Meditações - PSB
Meditações - PSB Meditações - PSB
20. Quando um adversário, no ginásio nos fere com as unhas ou nos magoa acabeça num choque, não protestamos nem ficamos ofendidos, nem passamosdepois a desconfiar sempre das suas intenções. Contudo passamos a olhá-locom cautela, não com inimizade ou suspeição, mas mantendo-o, com bonomia,à distância. Que assim seja também noutras situações da vida; concordemos empassar por cima de muitas coisas naqueles que são como que nossoscompetidores. O simples acto de evitar, como já tenho dito, está sempre, paranós, em aberto, sem suspeição ou má vontade.21. Se alguém me consegue mostrar e provar que estou errado no pensamentoou na acção, eu mudo de bom grado. Eu procuro a verdade, o que ainda nuncamagoou ninguém. Só a persistência na auto-ilusão e na ignorância é que magoa.22. Eu faço aquilo que é meu dever fazer. Nada mais me distrai; porquecertamente se trata de qualquer coisa inanimada e irracional, ou de alguém queestá iludido ou não sabe o caminho.23. Sê generoso e liberal na tua atitude em relação às criaturas irracionais e àgeneralidade das coisas materiais, porque tu tens uma razão e elas, não. Osseres humanos, por outro lado, têm uma razão; portanto trata-os comcamaradagem. Pede, em tudo, o auxílio dos deuses — mas sem demasiadapreocupação quanto à extensão das tuas preces; três horas chegam.24. Na morte, o fim de Alexandre da Macedónia não foi minimamente diferentedo do seu moço da estrebaria. Ou foram ambos recebidos no mesmo princípiogenerativo do universo, ou foram ambos igualmente dispersos em átomos.25. Pensa em tudo aquilo, de ordem corpórea ou mental, que se está a passarao mesmo tempo dentro de cada um de nós; e então não ficarás surpreendidoque um número infinitamente maior de coisas — na realidade, tudo o que nasceneste vasto Único-e-Todo a que chamamos o universo — possa existirsimultaneamente lá dentro.26. Se te pedissem que soletrasses o nome António, soltarias cada uma dasletras aos berros, e depois, se os teus ouvintes ficassem irritados tu, por tua vez,irritavas-te também? Ou começarias a enumerar as várias letras calmamenteuma a uma? Bem, então lembra-te de que, aqui na vida, cada um dos deveres étambém formado pelos seus elementos separados. Presta muita atenção a cadaum deles sem espalhafato e sem responder à irritação com irritação, para assimassegurares a finalização da tarefa que te foi distribuída.27. Como é bárbaro negar aos homens o privilégio de perseguirem aquilo queeles julgam ser as suas preocupações e interesses apropriados! E contudo, emcerto sentido, é isso exactamente o que tu estás a fazer quando deixas que a tuaindignação se manifeste perante os seus erros; porque, afinal, eles estão apenasa perseguir as suas aparentes preocupações e interesses. Tu dizes que eles— 70 —
estão enganados? Então diz-lhes isso, e explica-o a eles em vez de ficaresindignado.28. A morte: uma libertação das impressões sensoriais, dos impulsos do apetite,dos desvios do pensamento e do serviço da carne.29. Que vergonha para a alma: hesitar na estrada da vida enquanto o corpoainda persiste.30. Tem cuidado, não assumas em demasia a qualidade de monarca, não tedeixes tingir profundamente pela púrpura; porque isso pode acontecer. Conservaa simplicidade, a bondade, a pureza, a seriedade e a modéstia; o amor da justiçae da religiosidade; sê amável, afectuoso e resoluto na tua devoção ao dever.Esforça-te o máximo por seres sempre um homem como a Filosofia manda quesejas. Venera os deuses e ajuda os teus semelhantes mortais. A vida é curta, eessa