Marco Aurélio AntónioMarco Annio Vero, o futuro imperador de Roma, nasceu em 26 de Abril de 121 a.D. durante o reinado do Imperador Adriano. O pai, Annio Vero, era um nobreromano, e o avô, com o mesmo nome, tinha sido Prefeito da Cidade e, por trêsvezes, Cônsul. Ambos os pais morreram ainda novos e, depois da morte do pai,Marco foi adoptado pelo avô, de quem ele fala com caloroso afecto e respeito.Os anos da infância foram felizes, e de estudo; uma série de tutores dos maiscompetentes tomaram conta da sua educação e treinaram-no nas doutrinas dafilosofia estóica; e embora a sua saúde não fosse nunca muito robusta, gostavade montar a cavalo, caçar, lutar, e de jogos de ar livre. Quando tinha dezasseteanos, o Imperador Adriano morreu e sucedeu-lhe Aurélio António (vulgarmenteconhecido como António Pio), cuja mulher era uma tia de Marco chamadaFaustina. Não tendo filhos varões, António adoptou o jovem sobrinho de suamulher, mudou-lhe o nome para Marco Aurélio António, nomeou-o seu sucessore prometeu-o em casamento à sua filha Faustina. O grau de felicidade queMarco encontrou neste casamento é, e continuará por ventura a ser, um enigma.Os cronistas contemporâneos deliciam-se a relatar pormenorizadamentehistórias da despudorada licenciosidade da mulher, e afirmam que ela eratratada com uma indulgência censurável por um marido de longe bom demaispara ela. Contudo, as provas de tudo isto são duvidosas; e o certo é que,quando ela morreu, trinta anos mais tarde, Marco sofreu com a sua perda. Eladera-lhe cinco filhos que ele amava apaixonadamente; mas a morte roubou-lhesucessivamente todos eles, à excepção do inútil Cómodo, que viveu o suficientepara suceder ao pai.Dos dezassete aos quarenta anos, como companheiro próximo e colega deAntónio, Marco entregou-se à aprendizagem das artes de governo e àpreparação para os seus futuros deveres de imperador. Nesses anos amajestosa imensidão da pax romana, mantida pela administração imperial,estendeu-se a toda a Europa Ocidental e do Sul, ao Norte de África, à ÁsiaMenor, à Arménia e à Síria. Mas muito do fardo da governação deste vastodomínio centrava-se na pessoa do próprio imperador; e quando António morreu,em 161, caiu sobre Marco uma enorme e pesada responsabilidade. Contrariandoos desejos do Senado, levou consigo para o trono, como colega, Lúcio Vero, ooutro filho adoptivo de António; e, pela primeira vez, Roma assistiu aoespectáculo de dois imperadores. Quase simultaneamente, os longos anos deserenidade imperial chegaram ao fim. Uma peste espalhou-se desastrosamentepor todo o mundo ocidental. Inundações destruíram grandes quantidades decereal em Roma, obrigando Marco a vender as jóias reais para aliviar osofrimento dos seus súbditos famintos. A juntar à ansiedade da peste e da fome,ele encontrou-se a braços com sinais de guerra. A paz foi quebrada pelo fragordas armas; nas fronteiras orientais, bandos de ferozes homens tribais doMarcomanni (“homens das marcas”), Quadi, e Sarmati invadiram a raia numasérie de tentativas determinadas de penetrar nas defesas do Império. Peranteesta ameaça, Marco deixou Roma em 167 para assumir pessoalmente o— 18 —
comando das suas legiões depauperadas no Danúbio. Em 169 Vero morreu, edurante a maior parte dos treze anos seguintes Marco ficou só no seu posto.Durante um curto intervalo foi chamado à Ásia, onde o comandante das tropas,Avídeo Cássio, se revoltou e se fez proclamar imperador. Mas Cássio foiassassinado por dois dos seus oficiais; e, como é característico de Marco,quando aqueles lhe trouxeram, a cabeça decepada, ele recuou e recusourecebê-los. Ordenou que todos os papéis de Cássio fossem queimados por ler, etratou os rebeldes com clemência. Durante esta expedição ao Oriente, a suamulher Faustina, que o acompanhara, morreu; e Marco voltou para o Danúbiopara retomar a tarefa de suster a maré invasora da barbárie. Aí, por entre ospântanos enevoados e as ilhas fumegantes daquela melancólica região, elebuscava consolo para as suas horas de solidão e exílio na redacção das suasMeditações. Anos de trabalho árduo e conflito tinham-lhe exaurido o espírito;estava cansado da vida, e, nas suas próprias palavras, «à espera da saída parao retiro». Quando, por fim, uma doença infecciosa o atacou, ele ainda searrastou alguns dias, vindo a morrer em 17 de Março de 180, com cinquenta enove anos de idade e dezanove de reinado. «Não chorai por mim,» foram assuas últimas palavras, «pensem antes na pestilência e na morte de tantosoutros».Sugerir que Marco não era um verdadeiro estóico parece paradoxal. Contudo assuas meditações revelam um tipo de carácter que dificilmente agradaria a Zenãoou a Chrysipo. Os humores variando entre a esperança e a depressão, osensível retraimento perante companheiros desagradáveis ou a vista de sangue,a ânsia reprimida, mas evidente, por simpatia e afecto — tudo isto não eramsinais de um carácter moldado à antiga maneira estóica. A verdade é que Marcorepresenta uma fase transitória de pensamento. Em lugar da velha afirmação deauto-suficiência, há uma timidez e uma predisposição para reconhecer ospróprios fracassos; em vez da estóica virtude do orgulho, ele parece antecipar avirtude cristã da humildade. Por isso, ainda mais simpatizamos com as suasrepetidas lutas pelo autodomínio e pelos seus esforços por orientar todos osimpulsos naturais e emoções para o implacável serviço do dever. Sem dúvidaque esta constante preocupação em se aperfeiçoar, esta insistência emaperfeiçoar máximas e lugares-comuns morais, produziram uma impressãodesagradável em alguns leitores; e houve mesmo detractores que chamaram aMarco impostor e pedante. Penso que tal juízo mostra falta de entendimento danatureza do temperamento religioso; porque quando um homem toma a suareligião seriamente, o auto-exame consciencioso e a aspiração à virtude têmobrigatoriamente de constituir uma muito grande parte de todas as suasperegrinações interiores e meditações. Aliás, os escritos de um S. Paulo ou deum Thomas à Kempis mostram tantos conselhos, exortações à santidade ecitações de autoridades canónicas como as que encontramos em Marco;contudo, ninguém teve a audácia de acusar os seus autores de insinceridade —apesar mesmo das suas confessadas intenções de escrever para a edificaçãode uma larga faixa de leitores. Quando, por outro lado, escutamos as secretasconversas íntimas do imperador-filósofo com a sua própria alma, e noslembramos de que ele nunca se dirige a qualquer ouvinte humano a não ser ele— 19 —
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