O olhar inocente é cego. A construção da cultura visual ... - capes
O olhar inocente é cego. A construção da cultura visual ... - capes O olhar inocente é cego. A construção da cultura visual ... - capes
O OLHAR INOCENTE É CEGO 212mídia eletrônica. Como entretenimento popular, o panorama ofereceu um amploacesso à informações visuais, mas, ao contrário de outras formas de arte, ele nãorequeria nenhum conhecimento especializado anterior, assim como nenhumaexpertise estética. Justamente pela oferta de ilusão pictórica, além da totalaproximação com a natureza, o panorama era desprestigiado como arte. “A arteencanta porque relembra, não porque engana”. 436 Neste contexto, a imitação darealidade constituiu a base do prazer popular da classe média do século XIX – umprazer alicerçado na experiência dos sentidos. 437J. A. Eberhardt em suas críticas aos panoramas, escritas em 1807, descreveo terror, a vertigem e a náusea que os espectadores poderiam padecer:Nem o conhecimento da proximidade com o ponto de vista, nem a luz do sol, nemo contraste com a vizinhança imediata são capazes de me resgatar deste sonhoterrível, do qual tenho que me forçar contra minha inclinação. Deste modo, alguémpode por um fim à ilusão no momento em que ela se torna desagradável; mas atécnica não se encontra ao alcance de todos os espectadores do panorama. 438Bernard Comment em The Panorama, além de considerar a ética deste tipode representação, analisa nesta passagem a distinção entre representação eilusão. 439 Em nosso ponto de vista, ela aponta para uma pulsão escópica que emnossos dias é mais evidente na dificuldade de afastar o olhar das telas de TVencontradas em locais públicos. Do mesmo modo, a resistência a este tipo deimpulso, requer um autodomínio que talvez não se encontre ao alcance de todos.Neste sentido, é importante destacar a força com que algumas tecnologias sãocapazes de se infiltrar sobre o olhar.3.3.4. O tempo padronizadoA compressão tempo-espaço resultante da aceleração produzida pelas novastecnologias de transporte e comunicação produziram uma modificação concreta naforma como o tempo é compreendido e utilizado de maneira coletiva. Embora orelógio mecânico já existisse desde o século XIII e o relógio de pêndulo desde o436 In: RHODE, Eric. A History of the Cinema: From its origins to 1970. New York: Hill and Wang, 1976. p.8. apud MILLER, A. op. cit., p. 44.437 MILLER, A. op. cit., p. 44.438 EBERHARDT, J. A., Handbuch des Aesthetik, 1807. apud COMMENT, B. op. cit., p. 97.439 COMMENT, B. op. cit., p. 97.
O OLHAR INOCENTE É CEGO 213XVII, foi apenas no século XIX que eles passaram a ser produzidos em massa ecom peças intercambiáveis. 440 A utilização cada vez mais utilitária do mecanismo,mais do que uma necessidade da época evidencia a crescente importância de umtempo objetivo e impessoal sobrepondo-se ao tempo pessoal e subjetivo doindivíduo. O historiador alemão Karl Lamprecht observou nas últimas décadas doséculo XIX um crescente aumento na produção e importação de relógios de bolso(ele estima 12 milhões de relógios importados para uma população alemã deaproximadamente 52 milhões). Ao mesmo tempo, as pessoas passaram a prestarmaior atenção aos pequenos intervalos de tempo. 441 A crescente utilização derelógios é ao mesmo tempo causa e conseqüência do aumento do senso deurgência, de um maior desejo de velocidade através de uma maior compreensãoda pontualidade. Já em 1900, Simmel afirmava que “pontualidade,calculabilidade, exatidão são introduzida à força na vida pela complexidade eextensão da existência metropolitana e não estão apenas muito intimamenteligadas à sua economia do dinheiro e caráter intelectualístico”. 442A idéia de um tempo heterogêneo pertence ao terreno das subjetividades,aos novelistas, psicólogos e outros estudiosos interessados em examinar asdiferentes formas que os indivíduos se relacionam com o tempo. Em O retrato deDorian Gray, Oscar Wilde aponta para um tempo que passa, ou melhor, que nãopassa para o protagonista, enquanto o seu retrato, escondido no sótão, vairegistrando as mudanças que deveriam estar no corpo e no rosto de Dorian. ParaProust foi um pequeno bolo “curto e rechonchudo", uma madaleine, que o fezviajar no tempo em um processo que o autor passou a chamar de memóriainvoluntária, levando-o a concluir que o passado encontrar-se-ia “em um objetomaterial qualquer, fora do âmbito da inteligência e de seu campo de ação”. Emqual objeto, isso não se sabe, e é mesmo uma “questão de sorte se nos deparamoscom ele antes de morremos ou se jamais o encontramos”. 443Uma importante conseqüência direta da influência das ferrovias foi ainstituição do World Standard Time que representou a implantação de um tempohomogêneo, público e unificado. Em outras palavras, a transformação do tempo440 LOWE, D.,op. cit., p. 35.441 KERN, S. op. cit., p 110-111.442 SIMMEL, G. op. cit., p. 15.443 PROUST, Marcel. Em busca do tempo perdido. Vol. I: No caminho de Swann. Rio de Janeiro: Ediouro,1992. p. 55-56. A tradução reproduzida aqui é a de BENJAMIN, ibid., p. 106.
