No coracao do mar - Charlotte Rogan
entre nosso barco e ele. Ainda me pergunto se minha imaginação aumenta ou diminui os riscos que teríamos corrido se mudássemos o rumo para salvá-lo, mas agora acho que se eu e meus companheiros do barco salva-vidas devemos ser julgados por alguma coisa, deveria ser por esse ato. Talvez fosse o desconforto pelas roupas encharcadas ou talvez o estranho sentimento de remorso com relação à criança o que me mantinha acordada. Enquanto remoía o episódio acontecido com o menino, dei-me conta de que a Sra. Grant, sentada do outro lado de Mary Ann, contemplava por cima da borda do barco as estrelas brilhando no céu. Como Mary Ann estava deitada atravessada sobre meus joelhos e por isso não era uma presença sólida entre nós, a Sra. Grant percebeu que eu estava acordada e, pela primeira e última vez, segurou minha mão. Expliquei-lhe que pensava na criança, e ela respondeu: — Não adianta. O que está feito está feito. Então não pude mais me segurar e contei toda a história do sistema Marconi de telegrafia sem fio e falei de minha suspeita de que o Sr. Hardie tivesse mentido sobre as mensagens de socorro. Ela me agradeceu por ter lhe contado e completou com um comentário um tanto enigmático: — Se soubéssemos disso antes... Mas não prosseguiu, omitindo o corolário que tinha em mente. Se soubéssemos antes, que diferença faria? Teríamos agido de maneira diferente naqueles primeiros dias? Além de começar mais cedo a jogar as pessoas para fora do barco e içar a vela ou remar para a Europa enquanto ainda tínhamos força, não sei o que poderíamos ter feito. Pouco depois do amanhecer, descobrimos que as duas irmãs que até então se mantinham sentadas discretamente na traseira do barco haviam desaparecido sem deixar vestígio. Ninguém as vira cair do barco. Embora nunca tivesse conversado com elas, Mary Ann ficou muito abalada com a perda. Talvez porque tinham mais ou menos a nossa idade, ela tomou esse sumiço como um sinal do que poderia acontecer conosco. Virou-se para mim com um olhar desesperado e perguntou: — Acha que vamos morrer? Àquela altura eu estava plenamente convencida de que sim, e pensei em ser franca com ela. Estava tão arrasada quanto Mary Ann pelos acontecimentos da véspera, e me ressentia de sua expectativa de que eu tivesse respostas ou força. Eu queria gritar para ela: “Claro que vamos morrer! Sorte das irmãs, para quem tudo já acabou!” No entanto, permaneci calada. Apoiei a mão em seu ombro, como gostaria que alguém fizesse comigo, e murmurei uma espécie de invocação. Acho que eu disse “Protegei-nos, Senhor”, mas pode muito bem ter sido “O Sr. Hardie faz o que pode. Eu ainda não deixaria de acreditar nele”. Mais tarde nossa situação sofreu uma leve alteração ao constatarmos que o objeto que havia colidido com o barco abrira um rombo do tamanho de um
punho fechado na lateral do casco, logo abaixo da amurada a estibordo. Pelo buraco entrava um jato contínuo de água, que o Sr. Hardie passara a noite tentando estancar; ou seja, aparentemente as condições não eram muito promissoras.
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