Trabalho e saúde mental dos profissionais da saúde

Trabalho_e_saude_mental_dos_profissionais_da_saude Trabalho_e_saude_mental_dos_profissionais_da_saude

20.05.2016 Views

TRABALHO E SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE Fatores de risco Médicos estão expostos aos mesmos fatores de risco que a população geral. Dentre eles, destacam-se a história familiar, experimentação precoce, disponibilidade de droga e clima social de tolerância ao consumo. Aspectos individuais como personalidade, comportamento de busca de sensações e novidades, falta de monitoramento por parte dos familiares também podem ser considerados fatores de risco. De fato, boa parte dos problemas com uso de substâncias começam já durante a adolescência e nos anos de graduação, o que evidencia a necessidade de programas voltados à prevenção primária e secundária na graduação. 8 Contudo, o uso de benzodiazepínicos e opioides costuma ocorrer mais tarde, geralmente nos anos de Residência Médica. 9 Tais drogas são mais frequentemente abusadas por médicos que pela população geral. 6 Concomitantemente, diversas situações próprias às profissões de saúde podem levar a riscos peculiares, tais como: 1) facilidade de acesso a drogas com alto potencial de gerar dependência; 2) perda do tabu em relação a injeções; 3) estresse profissional contínuo somado a estratégias ineficazes de enfrentamento; 4) cultura favorável à automedicação; 6 5) fadiga crônica; 6) onipotência e “otimismo farmacológico”, ou seja, percepção de que problemas da vida pessoal e profissional possam ser tratados com medicamentos. Idealismo, perfeccionismo e dificuldade de reconhecer emoções têm sido citados. 10 Sugere-se que o acesso facilitado interfira no tipo de droga utilizado, mais que na prevalência. Particularmente, a Residência Médica tem sido considerada período de alto risco para o desenvolvimento de transtornos por uso de substâncias, e estratégias direcionadas são salientadas na literatura médica. 6, 11 Algumas especialidades são reportadas como de alto risco, como anestesiologia, psiquiatria, cuidados intensivos e médicos emergencistas. 12 O treinamento de residentes para enfrentamento de questões de estresse profissional, dor, cansaço, sobrecarga de trabalho, burnout, ansiedade e depressão, e redução da sobrecarga de trabalho, têm sido reportados como estratégias viáveis. 13 Detecção do problema 194 Não existem sinais patognomônicos que auxiliem a detectar o uso problemático de substâncias por um médico. Contudo, a concomitância de uma série de sintomas deve chamar a atenção. Tais elementos podem ser comportamentais (alterações súbitas de humor, isolamento, irritabilidade), sinais no local de trabalho (absenteísmo, muitas prescrições para familiares, quebra acidental recorrente de ampolas de medicamentos, problemas com a equipe e pacientes) e problemas de saúde (alterações de sono, apetite e peso corporal, condição médica geral). 14

Alguns estudos sugerem que o trabalho e o desempenho profissional são a última área da vida afetada e, quando isto ocorre, problemas familiares, sociais e psíquicos já estão instalados. 15 Intervalo de tempo até a busca de tratamento Observa-se uma significativa demora entre o surgimento de problemas e a busca por tratamento. Médicos parecem ser eficientes em controlar vários aspectos de sua vida, assim, podem ter dificuldades em admitir que perderam o controle sobre o uso de substâncias. Estima-se que o intervalo até a procura de ajuda seja superior a seis anos. Dentre os fatores explicativos para a demora na busca de tratamento, citamse respostas psicológicas disfuncionais, particularmente a negação, racionalização e intelectualização do problema (“eu posso cuidar de mim mesmo”, “sei o que estou fazendo”), bem como a falta de conhecimento específico sobre saúde mental e álcool e drogas, o que acarreta um senso de desamparo e intratabilidade. Adicionalmente, dependentes de substâncias enfrentam estigma maior que os portadores de outras doenças mentais ou clínicas, e o próprio sujeito acaba por julgar-se moralmente por estar doente. 16 Paralelamente, estabelece-se uma “conspiração do silêncio”: 17 tanto familiares quanto colegas e o próprio médico enfermo preferem não abordar o assunto por temor às consequências, desemprego e preocupação em abalar o status do serviço. 13 Programa do Cremesp para tratamento de médicos dependentes de álcool e drogas Serviços para apoio à saúde do médico Histórico e situação mundial Serviços de assistência à saúde do médico têm se revelado uma tendência em diversos países, fornecendo cuidados mais apropriados à natureza da clientela. Tais programas são disponíveis em todos os estados norte-americanos desde 1979 2 e em diversos países como Austrália, Japão e Inglaterra. Segundo o Manifesto de Barcelona, 18 fruto de um consenso de experts europeus no ramo da saúde mental do médico, algumas características destes serviços são recomendáveis: 1. Providenciar acesso rápido e discreto ao tratamento. 2. Preservar a confidencialidade do atendimento. 3. Criar programas de tratamento suficientes para contemplar as diversas necessidades. 4. Manter contato com órgãos profissionais e reguladores da atividade médica. 5. Preservar a qualidade do atendimento. 6. Ter um objetivo preventivo e de detecção precoce. 195

