PETRÓLEO E ESTADO
1RZuvmj
1RZuvmj
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
66 Petróleo e Estado<br />
Os primeiros passos foram dados em 1938, quando<br />
a firma Murray-Simonsen fez os estudos preliminares,<br />
contratando em seguida técnicos da<br />
empresa americana Foster Wheeller. A proposta<br />
formulada pela Murray-Simonsen ao governo fluminense,<br />
segundo depoimento do próprio Amaral<br />
Peixoto, foi a seguinte:<br />
[...] eles construiriam a refinaria em Niterói,<br />
explorariam durante cinco anos,<br />
com assistência do governo do estado,<br />
que teria participação nos lucros. No fim<br />
de cinco anos eles entregariam todo o<br />
material ao governo do estado do Rio.<br />
Eles seriam associados do governo do<br />
estado, e toda a compra de óleo e a distribuição<br />
seriam fiscalizadas em sociedade,<br />
entre eles e o governo do estado do Rio. 106<br />
Horta Barbosa reagiu de forma negativa à proposta,<br />
baseado em argumentos técnicos. Outro<br />
motivo do veto foi a questão da localização: para<br />
ele, a instalação da refinaria na enseada de São<br />
Lourenço não atendia às condições estabelecidas<br />
pelo Estado-Maior do Exército.<br />
As negociações não avançaram. Segundo a avaliação<br />
de Amaral Peixoto, o estado do Rio perdera<br />
uma oportunidade única, pois “se tivéssemos feito<br />
isso quando a guerra começou, nós estaríamos<br />
com a refinaria funcionando. [Mas] enquanto estávamos<br />
discutindo isso, rebentou a guerra. Aí era<br />
inútil qualquer tentativa”. 107<br />
O caso do projeto da refinaria de Niterói foi o<br />
mais polêmico e o que mais se prolongou, principalmente<br />
por envolver o genro de Vargas. A refinaria<br />
projetada para Salvador foi a primeira a ser<br />
descartada, em meados de 1939, após exame dos<br />
técnicos do CNP. Neste caso, Horta Barbosa se<br />
empenhou pessoalmente e conseguiu convencer<br />
o interventor Landulfo Alves de que as negociações<br />
para a construção da refinaria baseavam-se<br />
na mesma estratégia desenvolvida pelo governo<br />
paulista: desistir do negócio.<br />
O petróleo ainda<br />
não havia sido<br />
descoberto<br />
no País, e o sonho<br />
de se ter uma<br />
indústria petrolífera<br />
parecia restrito às<br />
refinarias.<br />
O projeto da refinaria em São Paulo, orçado em<br />
dois milhões de dólares, tinha como financiadores<br />
o Banco de São Paulo e Roberto Simonsen, presidente<br />
da poderosa Federação das Indústrias do<br />
Estado de São Paulo (Fiesp) e membro do CFCE.<br />
A unidade deveria produzir cerca de seis mil barris/<br />
dia. Tanto Simonsen quanto o banco consideraram<br />
os lucros inicialmente previstos insuficientes e desistiram<br />
do projeto. Para Wirth, por trás desta desistência<br />
estava a pressão feita pelas companhias<br />
petrolíferas americanas sobre o Eximbank, que teria<br />
deixado expirar o pedido de autorização do empréstimo<br />
por parte dos empresários brasileiros. 108<br />
Outro fato importante nesse momento eram as negociações<br />
entre o Brasil e a Bolívia, que vinham-se<br />
protelando desde antes da criação do CNP. Afinal,<br />
até este momento, o petróleo ainda não havia sido<br />
descoberto no País, e o sonho de se ter uma indústria<br />
petrolífera parecia ficar restrito às refinarias.<br />
Em 25 de novembro de 1937, os dois países assinaram<br />
um protocolo estabelecendo a construção,<br />
pelo Brasil, de uma estrada de ferro entre Santa<br />
Cruz de la Sierra e Corumbá, em troca de concessões<br />
nos campos petrolíferos bolivianos e de pagamento<br />
em petróleo cru. 109 As notas então assinadas<br />
só foram ratificadas em 1938, no chamado<br />
Acordo de Roboré. Derrotada pelo Paraguai na<br />
guerra do Chaco (1932-1935), a Bolívia procurava<br />
garantir suas fronteiras e desenvolver seus campos<br />
petrolíferos. Já o Brasil tinha interesse em contar<br />
com o petróleo do país vizinho, não apenas para se<br />
resguardar em termos de defesa, mas como forma<br />
de reduzir a influência argentina na Bolívia, especialmente<br />
forte na província de Oriente.<br />
Mesmo sofrendo pressão da Argentina para não<br />
ratificar o tratado com o Brasil, o governo de La<br />
Paz acabou concordando com a exploração do<br />
petróleo por companhias mistas brasileiro-bolivianas,<br />
embora exigisse que o governo brasileiro<br />
criasse uma companhia oficial destinada ao<br />
transporte, processamento e comercialização<br />
do petróleo boliviano no Brasil. Exigiu, da mesma<br />
forma, que as companhias privadas fossem<br />
mantidas à parte do processo, por receio de que<br />
106. PEIXOTO, E., 1985, v. I, p.341-343.<br />
107. PEIXOTO, E., 1985, loc. cit.<br />
108. WIRTH, 1973, p. 133.<br />
109. VARGAS, 1995, v. II, p.77, 2001, v. 5, p. 5.927.