curta existência terrena não tem senão um fruto para produzir — asantidade, interiormente, e, exteriormente, a acção desinteressada. Sê em todasas coisas discípulo de António; lembra-te da sua insistência no controle docomportamento pela razão, da sua postura tranquila em todas as ocasiões, e dasua própria santidade; da serenidade do seu aspecto e da doçura das suasmaneiras; do seu desprezo pela notoriedade, e do seu zelo pelo domínio dosfactos; e de como ele nunca punha de lado um assunto enquanto não oexaminasse exaustivamente e o compreendesse claramente; de como ele eraalvo de críticas injustas sem responder da mesma maneira; de como ele nuncatinha pressa e não tinha amigos mexeriqueiros; de como era astuto nos seusjuízos sobre os homens e sobre as maneiras, mas nunca crítico; de como estavacompletamente liberto de nervosismos, suspeições e demasiadas subtilezas; decomo facilmente se contentava em coisas como o alojamento, a cama, ovestuário, as refeições e o serviço; de como era trabalhador e paciente; de comoconseguia, graças a uma dieta frugal, ficar a trabalhar de manhã à noite semsequer atender aos apelos da natureza até à sua hora habitual; como era firme econstante nas amizades, tolerando as mais francas oposições às suas opiniões,e aceitando de bom grado qualquer correcção sugerida; da veneração, semqualquer vestígio de superstição, que mostrava para com os deuses. Lembra-tede tudo isto para que, quando a tua hora chegar, a tua consciência esteja tãolímpida como a dele.31. Volta agora aos teus sóbrios sentidos; recorda o teu próprio eu; desperta dotorpor e reconhece que foram apenas sonhos que te atormentaram; eexactamente como os olhaste, olha agora o que os teus olhos despertos vêem.32. Um corpo e uma alma constituem a minha pessoa. Ao corpo tudo éindiferente, porque é incapaz de fazer distinções. Ao espírito, as únicas coisasque não são indiferentes são as suas próprias actividades, e estas estão todassob o seu controle. Além disso, mesmo em relação a elas, a sua única— 71 —
- Page 20 and 21: próprio, creio que o nosso instint
- Page 22 and 23: universo, afirma, «A este Poder ch
- Page 25 and 26: Nota do tradutorda versão inglesaT
- Page 27: Marco AurélioMeditações
- Page 30 and 31: momento, perder de vista a razão.
- Page 32 and 33: complacência ou compunção os ben
- Page 34 and 35: sofista ou ter passado todo o meu t
- Page 36 and 37: Usa-o, portanto, para avançares no
- Page 38 and 39: causa da ignorância dos homens a r
- Page 41 and 42: LIVRO 31. A consumição diária da
- Page 43 and 44: 5. Que haja nas tuas acções solic
- Page 45: 12. Se cumprires a tarefa que tens
- Page 48 and 49: própria morada, um minúsculo cant
- Page 50 and 51: sepultura, nada, evidentemente; e m
- Page 52 and 53: todo o coração aos deuses, e que,
- Page 54 and 55: sempre em ciclos repetidos». Lembr
- Page 57 and 58: LIVRO 51. Aos primeiros raios de lu
- Page 59 and 60: ocorrências no interesse do nosso
- Page 61 and 62: outra parte, e assim sucessivamente
- Page 63 and 64: 26. Não deixes que as emoções da
- Page 65: Apesar de banido para não importa
- Page 68 and 69: 11. Quando a força das circunstân
- Page 72 and 73: preocupação são as do momento pr
- Page 74 and 75: consequentemente, o que é bom para
- Page 77 and 78: LIVRO 71. O que é o mal? Uma coisa
- Page 79 and 80: 16. A razão-mestra nunca é vítim
- Page 81 and 82: lembrar que todas as coisas estão
- Page 83 and 84: 52. «Mais astuto na arena», 58 se
- Page 85 and 86: enfrentou mais arduamente os rigore
- Page 87 and 88: LIVRO 81. A tendência será para a
