Trabalho e saúde mental dos profissionais da saúde
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TRABALHO E SAÚDE MENTAL DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE<br />
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do profissional médico atenção, gentileza e conhecimento científico apurado. 36<br />
Entretanto, no mundo absolutamente injusto do trabalho, essa concepção sacerdotal<br />
é utiliza<strong>da</strong> para a prática <strong>da</strong> exploração do trabalho do profissional<br />
médico. Em face <strong>da</strong> atitude de algumas autori<strong>da</strong>des que dela se utilizam, quando<br />
os médicos exercem o direito soberano de reclamar por melhores condições<br />
salariais, o poder público utiliza o sentimento do povo acerca <strong>da</strong> Medicina<br />
como sacerdócio para obrigar os médicos a abdicar <strong>da</strong>s suas atitudes contestatórias.<br />
Era comum que, nas raras ocasiões em que os <strong>profissionais</strong> médicos entraram<br />
em greve, o poder público fez exalta<strong>dos</strong> apelos à santi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> profissão<br />
médica, para alegar que sua destinação suprema deve superar qualquer anseio<br />
de ordem material, num reclamo descabido à população para que censure os<br />
<strong>profissionais</strong> médicos grevistas.<br />
A esse profissional médico que se atribui caráter tão elevado, não é mencionado<br />
o fato real que os médicos se alimentam, pagam tributos, criam filhos<br />
e que têm de enfrentar as terríveis Políticas de Saúde. Desta forma, o<br />
decantado sacerdócio médico constitui tanto uma coroa de glória quanto<br />
uma de espinhos. 34<br />
Não resta dúvi<strong>da</strong> que o trabalho do profissional médico é enobrecedor<br />
por si mesmo, e que a maioria <strong>dos</strong> <strong>profissionais</strong> médicos se sente honra<strong>da</strong> e satisfeita<br />
com a escolha profissional que fez. De acordo com Carneiro e Gouveia<br />
(2004), 19 poucos são os <strong>profissionais</strong> médicos que abandonaram a profissão<br />
para se dedicar a outras ativi<strong>da</strong>des, e escassos são aqueles que têm outras fontes<br />
de ren<strong>da</strong> além <strong>da</strong> Medicina. Preocupante e revelador é o fato que a maioria<br />
37, 38, 39<br />
relatou que a profissão é desgastante, e a taxa de suicídio eleva<strong>da</strong>.<br />
Ser médico é dignificante e exige sacrifícios. Receber <strong>da</strong> população o reconhecimento<br />
por seu labor, mas também a cobrança para nunca errar, são apenas<br />
dois la<strong>dos</strong> do mesmo desígnio. 36 Anos a fio de estu<strong>dos</strong> e o ideal de cumprir<br />
a vocação de amenizar a dor e promover o bem-estar reforçam o desejo de ser<br />
médico. Não obstante, os médicos são pessoas, como quaisquer outros <strong>profissionais</strong>,<br />
e exigi<strong>dos</strong> sem condições de trabalho dignas ou em troca de míseros<br />
salários obti<strong>dos</strong> em múltiplas ativi<strong>da</strong>des, incluindo os plantões. Estes <strong>profissionais</strong><br />
médicos reclamam também a sua precária condição de <strong>saúde</strong> e, nas<br />
conversas informais, denunciam o pleno esgotamento e o limite <strong>da</strong>s suas capaci<strong>da</strong>des<br />
de suportar a dor, não somente física, mas emocional, e a per<strong>da</strong>, em<br />
sentido amplo de prestígio, status e confiança. 40 Isso certamente deve ser espelhado<br />
no esgotamento laboral que potencializa o surgimento ou a acentua ção<br />
de quadros nosológicos orgânicos e psiquiátricos. 29<br />
Carneiro e Gouveia (2004) 19 estu<strong>da</strong>ram acerca do trabalho médico no<br />
Brasil, e encontraram que a expressiva maioria <strong>dos</strong> <strong>profissionais</strong> médicos tem<br />
seu sustento obtido exclusivamente do exercício <strong>da</strong> Medicina. Esclarecedor é o<br />
fato de que o setor público constitui a fonte principal de exercício <strong>da</strong> profissão<br />
médica, quando anteriormente, em pesquisa realiza<strong>da</strong> nos anos 1990, este lu-