- Page 161 and 162: O OLHAR INOCENTE É CEGO 161descont
- Page 163 and 164: O OLHAR INOCENTE É CEGO 163sucess
- Page 165 and 166: O OLHAR INOCENTE É CEGO 165O grand
- Page 167 and 168: O OLHAR INOCENTE É CEGO 167especia
- Page 169 and 170: O OLHAR INOCENTE É CEGO 169Figura
- Page 171 and 172: O OLHAR INOCENTE É CEGO 171Figura
- Page 173 and 174: O OLHAR INOCENTE É CEGO 173busca t
- Page 175 and 176: O OLHAR INOCENTE É CEGO 175Figura
- Page 177 and 178: O OLHAR INOCENTE É CEGO 177É nest
- Page 179 and 180: O OLHAR INOCENTE É CEGO 179buscava
- Page 181 and 182: O OLHAR INOCENTE É CEGO 181Figura
- Page 183 and 184: O OLHAR INOCENTE É CEGO 183As prim
- Page 185 and 186: O OLHAR INOCENTE É CEGO 185de índ
- Page 187 and 188: O OLHAR INOCENTE É CEGO 187Apesar
- Page 189 and 190: O OLHAR INOCENTE É CEGO 189apontad
- Page 191 and 192: O OLHAR INOCENTE É CEGO 191Figura
- Page 193 and 194: O OLHAR INOCENTE É CEGO 193percebi
- Page 195 and 196: O OLHAR INOCENTE É CEGO 195estabil
- Page 197 and 198: O OLHAR INOCENTE É CEGO 197Figura
- Page 199 and 200: O OLHAR INOCENTE É CEGO 199Neste c
- Page 201 and 202: O OLHAR INOCENTE É CEGO 201relacio
- Page 203 and 204: O OLHAR INOCENTE É CEGO 203mecâni
- Page 205 and 206: O OLHAR INOCENTE É CEGO 205belezas
- Page 207 and 208: O OLHAR INOCENTE É CEGO 207percep
- Page 209 and 210: O OLHAR INOCENTE É CEGO 209alguns
- Page 211: O OLHAR INOCENTE É CEGO 211Enquant
- Page 215 and 216: O OLHAR INOCENTE É CEGO 215cinco m
- Page 217 and 218: O OLHAR INOCENTE É CEGO 2174.A ped
- Page 219 and 220: O OLHAR INOCENTE É CEGO 219exemplo
- Page 221 and 222: O OLHAR INOCENTE É CEGO 221indúst
- Page 223 and 224: O OLHAR INOCENTE É CEGO 223de la R
- Page 225 and 226: O OLHAR INOCENTE É CEGO 225constit
- Page 227 and 228: O OLHAR INOCENTE É CEGO 227esforç
- Page 229 and 230: O OLHAR INOCENTE É CEGO 229nova cu
- Page 231 and 232: O OLHAR INOCENTE É CEGO 231impress
- Page 233 and 234: O OLHAR INOCENTE É CEGO 233de Cris
- Page 235 and 236: O OLHAR INOCENTE É CEGO 235Figura
- Page 237 and 238: O OLHAR INOCENTE É CEGO 237ornamen
- Page 239 and 240: O OLHAR INOCENTE É CEGO 239O final
- Page 241 and 242: O OLHAR INOCENTE É CEGO 241grande
- Page 243 and 244: O OLHAR INOCENTE É CEGO 243Haveria
- Page 245 and 246: O OLHAR INOCENTE É CEGO 245palavra
- Page 247 and 248: O OLHAR INOCENTE É CEGO 247argumen
- Page 249 and 250: O OLHAR INOCENTE É CEGO 249Figura
- Page 251 and 252: O OLHAR INOCENTE É CEGO 251tartaru
- Page 253 and 254: O OLHAR INOCENTE É CEGO 253depois,
- Page 255 and 256: O OLHAR INOCENTE É CEGO 255Figura
- Page 257 and 258: O OLHAR INOCENTE É CEGO 257por úl
- Page 259 and 260: O OLHAR INOCENTE É CEGO 259como me
- Page 261 and 262: O OLHAR INOCENTE É CEGO 261Nenhum
