No coracao do mar - Charlotte Rogan

com exceção da Sra. Forester, que viria a morrer naquele mesmo dia sem que
ninguém nem prestasse muita atenção, estávamos todos relativamente bem de
saúde. Além do mais, embora houvesse divergência se o barco recém-avistado
era o de Blake ou o do homem de barba, seus ocupantes estavam visivelmente
mais doentes e esgotados do que nós. Sabíamos que um dos barcos partira com
lotação acima da capacidade, e, se fosse o que acabáramos de ver, parecia que
as chances de morte a bordo daquele eram muito maiores do que no nosso. E o
Sr. Hoffman tinha plena convicção de que devíamos isso à extrema capacidade
do Sr. Hardie de preservar a vida de quem se encontrava sob sua
responsabilidade. O Sr. Nilsson manteve-se em silêncio e não tomou posição,
nem a favor nem contra.
O Sr. Hardie resmungou que, fosse qual fosse o barco que acabáramos de
avistar, havia agora muito lugar a bordo.
— Se algum de vocês quiser arriscar, tenho certeza de que é possível dar um
jeito — sugeriu ele.
A Sra. Grant, no entanto, disse que, se fosse para algum de nós ser transferido
para o outro barco, que fosse o próprio Sr. Hardie. Diante de tal sugestão, o Sr.
Hardie a olhou atravessado e eu encolhi-me contra o Sr. Preston, aterrorizada
pela ideia de que um indivíduo pudesse abrigar dentro de si personalidades tão
opostas. De todo modo, o barco não estava mais à vista, e, nesse caso, mesmo
que houvesse um modo prático de transferir o Sr. Hardie, a hipótese agora estava
descartada.
Lisette tomou a palavra para falar de um boato que circulava desde o terceiro
dia, quando ficáramos sabendo que o Sr. Blake tinha jogado no mar duas pessoas
de seu barco. Eu ouvira essa história em diversas ocasiões, cada vez com novos
detalhes, que eram ou contribuições factuais de testemunhas confiáveis ou puras
fantasias resultantes de nossa imaginação sempre mais fértil. Lisette sugeriu que,
se o barco do Sr. Blake navegava de modo estranho, era porque estava
carregando algo pesado, algo talvez roubado do cofre do Empress Alexandra.
Greta, que se afeiçoara demais a Hannah e à Sra. Grant e desenvolvera uma
antipatia irracional pelo Sr. Hardie, sugeriu que ele e Blake estavam de conluio e
que, de algum modo, Hardie ajudava Blake ao manter nosso barco afastado do
dele.
— Mas que prova você tem disso? — gritei, antes mesmo de dar-me conta de
que desejava falar.
O coronel interrompeu-me:
— Se a acusação for falsa, o Sr. Hardie nos dirá.
— Greta tem tanto direito de se manifestar quanto qualquer um de nós —
observou a Sra. Grant, em retribuição à afeição de Greta. Em seguida, virandose
para o Sr. Hardie, perguntou: — Tem algo a dizer em sua defesa?
— Se Blake e eu de fato roubamos alguma coisa, algo que de todo modo teria