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No coracao do mar - Charlotte Rogan

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discussões — ouvi o Sr. Nilsson dizer ao coronel Marsh. — Elaborar um plano<br />

não significa que algum dia iremos colocá-lo em prática.<br />

O Sr. Hardie não era o tipo de pessoa que aceitava ordens de qualquer um, e<br />

eu tinha a sensação de que, de algum mo<strong>do</strong>, éramos manipula<strong>do</strong>s. Minha mente,<br />

no entanto, estava entorpecida pelo me<strong>do</strong>, e talvez seja apenas ao me lembrar<br />

disso — agora que enfrento um tipo diferente de autoridade — que penso na<br />

possibilidade de ter havi<strong>do</strong> redes de influência e mentiras no barco salva-vidas<br />

desde o primeiro momento.<br />

Estranhamente, minha lucidez aumentava com o passar <strong>do</strong> tempo. Nas<br />

primeiras horas, o pavor me impedia de observar a situação com um olhar<br />

crítico: sentia calor demais ou frio demais, fome demais ou sede demais,<br />

tendência excessiva a imaginar coisas e a perguntar à jovem sentada a meu la<strong>do</strong>:<br />

“O que é aquilo lá adiante, Mary Ann? Às duas horas! Não vê alguma coisa<br />

brilhan<strong>do</strong> ao sol?” Ou: “O que é aquela forma escura, Mary Ann? Não acha que<br />

pode ser um navio?” <strong>No</strong> anoitecer <strong>do</strong> segun<strong>do</strong> dia, enquanto o enorme sol laranja<br />

mergulhava no horizonte como uma bola pesada e as pessoas pareciam emergir<br />

de seu torpor o suficiente para queixar-se de músculos <strong>do</strong>lori<strong>do</strong>s ou pés<br />

molha<strong>do</strong>s, o Sr. Hoffman foi categórico:<br />

— Se não houver voluntários, precisaremos decidir por sorteio.<br />

A essa altura, Any a Robeson, mulher de poucas palavras mas que Mary Ann<br />

descrevera como “passageira da terceira classe”, fuzilou o Sr. Hoffman com um<br />

olhar inflexível e abraçou o filho Charles, aninhan<strong>do</strong>-o sob seu casaco. Não<br />

queria que ele ouvisse o que diziam. “Atenção ao que fala, há uma criança aqui”,<br />

protestava invariavelmente cada vez que algum <strong>do</strong>s homens mencionava a morte<br />

ou usava palavras rudes. Não sei por que ela se inquietava com aquilo — talvez<br />

assim não precisasse se preocupar com o oceano sem fim, que mudava <strong>do</strong> azul<br />

para o cinza quan<strong>do</strong> uma nuvem encobria o sol e <strong>do</strong> cinza para o carmim quan<strong>do</strong><br />

o sol se inflamava a caminho <strong>do</strong> horizonte. Greta Witkoppen, uma jovem alemã,<br />

debulhou-se em lágrimas, e no início pensei que chorasse porque logo seria noite<br />

ou porque havia perdi<strong>do</strong> uma pessoa querida, mas depois percebi que fora a<br />

conversa <strong>do</strong>s homens que a tinha assusta<strong>do</strong>.<br />

A Sra. Grant inclinou-se na direção de Greta e bateu de leve em seu ombro.<br />

— Não se preocupe — confortou-a. — Você sabe como são os homens.<br />

Greta então demonstrou um pouco de vivacidade ao recla<strong>mar</strong> bem alto:<br />

— Vocês estão assustan<strong>do</strong> as pessoas. Não deviam falar essas coisas.<br />

Mais tarde, comentou diretamente com o Sr. Hardie:<br />

— Eu diria que o senhor deveria se preocupar mais com a opinião <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

— Do mun<strong>do</strong>! — zombou Hardie. — O mun<strong>do</strong> nem sabe que eu existo.<br />

— Algum dia saberá — ousou Greta. — E algum dia o julgará.<br />

— Deixe isso para os historia<strong>do</strong>res — gritou Hoffman.<br />

Hardie riu e também gritou, no momento em que o vento começou a soprar:

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