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No coracao do mar - Charlotte Rogan

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mas de novo ela emergiu da água azul-escura quase preta, e lembro-me de seus<br />

olhos suplicantes que pareciam fixar-se diretamente nos meus.<br />

— Façam alguma coisa! — gritei.<br />

Em seu depoimento, Hannah sustentou que ela e a Sra. McCain foram as<br />

únicas que insistiram para que Hardie fizesse alguma coisa e que eu me limitara<br />

a observar passivamente, o que prova que ela não estava tão atenta quanto<br />

afirma.<br />

O Sr. Hardie estava de pé na popa <strong>do</strong> barco, contra um fun<strong>do</strong> de nuvens<br />

empalidecidas pelo sol semiencoberto. A água escura cobria Rebecca até o nariz.<br />

Mechas de seus cabelos moviam-se como enguias pretas diante de seus olhos, e<br />

suas mãos muito alvas agarravam o ar, imploran<strong>do</strong> por ajuda.<br />

— Sentem-se! — ordenou Hardie.<br />

Hannah, depois de quase ter caí<strong>do</strong> no <strong>mar</strong>, resolveu obedecer, e ao menos<br />

uma vez na vida se manteve calada, enquanto eu perguntava, aos gritos:<br />

— Ninguém vai ajudá-la?<br />

Dois homens levantaram-se e fizeram menção de lançar a boia salva-vidas<br />

para Rebecca. O barco balançava para to<strong>do</strong>s os la<strong>do</strong>s com a redistribuição <strong>do</strong><br />

peso, a cada movimento deixan<strong>do</strong> entrar mais água pela borda.<br />

— Os baldes! — gritou Hardie. — Onde estão os baldes? Vamos, mexam-se,<br />

façam alguma coisa! — E arrancou a boia das mãos de seja lá quem a estava<br />

seguran<strong>do</strong>.<br />

A Sra. Grant exclamou:<br />

— Lá está ela!<br />

E apontou para Rebecca, que agitava freneticamente as mãos na direção <strong>do</strong><br />

céu e tentava inutilmente dizer alguma coisa, só conseguin<strong>do</strong> emitir sons<br />

abafa<strong>do</strong>s e engolir mais água. Seu vesti<strong>do</strong> ondulava a sua volta, sua touca estava<br />

bem firme sobre as orelhas, e, embora o colete inflável servisse para manter sua<br />

cabeça acima da água, não impedia que as ondas a fizessem submergir ou que a<br />

corrente a afastasse de nós. Sua expressão era mais de surpresa <strong>do</strong> que de pavor,<br />

e pensei tê-la ouvi<strong>do</strong> pedir, quase com delicadeza:<br />

— Aqui, Sr. Hardie, aqui.<br />

Ela tinha certeza de que seria salva, como to<strong>do</strong>s nós tínhamos até então. O <strong>mar</strong><br />

estava agita<strong>do</strong> como nunca, e o nível da água no fun<strong>do</strong> <strong>do</strong> barco não parava de<br />

subir. Hardie desperdiçava minutos preciosos fazen<strong>do</strong> com que os encarrega<strong>do</strong>s<br />

de escoar a água retomassem o trabalho, pois estavam to<strong>do</strong>s com os olhos fixos<br />

em Rebecca ou seguran<strong>do</strong>-se para não serem leva<strong>do</strong>s ao chão pelo balanço <strong>do</strong><br />

barco. Naquele instante, ocorreu-me que o resgate de Rebecca definitivamente<br />

não era algo garanti<strong>do</strong>.<br />

Foi só depois <strong>do</strong> que me pareceu uma eternidade que Hardie ordenou aos<br />

rema<strong>do</strong>res que seguissem na direção dela, e quan<strong>do</strong> afinal ele a tirou da água,<br />

não tive a sensação de que aquele fosse um gesto heroico. Hardie transmitia mais

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