interminavelmente sobre a destruição do mundo pelo fogo, mas no fim foi a águaque lhe saturou o corpo e morreu num emplastro de excrementos. Demócrito 19foi destruído por insectos; Sócrates por insectos de outro tipo 20 . E a moral detudo isto? Esta. Embarca-se, faz-se a viagem, chega-se ao porto: desembarcase,então. Noutra vida? Há deuses por toda a parte, mesmo no além. Nainsensibilidade final? Então ficaremos fora do alcance da dor e do prazer, e jánão escravos desta embarcação terrena, tão incomensuravelmente maismesquinha do que o seu ministro assistente. Porque um é espírito e divindade; eo outro, apenas barro e corrupção.4. Não desperdices o que resta da tua vida a especular sobre os teus vizinhos,a não ser que tenhas em vista qualquer benefício mútuo. Interrogares-te sobre oque fulano está a fazer e porquê, ou sobre o que ele está a dizer ou a pensar oua planear — numa palavra, sobre qualquer coisa que te desvie da fidelidade aosoberano governador dentro de ti — significa uma perda de oportunidade paraoutra tarefa qualquer. Repara então que o fluir dos teus pensamentos estáliberto de fantasias ociosas ou casuais, particularmente daquelas de naturezaindiscreta ou maldizente. Um homem devia habituar-se de tal maneira a estemodo de pensar que, subitamente perguntado, «Em que estás a pensar nestemomento?» pudesse responder honestamente e sem hesitação, provando assimque todos os seus pensamentos eram simples e bondosos como convém a umser social, sem o gosto pelos prazeres de imaginações sensuais, ciúmes,invejas, suspeitas ou quaisquer outros sentimentos que o fariam corar aoreconhecê-los em si próprio. Um homem assim, determinado aqui e agora aaspirar às alturas, é, de facto, um pastor e ministro dos deuses; porque está ausar plenamente aquele poder interior que pode manter um homem limpo deprazeres, à prova da dor, indiferente ao insulto e impermeável ao mal. É umconcorrente ao maior dos concursos, a luta contra o domínio da paixão; ficacompletamente impregnado de rectidão, recebendo com sincera alegria o quequer que seja que lhe caiba em sorte e raramente se perguntando sobre o queos outros possam dizer, fazer ou pensar, excepto quando o interesse público oexija. Limita as suas actividades àquilo que lhe diz respeito, deixando a suaatenção presa ao seu particular fio da teia universal, procurando fazer com queas suas acções sejam honradas, e na convicção de que tudo o que lhe possaacontecer tem de ser para o melhor — porque o seu próprio destino está, elepróprio, sob orientação superior. Não esquece a relação fraterna de todos osseres racionais, nem que a preocupação por todos os homens é própria dahumanidade: e sabe que não são as opiniões do mundo que deve seguir, masapenas as dos homens cuja vida está confessadamente de acordo com aNatureza. Quanto aos outros, cuja vida não está assim organizada, ele lembraconstantemente o carácter que eles mostram diariamente, dia e noite, em casa,e cá fora, e o tipo de sociedade que eles frequentam; e a aprovação de taishomens, que nem sequer se sentem bem consigo próprios, não tem, para ele,qualquer valor.— 42 —
5. Que haja nas tuas acções solicitude, sem deixares, porém, de ter em atençãoo interesse comum; ponderação, mas sem indecisão; e que nos teussentimentos não haja excesso pretensioso de refinamento. Evita a loquacidade,evita a solicitude excessiva. O deus que há dentro de ti deve presidir sobre umser que seja viril e maduro, homem de estado, romano e soberano; um homemque não ceda terreno, qual soldado à espera do sinal de retirada do campo debatalha da vida, pronto a dar as boas vindas ao seu alívio; um homem cujareputação não necessite de ser afirmada por si próprio, nem avalizada pelosoutros. Eis o segredo da alegria, de não depender da ajuda de fora, e de nãoprecisar de implorar a ninguém o favor da tranquilidade. Temos de nos pôr de pépor nós próprios, e não ser postos de pé.6. Se a vida mortal te puder oferecer alguma coisa melhor do que a justiça e averdade, o autodomínio e a coragem — isto é, paz de espírito na evidenteconformidade das tuas acções com as leis da razão, e paz de espírito nasprovações de um destino que não controlas — se, digamos, conseguiresdiscernir um ideal mais elevado, nesse caso, aproveita-o com toda a tua alma ealegra-te com o prémio que encontraste. Mas se nada te parece melhor do que adivindade que mora dentro de ti, que orienta cada impulso, que pesa cadaimpressão, que abjura (nas palavras de Sócrates) as tentações da carne, e queconfessa fidelidade aos deuses e compaixão pela humanidade; se, emcomparação, achares tudo o resto mesquinho e sem valor, então não abras em tiespaço a quaisquer outras causas. Porque se alguma vez hesitares e tedesviares, já