TRABALHO E SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE<br />

Fatores de risco<br />

Médicos estão expostos aos mesmos fatores de risco que a população<br />

geral. Dentre eles, destacam-se a história familiar, experimentação precoce,<br />

disponibili<strong>da</strong>de de droga e clima social de tolerância ao consumo. Aspectos<br />

individuais como personali<strong>da</strong>de, comportamento de busca de sensações e novi<strong>da</strong>des,<br />

falta de monitoramento por parte <strong>dos</strong> familiares também podem ser<br />

considera<strong>dos</strong> fatores de risco. De fato, boa parte <strong>dos</strong> problemas com uso de<br />

substâncias começam já durante a adolescência e nos anos de graduação, o que<br />

evidencia a necessi<strong>da</strong>de de programas volta<strong>dos</strong> à prevenção primária e secundária<br />

na graduação. 8 Contudo, o uso de benzodiazepínicos e opioides costuma<br />

ocorrer mais tarde, geralmente nos anos de Residência Médica. 9 Tais drogas<br />

são mais frequentemente abusa<strong>da</strong>s por médicos que pela população geral. 6<br />

Concomitantemente, diversas situações próprias às profissões de <strong>saúde</strong><br />

podem levar a riscos peculiares, tais como: 1) facili<strong>da</strong>de de acesso a drogas com<br />

alto potencial de gerar dependência; 2) per<strong>da</strong> do tabu em relação a injeções; 3)<br />

estresse profissional contínuo somado a estratégias ineficazes de enfrentamento;<br />

4) cultura favorável à automedicação; 6 5) fadiga crônica; 6) onipotência e<br />

“otimismo farmacológico”, ou seja, percepção de que problemas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> pessoal<br />

e profissional possam ser trata<strong>dos</strong> com medicamentos. Idealismo, perfeccionismo<br />

e dificul<strong>da</strong>de de reconhecer emoções têm sido cita<strong>dos</strong>. 10 Sugere-se que<br />

o acesso facilitado interfira no tipo de droga utilizado, mais que na prevalência.<br />

Particularmente, a Residência Médica tem sido considera<strong>da</strong> período de<br />

alto risco para o desenvolvimento de transtornos por uso de substâncias, e<br />

estratégias direciona<strong>da</strong>s são salienta<strong>da</strong>s na literatura médica. 6, 11 Algumas especiali<strong>da</strong>des<br />

são reporta<strong>da</strong>s como de alto risco, como anestesiologia, psiquiatria,<br />

cui<strong>da</strong><strong>dos</strong> intensivos e médicos emergencistas. 12<br />

O treinamento de residentes para enfrentamento de questões de estresse<br />

profissional, dor, cansaço, sobrecarga de trabalho, burnout, ansie<strong>da</strong>de e<br />

depressão, e redução <strong>da</strong> sobrecarga de trabalho, têm sido reporta<strong>dos</strong> como<br />

estratégias viáveis. 13<br />

Detecção do problema<br />

194<br />

Não existem sinais patognomônicos que auxiliem a detectar o uso problemático<br />

de substâncias por um médico. Contudo, a concomitância de uma série<br />

de sintomas deve chamar a atenção. Tais elementos podem ser comportamentais<br />

(alterações súbitas de humor, isolamento, irritabili<strong>da</strong>de), sinais no local de trabalho<br />

(absenteísmo, muitas prescrições para familiares, quebra acidental recorrente<br />

de ampolas de medicamentos, problemas com a equipe e pacientes) e problemas<br />

de <strong>saúde</strong> (alterações de sono, apetite e peso corporal, condição médica geral). 14

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!