Trabalho e saúde mental dos profissionais da saúde

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20.05.2016 Views

TRABALHO E SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE Como o ser humano é indivisível, tanto a saúde física quanto a saúde mental dos estudantes deveriam ser contempladas durante o período de formação. O contato com o sofrimento humano, com a morte, com sua impotência e ignorância é causa de estresse e pode levar o estudante a buscar alguma saída para conseguir chegar ao final da jornada. Muitas vezes, esses jovens buscam saídas para essas angústias por meio de situações extremamente destrutivas. Dessa maneira, o nível de estresse vai gradualmente aumentando. Como se observa na literatura, o curso médico é um agente estressor. Há estudantes que conseguem lidar de uma forma adequada com esse agente e não adoecem. No entanto, há uma parte considerável que não encontra meios de lidar com o estresse provocado pela graduação médica. Esses acabam desenvolvendo alguma doença, seja em nível psíquico ou não. Como o estudante não pode encerrar sua fonte de estresse, o curso médico, uma vez que é o meio de formação escolhido por ele como futura profissão, resta-lhe aprender a lidar com esse agente estressor. O fator mais importante, segundo Firth, 17 é o fato de a Medicina ser um curso longo, portanto mantendo-se como um agente estressor permanente durante toda a graduação. Nogueira-Martins 16 mostrou que havia uma “alta prevalência de suicídio, depressão, uso de drogas, distúrbios conjugais e disfunções profissionais em médicos e estudantes de Medicina”. Sugeriu a existência de evidências de que 8% a 10% da população médica apresentavam riscos em relação a distúrbios emocionais. O autor apontou ainda que, após vencer o desafio do vestibular, o estudante de Medicina deparava-se com as dificuldades inerentes ao curso médico e às mais diferentes situações que o levavam ao estresse. Ressaltou a continuidade desse quadro na vida profissional: Apesar de haver diferenças qualitativas e quantitativas em relação ao estresse nas diversas especialidades médicas, o fato é que, enquanto curso e como profissão, o exercício da Medicina apresenta elevada toxicidade psicológica. Como as radiações e as infecções, os fenômenos psicológicos e contagiosos. As angústias inerentes à tarefa médica são poderosas radiações contagiantes que, encontrando terreno propício, podem ser muito danosas ao profissional. 18 44 A partir de experiência clínica advinda do acompanhamento dos estudantes de Medicina da Famema pode-se inferir que há um número considerável desses discentes que estruturam uma série de defesas, e que não procuram ajuda, ficando sem diagnóstico e, consequentemente, sem tratamento. Para ser um bom médico é preciso valorizar e acolher as dificuldades emocionais do paciente. No entanto, como afirmam, 19,20 para reconhecer o sentimento do outro é preciso primeiro reconhecer o seu próprio. A existência de serviços de atendimento psicológico ao estudante de

Medicina permite que o futuro médico inicie o conhecimento de seu funcionamento mental na época de sua formação. Sendo assim, poderá, ao se formar, estar apto tanto do ponto de vista cognitivo quanto emocional. Olhando o estudante de Medicina por esse vértice, pode-se pensar na função formadora da faculdade, responsável por fornecer meios para a futura prática profissional. As dimensões biológica, psicológica e populacional compõem o conteúdo necessário para a formação médica. Vale lembrar que o humanismo é um instrumento terapêutico poderoso. Entretanto, o incentivo ao estudante para vir a conhecer-se por meio de um trabalho psicoterápico ainda é incipiente. O estresse inerente ao curso médico se mantém durante o período de Residência Médica, 16 etapa da formação médica para a qual os pesquisadores já sugerem mudanças a fim de “reduzir o estresse do treinamento, promover o crescimento profissional e pessoal, prevenir disfunções profissionais e distúrbios emocionais nos residentes”. 21 Frequentemente vivido pelos residentes e internos, “a privação de sono pode causar uma desintegração do ego e psicose”. 22 Enfim, existe a necessidade de cuidar do futuro médico a fim de que ele possa cuidar melhor de seus futuros pacientes. Em decorrência desses achados, poder-se-ia pensar em programas de prevenção do estresse, oferecendo para essa população vários recursos diferentes, de maneira que cada um dos estudantes pudesse encontrar aquele que mais se adaptasse às suas necessidades, 23 pois a formação do psiquismo se faz de maneira muito singular, com especificidades e características exclusivas. Talvez esse tema possa ser desenvolvido numa futura pesquisa. Além de um serviço de atendimento ao discente, sugere-se também, pelas evidências já apontadas neste trabalho, que durante a graduação haja um espaço de discussão sobre a saúde mental do estudante de Medicina a fim de que ele possa aprender a lidar com o estresse inerente ao curso médico. Seria favorável à criação de uma identidade profissional menos idealizada e mais humana. As considerações aqui apresentadas são fruto de reflexões que levam ao encontro de pensamentos da autora, tecidos com contribuições de outros autores. Escapar da tentação de escrever entre aspas, citando esses autores, “implica, por um lado, reconhecer que o logos faz parte do Outro e dele provém, isto é, que a originalidade do discurso é um sonho do autor. Por outro lado, implica a construção da representação do vivido, que é sempre singular”. 24 Por meio dos resultados obtidos pôde-se chegar às seguintes conclusões: • Há prevalência de estresse nos estudantes do curso médico; • O primeiro ano apresenta níveis de estresse significativamente menores do que os níveis apresentados pelos outros anos; • O quarto ano apresenta níveis de estresse significativamente maiores do que o primeiro ano e, ao mesmo tempo, apresenta níveis de estresse menores do que o segundo, terceiro, quinto e sexto anos; 2 Saúde mental do estudante de Medicina 45