não serás capaz de oferecer lealdade firme ao ideal que escolhestepara ti próprio. Nenhumas ambições de outra natureza diferente podem disputaro título à bondade que pertence à razão e ao dever cívico; nem o aplauso domundo, nem o poder, nem a riqueza, nem a alegria do prazer. À primeira vista,parece não haver incompatibilidade nestas coisas, mas logo elas levam a melhore desequilibram o homem. Dir-te-ia, então, que escolhesses simples eespontaneamente o mais elevado e aderisses a ele. «Mas o melhor para mim éo mais elevado», dizes tu? Se é o melhor para ti como ser racional, segura-obem; mas se o é meramente como animal, então di-lo abertamente e mantém oteu ponto de vista com a correspondente humildade — assegura-te apenas deque ponderaste bem o assunto.7. Não prezes as vantagens advindas de qualquer coisa que envolva quebra dafé, perda do respeito por ti próprio, ódio, suspeita, ou maldição dos outros,insinceridade, ou desejo de qualquer coisa que tenha de estar dissimulado ouescondido. Uma pessoa cuja principal atenção vai para o seu próprio espírito epara a divindade que há dentro de si, bem como para servir a sua excelência,não toma atitudes afectadas, não se queixa, e não suspira pela solidão nem tãopouco por uma multidão. E o melhor de tudo é que a sua vida ficará livre decontínuas buscas e esquivas. Não se preocupa se a alma dentro do seu corpomortal será sua por muitos ou poucos anos; se neste preciso momento for aaltura de partir, avançará tão prontamente como para desempenhar qualqueroutra acção que possa ser realizada de maneira digna e tranquila. Não tem outra— 43 —
- Page 1: Marco Aurélio(Imperador Romano)Med
- Page 4 and 5: Versão portuguesabaseada na tradu
- Page 9: «Enquanto os homens continuarem a
- Page 12 and 13: com autoridade nos campos da metaf
- Page 14 and 15: pelos cabelos e lhe arranca a aceit
- Page 16 and 17: assento no coração, o principal c
- Page 18 and 19: Marco Aurélio AntónioMarco Annio
- Page 20 and 21: próprio, creio que o nosso instint
- Page 22 and 23: universo, afirma, «A este Poder ch
- Page 25 and 26: Nota do tradutorda versão inglesaT
- Page 27: Marco AurélioMeditações
- Page 30 and 31: momento, perder de vista a razão.
- Page 32 and 33: complacência ou compunção os ben
- Page 34 and 35: sofista ou ter passado todo o meu t
- Page 36 and 37: Usa-o, portanto, para avançares no
- Page 38 and 39: causa da ignorância dos homens a r
- Page 41: LIVRO 31. A consumição diária da
- Page 45: 12. Se cumprires a tarefa que tens
- Page 48 and 49: própria morada, um minúsculo cant
- Page 50 and 51: sepultura, nada, evidentemente; e m
- Page 52 and 53: todo o coração aos deuses, e que,
- Page 54 and 55: sempre em ciclos repetidos». Lembr
- Page 57 and 58: LIVRO 51. Aos primeiros raios de lu
- Page 59 and 60: ocorrências no interesse do nosso
- Page 61 and 62: outra parte, e assim sucessivamente
- Page 63 and 64: 26. Não deixes que as emoções da
- Page 65: Apesar de banido para não importa
- Page 68 and 69: 11. Quando a força das circunstân
- Page 70 and 71: 20. Quando um adversário, no giná
- Page 72 and 73: preocupação são as do momento pr
- Page 74 and 75: consequentemente, o que é bom para
- Page 77 and 78: LIVRO 71. O que é o mal? Uma coisa
- Page 79 and 80: 16. A razão-mestra nunca é vítim
- Page 81 and 82: lembrar que todas as coisas estão
- Page 83 and 84: 52. «Mais astuto na arena», 58 se
- Page 85 and 86: enfrentou mais arduamente os rigore
- Page 87 and 88: LIVRO 81. A tendência será para a
- Page 89 and 90: 14. Quando conheceres alguém, seja
- Page 91 and 92: aloje nesta minha alma; está ao me
- Page 93 and 94:
impotentes para o tocar. «O globo,
- Page 95 and 96:
53. Gostarias de receber o louvor d
- Page 97 and 98:
LIVRO 91. A injustiça é pecado. A
- Page 99 and 100:
aqui em baixo, elas são tão ávid
- Page 101 and 102:
acto tão cismático como quando qu
- Page 103 and 104:
dizer que tudo está errado e sempr
- Page 105:
qualquer maneira serviu o bem comum
- Page 108 and 109:
6. Independentemente do facto de o
- Page 110 and 111:
felicidade de uma integridade e dig
- Page 112 and 113:
que queiras. Encontrarás esta mesm
- Page 114 and 115:
de ultrapassar todas as barreiras t
- Page 117 and 118:
LIVRO 111. As propriedades de uma a
- Page 119 and 120:
que nunca voltou a enxertar-se depo
- Page 121 and 122:
Um Terceiro. Se o que eles estão a
- Page 123 and 124:
uniformidade a todos os seus actos,
- Page 125 and 126:
LIVRO 121. Todas as bênçãos que,
- Page 127 and 128:
10. Vê de que é que as coisas sã
- Page 129 and 130:
25. Uma vez rejeitada a visão que
- Page 131:
cinco actos». Precisamente; no dra
- Page 134 and 135:
sendo a primeira vítima o seu inve
- Page 136:
cortesão — tomam o lugar de pess