Trabalho e saúde mental dos profissionais da saúde
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TRABALHO E SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE<br />
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grupos de comparação. Os resulta<strong>dos</strong> mostraram que a modificação curricular<br />
associou-se à diminuição do nível de ansie<strong>da</strong>de entre alunos nos dois primeiros<br />
anos do curso médico, não havendo alteração nos grupos de comparação.<br />
Fatores caracteriza<strong>dos</strong> como abuso – O problema do abuso nas escolas médicas<br />
já foi descrito na déca<strong>da</strong> de 80. 29 Observando os estu<strong>da</strong>ntes no início do<br />
curso, plenos de idealismo e perspectivas altruístas, e ao final, muitas vezes<br />
frios e distantes afetivamente, Silver (1982) 29 traçou um paralelo entre os estu<strong>da</strong>ntes<br />
e as crianças que sofrem abusos por parte de seus cui<strong>da</strong>dores. A esta<br />
reflexão, seguiram-se vários estu<strong>dos</strong> identificando a existência, a frequência e<br />
as características de abusos na escola médica. Tais abusos podem apresentar-se<br />
de diferentes formas: verbal (humilhações, comentários sarcásticos ou rudes),<br />
institucional ou acadêmico (tarefas estabeleci<strong>da</strong>s como punição e não com<br />
foco no aprendizado; ameaças com notas baixas; carga de trabalho inapropria<strong>da</strong><br />
ou excessiva); submissão do aluno a situações de risco desnecessárias, sem<br />
supervisão; ameaças físicas ou contato físico negativo; sexual (sutil ou explícito,<br />
observações de caráter sexual ou discriminatórias).<br />
Ao comparar o abuso vivido na infância com aquele presente nas escolas<br />
médicas, SILVER (1982) 29 também destacou que em ambos há uma interdição<br />
a falar sobre o abuso, tanto entre as famílias cujas crianças são abusa<strong>da</strong>s, quanto<br />
entre os alunos e professores nas escolas médicas. Como consequência deste<br />
silêncio, o abuso se perpetua e é naturalizado, não mais sendo percebido como<br />
abusivo, mas sim fazendo parte de uma cultura institucional. 30<br />
Independentemente <strong>da</strong>s formas como são classifica<strong>da</strong>s e do silêncio sobre<br />
sua ocorrência, situações de abusos parecem ser bastante prevalentes,<br />
ocorrendo em diferentes países. No estudo já citado de SILVER e GLICKEN<br />
(1990), 31 46,4% <strong>dos</strong> estu<strong>da</strong>ntes relatavam já terem sido abusa<strong>dos</strong> de alguma<br />
maneira. Em outro estudo, realizado nos EUA, os autores se propuseram a<br />
avaliar a prevalência de abusos sofri<strong>dos</strong> pelos estu<strong>da</strong>ntes ao longo do curso e a<br />
consequência deste em termos de <strong>saúde</strong> <strong>mental</strong>. 32 Para isto, 137 alunos foram<br />
avalia<strong>dos</strong> na entra<strong>da</strong> na universi<strong>da</strong>de e após quatro anos de curso, tendo sido<br />
relata<strong>da</strong>s diferentes formas de abuso por 72% <strong>dos</strong> sujeitos, associa<strong>da</strong>s fortemente<br />
a sintomas mentais.<br />
Outro estudo, conduzido no Paquistão, a partir de entrevistas com 350<br />
estu<strong>da</strong>ntes de Medicina, identificou 62,5% <strong>dos</strong> alunos relatando terem sido<br />
maltrata<strong>dos</strong> ou de algum modo deprecia<strong>dos</strong> na presença de outras pessoas. 33<br />
As principais fontes de maus-tratos aponta<strong>da</strong>s foram os residentes e o corpo<br />
médico <strong>da</strong>s instituições, cujas relações com os alunos foram descritas como<br />
altamente hierarquiza<strong>da</strong>s, havendo provável abuso do poder. 33<br />
Há poucos estu<strong>dos</strong> nacionais sobre o tema. Em ensaio no qual explora<br />
o paralelismo entre a relação médico-paciente e a relação professor-aluno,<br />
HOSSNE (1994) 34 menciona que impulsos agressivos, não sublima<strong>dos</strong> pelos<br />
professores, poderiam se manifestar na forma de maus-tratos a alunos.