TRABALHO E SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE<br />

Como o ser humano é indivisível, tanto a <strong>saúde</strong> física quanto a <strong>saúde</strong> <strong>mental</strong><br />

<strong>dos</strong> estu<strong>da</strong>ntes deveriam ser contempla<strong>da</strong>s durante o período de formação.<br />

O contato com o sofrimento humano, com a morte, com sua impotência e<br />

ignorância é causa de estresse e pode levar o estu<strong>da</strong>nte a buscar alguma saí<strong>da</strong><br />

para conseguir chegar ao final <strong>da</strong> jorna<strong>da</strong>. Muitas vezes, esses jovens buscam<br />

saí<strong>da</strong>s para essas angústias por meio de situações extremamente destrutivas.<br />

Dessa maneira, o nível de estresse vai gradualmente aumentando.<br />

Como se observa na literatura, o curso médico é um agente estressor. Há<br />

estu<strong>da</strong>ntes que conseguem li<strong>da</strong>r de uma forma adequa<strong>da</strong> com esse agente e<br />

não adoecem. No entanto, há uma parte considerável que não encontra meios<br />

de li<strong>da</strong>r com o estresse provocado pela graduação médica. Esses acabam desenvolvendo<br />

alguma doença, seja em nível psíquico ou não. Como o estu<strong>da</strong>nte<br />

não pode encerrar sua fonte de estresse, o curso médico, uma vez que é o<br />

meio de formação escolhido por ele como futura profissão, resta-lhe aprender<br />

a li<strong>da</strong>r com esse agente estressor. O fator mais importante, segundo Firth, 17<br />

é o fato de a Medicina ser um curso longo, portanto mantendo-se como um<br />

agente estressor permanente durante to<strong>da</strong> a graduação.<br />

Nogueira-Martins 16 mostrou que havia uma “alta prevalência de suicídio,<br />

depressão, uso de drogas, distúrbios conjugais e disfunções <strong>profissionais</strong> em<br />

médicos e estu<strong>da</strong>ntes de Medicina”. Sugeriu a existência de evidências de que<br />

8% a 10% <strong>da</strong> população médica apresentavam riscos em relação a distúrbios<br />

emocionais. O autor apontou ain<strong>da</strong> que, após vencer o desafio do vestibular,<br />

o estu<strong>da</strong>nte de Medicina deparava-se com as dificul<strong>da</strong>des inerentes ao curso<br />

médico e às mais diferentes situações que o levavam ao estresse. Ressaltou a<br />

continui<strong>da</strong>de desse quadro na vi<strong>da</strong> profissional:<br />

Apesar de haver diferenças qualitativas e quantitativas em relação ao<br />

estresse nas diversas especiali<strong>da</strong>des médicas, o fato é que, enquanto curso e<br />

como profissão, o exercício <strong>da</strong> Medicina apresenta eleva<strong>da</strong> toxici<strong>da</strong>de psicológica.<br />

Como as radiações e as infecções, os fenômenos psicológicos e<br />

contagiosos. As angústias inerentes à tarefa médica são poderosas radiações<br />

contagiantes que, encontrando terreno propício, podem ser muito <strong>da</strong>nosas<br />

ao profissional. 18<br />

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A partir de experiência clínica advin<strong>da</strong> do acompanhamento <strong>dos</strong> estu<strong>da</strong>ntes<br />

de Medicina <strong>da</strong> Famema pode-se inferir que há um número considerável<br />

desses discentes que estruturam uma série de defesas, e que não procuram<br />

aju<strong>da</strong>, ficando sem diagnóstico e, consequentemente, sem tratamento. Para ser<br />

um bom médico é preciso valorizar e acolher as dificul<strong>da</strong>des emocionais do<br />

paciente. No entanto, como afirmam, 19,20 para reconhecer o sentimento do outro<br />

é preciso primeiro reconhecer o seu próprio.<br />

A existência de serviços de atendimento psicológico ao estu<strong>da</strong>nte de

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