaciona com o neoliberalismo?<br />

Nassif – Sim. Mas t<strong>em</strong> outro aspecto. T<strong>em</strong><br />

a financeirização, t<strong>em</strong> os merca<strong>do</strong>s se<br />

interligan<strong>do</strong>, uma ideologia que é considerar<br />

que interesse nacional é algo<br />

supera<strong>do</strong>. Aqui é curioso por que você<br />

teve, na gestão Fernan<strong>do</strong> Henrique Car<strong>do</strong>so<br />

essa ideologia muito forte, muito<br />

rasteira, de que tu<strong>do</strong> que v<strong>em</strong> <strong>do</strong> Brasil<br />

é anacrônico. Quan<strong>do</strong> entra o governo<br />

Lula, de alguma maneira você recria o<br />

conceito <strong>do</strong> interesse nacional com muitas<br />

concessões para área financeira e<br />

tu<strong>do</strong>. Mas você traz, à medida <strong>em</strong> que<br />

a globalização avança e a classe média<br />

passa a ter acesso a estu<strong>do</strong> lá fora,<br />

você cria uma ideologia nessa classe<br />

média que “pega” to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

OA – Como as <strong>em</strong>presas são vistas neste<br />

cenário?<br />

Nassif - Escrevi recent<strong>em</strong>ente que você<br />

não vê a <strong>em</strong>presa como ativo nacional.<br />

A Receita Federal, grande parte de lá,<br />

vê a <strong>em</strong>presa um local onde os caras<br />

faz<strong>em</strong> um monte de sacanag<strong>em</strong>. É a visão<br />

policialesca. O Ministério Público,<br />

com a Lava a Jato! Então você criou um<br />

probl<strong>em</strong>a sério que são algumas corporações<br />

dentro <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> com poder de<br />

Esta<strong>do</strong> e s<strong>em</strong> nenhuma noção sobre o<br />

que é interesse nacional. Não considera<br />

as <strong>em</strong>presas, ou o <strong>em</strong>prego <strong>do</strong> setor<br />

priva<strong>do</strong>.<br />

OA - Mas também não é algo generaliza<strong>do</strong>.<br />

Há <strong>em</strong>presas que são tomadas<br />

como inimigas e há <strong>em</strong>presas que não.<br />

Nassif - Teve aqui nessa história da Lava<br />

a Jato uma questão de postura partidária<br />

também, “essa <strong>em</strong>presa apoiava o<br />

PT”. Teve uma cooperação internacional.<br />

Os EUA, que são mestres na geopolítica,<br />

usaram a cooperação internacional<br />

para quebrar a perna de <strong>em</strong>presas<br />

brasileiras que disputavam lá fora. E o<br />

Ministério Público entrou de cabeça. As<br />

<strong>em</strong>presas que se internacionalizam receb<strong>em</strong><br />

apoio pesa<strong>do</strong> <strong>do</strong> governo, se for<br />

um país d<strong>em</strong>ocrático de parti<strong>do</strong>s políticos,<br />

e t<strong>em</strong> a contrapartida.<br />

OA - As instituições são formadas por<br />

pessoas com suas crenças, ideologias<br />

15

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!