que queiras. Encontrarás esta mesma ideia em Platão, quando ele fala em viverdentro das muralhas da cidade «como se a ordenhar os rebanhos num redil damontanha.» 7024. O que é para mim a minha razão-mestra? O que é que estou a fazer delaneste momento? Que uso estou eu a dar-lhe? Será que ela está a revelar-seuma tonta? Estará a ficar divorciada e separada dos laços da camaradagem?Terá ficado tão envolvida e tão identificada com a carne que reflecte as suasmudanças e vacilações?25. Um servo que se liberta do seu amo é um desertor. Para nós, o amo é a lei;e consequentemente qualquer transgressor tem que ser um desertor. Mas opesar, a cólera ou o medo são todos eles rejeições de qualquer coisa que nopassado, no presente ou no futuro foi decretado pelo poder que rege o universo— por outras palavras, pela Lei, que atribui a cada criatura aquilo que lhe édevido. 71 Ceder ao medo, ao pesar ou à cólera é, portanto, ser um desertor.26. Um homem deixa uma semente no útero e prossegue o seu caminho;depois outra causa pega nela, põe-se a trabalhar, e acaba a formar um bebé —que transformação! O mesmo homem ingere os alimentos e, uma vez mais, umaoutra causa pega neles e converte-os em sensação e movimento e, em suma,em vida, vigor, e outros produtos, muitos e variados. Pensa nestes processosque são trabalhados de maneira tão misteriosa; e vê o poder a trabalhar ali damesma maneira como vemos as forças que atraem os objectos para a terra epara cima — não com os olhos, quero dizer, mas não menos claramente.27. Pensa muitas vezes como toda a vida de hoje é uma repetição do passado;e observa que ela também pressagia o que está para vir. Revê os muitosdramas acabados e os seus cenários, todos tão semelhantes, que tensconhecido na tua experiência, ou da história passada: todo o círculo da corte deAdriano, por exemplo, ou a corte de António, ou as cortes de Filipe, Alexandre eCresus. A representação é sempre a mesma, só os actores mudam.28. Quando vires um homem aborrecido ou ressentido com alguma coisa,pensa num porco a espernear e a grunhir sob a faca do sacrifício. Outro que serecolha na cama, em solidão, lamentando-se silenciosamente da nossaservidão, também não está em melhor situação. Só aos seres racionais égarantido o poder de uma conformidade voluntária com as circunstâncias; asimples conformidade em si mesma, que a implacável necessidade exige decada criatura.29. Em qualquer coisa de que te encarregues, seja ela qual for, pára a cadapasso para te perguntares: «É a ideia de ser privado disto que me faz temer amorte?»— 112 —
30. Quando a falta de outrem te magoa, volta-te para ti mesmo e pensa nosdefeitos semelhantes que tu tens. Também encontras o teu bem estar nariqueza, no prazer, na reputação ou em coisas deste tipo? Pensa nisto, e a tuacólera logo será esquecida ao reflectires que ele está a agir sob pressão; quemais podia ele fazer? Em alternativa, arranja maneira de o libertar dessapressão.31. Que a vista de Satyricon te recorde os falecidos Socráticos ou Eutyches ouHymen; a vista de Euphrates te lembre Eutychion ou Silvano; um olhar aAlciphron te sugira a memória de Tropaeophorus; um vislumbre de Severo, o deCrito ou Xenofonte; quando te olhares pensa nos imperadores que teprecederam. Da mesma maneira, com cada homem imagina a sua contrapartida;e depois passa para a seguinte reflexão: «Onde estão eles agora?» Em partenenhuma — ou algures. Desta maneira, ir-te-ás acostumando a olhar tudo o queé mortal como um vapor e um nada; e mais ainda, se te lembrares também deque as mudanças nas coisas, uma vez operadas, são para sempre irreversíveis.Então porquê lutar e esforçares-te em vez de ficares satisfeito em viverconvenientemente a tua curta vida? Pensa no material e nas possibilidades parao bem que andas a rejeitar; uma vez que, o que são as tuas aflições senãoexercícios para treino da tua razão, depois de ter aprendido a ver as verdadesda vida a uma correcta luz filosófica? Sê paciente, pois, até que, para ti, elas setornem familiares e naturais, da mesma maneira que um estômago forte podeassimilar toda a espécie de alimentos, ou um fogo brilhante transforma qualquercoisa que se lhe atire em calor e chamas.32. Não permitas que alguém se sinta no direito de dizer com verdade que tefalta integridade e bondade; se alguém pensar tal coisa, trata de fazer com queisso não tenha fundamento. Tudo depende de ti, pois, quem mais te podeimpedir de conseguir a integridade e a bondade? Se não consegues viver destamaneira, só tens de tomar a decisão de não continuar a viver; porque, nessecaso, nem a própria razão te pode exigir que continues.33. Qual é a melhor coisa que pode ser dita ou feita com os materiais à tuadisposição? Qualquer que ela seja, tu tens o poder de o dizer ou fazer; que nãohaja a pretensão de que não és um agente livre. Essas tuas lamentações nuncaacabarão enquanto o cumprimento do dever natural de um homem, comquaisquer materiais que lhe venham ter às mãos, não representar tanto para ticomo os prazeres para o sibarita. (De facto, todo o exercício dos nossosinstintos naturais deve ser considerado como uma forma de prazer; e asoportunidades para isso estão presentes em toda a parte.) Um cilindro não temsempre o privilégio, seguramente, de se mover à sua vontade, nem a água, nemo fogo, nem qualquer outra coisa que esteja submetida ao governo da suaprópria natureza ou de uma alma sem razão; porque há muitos factores queintervêm para o evitar. Mas um espírito e uma razão podem avançar no meio dequaisquer obstáculos, porque a sua natureza para tal os capacita e a suavontade para tal os incita. Imagina a maneira como a razão descobre um meio— 113 —
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