No coracao do mar - Charlotte Rogan

DIA QUATRO
O episódio daquela noite — o avistar de luzes, que, se não foi um engano, no
mínimo não pôde ser confirmado — teve um efeito adverso sobre nós. Surgiram
novas interpretações das histórias sobre os últimos momentos do navio, mas o
romantismo que nos despertaram a indescritível beleza dos raios de sol e os
cânticos da tarde anterior não bastou para afastar a decepção da noite, e fomos
tomados por um desânimo avassalador, que o tempo encoberto ajudou a
intensificar. Por toda a nossa volta o chumbo do céu se fundia com o cinza do
mar no horizonte indefinido.
— As nuvens não estão brancas agora, não é mesmo, Sra. Winter? —
perguntou o Sr. Hardie. Maria ameaçou levantar-se de novo, retorcendo a roupa.
— Sente-se — resmungou ele —, ou precisarei amarrá-la.
— Quem viu as luzes? — perguntou a todos a Sra. Grant.
— Preston, aquele lá — respondeu o Sr. Sinclair. — Foi Preston.
— Eu vi — confirmou Preston, um homem sério e de rosto redondo que
parecia sempre ofegante. — Não estou inventando nada.
— Em qual direção estavam? — insistiu a Sra. Grant, como se perguntasse o
caminho para chegar a um hotel. — Veja se consegue lembrar.
Com expressão de imenso alívio, o Sr. Preston respondeu:
— Cinco graus contra o vento.
O Sr. Hardie nos havia ensinado como aplicar os graus de um círculo ou os
ponteiros de um relógio para verificar a localização de objetos em relação ao
vento ou ao nariz do barco, de modo que, quando o Sr. Preston mencionou essa
posição, todos nós espichamos o pescoço para a dianteira do barco, como se
buscássemos ver alguma coisa bem ali naquele momento. A Sra. Grant
demonstrava uma seriedade implacável, uma solenidade que ela conferia a todos
com quem falava, e percebi de imediato que esse tipo de respeito por seu ponto
de vista era tudo que o Sr. Preston queria.
— O vento mudou quarenta e cinco graus nesta última hora — explicou o Sr.
Hardie, apontando em outra direção.
— Ah — fez Preston, visivelmente desanimado e receoso de perder
credibilidade. — Sou contador, na verdade, não marinheiro, mas contadores são
conhecidos por sua precisão. Tenho olho bom para detalhes e uma memória de
elefante. Pergunte a qualquer um. Se digo que vi luzes, é porque vi luzes.
— Sua atenção, por favor! Escutem todos! — gritou a Sra. Grant, para que
todos a ouvissem.
Fiquei surpresa ao descobri-la capaz de alçar tal volume sua voz, pois até
aquele momento ela tinha demonstrado eficiência de maneira discreta.
— O Sr. Preston viu luzes naquele lado. — Ela apontou com a cabeça na