21.07.2015 Views

O olhar inocente é cego. A construção da cultura visual ... - capes

O olhar inocente é cego. A construção da cultura visual ... - capes

O olhar inocente é cego. A construção da cultura visual ... - capes

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

O OLHAR INOCENTE É CEGO 58representação de fachos, flechas ou “raios projetantes”. Em relação a esse tema,Michael Kubovy apresenta uma imagem no mínimo desconcertante: o afresco deAndrea Mantega que mostra um homem atingido no olho por uma flecha (Figura16). A primeira fotografia colori<strong>da</strong> deste afresco <strong>da</strong> igreja Eremitani de Pádua foifeita durante a Segun<strong>da</strong> Guerra, quando partes do desenho já se encontravam emp<strong>é</strong>ssimo estado. Ain<strong>da</strong> durante a guerra, a capela onde o afresco se encontrava, foicompletamente destruí<strong>da</strong> por um bombardeio. Para Kubovy, apesar <strong>da</strong> existênciade relatos que contam o martírio de São Cristóvão atingido no olho por umaflecha, nesta obra a flecha funciona como uma metáfora <strong>da</strong> arte <strong>da</strong> perspectiva 71 .Em sua hipótese, o psicólogo <strong>da</strong> percepção se apóia na id<strong>é</strong>ia de que durante aRenascença, a perspectiva era um conceito fun<strong>da</strong>mental para os artistas eintelectuais e, tamb<strong>é</strong>m, no fato de que a maior parte <strong>da</strong>s imagens de São Cristóvãofeitas no período não reproduz a cena <strong>da</strong> flecha<strong>da</strong>, inclusive outros afrescos dopróprio Mantegna. Kubovy igualmente se apóia em textos contemporâneos –inclusive de Leonardo <strong>da</strong> Vinci - que utilizam a metáfora <strong>da</strong> flecha para descrevero caminho <strong>da</strong> imagem capta<strong>da</strong> na direção do olho e na suposição de que esta partedo afresco seria uma homenagem a Alberti e sua janela. Mas, acima de tudo, oautor enfatiza a id<strong>é</strong>ia <strong>da</strong> perspectiva como portadora de uma sugestão espiritualcapaz de, à <strong>é</strong>poca, permitir uma experiência próxima à transcendência. Embora aid<strong>é</strong>ia de transcendência nos pareça excessiva <strong>é</strong> possível imaginar que, para o <strong>olhar</strong>de um admirador contemporâneo <strong>da</strong>s pinturas do inicio <strong>da</strong> Renascença, a visão<strong>da</strong>s imagens construí<strong>da</strong>s com a utilização <strong>da</strong> perspectiva devia parecerextraordinária, algo “equivalente à visão <strong>da</strong> alma” 72 , mais do que podemos hojeconceber como uma “reprodução do mundo visível”. O homem deste períodoain<strong>da</strong> estava muito carregado do misticismo <strong>da</strong> I<strong>da</strong>de M<strong>é</strong>dia e não <strong>é</strong> de estranharque esse misticismo produzisse influências sobre a sua forma de <strong>olhar</strong>.71 KUBOVY, Michael. The Psychology of Perspective and Renaissance Art. Cambridge University Press,1986. p. 1-14.72 SNYDER, Joel. Picturing Vision. In: MITCHELL, W. J. Thomas (ed.). The Language of images. Chicago:The University of Chicago Press, 1980. p. 246.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!