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No coracao do mar - Charlotte Rogan

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Olhei para Hardie a fim de avaliar sua reação, mas ele observava<br />

atentamente a linha da tempestade.<br />

— É verdade, Sr. Hardie? — gritou o coronel Marsh.<br />

O olhar de Hardie varreu nossos rostos ergui<strong>do</strong>s como a luz de um farol.<br />

— Sim, é verdade. A não ser que prefiram se afogar.<br />

Suas palavras tiveram o mesmo efeito de uma porta que se abrisse para uma<br />

fera enjaulada, e no momento em que a fera foi solta entre nós, consegui<br />

respirar de novo.<br />

— É verdade — concordei, tomada por uma calma glacial.<br />

Meu temor desaparecera por completo. Eu era como um homem de negócios<br />

avalian<strong>do</strong> as opções de investimento com base em um livro-razão cheio de<br />

números e probabilidades.<br />

Mary Ann parecia horrorizada.<br />

— Pular <strong>do</strong> barco? — perguntou ela. — De propósito?<br />

— Claro que de propósito!<br />

Eu não tinha intenção de gritar com ela, mas de repente não me pareceu que<br />

esse gesto de sacrifício envolvesse morte, mas vida. Não me ocorreu que eu<br />

poderia precisar me sacrificar. Até a desgraça de meu pai, as portas se abriam<br />

para mim e refeições me eram servidas por jovens lindas como Mary Ann. Ela<br />

deve ter percebi<strong>do</strong> alguma coisa, pois seu rosto se contraiu em uma expressão de<br />

me<strong>do</strong> e desprezo.<br />

Em minha opinião, uma pessoa fraca como Mary Ann ou Maria seria a<br />

escolha óbvia, mas quan<strong>do</strong> um <strong>do</strong>s homens — seria o Sr. Nilsson? — ressaltou<br />

que naquelas circunstâncias os homens eram mais úteis <strong>do</strong> que as mulheres e<br />

que, se alguém deveria se sacrificar, que fosse uma mulher, fiquei horrorizada.<br />

De certa forma, no entanto, eu concordava com ele. Talvez contestássemos tanto<br />

essa ideia porque era justa. Quan<strong>do</strong> Mary Ann caiu sobre mim em um<br />

semidesmaio, afastei seu cabelo e sussurrei em seu ouvi<strong>do</strong>:<br />

— Por que não, Mary Ann? Você se pouparia muito sofrimento jogan<strong>do</strong>-se no<br />

<strong>mar</strong>. Você não sobreviverá mesmo, e dizem que morrer por afogamento é muito<br />

melhor <strong>do</strong> que de fome ou sede.<br />

Devo ser criticada por isso? Não pedimos que certas ideias invadam nossas<br />

mentes nem que outras se mantenham afastadas. Acredito que as pessoas sejam<br />

responsáveis por seus atos, mas não pelo conteú<strong>do</strong> de sua mente, então talvez eu<br />

seja culpada por deixar, vez ou outra, que essas ideias se transformem em<br />

palavras. O que posso dizer é que não pedi para Mary Ann sentar-se a meu la<strong>do</strong>.<br />

Fui a primeira a quem ela dirigiu-se com lamúrias e reclamações. E naquele<br />

momento, quan<strong>do</strong> despertou de seu quase desmaio, ela disse que tivera um sonho<br />

muito vívi<strong>do</strong>, em que salvava a to<strong>do</strong>s atiran<strong>do</strong>-se no oceano.<br />

— Dez minutos! — anunciou o Sr. Hardie.<br />

Contei sessenta segun<strong>do</strong>s e falei “<strong>No</strong>ve”, mais para mim mesma <strong>do</strong> que para

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