O OLHAR INOCENTE É CEGO 212mídia eletrônica. Como entretenimento popular, o panorama ofereceu um amploacesso à informações visuais, mas, ao contrário de outras formas de arte, ele nãorequeria nenhum conhecimento especializado anterior, assim como nenhumaexpertise est<strong>é</strong>tica. Justamente pela oferta de ilusão pictórica, al<strong>é</strong>m <strong>da</strong> totalaproximação com a natureza, o panorama era desprestigiado como arte. “A arteencanta porque relembra, não porque engana”. 436 Neste contexto, a imitação <strong>da</strong>reali<strong>da</strong>de constituiu a base do prazer popular <strong>da</strong> classe m<strong>é</strong>dia do s<strong>é</strong>culo XIX – umprazer alicerçado na experiência dos sentidos. 437J. A. Eberhardt em suas críticas aos panoramas, escritas em 1807, descreveo terror, a vertigem e a náusea que os espectadores poderiam padecer:Nem o conhecimento <strong>da</strong> proximi<strong>da</strong>de com o ponto de vista, nem a luz do sol, nemo contraste com a vizinhança imediata são capazes de me resgatar deste sonhoterrível, do qual tenho que me forçar contra minha inclinação. Deste modo, algu<strong>é</strong>mpode por um fim à ilusão no momento em que ela se torna desagradável; mas at<strong>é</strong>cnica não se encontra ao alcance de todos os espectadores do panorama. 438Bernard Comment em The Panorama, al<strong>é</strong>m de considerar a <strong>é</strong>tica deste tipode representação, analisa nesta passagem a distinção entre representação eilusão. 439 Em nosso ponto de vista, ela aponta para uma pulsão escópica que emnossos dias <strong>é</strong> mais evidente na dificul<strong>da</strong>de de afastar o <strong>olhar</strong> <strong>da</strong>s telas de TVencontra<strong>da</strong>s em locais públicos. Do mesmo modo, a resistência a este tipo deimpulso, requer um autodomínio que talvez não se encontre ao alcance de todos.Neste sentido, <strong>é</strong> importante destacar a força com que algumas tecnologias sãocapazes de se infiltrar sobre o <strong>olhar</strong>.3.3.4. O tempo padronizadoA compressão tempo-espaço resultante <strong>da</strong> aceleração produzi<strong>da</strong> pelas novastecnologias de transporte e comunicação produziram uma modificação concreta naforma como o tempo <strong>é</strong> compreendido e utilizado de maneira coletiva. Embora orelógio mecânico já existisse desde o s<strong>é</strong>culo XIII e o relógio de pêndulo desde o436 In: RHODE, Eric. A History of the Cinema: From its origins to 1970. New York: Hill and Wang, 1976. p.8. apud MILLER, A. op. cit., p. 44.437 MILLER, A. op. cit., p. 44.438 EBERHARDT, J. A., Handbuch des Aesthetik, 1807. apud COMMENT, B. op. cit., p. 97.439 COMMENT, B. op. cit., p. 97.