PETRÓLEO E ESTADO
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130 Petróleo e Estado<br />
A crise de 1954<br />
Organizada num momento de intensa radicalização<br />
política, a Petrobras logo se tornou um dos<br />
principais alvos da campanha oposicionista, movida<br />
pelos políticos conservadores e pela grande<br />
imprensa, contra a orientação nacionalista do<br />
governo Vargas.<br />
Na carta-testamento, explicando ao povo brasileiro<br />
o seu suicídio, na manhã de 24 de agosto de<br />
1954, Getúlio fez uma referência direta a esse fato:<br />
A campanha subterrânea dos grupos<br />
internacionais aliou-se à dos grupos<br />
nacionais revoltados contra o regime<br />
de garantia do trabalho. A lei de lucros<br />
extraordinários foi detida no Congresso.<br />
Contra a justiça da revisão do salário mínimo<br />
se desencadearam os ódios. Quis<br />
criar a liberdade nacional na potencialização<br />
das nossas riquezas através da<br />
Petrobras e, mal começa esta a funcionar,<br />
a onda de agitação se avoluma (...). 215<br />
A ascensão do vice-presidente João Café Filho ao<br />
poder representou, mais uma vez, uma redefinição<br />
da política econômica brasileira, marcada por tentativas<br />
de estabilização monetária centradas no combate<br />
à inflação e por medidas em direção oposta ao<br />
rumo que vinha sendo seguido no segundo governo<br />
Vargas. Foi este o caso do favorecimento à entrada<br />
de maquinaria e capitais externos no País. 216<br />
O ministério montado pelo novo presidente, principalmente<br />
com nomes ligados à UDN, não era<br />
muito favorável à Petrobras. O próprio Café Filho<br />
não via com entusiasmo a criação da estatal, assim<br />
como o seu ministro da Aeronáutica, o brigadeiro<br />
Eduardo Gomes, que havia sido derrotado<br />
por Vargas nas eleições de 1950. O ministro da<br />
Fazenda, Eugênio Gudin, visto como um intransigente<br />
liberal, considerava “uma política econômica<br />
inadequada” a participação do Estado<br />
na indústria do petróleo. 217 Acrescente-se a esse<br />
ambiente desfavorável a nomeação de Juarez Távora,<br />
ferrenho adversário do monopólio estatal<br />
do petróleo, para a chefia do Gabinete Militar do<br />
novo governo, agora com a tarefa de coordenar e<br />
controlar as atividades de diversos órgãos ligados<br />
diretamente à Presidência da República, entre as<br />
quais o CNP e a própria Petrobras. 218<br />
Em seu livro de memórias, Café Filho afirma que sempre<br />
defendeu a posição de que a Petrobras deveria<br />
adquirir maior experiência, para que então o governo<br />
pudesse avaliá-la corretamente, e assim decidir quanto<br />
à oportunidade da revisão ou não da legislação sobre o<br />
petróleo. Era essa também a opinião das Forças Armadas.<br />
Em 9 de novembro de 1954, o general Canrobert<br />
Pereira da Costa, chefe do Estado-Maior das Forças<br />
Armadas (EMFA), entregou-lhe um documento segundo<br />
o qual os chefes militares consideravam inoportuna,<br />
naquele momento, qualquer alteração da lei do<br />
monopólio estatal da exploração do petróleo.<br />
Neste seu primeiro pronunciamento institucional sobre<br />
a nova empresa, os chefes militares concluíam:<br />
[...] ser conveniente que se mantivesse<br />
a atual política, apoiando-a com todos<br />
os recursos possíveis, durante um prazo<br />
mínimo, experimental. Esgotado esse<br />
prazo, refundir, ou não, a legislação, consoante<br />
os resultados apresentados. 219<br />
Em janeiro de 1955, o engenheiro Plínio Cantanhede<br />
deixou a direção do CNP, sendo substituído no<br />
dia 27 pelo também engenheiro Adroaldo Tourinho<br />
Junqueira Ayres.<br />
Nesse mesmo ano, com a entrada em serviço das refinarias<br />
Presidente Bernardes (em Cubatão), União<br />
(Capuava) e Manguinhos (Rio), o Brasil economizou<br />
US$ 56 milhões em divisas com a importação de<br />
derivados do petróleo, comprando menos 22% do<br />
que em 1953, embora o consumo tenha aumentado.<br />
A produção das sete unidades de refino instaladas<br />
no Brasil 220 – as três novas, somando-se às de Uruguaiana<br />
e Rio Grande (RS), a do grupo Matarazzo<br />
(SP) e a refinaria de Mataripe (BA) – chegou a quase<br />
4 bilhões de litros de derivados de petróleo (gasolina<br />
comum, querosene, óleo diesel, óleo combustível,<br />
gás liquefeito, solvente e asfalto), muito acima<br />
dos 392 milhões de litros do ano anterior. Para isso<br />
foi necessário importar 3.370.000 toneladas de petróleo,<br />
quase 12 vezes mais do que o total de 281.188<br />
toneladas do ano anterior.<br />
215. PETROBRAS 50 anos: uma construção da inteligência brasileira. Rio de Janeiro: Petrobras, 2003, p. 109-110.<br />
216. SUPERINTENDÊNCIA DA MOEDA E DO CRÉDITO (SUMOC). In: ABREU, Alzira Alves de. et al. (Coord.). Dicionário histórico e biográfico<br />
brasileiro. Rio de Janeiro: FGV, CPDOC, 2001. v. 5, p. 5612-5616.<br />
217. CARVALHO, G., 1977, p. 83.<br />
218. Sobre Juarez Távora, ver também capítulos 3 e 9.<br />
219. CAFÉ FILHO, João. Do sindicato ao Catete: memórias políticas e confissões humanas. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1966. v. 2, p. 468.<br />
220. CARVALHO, Ernani Filgueiras de; SALA, Janaina Francisco. Política para a ampliação do parque de refino nacional: uma proposta. In: SUSLICK,<br />
Saul B. (Org.). Regulação em petróleo e gás natural. Campinas: Komedi, 2001.