- Page 89 and 90: 14. Quando conheceres alguém, seja
- Page 91 and 92: aloje nesta minha alma; está ao me
- Page 93 and 94: impotentes para o tocar. «O globo,
- Page 95 and 96: 53. Gostarias de receber o louvor d
- Page 97 and 98: LIVRO 91. A injustiça é pecado. A
- Page 99 and 100: aqui em baixo, elas são tão ávid
- Page 101 and 102: acto tão cismático como quando qu
- Page 103 and 104: dizer que tudo está errado e sempr
- Page 105: qualquer maneira serviu o bem comum
- Page 108 and 109: 6. Independentemente do facto de o
- Page 110 and 111: felicidade de uma integridade e dig
- Page 112 and 113: que queiras. Encontrarás esta mesm
- Page 114 and 115: de ultrapassar todas as barreiras t
- Page 117 and 118: LIVRO 111. As propriedades de uma a
- Page 119 and 120: que nunca voltou a enxertar-se depo
20. Quando um adversário, no ginásio nos fere com as unhas ou nos magoa acabeça num choque, não protestamos nem ficamos ofendidos, nem passamosdepois a desconfiar sempre das suas intenções. Contudo passamos a olhá-locom cautela, não com inimizade ou suspeição, mas mantendo-o, com bonomia,à distância. Que assim seja também noutras situações da vida; concordemos empassar por cima de muitas coisas naqueles que são como que nossoscompetidores. O simples acto de evitar, como já tenho dito, está sempre, paranós, em aberto, sem suspeição ou má vontade.21. Se alguém me consegue mostrar e provar que estou errado no pensamentoou na acção, eu mudo de bom grado. Eu procuro a verdade, o que ainda nuncamagoou ninguém. Só a persistência na auto-ilusão e na ignorância é que magoa.22. Eu faço aquilo que é meu dever fazer. Nada mais me distrai; porquecertamente se trata de qualquer coisa inanimada e irracional, ou de alguém queestá iludido ou não sabe o caminho.23. Sê generoso e liberal na tua atitude em relação às criaturas irracionais e àgeneralidade das coisas materiais, porque tu tens uma razão e elas, não. Osseres humanos, por outro lado, têm uma razão; portanto trata-os comcamaradagem. Pede, em tudo, o auxílio dos deuses — mas sem demasiadapreocupação quanto à extensão das tuas preces; três horas chegam.24. Na morte, o fim de Alexandre da Macedónia não foi minimamente diferentedo do seu moço da estrebaria. Ou foram ambos recebidos no mesmo princípiogenerativo do universo, ou foram ambos igualmente dispersos em átomos.25. Pensa em tudo aquilo, de ordem corpórea ou mental, que se está a passarao mesmo tempo dentro de cada um de nós; e então não ficarás surpreendidoque um número infinitamente maior de coisas — na realidade, tudo o que nasceneste vasto Único-e-Todo a que chamamos o universo — possa existirsimultaneamente lá dentro.26. Se te pedissem que soletrasses o nome António, soltarias cada uma dasletras aos berros, e depois, se os teus ouvintes ficassem irritados tu, por tua vez,irritavas-te também? Ou começarias a enumerar as várias letras calmamenteuma a uma? Bem, então lembra-te de que, aqui na vida, cada um dos deveres étambém formado pelos seus elementos separados. Presta muita atenção a cadaum deles sem espalhafato e sem responder à irritação com irritação, para assimassegurares a finalização da tarefa que te foi distribuída.27. Como é bárbaro negar aos homens o privilégio de perseguirem aquilo queeles julgam ser as suas preocupações e interesses apropriados! E contudo, emcerto sentido, é isso exactamente o que tu estás a fazer quando deixas que a tuaindignação se manifeste perante os seus erros; porque, afinal, eles estão apenasa perseguir as suas aparentes preocupações e interesses. Tu dizes que eles— 70 —